Acórdão nº 553/17.4T8ABT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelFLORBELA MOREIRA LAN
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.

Relatório BB e mulher CC instauraram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra DD e mulher EE, pedindo seja decretada a mudança de servidão de passagem, constituída por destinação de pai de família, que onera o prédio dos Autores, a favor do prédio dos Réus, do local onde se encontra estabelecida, para o local indicado no art.º 12.º da petição inicial, ou seja, “uma passagem para o prédio dos RR., iniciando-se no espaço existente junto à Rua da …, seguindo em direcção a sul e curvando para a esquerda em direcção à estrema da parte rústica do prédio dos RR”, condenando os Réus a abster-se de passar pela primeira.

Subsidiariamente pediram que seja decretada a alteração do modo de exercício da servidão de passagem, nos termos supra referidos, ordenando que a servidão de passagem constituída a favor dos Réus, não se concretize na necessidade de instalação de um portão de abertura automático, mas somente com a entrega das chaves do portão aos Autores.

Os Réus contestaram, invocando a nulidade de todo o processo por falta/ininteligibilidade da causa de pedir.

Os AA. responderam à arguida excepção dilatória.

Terminada a fase dos articulados, conclusos os autos, foi proferido o seguinte despacho: “Terminada que está a fase dos articulados, dispenso a realização da audiência prévia, porque a presente acção tem um valor de € 5.000.01, o qual não é superior a metade da alçada do Tribunal da Relação (€ 15.000,00, porque o valor da alçada do Tribunal da Relação é de € 30.000,00, nos termos do artº 44º nº 1 da L.O.S.J.).

Com efeito, nas acções com este valor, a não realização da audiência précia é a regra (cfr. artº 597º do C.P.C.), não se afigurando, no caso concreto, considerando o teor dos articulados, em face do dever de gestão processual (artº 6º do C.P.C.) e do princípio da adequação formal (artº 547º do C.P.C.), que a convocação da audiência prévia fosse adequada às especificidades do caso «sub judice», ou necessária e útil aos fins do processo, razão pela qual dispenso a sua realização (neste sentido, Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil anotado, vol. II, 2017, p. 648; Paulo Ramos de Faria/Ana Luísa Loureiro – Primeiras Notas ao Código de Processo Civil, 2014, 2ª ed., vol. I, p. 558 e Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2015, p. 299).

Assim sendo, passo a proferir, de imediato, despacho saneador, bem como despacho a fixar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, bem como o despacho a admitir os meios de prova, em obediência ao disposto no artº 597º, als. c) e e) do C.P.C.

Notifique.

DESPACHO SANEADOR : O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria, da hierarquia e do território.

Da nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, em face da falta/ininteligibilidade da causa de pedir: Nos termos do disposto no artº 186º nº 1 do C.P.C., é nulo todo o processo, quando for inepta a petição inicial.

A ineptidão pode ocorrer quando falte, ou seja ininteligível, a indicação do pedido ou da causa de pedir ( artº 186º nº 2, al. a) do C.P.C. ).

Sendo a causa de pedir o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido pelo Autor ou requerente – cfr. Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª ed., p. 245 – a ininteligibilidade da mesma ocorre quando a causa de pedir for exposta em termos verdadeiramente obscuros ou ambíguos, que impeçam a parte contrária de tomar uma posição definida sobre os factos que a integram ( cfr. Antunes Varela e outros, ob. cit., p. 246 e Castro Mendes, Processo Civil, vol. III, p. 48 ).

Por seu lado, a falta da causa de pedir consiste na falta de indicação dos factos concretos que servem de servem de fundamento ao efeito jurídico pretendido pelos Autores.

É o que sucede no caso dos autos, como passaremos a expor, uma vez que falta a causa de pedir na presente acção.

Senão vejamos : BB e mulher CC, residentes na Rua da …, nº …, Ortiga, Mação, instauraram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra DD e mulher EE, residentes em …, França, pedindo seja decretada a mudança de servidão de passagem, constituída por destinação de pai de família, que onera o prédio dos Autores, a favor do prédio dos Réus, do local onde se encontra estabelecida, para o local indicado no artº 12º da petição inicial, condenando os Réus a abster-se de passar pela primeira.

Subsidiariamente pediram seja decretada a alteração do modo de exercício da servidão de passagem, nos termos supra referidos, ordenando que a servidão de passagem constituída a favor dos Réus, não se concretize na necessidade de instalação de um portão de abertura automático, mas somente com a entrega das chaves do portão aos Autores.

Foi alegada a constituição de uma servidão de passagem que onera um prédio dos Autores, em benefício de um prédio dos Réus.

Tal encontra-se documentado e foi assim decidido na Acção Sumária nº 124/12.1TBMAC do Juízo Local Cível de Abrantes do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, na qual foi proferida sentença em 29/12/2015, transitada em julgado em 17/2/2016, que decidiu o seguinte ( cfr. o documento de fls. 69 a 126, 134 e 135 ) : - foram os ora Autores condenados a reconhecer os ora Réus, como donos e legítimos possuidores do prédio misto, sito em …, freguesia de Ortiga, concelho de Mação, com a área total de 440 m2, composta na parte rústica, por olival, solo subjacente de cultura arvense de olival e na parte urbana, de casa de rés-do-chão para palheiro e logradouro, com a área de 320 m2, sendo de superfície coberta 70 m2 e de logradouro 250 m2, que confronta a norte com a Rua da …, a sul com ribeira, a nascente com Maria … e a poente com DD e EE ( os Réus ), inscrito na matriz predial rústica sob o artº … da Secção R e na matriz predial urbana sob o artº …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mação sob o nº …/… e aí inscrita, a favor dos Autores, pelas Ap. … de 1999/08/11 ( quanto a ½ ) e Ap. … de 2010/11/02 ( quanto à restante ½ ); - foram os ora Autores condenados a reconhecer que, sobre o prédio urbano, sito em …, Ortiga, concelho de Mação, com a área total de 360 m2, composto na parte rústica por cultura arvense, citrinos e oliveiras e na parte urbana, de casa de rés-do-chão e cave, tendo no rés-do-chão, uma cozinha, uma casa de banho e 3 divisões para habitação; na cave, uma divisão para arrecadação, com a superfície coberta de 78 m2 e superfície descoberta de 250 m2, que confronta do norte com Rua da …, do sul com ribeiro, do nascente com Manuel … e do poente com herdeiros de Henrique …, inscrito na matriz predial urbana sob o artº …, encontrando-se a parte rústica que estava inscrita sob o artº … da Secção …, incluída na parte urbana, denominado logradouro, prédio no seu todo descrito na Conservatória do Registo Predial competente sob o nº …, e em benefício do prédio misto, sito em …, freguesia de Ortiga, concelho de Mação, com a área total de 440 m2, composto na parte rústica por olival, solo subjacente de cultura arvense de olival e, na parte urbana, de casa de rés-do-chão para palheiro e logradouro, com a área de 320 m2, sendo de superfície coberta de 70 m2 e de logradouro 250 m2, que confronta a norte com a Rua da …, a sul com ribeiro, a nascente com Maria … e a poente com João …, inscrito na matriz predial rústica sob o artº … da Secção … e na matriz predial urbana sob o artº …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mação com o nº …, está constituída uma servidão de passagem por destinação de pai de família, servidão essa com as seguintes características : entrada pelo espaço existente junto à Rua da …, segue em direcção a sul, que junto à parede a sul da habitação do prédio descrito em M., a contorna no sentido nascente e até ao prédio descrito em A., com uma largura igual à que resulta da planta topográfica de fls. 365, eliminado que seja o denominado na planta «pial», e com o comprimento que vai desde a Rua da … e até ao limite poente do prédio descrito em A.

É esta a servidão de passagem que os Autores pretendem seja alterada ou mudada de local, através da propositura da presente acção, invocando para o efeito o disposto no artº 1568º nº 1 e 3 do C.C.

Dispõe o artº 1568º nº 1 do C.C., que : «O proprietário do prédio serviente não pode estorvar o uso da servidão, mas pode, a todo o tempo, exigir a mudança da mesma para sítio diferente do primitivamente assinado, ou para outro prédio, se a mudança lhe for conveniente e não prejudicar os interesses do proprietário do prédio dominante, contanto que a faça à sua custa; com o consentimento de terceiro pode a servidão ser mudada para o prédio deste.

Por outro lado, estabelece o artº 1568º nº 3 do C.C., que : «O modo e o tempo de exercício da servidão serão igualmente alterados, a pedido de qualquer dos proprietários, desde que se verifiquem os requisitos referidos nos números anteriores».

Os Réus, na presente acção, invocaram a nulidade de todo o processo por falta/ininteligibilidade da causa de pedir e os Autores tiveram a oportunidade de exercer o contraditório, como exerceram.

Cumpre agora decidir e explicar porque razão não existe causa de pedir na presente acção : Se os Autores pretendem a mudança de uma servidão de passagem para um outro prédio e, subsidiariamente, pretendem a alteração do modo do exercício dessa mesma servidão, têm necessariamente que alegar os factos concretos que servem de fundamento aos pedidos que formularam.

Tratando-se de uma servidão de passagem, pretendendo que a mesma, desde logo, seja mudada para um outro prédio, que ficaria a ser o prédio serviente e que eles alegaram como sendo o prédio identificado no artº 10º da petição inicial, competiria aos Autores alegar, o que não fizeram : - em que termos se efectuaria a passagem, por esse novo prédio ( identificado no artº 10º da petição inicial ) para o prédio dos ora Réus : onde se iniciaria concretamente a nova passagem, qual...

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