Acórdão nº 2981/17.6YLPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

Nos autos de procedimento especial de despejo em que BB - Sociedade de Construção e Administração …, Lda.

(A), com sede em Faro, demandou CC, Unipessoal Lda. (R), com sede em Sines, a A alega que é proprietária do prédio misto sito no Cerro do Lobo, em Estói, concelho de Faro, o qual foi dado, por contrato de arrendamento não habitacional de 12.05.2016, de arrendamento à R, com início em 15.05.2016, pelo prazo de 5 anos, renovado sucessivamente por 3 anos caso não houvesse oposição à renovação, mediante a renda mensal de € 5.000,00, sendo que o contrato previa um período de carência de 12 meses e até 14.07.2017, durante o qual a R pagaria a renda de € 3.000,00, a ser entregue no primeiro dia útil do mês anterior ao que dissesse respeito, tendo a R pago a quantia de € 1.500,00, correspondente a metade da renda devida entre 15.07.2016 e 31.07.2016 e nada mais pagou desde Agosto de 2016 a Junho de 2017, encontrando-se em dívida a quantia de € 43.000,00, pelo que a A procedeu à notificação judicial avulsa da R para resolver o contrato e obter a entrega do imóvel com fundamento na falta de pagamento das rendas. Apesar de notificada em 11.08.2017, a R não entregou o imóvel nem procedeu ao pagamento das rendas em dívida acrescidas da indemnização devida pela mora, pelo que a A intentou requerimento especial de despejo para lhe ser reconhecida a resolução do contrato invocando o disposto no art.º 1083.º, n.º 3 do Código Civil.

A R deduziu oposição, invocando, a título de questão prévia, a falta de validade do contrato de arrendamento por falta de licença para o fim do contrato de arrendamento, o que determina a nulidade deste e a impossibilidade de recurso a este procedimento especial. Mais alega que, para além da quantia de € 1.500,00, pagou ainda à A a quantia de € 15.000,00, de acordo com a cláusula 5.ª do contrato.

Conclui pela improcedência do pedido de despejo.

Em resposta, alega a A a existência de licença válida e que a requerida sabia das condições de licenciamento quando subscreveu o contrato e iniciou e continua a explorar o imóvel, pelo que, conclui, o contrato não padece de qualquer invalidade e, a existir, a requerida não a pode invocar ou dela prevalecer-se, por tal constituir um verdadeiro abuso do direito, pelo que reitera a procedência do pedido de despejo.

Realizou-se a audiência de julgamento.

Foi então proferida sentença, que julgou a acção procedente por provada e, em consequência: 1 - Declarou resolvido o contrato de arrendamento; 2) Condenou a R a entregar à A, completamente livre e devoluto de pessoas e bens, o prédio misto sito no Cerro do Lobo, em Estói, concelho de Faro, descrito na CRP de Faro sob o n.º … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e na matriz predial rústica sob o artigo … secção AR da União das Freguesias de Conceição e Estói.

Inconformada com a sentença, veio a R interpor o presente recurso contra a mesma, extraindo as seguintes conclusões (transcrição): “1ª -. O arrendamento urbano só pode recair sobre locais cuja aptidão para o fim do contrato seja atestada pelas entidades competentes, designadamente através de licença de utilização, quando exigível – artº 1070º/1, CC. 2ª - Em anotação ao artº 9º do NRAU, de teor semelhante, escreveram os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela, que tal preceito, pretendendo pôr ordem e imprimir certeza numa área em que, na prática, ainda imperava a desordem e a vaga confiança no fechar complacente dos olhos das autoridades ou na condenação dos excessos da burocracia, firmou de novo a exigência da licença de utilização, estendeu-a a todas as variantes do arrendamento urbano (C.CIV. ANOT., Vol.II, pg.507). 3ª - O nº 2 do artº 1070º dispõe que Diploma próprio regula o requisito previsto no número anterior, diploma esse que veio a ser o Decreto-Lei nº 160/2006 (republicado pelo Dec-Lei nº 266-C/2012, de 31 de Dezembro). 4ª -. O nº1 do artº 5º do Decreto-Lei nº 160/2006 dispõe que só podem ser objecto de arrendamento urbano os edifícios e suas fracções cuja aptidão para o fim pretendido pelo contrato seja atestada pela licença de utilização. 5ª.- E acrescenta o nº 4 do citado artigo 5ª: A mudança de finalidade e o arrendamento para fim não habitacional de prédios ou fracções não licenciados devem ser sempre previamente autorizados pela Câmara Municipal. 6ª -.O mesmo diploma legal comina com a nulidade o arrendamento para fim diverso do licenciado sem prejuízo, sendo esse o caso, da aplicação da sanção prevista no nº5 e do direito do arrendatário à indemnização – nº 8 do citado artº 5º. 7ª - Conforme consta do contrato dos autos – e foi transcrito no Facto provado 1 – foi mencionada pela entidade proprietária a existência da licença de utilização nº …/93, concedida pela Câmara Municipal de Faro em 02 de Dezembro de 1993. 8ª - A referida licença de utilização nº …/93 consta dos autos, nela estando escrito “destinada a estalagem” e ainda “ ocupação – Estalagem”. 9ª - É assim incontornável que a licença de utilização/ocupação referida no contrato dos autos e nos Factos Provados era uma licença de carácter específico (para um determinado tipo de estabelecimento hoteleiro – estalagem) e não de carácter genérico, como, p.ex., comércio, serviços). 10ª - À data da celebração do contrato em causa nos autos (12 de Maio de 2016), não era possível licenciar e explorar uma “estalagem”, porquanto este tipo de equipamento hoteleiro fora eliminado pelo Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, como claramente se infere do nº 2 do seu artº 11º. 11ª – A licença nº …/93, a partir da entrada em vigor, em 7 de Abril de 2008, do Decreto-Lei nº 39/2008, uma vez que apenas atestava a idoneidade do edifício para a utilização/ocupação “estalagem”, perdeu toda a sua eficácia. 12ª - A aqui apelada, aliás, estava bem ciente de que a licença de utilização nº …/93 não cumpria os requisitos para a celebração de um contrato de arrendamento válido, tanto assim que deu início ao processo de reconversão de actividade para hotel (cfr. Ponto 7 da matéria de facto provada). 13ª - Foi agendada a vistoria final para o dia 29/01/2015, a qual não se realizou por o imóvel estar encerrado desde 2015 (cfr. Ponto 8 da matéria de facto provada). 14ª- A aqui apelada, não obstante não ter obtido nova licença de utilização correspondente à reconversão da actividade para hotel, outorgou o contrato dos autos, onde referiu a licença de utilização nº …/93, que, além de não ser genérica, atestava as condições do edifício para o exercício de um – e só um -...

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