Acórdão nº 18/11.8T8LLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução11 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1.

AA intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra BB, CC e Companhia de Seguros DD, S.A.

, pedindo a condenação dos réus no pagamento de uma indemnização no valor de 348.900,31€ relativa a danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência de incêndio, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo pagamento, bem como em indemnização pelos danos ocorridos no futuro conexos com o sinistro.

Em fundamento alegou, em síntese, que ocorreu um incêndio na fracção autónoma propriedade do primeiro réu e que lhe fora arrendada pela segunda ré, do qual resultou a destruição de bens e as lesões corporais que descreve e cujo ressarcimento peticiona, sendo a terceira ré responsável em virtude de contrato de seguro habitação e os primeiros réus responsáveis pelo pagamento na parte não coberta pelo capital seguro.

  1. Regularmente citados, todos os Réus contestaram.

    2.1.

    A ré Companhia de Seguros DD, por excepção, invocou, em suma, a exclusão do sinistro da cobertura do seguro contratado, a falta de alegação dos pressupostos da responsabilidade civil do segurado, a ausência de culpa do segurado e a existência de outra apólice de seguro que abrange os prejuízos causados pelo sinistro, a qual foi accionada e que desconhece se indemnizou a autora pelos danos no imóvel. Impugnou, ainda e na generalidade, os factos alegados e peticionou a intervenção principal provocada da seguradora EE Companhia de Seguros.

    2.2.

    Os réus BB e CC, por excepção, invocaram a ilegitimidade passiva do réu, porque desacompanhado do cônjuge, a ineptidão da petição inicial, por falta de causa de pedir em relação à ré, a ilegitimidade passiva da ré, por não ser sujeito da relação material controvertida, bem como a prescrição do direito da autora, pelo decurso do prazo de 3 anos. Mais impugnaram a generalidade dos factos alegados, aduzindo que o incêndio ocorreu devido a conduta da autora, a qual detinha a coisa e a quem incumbia o dever de vigilância.

  2. A autora respondeu à matéria da excepção invocada, concluindo pela sua improcedência, deduzindo incidente de intervenção principal provocada do cônjuge do réu BB.

  3. Foi admitida a intervenção principal provocada de FF e indeferida a intervenção principal provocada da EE Companhia de Seguros.

  4. Foi realizada audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho a convidar a autora a aperfeiçoar a petição inicial, o que esta fez, impugnando os réus os factos aduzidos; foi admitida a ampliação do pedido formulada pela autora, e proferido despacho saneador, julgando-se improcedentes as excepções dilatórias de nulidade, por ineptidão da petição inicial, de ilegitimidade, retirando os réus a alegação da excepção peremptória de prescrição do direito de acção; foi, ainda, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, não tendo sido apresentada reclamação.

  5. Realizou-se a audiência final, tendo seguidamente sido proferida sentença que julgou a acção improcedente, por não provada, e, em consequência, absolveu os Réus do pedido.

  6. Inconformada, a Autora apresentou o presente recurso de apelação da sentença proferida, pugnando pela sua revogação e a condenação dos réus conforme pedido na petição inicial, finalizando a sua minuta recursória com as seguintes conclusões: «1 – Requer a ora Recorrente a reapreciação da prova, referente ao ponto 18 dos factos provados (parcialmente), bem como das alíneas c), d) e e) dos factos não provados; 2 – Quanto ao ponto 18, por considerar que existe prova nos autos para o efeito, deve ser dado como provado que “A autora utilizou, algumas vezes, o esquentador desde meados de Março de 2007 até ao dia 23 de Junho de 2007” 3 – Quanto à alínea c) dos factos não provados, por existir prova suficiente nos autos para o efeito, deve considerar-se provado que “o gás libertado pelo esquentador acumulou-se no tecto falso que fazia um “L” do corredor onde estava embutido ao esquentador até à kitchenette, gerando uma bolsa de gás”; 4 – Quanto à alínea d) dos factos provados, também se deverá dar como provada “e provocou a explosão” 5 – Também deverá constar do rol de factos provados, o constante da alínea e) dos factos não provados: “a segunda ré, alertada para o deficiente funcionamento do esquentador, não procedeu à sua reparação”.

    6 – Para tal deverá ser dada relevância a prova que foi produzida, mas não valorada pelo Tribunal de que se recorre, tais como depoimentos e documentos constantes dos autos, que se identificam.

    7 – A instalação de gás da fracção autónoma objecto de arrendamento estava em situação irregular, há 3 anos, conforme resulta do relatório de inspecção junto pelos RR. aos autos e cujo teor não foi valorado.

    8 – Tais falhas nunca foram corrigidas.

    9 – Para além de que também não recorreram a técnico credenciado pela DGEG, para proceder à montagem do esquentador (que foi adquirido em momento posterior à inspecção referenciada), nem para efectuar a devida inspecção do mesmo aparelho já em funcionamento.

    10 – O esquentador foi montado pelo comerciante que o vendeu aos RR. e que não é credenciado pela DGEG.

    11 - Também não recorreram os RR. a mecânico de esquentadores credenciado, como era sua obrigação, para rever e reparar o esquentador, na sequência das queixas da arrendatária, quanto à existência de problemas quanto ao aquecimento da água.

    12 – Comportamentos estes que distam, a léguas, dos exigíveis, segundo o critério do bom pai de família, aos cidadão médios, zelosos e cumpridores, colocados na mesma situação.

    13 – O D.L. n.º 263/89, de 17 de Agosto, e a Portaria n.º 362/2000, de 20 de Junho, consagram regras jurídicas que estabelecem a obrigatoriedade de recurso a técnico credenciado para montar, avaliar, reparar e manusear aparelhos de gás e respectivas instalações.

    14 – Não existe qualquer relatório de conformidade da instalação de gás, que ateste a correcção dos vícios.

    15 – Não existe qualquer relatório de conformidade de funcionamento do esquentador.

    16 – Pelo que não se pode atestar da conformidade do esquentador e da instalação de gás.

    17 – Pelo exposto, deve constar dos elenco dos factos provados que “O réu AA requereu a inspecção à instalação de gás, que foi realizada pela Gasinspec, em 29.06.2004, e que concluiu pela existência de defeitos críticos, designadamente: a) Coluna montante no interior do fogo; válvulas de corte aos aparelhos não respeitavam as alturas exigidas; e contador de gás no interior do fogo”. – facto complementar emergente de prova documental 18 - Deve também constar do elenco dos factos provados que “não existe relatório de conformidade da instalação de gás, posterior à data do relatório da Gasinspec, de 29.06.2004, que denunciou a existência de defeitos/vícios da referida instalação”. – facto complementar emergente de prova documental 19 – Também a constar no rol de factos provados: “não existe relatório de conformidade de montagem e funcionamento do esquentador, após a data da sua aquisição, ocorrida em 10 de Julho de 2004”.

    20 - Os RR. bem sabiam que deviam ter actuado de forma diferente, tendo em conta que foram notificados pela GASINSPEC para o efeito, e que no próprio manual do esquentador Zeus 11, constam as regras constantes da lei reguladora supramencionada.

    21 – Ainda assim, agiram de forma diversa da que lhes era exigível e agiram com culpa.

    23 – Também para constar do rol dos factos provados: “a instalação de gás permanecia em desconformidade com os requisitos legalmente exigidos desde 29 Junho de 2004, até ao momento do incêndio, em 23 Junho de 2007”.

    24 – Na qualidade de locadores, competia aos ora 1.ºs e 2.ª recorridos assegurar à locatária o gozo da coisa para os fins a que se destinava, cumprindo-lhes também efectuar as obras e reparações necessárias.

    25 – Deviam os mesmos ter adoptado medidas idóneas e evitar e remover o perigo criado pela sua própria actuação ou decorrente, por motivos diversos, das coisas que lhes pertencem ou tinham o dever de vigiar.

    26 – Os RR. violaram as normas dos artigos 6.º e 7.º do DL n.º 263/89, de 17 de Agosto, bem como não agiram em conformidade com as constantes da Portaria n.º 362/2000, de 20 de Junho.

    27 – A presunção de culpa dos locatários não poderia nunca ser transferida para a locatária, tendo em conta que, no caso sub judice, se provou que a ora Recorrente alertou pelo menos por duas vezes (provadas nos pontos 10 e 15), para existência de problemas com o esquentador.

    28 – As reparações emergentes dessas reclamações não foram devidamente efectuadas, por técnicos credenciados.

    29 – Não se pode assacar qualquer responsabilidade à Recorrente, que agiu de acordo com os padrões do bonus pater familiae.

    30 – Incorreram assim na prática de uma acto ilícito, culposo, que foi causa adequada dos danos sofridos pela Recorrente.

    31 – Haverá, assim, no caso subjacente, uma responsabilidade principal de natureza obrigacional, emergente da relação que se estabeleceu entre as partes por força, bem como responsabilidade extracontratual ou objectiva pelo dever de vigilância da coisa e pelos danos ocorridos, independentemente de culpa.

    32 – Atento o contrato de seguro (norma de exclusão de responsabilidade – clausula 7.1 – a responsabilidade da seguradora apenas estão excluídas as reparações pecuniárias exigíveis ao tomador do seguro (proprietário/inquilino) com fundamento em responsabilidade civil extracontratual.

    33 – Estamos, como foi já mencionado, mormente no foro da responsabilidade civil contratual, pelo que deverá a seguradora DD acompanhar os demais RR e ser também responsabilizada pelos danos causados à Recorrente, mediante pagamento de indemnização».

  7. Pelos RR. foram apresentadas contra-alegações, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

  8. Observados os vistos, cumpre decidir.

    *****II. O objecto do recurso.

    Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e...

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