Acórdão nº 104/14.2T8MMN-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I- AA, credor reclamante no processo à margem identificado, inconformado com a sentença de verificação e graduação de créditos e bem assim com o teor do despacho proferido em 27 de Junho de 2017 que a antecedeu, interpôs recurso[1] de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1.ª Vem o presente recurso de Apelação interposto da douta Sentença proferida em 27 de Outubro de 2017, a fls. ... dos presentes autos, que não reconhece ao ora Recorrente, entre outros, o privilégio imobiliário especial sobre a fracção autónoma identificada na verba 1 do auto de apreensão, mencionado na douta Sentença como imóvel descrito na CRP o nº … – Fracção A (prédio sito na Rua …, nº …, Bairro de São Miguel, em Beja).

  1. O presente recurso incide ainda sobre o douto Despacho proferido pelo Tribunal “a quo” em 27 de Junho de 2017, a fls. … dos autos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 644.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

  2. A douta Sentença impugnada enferma de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, já que, pese embora observe e reconheça que o imóvel descrito na alínea a) da Graduação dos Créditos, fracção autónoma designada pela letra A, inscrita na matriz predial urbana sob o artigo …, e descrito na CRP sob o n.º …-A, freguesia de Beja, corresponde ao imóvel onde os trabalhadores exerciam e desenvolviam a sua actividade, não extrai, todavia, as consequências desse facto relativamente ao aqui recorrente e a outros credores reclamantes, com claro prejuízo para os seus direitos.

  3. O recorrente e outros credores reclamantes reclamaram os seus créditos nos termos legalmente estabelecidos e identificaram expressa e inequivocamente nas suas reclamações de créditos o estabelecimento industrial da Insolvente BB, onde prestaram a sua actividade laboral: Rua …, n.º …, Bairro de S. Miguel, em Beja, tudo em conformidade com o disposto no artigo 128.º, n.º 1, alíneas a) a e) do CIRE.

  4. O seu local de trabalho está ainda devidamente certificado nos seus recibos de vencimento a fls. … dos autos, onde vem mencionado expressamente que o seu Departamento é Beja.

  5. Ora, pese embora conste da massa insolvente, como activo, dois prédios da Insolvente, o douto Tribunal recorrido não identificou o imóvel no qual o recorrente exercia a sua actividade laboral à data da cessação do seu contrato de trabalho, sendo certo que tal averiguação era fundamental para efeitos de graduação relativamente a cada um dos imóveis, conforme resulta expressamente do texto da douta Sentença recorrida.

  6. A actuação do douto Tribunal “a quo” configura o vício de omissão de pronúncia e causa claro prejuízo para os direitos do recorrente e para a boa decisão da causa.

  7. O referido vício acarreta a nulidade da douta Sentença recorrida, por deixar de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do C.P.C..

  8. – Sem conceder, é de aplicar in casu uma concepção ampla do privilégio imobiliário especial que é “mais consentânea com a razão de ser da atribuição do privilégio creditório aos créditos laborais, que é, como se referiu, a especial protecção que devem merecer esses créditos, em atenção à sua relevância económica e social, que não se concilia com um injustificado tratamento diferenciado dos trabalhadores de uma mesma empresa, em função da actividade profissional de cada um e do local onde a exercem”, como já doutamente decidido nos presentes autos.

  9. A douta Sentença recorrida, consubstanciada no reconhecimento do privilégio imobiliário especial sobre a fracção autónoma sita no Bairro de S. Miguel, Rua …, n.º …, em Beja (verba n.º 1), apenas a um conjunto de trabalhadores da Insolvente é claramente violadora dos princípios da igualdade e da justiça, prejudicando, assim, de forma notória e grave, o aqui recorrente e outros ex-trabalhadores da insolvente.

  10. Salvo o devido respeito, a fundamentação do douto Despacho de 27 de Junho de 2017, ora impugnado, não pode proceder.

  11. A ausência de impugnação de créditos constantes da lista apresentada pelo AI, nos termos do art. 129º do CIRE, não impede o Juiz de exercer um controle sobre a respectiva legalidade, não apenas formal mas substantiva: os requisitos da elaboração da lista contêm normas procedimentais e juízos de qualificação jurídica.

  12. Decorre da análise das diversas reclamações de créditos constantes dos autos, a existência de várias classes de credores reclamantes, uns com garantias reais, outros com créditos privilegiados, como é o casos dos trabalhadores da insolvente, já que, quanto a estes, logo identificaram nos requerimentos apresentados essa qualidade, indicando o seu lugar de trabalho, tendo em vista o privilégio que lhes é conferido pelo art. 333º do Código do Trabalho.

  13. Não obstante o aqui recorrente e outros credores reclamantes terem alegado expressamente nas suas reclamações de créditos que o local de trabalho principal da sua actividade laboral, ao serviço da Insolvente BB, Lda., era no seu estabelecimento industrial, sito na Rua …, n.º …, em Beja, o douto Tribunal não emitiu pronúncia sobre qual era o imóvel onde exerciam a sua actividade laboral, conforme resulta expressamente do texto das doutas decisões impugnadas.

  14. A imagem que se colhe do douto Despacho e da douta Sentença aqui impugnados é a de que o recorrente e os demais credores prejudicados trabalharam na empresa insolvente mas não tinham local de trabalho, nem em Beja, nem em Montemor-o-Novo, localidades onde estavam situadas as duas unidades fabris da insolvente !!! 16.ª As decisões aqui impugnadas traduzem, aliás e sempre salvo o devido respeito, uma função formal do douto Julgador.

  15. O douto Tribunal “a quo” não atendeu ao princípio do inquisitório vigente no processo de insolvência consagrado no artigo 11.º do CIRE.

  16. As decisões aqui impugnadas estão em clara contradição com a realidade material dos factos e com os documentos constantes dos autos, tendo-se, assim, julgado em desconformidade com o direito.

  17. A incorrecta graduação dos créditos aqui posta em crise tem graves consequências e como já doutamente afirmado e decidido em 20 de Outubro de 2016, nos presentes autos pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora,“(…) é fundado em razões de justiça social que o legislador reconheceu uma garantia real particularmente forte aos créditos laborais, em virtude da natureza de direito fundamental constitucionalmente protegido do...

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