Acórdão nº 840/15.6T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018
Magistrado Responsável | FLORBELA MOREIRA LAN |
Data da Resolução | 08 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.
Relatório AA intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB, pedindo que se declare que é dona e legitima proprietária do prédio misto denominado “Courela …”, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o n.º …/…, e inscrito na Matriz Predial, a parte urbana sob o artigo n.º … e a rústica sob o artigo … da secção 002, e que se condene o réu a restituir o mesmo livre de pessoas e a bens e abster-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização do mesmo. Por fim peticiona a condenação do réu no pagamento da quantia diária de € 100, desde a citação até à entrega efectiva do imóvel, a título de indemnização pelos danos causados com a privação de uso e fruição do prédio.
Invocou para o efeito que por contrato de compra e venda, datado de 17 de Fevereiro de 2009, adquiriu o referido imóvel ao réu, pelo preço de € 176.820,00, quantia que obteve com recurso a um crédito junto do Banco CC, S.A., sem que o réu haja abandonado o imóvel, entregando-o à autora, agindo contra a sua vontade, embora sabendo que contraiu um empréstimo que se encontra a liquidar em prestações mensais de cerca de € 500 mensais.
Citado, o réu contestou por impugnação, alegando que propôs à autora que figurasse como mutuária no contrato de mútuo, sendo na realidade o réu o verdadeiro mutuário, transferindo-se ficticiamente a propriedade a fim do mesmo ser dado como garantia, como já haviam efectuado anteriormente em relação a um outro prédio, pelo que não visaram as partes comprar e vender o referido imóvel, mas tão-somente possibilitar o empréstimo da quantia de € 176.000,00 de que o réu carecia, tendo ambos acordado que aquele pagaria as prestações mensais e demais despesas, devendo para o efeito provisionar a conta bancária da Autora com o n.º 45372526089, existente no CC, o qual seria integralmente liquidado quando vendesse o imóvel.
Desta forma, deduziu pedido reconvencional, peticionando que se declare a nulidade da compra e venda celebrada entre autora e réu e o cancelamento do respectivo registo de aquisição, declarando-se que o mesmo é legítimo proprietário do prédio.
Por fim, peticiona o réu a condenação da autora como litigante de má-fé, porquanto a mesma sabia que o teor da escritura era ficcionado e que aquele é o legitimo proprietário do prédio.
Admitida a intervenção principal do “Banco CC, S.A.”, na qualidade de credor hipotecário, veio o mesmo peticionar que se julgue improcedente quer a acção, quer a reconvenção, alegando que a nulidade invocada pelo réu não afecta o mútuo ora celebrado, na medida em que assume a posição de terceiro de boa fé.
Foi proferido despacho saneador e fixado o objecto do litígio e os temas da prova.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença que julgou: - a acção improcedente, por não provada e, em consequência, absolveu o réu de todos os pedidos deduzidos pela autora; - procedente a reconvenção, tendo, consequentemente, declarado a nulidade da compra e venda ocorrida em 17 de Fevereiro de 2009, no Cartório Notarial de Reguengos de Monsaraz, entre autora e réu, ordenado o cancelamento da inscrição registal da aquisição a favor da autora, declarado o réu / reconvinte legitimo proprietário do prédio misto denominado “courela …”, sito em Seixo, Santiago Maior, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alandroal, sob o n.º …/…, e inscrito na matriz predial da freguesia de Santiago Maior, Concelho do Alandroal, a parte urbana sob o artigo n.º … e a parte rústica sob o artigo n.º … da secção 002 e condenado a A.
como litigante de má fé numa multa de 3 UC e em indemnização a pagar ao réu, na importância de 3 UC, bem como no pagamento das despesas suportadas pelo réu em consequência da interposição da presente acção, aí incluindo-se os honorários devidos ao seu ilustre mandatário.
A A.. não se conformando com a sentença prolatada dela interpôs recurso apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1a - Em apreço no presente recurso está a admissibilidade da prova testemunhal quando o simulador invoca a simulação do negócio celebrado entre Apelante e Apelado, bem como a verificação, de todos os elementos necessários à cominação com a nulidade do referido negócio.
2a- Com relevância para o presente recurso, foi dado como provado na douta sentença recorrida que:
-
Encontra-se registada a favor da A a aquisição do prédio misto denominado "Courelas …", sito em Seixo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alandroal, sob o nº …/…, e inscrito na Matriz Predial da freguesia de Santiago Maior, concelho de Alandroal, sob o artigo … e nº … secção 002, respetivamente a parte urbana e a parte rústica; b) Na escritura pública denominada "Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca" datada de 17 de fevereiro de 2009, outorgada no Cartório Notarial de Reguengos de Monsaraz, declarou o Réu que pelo preço de 176 820,00 Euros, vendia à autora o prédio referido no número anterior, o que foi aceite; c) Por seu turno, declarou a A. ser devedora ao Banco CC, S.A. da quantia de 176 820,00€, que recebeu a título de empréstimo e que iria ser aplicada na aquisição do prédio, constituindo a favor da mesma hipoteca sobre o referido prédio; d) Mais foi dado como provado que o reu propôs a Autora figurasse como mutuária no contrato de mutuo referido em 3), para junto do Banco CC, S.A. obter a quantia de €: 176 820,00, de que necessitava e esta aceitou; e) Desta forma, com a compra e venda referida em 2) o Reu e a Autora não pretenderam transmitir a propriedade, mas possibilitar a obtenção do empréstimo mencionado em 3); f) Acordaram a autora e o reu que este pagaria todas as prestações mensais e demais despesas decorrentes do empréstimo, bem como os valores dos impostos, o qual deveria ser totalmente liquidado quando lograsse vender o prédio; g) Para o efeito o reu devia provisionar a conta bancária titulada pela autora existente no CC, com o número 4532526098; h) Na data da escritura referida em 2), ficou disponível na conta titulada pela autora existente no CC, com o nº 25246292238, a quantia de €: 176820,00; i) No dia 25 de fevereiro de 2009, foi transferida a partir daquela conta bancária para a conta bancária titulada pela Autora referida em 7) a quantia de 36 000€ para pagamento das prestações e demais despesas decorrentes do empréstimo, bem como valores dos impostos.
j) Posteriormente, com a mesma finalidade, o Réu ainda procedeu a diversas transferências bancárias para a conta bancária titulada pela autora referida em 7) nas datas e valores seguintes: - novembro de 2013 € 1350,00 - Janeiro de 2014 € 1400,00 - Abril de 2014 € 2000,00 - Julho de 2014 € 1350,00 -Novembro de 2014 € 2000,00 k) A Autora procedeu ao pagamento do Imposto Municipal sobre Imóveis referente aos anos de 2009, 2010,2011, 2012 e 2013; l) Após a realização da escritura pública de compra e venda continuou a diligenciar pela venda do imóvel.
3a- Em consequência foi declarada como não provada a ação, e, em consequência, absolvido o Apelado de todos os pedidos formulados pela Apelante.
4a- Foi considerada procedente por provada a reconvenção e em consequência declarou-se a nulidade da compra e venda ocorrida em 17 de fevereiro de 2009, determinou-se o cancelamento da inscrição registai da aquisição a favor da autora e condenou-se esta como litigante de má-fé.
5.ª- O Tribunal a quo, para fundamentar a sua posição considerou que a prova documental junto aos autos constituía um principio de prova bastante forte relativamente ao acordo simulatório invocado pelo Réu/Apelado, e, recorrendo igualmente a prova testemunhal, considerou demonstrados os factos alegados em 4) a 7).
6a- A decisão recorrida estribou-se no entendimento de que, embora seja proibida a produção de prova testemunhal quando a simulação é invocada pelos próprios simuladores, como é o caso, se admite, em interpretação restritiva do artigo 394º do Código Civil, que possa ser produzida prova testemunhal, desde que o acordo simulatório contenha um mínimo de prova, um começo de prova de natureza documental, que o tribunal encontrou nos documentos insertos nos autos.
7a- designadamente, nos documentos de fls 68 e segs e 74 e segs, que correspondem a duas escrituras publicas de compra e venda de um imóvel, uma celebrada entre as partes e outra entre a Apelada e uma terceira pessoa, concluindo que tais documentos indiciam que em data anterior à do negócio em apreço nos presentes autos. as partes haviam procedido de forma idêntica relativamente a outro imóvel que identificam como Casa do Seixo.
8a- Tal dedução, foi suficiente para o Tribunal recorrido se convencer que aqueles documentos constituem um principio de prova de que o contrato de compra e venda celebrado entre Apelante e Apelado também foi celebrado com recurso à simulação Isto porque, 9a - Sem qualquer tratamento jurídico dos factos o tribunal a quo conclui que não se mostra compatível com a realidade que, em escassos anos, a Apelada adquirisse dois imoveis ao Apelante, assim como que este lhe vendesse um por 150 000€ e ela o revendesse a outra pessoa por 400,000,00€ 10a- Do teor de tais documentos não se pode extrair porque razão um prédio comprado ela A ao R por €150 000,00 foi posteriormente vendido por esta por €: 400 000,00 (não se alcançando por isso, que razão de ciência presidiu à decisão da Mma Juiz de considerar. desconhecendo o circunstancialismo em que o mesma foi celebrada, que tal venda não é conforme à realidade, como vertido na douta sentença recorrida, e menos ainda se descortina de que forma a realização daquela compra e venda constitui um principio de prova de acordo simulatório no negócio controvertido na presente ação.
11ª- Em suma, não constitui objeto do presente litigio, nem tema de prova nos presentes autos, apurar se o primeiro negócio celebrado entre a A e o R foi simulado, como o alega o Apelado, não tendo sido tal admitido por acordo, nem provado por...
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