Acórdão nº 1415/15.5T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelFLORBELA MOREIRA LAN
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.

Relatório BB propôs contra CC e marido, DD a presente acção de simples apreciação negativa alegando o seguinte: - EE, mãe da autora e da ré, faleceu em 9 de Janeiro de 2008 no estado de intestada e sem disposição de última vontade; - da herança aberta por óbito daquela faz parte um prédio rústico sito em Loureiros, Caxarias, inscrito na matriz sob o artigo … da freguesia de Seiça e inscrito na Conservatória do Registo Predial a favor da autora e demais herdeiros de Júlia da Graça; - com o consentimento dos pais, EE e FF, falecido antes daquela, os réus procederam à construção naquele prédio de uma casa de habitação; - em 14 de Abril de 2011 o réu requereu no Serviço de Finanças de Ourém a inscrição como omisso do seguinte prédio: terra de semeadura sito na sede da freguesia de Caxarias, denominado por “Loureiros”, com a área de 460 m2, que confronta do Norte com Nuno …, Sul com herdeiros de EE, Nascente com Manuel … e Poente com Manuel …, ao qual foi atribuído o artigo matricial …/rústico da freguesia de Seiça; - munidos deste artigo matricial os réu outorgaram, no Cartório Notarial de Ourém, uma escritura de justificação, na qual declararam terem adquirido por usucapião tal prédio rústico, tendo procedido à sua inscrição no registo predial em nome dos mesmos; - este prédio constitui uma parte do prédio rústico sito em Loureiros, Caxarias, inscrito na matriz sob o artigo …; - não é verdade que tal prédio tivesse sido verbalmente doado aos réus, tendo apenas existido autorização para construção de uma habitação; - eram os pais da autora e da ré que amanhavam e cultivavam todo o prédio e recolhiam os respectivos frutos; - os réus não praticaram quaisquer actos de posse na convicção de serem donos de parte do prédio; - as declarações prestadas perante o Notário são falsas e provocam a nulidade da escritura e o cancelamento do registo feito a favor dos réus; - o prédio inscrito na matriz sob o artigo … da freguesia de Seiça foi avaliado em € 45.000, pelo que a parcela cuja propriedade foi justificada tem o valor de € 11.500, sendo este o montante do enriquecimento dos réus à custa do património da herança; - a autora mulher sente-se profundamente angustiada com a conduta dos réus, vendo-se na necessidade de demandar judicialmente a sua irmã, passando também a andar em Advogados e por repartições de finanças.

Com base nesta factualidade assim sumariamente descrita, pedem os autores que se declare nula a escritura de justificação da posse por falsidade das declarações nela prestadas, que se ordene o cancelamento do registo feito em benefício dos réus com base na mesma e que estes sejam condenados no pagamento de uma indemnização no valor de € 7.500 a título de danos morais.

Regular e pessoalmente citados, contestaram os réus invocando a excepção de ilegitimidade activa por preterição de litisconsórcio necessário, visto que esta acção exige a intervenção do marido da autora. Mais impugnaram os réus os factos alegados na petição inicial por entenderem que a escritura de justificação não contém qualquer falsidade, tendo antes sido lavrada de acordo com o que efectivamente se passou, ou seja, que o prédio lhes foi doado verbalmente pelos pais da ré e que têm vindo a exercer actos de posse sobre o mesmo há mais de vinte anos, pelo que adquiriram o direito de propriedade por usucapião.

Por despacho de fls. 243 foi admitida a intervenção do marido da autora para suprimento da excepção de ilegitimidade activa.

Teve lugar a audiência prévia na qual se fixou o objecto da causa e os temas da prova, não tendo sido apresentada qualquer reclamação.

Realizada a audiência final foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu os RR. do pedido Os AA.. não se conformando com a sentença prolatada dela interpuseram recurso apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “a) A matéria de facto dado como provada deve ser alterada se do processo constarem meios probatórios que impunham decisão diversa, b) Resulta dos documentos juntos aos autos que da herança de FF apenas fazia parte ½ do prédio inscrito na matriz sob o artº …/ Seiça c) Resulta dos documentos juntos aos autos que da herança de FF não fazia parte a totalidade do prédio inscrito na matriz sob o artigo …/ Seiça; d) Os factos provados nº 3 e 4 são, logicamente, impossíveis; e) Resulta dos documentos juntos aos autos que FF e EE não eram donos da totalidade do prédio inscrito na matriz sob o artº …/ Seiça; f) Resulta dos documentos juntos aos autos que FF e EE só ficaram donos de todo o prédio em 11/03/2003, não tendo até esta data uma posse exclusiva; g) Se não eram donos do prédio não podiam doar, sob pena se de tratar de doação de coisa alheia, com a consequente nulidade; h) O facto de os pais autorizarem um filho a edificar em terreno deles, não configura “posse” susceptível de aquisição, por usucapião, do direito de propriedade; i) Tal autorização exclui o” animus sibi habendi” j) E, a mera detenção, dure por pouco ou muito tempo, não é susceptível de conduzir à usucapião, enquanto não ocorrer inversão do titulo, só desde então se contando o prazo; l) A douta sentença interpretou e aplicou incorrectamente o disposto nos arºs 607/4 CPC, 1251 e 1287, ambos do C. C.

Razão porque deve a douta sentença ser revogada e substituída por outra que defira o peticionado pelos A. A., como é de JUSTIÇA”.

Os apelados responderam às alegações, pugnando pela confirmação da sentença sob censura.

Pela leitura das alegações de recurso a Mm.ª Juiza a quo verificou a existência de um lapso de escrito no ponto 4. do quadro fáctico provado, tendo procedido à sua rectificação.

Providenciados os vistos e nada obstando ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir II.

Objecto do Recurso Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (art.º 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2 do CPC), Importa, pois, decidir se: - A decisão da matéria de facto deve ser alterada, nos termos pretendidos pelos apelantes; - Os recorridos exerceram uma posse apta a conduzir à aquisição por usucapião.

III.

Fundamentação 1.

De Facto 1.1. Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1. FF e EE são pais da autora e da ré e foram casados um com o outro; 2. FF e EE já faleceram, ele em 6 de Agosto de 1998 e ela em 9 de Janeiro de 2008, e não deixaram testamento ou disposição de última vontade; 3. Da herança aberta por óbito de FF faz parte o seguinte bem: metade indivisa de uma terra de semeadura com oliveiras, pereiros, no sítio de Loureiros, limite de Caxarias, freguesia de Seiça, a confrontar de Norte com Maria … e outro, de Sul com Alfredo …, de Nascente com herdeiros de Manuel … e de Poente com herdeiros de Manuel …, descrito sob o art. …; 4. Da herança aberta por óbito de EE faz parte o seguinte bem: prédio rústico sito em Loureiros, limite de Caxarias, composto de terra de semeadura com oliveiras e pereiros, com a área de três mil quatrocentos e vinte e seis metros quadrados, a confrontar do Norte, herdeiros de Maria … e outros, do Sul com herdeiros de Alfredo …, de Nascente com herdeiros de Manuel … e de Poente com herdeiros de Maria …, inscrito na matriz sob o artigo …, da freguesia de Seiça; 5. Este prédio rústico está descrito na Conservatória do Registo Predial de Ourém sob o n° …, da freguesia de Seiça e aí está inscrita a aquisição, por sucessão, a favor da autora e demais herdeiros da falecida EE; 6. Enquanto foram vivos, FF e EE procederam, por si próprios ou recorrendo a terceiros, ao amanho e cultivo do prédio referido em 3 e 4, dele retirando os respectivos frutos; 7. Os réus emigraram para França após o seu casamento; 8. Em data não concretamente apurada dos finais dos anos sessenta, mas após o casamento dos réus, ocorrido no ano de 1966, os pais da autora e da ré doaram verbalmente aos réus uma parcela do prédio identificado em 3 e 4 para que aí construíssem uma casa de habitação; 9. Os réus apresentaram na Câmara Municipal de Ourém um projecto de obras destinado à construção de uma casa de habitação; 10. Em 15 de Janeiro de 1971 foi emitido o alvará de licença n.º 40, através do qual foi concedida licença a DD, ora réu, para construir uma casa de habitação; 11. Após a emissão dessa licença os réus iniciaram a construção da casa de habitação, que ficou concluída, segundo declaração do réu marido feita perante a Direcção-Geral de Contribuições e Impostos e junta a fls. 76, em 26 de Julho de 1975; 12. Em 19 de Agosto...

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