Acórdão nº 297/15.1T8PTM-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I- Relatório.

AA, progenitor de BB, menor, nascida a 22 de Dezembro de 2014, instaurou, por apenso ao processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, a presente ação de alteração do exercício das responsabilidades parentais contra a progenitora desta, CC, alegando, em suma, dificuldades de conviver com a filha e de marcar as visitas e período de férias com a requerida, peticionando a alteração da guarda da filha no sentido de ser atribuída alternadamente, num regime bimensal, a cada um dos pais e sendo a guarda partilhada por ambos os progenitores e bem assim que cada um dos pais assuma as despesas com a filha durante o tempo em que a tiver a seu cargo.

Citada, a requerida deduziu oposição à pretendida alteração, alegando não salvaguardar o superior interesse da filha, negando, no essencial, as alegações do requerente, imputando-lhe sofrer de problemas psicológicos (álcool) e instabilidade, concluindo pela manutenção do acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, salvo quanto às cláusulas 3.ª, 4.ª e 5.ª e 12.º, cuja alteração defende, nos termos que apresentou.

Teve lugar a conferência de pais, na qual não foi possível chegar a acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais, ficando suspensa a conferência por dois meses, sendo as partes remetidas para audição técnica especializada.

Após a audição técnica especializada, foi designada continuação para a conferência de pais e, não tendo as partes chegado a acordo, foram notificadas nos termos do art. 39º, n.º 4 RGPTC.

Ambos alegaram e arrolaram testemunhas.

Realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que decidir alterar a regulação do exercício das responsabilidades parentais da criança nos termos que se transcrevem: “1. Fixar a residência da menor em períodos de 15 (quinze) dias alternados com cada um dos progenitores, iniciando-se tal período às sextas-feiras, indo o progenitor, ou progenitora, buscar a menor à escola, no final das atividades escolares.

  1. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da menor incumbe àquele com quem a menor estiver nesse período de 15 (quinze) dias.

  2. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da menor (v.g., intervenções cirúrgicas, mudança de ensino público para privado, ou vice-versa, mudança de residência, religião, licença de condução) são exercidas de comum acordo por ambos os progenitores, salvo caso de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.

  3. No dia de aniversário da menor, no dia de aniversário do pai, no dia do pai e no dia da criança, a menor tomará uma refeição com o progenitor, sucedendo o mesmo para a mãe nos dias correspondentes.

  4. A menor passará as épocas festivas (entenda-se, a véspera e dia de natal; véspera e dia de ano novo e domingo de Páscoa), alternadamente com cada um dos progenitores.

  5. Cada um dos progenitores suporta as despesas com os alimentos da menor durante o período em que esta reside consigo.

  6. Cada progenitor suportará, em parte iguais, as despesas médicas e medicamentosas, escolares e extracurriculares (estas, desde que sejam acordadas entre ambos) da menor, devidamente documentadas, a liquidar no mês subsequente à apresentação da documentação.

  7. Custas a suportar pela progenitora, que fixo em 3 (três) Uc´s”.

    Inconformada com esta decisão veio a requerida CC interpor o presente recurso, terminando as suas extensas e complexas alegações, razão pela qual não se transcrevem, delas extraindo-se, de relevante, as seguintes: 1. Verifica-se a NULIDADE SENTENÇA por falta de declaração de «quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência», ex vi artigos 607.º, n.º 4, e 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do NCPC e artigo 205.º, n.º 1, da CRP 1976.

  8. Foram retiradas ilações, relativamente ao carácter (embriaguez), condições pessoais e habitacionais do progenitor, senão mesmo subjetivas conclusões, de factos instrumentais, sem pertinência ou desligados do alegado e provado pelos vários meios de prova mobilizados.

  9. O Tribunal “a quo”, na sua sentença, não deu cabal conhecimento dos «demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção» «livre» (mas nunca arbitrária!), mormente para efeitos da conclusão pela inexistência de prodigalidade na bebida, por parte do progenitor, bem como não ter sido ele o autor das agressões, em contexto de violência doméstica, à Requerida, embora o mesmo tenha sido constituído arguido e sujeito à medida de coação “Termo de Identidade e Residência” (artigo 196.º, do CPP), quer para efeitos do disposto no artigo 40.º, n.º 9, do RGPTC 4. Se olharmos aos factos que se transcrevem, o seu contexto é propício à conclusão de que o Requerente tem problemas de alcoolismo, é agressivo, não tem habitação própria, encontra-se sujeito a uma medida de coação penal – Termo de Identidade e Residência –, está indiciado e a ser investigado por suspeita de crime de violência doméstica para com a sua ex-companheira.

    Ora, tudo isto, num direito tutela e de jurisdição voluntária, é de molde a concluir negativamente pela alteração do atual modelo de gestão das responsabilidades face à menor.

  10. Tendo-se comprovado que o Progenitor se encontra sujeito a uma medida de coação penal – TIR – não se vê como é que o Tribunal pudesse adotar ou evoluir, como o fez, de uma guarda exclusiva (da progenitora) para uma guarda partilhada, quando é o próprio artigo 40.º, n.º 9, RGPTC, e 1906.º-A, do Código Civil. E, com isso, 6. O Tribunal, face à prova testemunhal produzida, mormente relativamente ao FERNANDO …, amigo do casal, que, no essencial, sem reservas, afirmou que o progenitor, em convívio, «bebe demais» e é dado a extravasar os limites sociais, já que não se inibe de, pela madrugada a dentro, fora de si, ligar às pessoas, incomodando-as.

  11. Face a isto e ao facto de o progenitor estar indiciado por um crime de violência doméstica, se o Tribunal não fizer uma atuação cautelar ou preventiva, corre o risco de as suas decisões serem, posterior e infelizmente, «manchadas de sangue». Além de que, 8. Ciente da sua impunidade, o agressor terá tendência a «esticar a corda», sendo, aliás, o presente requerimento, já um sintoma dessa tentativa de hegemonia masculina e de tentar impor um estatuto superior, face à menor, pelo pai e progenitor, que está, aqui, em casa.

  12. Não tendo o progenitor um lugar habitacional seu, como pode o Tribunal, sem averiguar as condições sociais e psicoafectivas da companheira achar “natural e não perigoso”, para a menor, estar obrigada a conviver, durante 15 dias, com uma pessoa estranha. Aliás, 10. Não se percebe como os factos supra indicados se coaduna com os factos não provados, já que se diz que bebe muito e, depois, embora se saiba que beber muito cria habituação, não se conclui que o pai tem problemas com a bebida.

  13. Afastou-se ou desvalorizou todo um tipo de prova licitamente apresentada e que deveria levar a concluir negativamente pela guarda partilhada, mormente tendo em conta o problema habitacional do progenitor (sem casa própria); o facto de viver com uma companheira de que o Tribunal desconhece, em absoluto, o seu carácter ou personalidade; o facto de, dentro e fora de convívios sociais, o progenitor ser dado à bebida e fazer telefonemas inapropriados; o facto de o progenitor estar indiciado por crime de violência doméstica e, consequentemente, sujeito a TIR.

  14. Porque alguns factos provados deveriam ter sido considerados não provados e alguns considerados não provados o deveriam ter sido ao contrário. Nesse sentido, a título de exemplo, o Tribunal podia e devia ter concluído pela instabilidade emocional do progenitor e pela existência de problemas com o álcool, quer face às agressões padecidas pela progenitora, quer face ao depoimento da testemunha FERNANDO ….

  15. Verifica-se que o Tribunal, embora tenha dado como provados os factos 5.º (B), 6.º (B[1]), 7.º, 8.º, 9.º, 17.º, 18.º, 24.º, 26.º, 27.º, 29.º e 30.º, o certo é que os mesmos contrastam com as conclusões, ao nível dos factos não provados, de que o progenitor não tem instabilidade emocional, não tem problemas de alcoolismo, não ter sido o mesmo o autor das agressões da progenitora, embora haja depoimentos testemunhais a indicar o contrário (que bebe e bem nos convívios e fora deles), que é conflituoso (intervenção da PSP/GNR e CPCJ em 28-03-2017) e que não tem habitação própria, certa e dele. Aliás, 14. Basta recordar o teor da mensagem de 06 de Abril de 2016 para verificar que o progenitor tem problemas psicológicos e sociais muito graves: «Desculpa pelo meu comportamento ontem… eu tenho andado a beber fortemente. Estou mesmo infeliz com a minha vida neste momento. Não devia estar a descontar em ti». E, por isso, 15. À luz do disposto nos artigos 3.º, n.º 3, 615.º, n.º 1, alínea c), do NCPC + artigos 2.º e 9.º, alínea b), e 205.º, n.º 1, da CRP 1976, não pode deixar de afirmar-se e verificar-se que os fundamentos da decisão judicial se encontram em oposição com a decisão.

  16. Face aos factos 5, 6, 7, 8, 9, 17, 18, 24, 26, 27, 29 e 30, parece-nos existir uma contradição insanável entre a fundamentação e a decisão judicial “sob recurso” por efeito da “decisão surpresa” de decretamento da guarda partilhada, contra o fixado nos apontados factos, assim incorrendo o libelo absolutório na violação do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do NCPC + artigos 2.º e...

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