Acórdão nº 3/14.8FCOLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | S |
Data da Resolução | 08 de Maio de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório No Processo Comum nº 3/14.8FCOLH, que correu termos no actual Juízo Local Criminal de Albufeira do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, foi proferida sentença, em 20/12/16, com o seguinte dispositivo: VI. l - DECISÃO CRIMINAL Face ao exposto, decide o Tribunal: 1. Condenar F. pela prática, em autoria material, de um crime de desobediência qualificada, p. e p. pelo 348º nº 2 do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de €5,00, o que perfaz o valor de €500,00 (quinhentos euros); 2. Condenar o arguido no pagamento das custas, que se fixam nos seguintes termos: 2 UC.
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Se proceda à liquidação da pena de multa e custas.
VIII.2. - DECISÃO CIVEL Face ao exposto, o tribunal julga os pedidos de indemnização cível improcedente e, em conformidade:
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Absolver F. do pedido de indemnização civil deduzido por N.
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Custas pelo demandante nos termos do artigo 527.° do Código de Processo Civil.
Com base nos seguintes factos, que então se deram como provados (mantém-se a numeração original, em que se omite o nº 1): 2. No dia 8 de Junho de 2014, cerca das 15h35m, o Arguido F. estava na Praia dos Alemães, sita neste concelho de Albufeira, seu local de trabalho e onde exercia as funções de Nadador-salvador, como funcionário da Sociedade "L…, Lda", empresa concessionária daquela praia.
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Nesse local e data, os militares da GNR/UCC- Destacamento de Olhão- N e R, encontravam-se em exercício de funções, devidamente uniformizados e deslocavam-se em veículo todo o terreno (moto 4).
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No âmbito desse exercício de funções, os militares abordaram o arguido, informando-o que o iam autuar em virtude de entenderem que o mesmo estaria em violação do disposto no artigo 4° alínea e) do Decreto-lei 96-A/2006, de 3/6.
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Assim, solicitaram ao arguido que procedesse à sua identificação para que pudessem pro28ceder ao levantamento do respetivo auto de contraordenação.
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Descontente com a abordagem dos militares, o arguido recusou prestar a sua identificação, proferindo as seguintes palavras aos militares: "tu aqui não mandas nada!", alegando que a GNR não teria competência para o autuar, só a polícia marítima.
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Nessa sequência, os militares da GNR, não só o informaram que teriam competência para tal, como lhe transmitiram que o mesmo tinha de se identificar e que caso não o fizesse poderia ser detido.
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O arguido recusou novamente identificar-se aos militares.
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Não obstante, os militares da GNR solicitaram novamente a identificação do Arguido, ao que este respondeu que não iria facultar a sua identificação.
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O militar da GNR autuante, juntamente com o seu colega, advertiu então o Arguido que, caso não facultasse a sua identificação, incorreria num crime de desobediência e seria detido.
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O Arguido negou mais uma vez fornecer a sua identificação.
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O Arguido quis, dessa forma, subtrair-se ao cumprimento da ordem para se identificar e agiu com o propósito de desobedecer à mesma, regular e repetidamente comunicada pelos militares da GNR, em exercício de funções, apesar de ter percebido o sentido e o alcance da mesma, que sabia ser legítima.
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Bem sabia ainda, por ter sido devidamente advertido, que o seu não acatamento implicaria a prática de um crime de desobediência.
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O Arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida penalmente.
Mais se apurou que: 15. Ainda nessa mesma ocasião, surgiu o polícia marítimo, PC, o qual insistiu a que o arguido facultasse a sua identificação aos militares da GNR, tendo este, apos alguma relutância, acabado por mostrar a sua identificação.
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O arguido encontra-se atualmente desempregado, sobrevivendo graças às economias que efetua com o seu trabalho sazonal (aufere o ordenado mínimo durante um período entre 3 a 4 meses).
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Não recebe subsidiado nem apoio estatal ou particular.
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Vive numa habitação pertencente a um amigo, gratuitamente.
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Auxilia, quando possível, o filho de 22 anos de idade, o qual é estudante (cerca de €100,00 mensais).
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Concluiu o antigo 5.º ano (equivalente ao atual 9.° ano).
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Do seu certificado de registo criminal nada consta.
A mesma sentença julgou os seguintes factos não provados:
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Descontente com a abordagem dos militares, o arguido proferiu as seguintes palavras aos militares: "Não te dou identificação nenhuma, não me quero identificar! E é assim como eu digo! Vai-te embora que eu agora tenho de trabalhar!".
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O arguido recusou-se a facultar a sua identificação a quem quer que fosse, proferindo as seguintes palavras:" Nem penses! Não me identifico pá! Sai daqui para não teres problemas! Daqui não me levas tu nem que seja à força!".
Da referida sentença o arguido F. veio interpor recurso devidamente motivado, formulando as seguintes conclusões: 1 - O recorrente foi condenado pela prática, em autoria material, de um crime de desobediência qualificada, previsto e punido pelo artigo 348.º, n.º 2, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de €5,00, o que perfaz o valor de €500,00 (quinhentos euros).
2 – Para o efeito contribuiu o facto de ter julgado incorrectamente os factos identificados na matéria de facto dada como provada com os números 12, 13 e 14, porquanto em relação aos mesmos não foi produzida prova que permita considerar, sem margem para dúvidas, a prática dos mesmos.
3 - No caso em análise, tendo em conta os depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, mormente o depoimento do agente da Polícia Marítima, PC, era evidente e notório que o arguido não estava a cometer qualquer infracção, que legitimasse a ordem de identificação proferida pelo militar da GNR.
4 – O militar autuante tentou obter respaldo para a sua actuação numa norma cujo tipo legal não está preenchido, facto que não podia desconhecer.
5 – Assim, sendo manifesta e evidente a ilegalidade da ordem do agente autuante, o recorrente podia legitimamente recusar o seu cumprimento, ao abrigo do disposto no artigo artigo 31.º, n.º 2, al. b), do CP, 6 - Por esta razão a sua conduta não era punível, de acordo com o disposto no artigo 31.º, n.º1, al. b), do CP, em virtude da ilicitude se encontrar excluída.
7 - Deste modo, ao decidir condenar o arguido, o tribunal a quo violou, entre outros, os entre outros, os artigos 21.º, 26.º, n.º 1, 27.º e 272.º, n.º 2, todos da CRP, bem como o artigo 250.º, do Código de Processo Penal, e ainda os artigos 31.º, n.º 2, al. b), e 347.º, n.º 1, ambos do Código Penal.
8 - Caso assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio se admite, ainda se dirá que a pena em que o arguido foi condenado é manifestamente exagerada, atendendo ao facto do arguido ser primário, ter 65 anos de idade, e de o militar da GNR ter acabado por concretizar o seu intento, procedendo à identificação do arguido. Pelo que, 9 - A douta sentença é passível de censura, no que concerne à fixação da multa, por violação do artigo 71º do Código Penal, devendo, em consequência, ser a mesma reduzida para próximo dos limites mínimos.
Nestes termos e nos demais de direito, que V. Exas. queiram subscrever, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, absolver-se o arguido do crime de que vem acusado, ou, assim não se entendendo, deverá a sentença recorrida ser parcialmente revogada, na parte referente à fixação da medida da pena, reduzindo a pena fixada para próximo dos mínimos legais, assim se fazendo inteira e esperada JUSTIÇA! O recurso interposto foi admitido com subida imediata nos próprios autos, e efeito suspensivo.
O MP respondeu à motivação do recorrente, formulando, por sua vez, as seguintes conclusões: 1- Relativamente às questões levantadas pelo arguido, as mesmas não têm qualquer razão de ser.
2- O artigo 127º do Código de processo Penal, dispõe que a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
3- Se é verdade que se tratará de uma convicção racionazável, também certo será que terá o seu fundamento nas declarações das testemunhas.
4- Assim, as declarações das testemunhas foram ponderadas pelo tribunal, tudo conjugado com as declarações do arguido e ainda, certamente, as regras da experiência comum.
5- O funcionamento das regras da livre apreciação da prova, significa que o julgador, perante depoimentos contraditórios, com recurso às regras da experiência comum, da normalidade das coisas e da lógica da natureza humana, vai concluir pela verdade dos factos, ou pela falsidade dos mesmos, de forma lógica e racional.
6- Assim considerou o tribunal “a quo” a prova efectuada nestes autos e assim, convencendo-se da versão dos autuantes, considerou não credível a versão do arguido.
7 - O tribunal analisou todo o supra referido e no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova considerou provada a prática pelo arguido do crime pelo qual vinha acusado.
8- A Mª. Juiz "a quo", determinou depois, em primeiro lugar, qual o tipo de pena a aplicar e porque atentou no carácter excepcional da pena de prisão, optou então, pela pena de multa.
9- Após a determinação do tipo de pena a aplicar, determinou a medida dessa pena.
10- A medida da pena deve ser encontrada dentro de uma moldura penal onde as exigências de prevenção geral (de integração ou estabilização contrafáctica das normas) determinarão o limite mínimo de defesa do ordenamento jurídico, sendo o limite máximo traduzido pela medida óptima da tutela dos bens jurídicos. Dentro dessa moldura actuará a culpa - pressuposto e limite inultrapassável da pena - e a prevenção especial (de socialização), que fixará a medida concreta da pena (artigo 40° n.º 1).
11- Considerando que no artigo 348º nº 2 do Código Penal a pena varia entre dez (10) dias até duzentos e quarenta (240) dias, temos que a condenação na pena de multa de cem dias (100), que ao arguido foi aplicada não se mostra como excessiva.
12- Atenta a situação pessoal e económica do arguido, o quantitativo fixado na douta sentença...
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