Acórdão nº 627/16.9T8ABT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelPAULO AMARAL
Data da Resolução10 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 627/16.9T8ABT-A.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora (…) Banco S.A. propôs acção declarativa de condenação contra (…) e (…) pedindo que os RR. fossem condenados a pagar-lhe: € 14.359,92, a título de capital em dívida proveniente de um contrato de crédito pessoal; € 10,842,31, correspondentes a juros vencidos à taxa de 4%, acrescidos de imposto de selo sobre os juros à taxa legal de 4%, calculados sobre o montante de capital € 14.359,92, desde 25 de Dezembro de 1998 até 14 de Novembro de 2016 e juros vincendos desde 15 de Novembro de 2016 até efectivo e integral pagamento.

Alegou que celebrou com os Réus um contrato de crédito pessoal pelo montante de € 15.710,49, em 25 de Junho de 1998. O empréstimo seria pago em 60 meses.

A última prestação foi paga em 25 de Dezembro de 1998.

*A R. contestou invocando as seguintes excepções: - prescrição por ter havido dação em cumprimento; - prescrição das quotas de amortização pagáveis com os juros; - prescrição dos juros de mora.

*O A. respondeu.

*Foi decidido julgar procedente a excepção da prescrição dos juros de mora. Entendeu-se que o crédito do Autor (quer a título de capital, quer a título de juros) estava prescrito a partir do dia 26 de Dezembro de 2003, apenas sendo exigível até 25 de Dezembro de 2003.

Na audiência preliminar foi ainda decidido relegar para a sentença a questão da dação em cumprimento.

*Deste despacho recorrem a Ré e o Autor.

O Autor defende que ao caso se aplica o artigo 309.º e não o artigo 310.º, do Código Civil, que diz respeito a prestações periodicamente renováveis e não ao pagamento de uma quantia repartida em prestações.

A Ré alega, por sua vez, que toda a obrigação se extinguiu por prescrição*Os factos alegados que devem ser tidos em conta são os seguintes: Em 25 de Junho de 1998, foi celebrado um contrato de crédito pessoal através do qual o A. emprestou aos RR. a quantia de € 15.719,49 que seria amortizável em 60 meses.

A última prestação paga pelos RR. foi a vencida em 25 de Dezembro de 1998.

O A. interpelou os devedores para pagarem a totalidade da dívida, acrescida de juros, em 27 de Abril de 2016.

*O problema é saber se este contrato, melhor dizendo, se as obrigações provenientes deste contrato prescrevem no prazo ordinário de 20 anos ou no prazo especial de 5 anos.

A Ré defende que é este último prazo porque as prestações que vão sendo pagas correspondem a quotas de amortização do capital, pagáveis com juros.

Ao invés, o A. defende que se aplica o primeiro prazo porque não estamos perante prestações periódicas mas sim perante um pagamento fraccionado no tempo.

*Diga-se desde já que concordamos com o A..

O caso dos autos é um contrato de mútuo (em que o dinheiro foi logo recebido) e não um contrato que obrigue a uma prestação que regularmente se renova, como é o caso dos pagamentos de rendas locatícias, foros (já extintos), rendas, pensões de alimentos, etc.. Nestes casos, os créditos «resultam de uma relação unitária duradoura (v.g.

, renda perpétua, enfiteuse, locação)» (Vaz Serra, «Prescrição Extintiva e Caducidade», BMJ, n.º 106, p. 109).

No caso dos autos isso não acontece pois que todo o dinheiro (dado o carácter real do contrato de mútuo) foi logo entregue aos Réus.

Conforme cita o A., escreve I. Galvão Telles que as «prestações periódicas resolvem-se em actos sucessivos (…) como a obrigação do inquilino de pagar as rendas ou a do fornecedor de fazer entregas à medida que forem solicitadas.

Não se confunde com esta última categoria o caso de uma obrigação única dividida ou fraccionada em parcelas. Existe então uma prestação global que é efectuada por partes, escalonadas no tempo, as quais se dizem “prestações” num sentido especial da palavra. Pode apontar-se como exemplo uma venda a prestações ou um empréstimo de dinheiro em que se convencione o pagamento parcelado

(Direito das Obrigações, 7.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1997, pp. 39-40).

Como escreve ainda Antunes Varela, as prestações podem ser instantâneas, fraccionadas ou repartidas, e duradouras, cabendo dentro destas as prestações de execução continuada e as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo. E acrescenta: a «distinção entre umas e outras [obrigações de prestação instantânea e obrigações de prestação continuada ou periódica] é essencial para a compreensão do disposto, entre outros lugares, nos artigos 307.º e 310.º» (Das Obrigações em Geral, vol. I., 9.ª ed., Almedina, Coimbra, 1998, p. 96).

São coisas diferentes a prestação periódica e o pagamento em prestações tal como são diferentes os regimes de incumprimento em cada uma delas.

No caso do incumprimento das prestações periódicas, se o devedor não cumprir, o credor pode pedir a sua condenação ao pagamento das prestações já vencidas assim como as que entretanto se vencerem, enquanto perdurar ou subsistir a relação subjacente. Em contrapartida, no caso de prestações fraccionadas, como é o caso dos autos, o credor poderá, na hipótese de ter celebrado um contrato de crédito ao consumo e caso haja incumprimento no pagamento de uma das prestações convencionadas, exigir o pagamento de todas as restantes, porquanto nos termos do artigo 781.º do Código Civil, a falta de realização de uma prestação importa o vencimento de todas as restantes (é neste sentido a alegação do recorrente no caso do ac. da Relação do Porto, de 24 de Março de 2104, embora sem sucesso; cfr., também, Antunes Varela, ob. cit.

, pp. 97-98).

*O A. não pediu o pagamento das prestações em falta acrescidas dos juros que integravam cada uma das prestações; pediu outrossim o pagamento do capital, por força da perda do benefício do prazo, acrescido de juros moratórios — o que é perfeitamente lícito (cfr. acs. do STJ, de 24 de Maio de 2007 e de 7 de Outubro de 2004, entre muitos outros).

A circunstância do não pagamento de uma prestação origina o imediato vencimento das demais, nos termos do art.º 781.º. A partir do momento em que uma prestação não é paga, não podemos mais falar em prestações; apenas podemos falar em dívida.

É que já não há prestações a pagar.

O citado preceito legal é fundamental para permitir distinguir as (1.º) prestações (2.º) da dívida resultante do incumprimento de uma delas. A falta de pagamento de uma implica o vencimento imediato de todas. A partir do momento em que o devedor falha o pagamento de uma, ele não deve mais prestações — seja com juros ou sem juros. A partir do dito momento, o devedor só deve o capital, acrescido dos respectivos juros moratórios.

O caso não é, pois, de prestações em dívida.

*Entendemos assim que à dívida dos autos se aplica o art.º 309 e não o art.º 310.º.

O que significa, também, que a jurisprudência invocada nas alegações da R. não tem aqui aplicação – em princípio; esta jurisprudência, que aplica o art.º 310.º ao caso das prestações de capital e juros, tem por objecto algo diferente do nosso, uma vez que neste não estão em causa prestações daquele tipo. O que está aqui em...

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