Acórdão nº 27/15.8GDSTC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelGILBERTO CUNHA
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: RELATÓRIO.

Decisão recorrida.

No processo comum nº742/12.8GTABF procedente do Juízo de Competência Genérica de Santiago do Cacém (juiz 1), do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, os arguidos MM e LL, ambos devidamente identificados nos autos, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento perante tribunal singular, vindo por sentença proferida em 30-05-2017, para o que aqui releva, a ser julgada parcialmente procedente a acusação e consequentemente ser decidido o seguinte:

  1. Absolver o arguido LL da prática de 1 (um) crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137.º, n.º 1, do Código Penal, de que vinha acusado; b) Condenar o arguido MM pela prática de 1 (um) crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137.º, n.º 1 do Código Penal na pena de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa, à razão diária de 15,00 € (quinze euros), o que perfaz o montante global de 3.900,00 € (três mil e novecentos euros); c) Condenar o arguido MM, nos termos do artigo 69,º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período de 6 (seis) meses.

    Recurso.

    Inconformado com essa decisão dela recorreu o arguido MM, pugnando pela sua absolvição, rematando a motivação com as seguintes (transcritas) conclusões: A.

    O presente recurso vai interposto da sentença que condenou o Arguido/Recorrente pela prática de 1 (um) crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137º nº. 1 do Código Penal na pena de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa, à razão diária de 15,00 € (quinze euros), o que perfaz o montante global de 3.900,00 € (três mil e novecentos euros); nos termos do artigo 69º nº. 1 al. a) do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período de 6 (seis) meses; no pagamento das custas do processo (artigos 513º e 514º do Código de Processo Penal), fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) Unidades de Conta, nos termos do artigo 8º, nº. p e Tabela III, do Decreto-Lei nº. 34/2008 de 26 de Fevereiro (Regulamento das Custas Processuais) e 334º nº. 2, al. c) do Código de Processo Penal, e demais encargos.

    B.

    Está em causa nos presentes Autos a eventual prática por parte do Arguido/Recorrente de um crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137º nº. 1 do Código Penal.

    C.

    Para o efeito, entendeu o Tribunal “ad quo” dar como provado, nomeadamente, que: No dia 29 de Julho de 2015, pelas 14h20 o arguido MM conduzia o veículo pesado de mercadorias com a matrícula XT-, propriedade de “T… Agrícolas Unipessoal, Lda.”, na estrada Nacional nº- 261, perto do Km 83,5 no sentido de marcha IC1-Aljustrel, na direcção do entroncamento com a Estrada Nacional nº. 526, que liga a Gasparões, a uma velocidade superior a 30 Km/hora, pela metade direita da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marca – Facto 1; Ao aproximar-se do entroncamento com a Estrada Municipal nº. 526, o arguido MM pretendia virar à esquerda, atento o seu sentido de marcha – Facto 2; Neste circunstancialismo de tempo e lugar, na mesma estrada mas em sentido contrário, Aljistrel-IC1, circulava o veículo de passageiros de matrícula -LE, propriedade de NT, à velocidade de cerca e não inferior a 88 Kms. Hora, conduzido pelo arguido LL, pela metade direita da faixa de rodagem, atendendo ao seu sentido de marcha – Facto 3; Ao pretender ingressa naquela Estrada Municipal, o arguido MM, porque não prestava atenção ao que se passava à sua frente, não parou no sinal de perigo de entroncamento à esquerda com via sem prioridade que ali se encontra, embora tivesse abrandado, tendo invadido a via de trânsito destinada ao trânsito de sentido oposto, onde circulava o veículo conduzido pelo arguido LL - Facto 5; Ao avistar o veículo conduzido pelo arguido MM a uma distância de cerca de 55 metros, o arguido Luís Silva, travou a marcha do seu veículo e desviou-se para a esquerda, não conseguindo, contudo, evitar o embate da lateral direita da parte da frente do seu veículo no eixo traseiro do lado direito do veículo conduzido pelo arguido MM. - Facto 6; O embate verificou-se junto do eixo da faixa de rodagem, quando o veículo do arguido LL já tinha invadido praticamente na sua totalidade a via de trânsito contrária, encontrando-se apenas os rodados do lado direito do veículo na sua via, mais precisamente sobre a linha longitudinal descontínua adjacente à linha contínua (linha mista) que apenas separa as vias de trânsito; - Facto 7; Por seu lado, no momento do embate, o veículo de MM circulava a uma velocidade de cerca de 30 Km/h e ocupava, em diagonal, toda a via de trânsito contrária (a via de origem do veículo conduzido por LL), encontrando-se a parte da frente a transpor a linha longitudinal descontínua que separa a Estrada Nacional da Estrada Municipal e quedando ainda a parte de trás do veículo, nomeadamente a zona anterior ao eixo traseiro, na sua via de origem. - Facto 8; A E.N. nº. 261 no local do acidente apresenta uma largura de 8 metros e a E.M. nº. 526, na intersecção com esta, uma largura de 44 metros. - Facto 12; E.N. nº. 261 naquele local tem duas vias de trânsito, uma em cada sentido, separada por uma linha contínua, separadora de sentidos de trânsito, apresentando no entroncamento uma linha mista, a fim de permitir pisar e transpor a linha contínua para a realização de mudança de direcção; - Facto 13; A E.N. nº 261 no sentido de marcha do arguido LL (Aljustrel – IC1) apresenta-se como uma recta com boa visibilidade, com uma extensão de pelo menos 375 metros e com inclinação descendente (1,1º). - Facto 14.

    Nos dois sentidos de trânsito está colocado um sinal de proibição de exceder a velocidade máxima de 70 km/h, que se impunha aos arguidos. - Facto 15; A largura da via no sentido IC1-Aljustrel é de 3,17 metros e de 3,13 metros no sentido contrário (Aljustrel-IC1); - Facto 16; Do local onde iniciou a manobra de mudança de direcção o arguido MM avistava qualquer veículo que circulasse no sentido contrário ao seu a pelo menos uma distância de 170 metros. - Facto 22; Também o arguido LL avistava qualquer veículo que se encontrasse no entroncamento onde ocorreu o embate a uma distância de cerca de 170 metros. - Facto 23.

    Por outro lado, o arguido LL podia e devia ter tomado outros cuidados na sua condução, como lhe era exigível e possível, designadamente de não ultrapassar o limite de velocidade exigido naquele local (7º km/h), conduta que se tivesse adoptado evitaria o embate e a morte de RM – Facto 27.

    Agiu, assim, o arguido LL com manifesta falta de consideração pelas normas legais relativas à circulação automóvel, não agindo com a diligência e cautela que lhe eram exigíveis e que estavam ao seu alcance - Facto 29.

    Sendo este o seu primeiro e único contacto com o sistema de justiça, MM não aceita as acusações que lhe são dirigidas, recusando a culpa do acidente ocorrido, considerando uma injustiça a situação que vivencia, com muito sofrimento, sendo ainda muito doloroso para ele falar sobre os factos - Facto 44; Neste contexto, tem vindo a apresentar uma forte instabilidade emocional, referindo que a situação lhe causou trauma significativo, revelando, desde então, comportamentos de ansiedade e depressão, com interferência na dinâmica familiar e profissional, recorrendo neste momento a medicação psiquiátrica para controlar estes sintomas – Facto 45.

    D.

    Dos documentos juntos aos Autos e das declarações prestadas na audiência de julgamento nomeadamente pelos Arguidos LL (cf.ficheiro 103906), MM (cf. ficheiro 111011), e pelas testemunhas AP (cf. ficheiro 145449), FR (cf. ficheiro 153035) não podem retirar-se tais conclusões.

    E.

    Pese embora vigorar no Processo Penal o Princípio da livre apreciação da prova, a mesma não pode, nos termos da jurisprudência do Tribunal Constitucional, ser " ...arbitrária, discricionária ou caprichosa." - Cfr. Ac. do Tribunal Constitucional n.º1165/98 de 19 de Novembro; BMJ, 461, 93).

    F.

    Não teve assim o Tribunal recorrido em devida consideração quer as declarações prestadas pelo Arguido/Recorrente, quer as declarações prestadas pelo arguido LL, quer ainda, e nomeadamente, o depoimento das testemunhas AP (cf. ficheiro 145449), FR, e ao julgar como julgou, não submeteu a um exame crítico toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento.

    G.

    Violando, assim, o disposto na alínea c) do n.º 2 art. 410.° do C.P.P.; H.

    Existindo assim não só um erro notório na apreciação das provas como, também, contradição entre a fundamentação e a douta decisão proferida, que impõem, assim, decisão diversa da recorrida, porquanto ao considerar-se as declarações dos arguidos e a referida prova testemunhal, a decisão do Tribunal recorrido quanto à matéria de facto teria que ser necessariamente outra.

    I.

    Assim, face à prova produzida em sede de audiência de julgamento, entende o Recorrente que não pode dar-se como provado que: O arguido MM não prestava atenção ao que se passava à sua frente quando pretendia ingressar naquela Estrada Municipal - Facto 5; O arguido avistou o veículo conduzido pelo arguido MM a uma distância de cerca de 55 metros. - Facto 6; J.

    Devendo, sim, dar-se como provado que: Ao pretender dirigir-se para a esquerda, para ingressar na Estrada Municipal nº. 526, o arguido MM accionou a luz de pisca-pisca do lado esquerdo do seu veículo, e dirigiu o mesmo para o lado esquerdo para entrar na aludida Estrada Municipal nº. 526; Sinalização de mudança de direção que o arguido LL avistou ao chegar ao cimo da lomba, quando viu o outro veículo já com a marcha iniciada para voltar para a esquerda, mas já a apanhar a sua faixa de rodagem; E quando o veículo conduzido pelo arguido MM se encontrava com a parte da frente já a transpor a linha longitudinal descontínua que separa a Estrada Nacional da Estrada Municipal e quedando ainda a parte de trás do veículo, nomeadamente a zona anterior ao eixo traseiro...

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