Acórdão nº 39/09.0TBMGD-M.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução06 de Novembro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães RELATÓRIO A Massa Insolvente de E…, Lda.

, representada pela administradora da insolvência, intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra C…, Llc, E…, Lda.

e S…, pedindo que: a) seja declarada, quer a eficácia da resolução, quer a produção dos efeitos do acto jurídico de resolução do acto notarial de compra e venda outorgada em 14.08.2008 celebrado entre a E…, Lda., e a C…, Llc, respeitante ao bem imóvel identificado enquanto "fracção autónoma designada pela letra "B", localizada no rés-do-chão esquerdo destinado a comércio do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito no lugar do Prado, freguesia e concelho de Mogadouro, descrito na CRPredial de Mogadouro sob o nº 1.142, e inscrito na matriz sob o artigo 3316 da freguesia de Mogadouro; b) os réus sejam condenados a reconhecer a legitimidade e validade de tal declaração de resolução; c) se declare revertido o bem imóvel em causa para a Massa Insolvente nos termos do artº 126º, nº 1 do CIRE; d) seja fixado judicialmente um prazo para a sua restituição; e) seja ordenada a extinção dos ónus e/ou registos que incidam sobre os bens com efeitos à data do acto resolvido.

Alegou, para tal, que por escritura de compra e venda outorgada em 14.08.2008, a 2ª ré, representada pelo aqui 3º réu, vendeu à 1ª ré, entidade de direito estrangeiro de raiz e participação desconhecidas, comummente designada por empresa offshore, a fracção autónoma acima identificada, sendo que tal alienação mais não representou do que a fórmula encontrada pelos réus para fazer deslocar do acervo patrimonial da 2ª ré o seu bem mais valioso, evitando assim que o imóvel fosse avocado para pagamento das dívidas da empresa, a qual acabou por ser declarada insolvente em Abril de 2009. O preço de € 100.000,00 declarado a pagar pela compradora à vendedora - que o 3º réu admitiu ter recebido -, não foi pago, não se encontrando sequer reflectido na contabilidade da ré insolvente, além de que esse preço não corresponde ao valor efectivo e de mercado do imóvel, à data da alienação, o qual ascende ao valor mínimo de € 500.000,00.

Mais alega ter a administradora da insolvência procedido à resolução do acto danoso e prejudicial para a massa, através de carta registadas enviadas a todos os intervenientes no negócio, do qual apenas teve conhecimento no início do mês de Maio de 2009, na sequência das averiguações realizadas para a busca e apreensão do património da 2ª ré, sendo que a 1ª ré, atento o valor real do imóvel em causa, ficou claramente beneficiada em detrimento dos interesses dos credores da empresa vendedora, não ignorando esta ré, tal como os demais réus, que em Agosto de 2008, o imóvel representava um essencial meio garantístico para a solvência das dívidas da insolvente, bem como a situação de insolvência da 2ª ré, dado que tal facto era do conhecimento público, sendo o seu objectivo prejudicar os credores, tendo, pois, todos os réus agido com perfeita consciência do alcance dos seus actos, visando unicamente evitar a avocação do imóvel pela massa insolvente e, assim, prejudicar os seus credores.

Contestou apenas a 1ª ré, excepcionando e impugnando.

Por excepção, invocou a prescrição do direito da autora, afirmando nunca ter recebido nenhuma comunicação de resolução do negócio, sendo apenas com a citação para a presente acção que teve conhecimento de tal pretensão.

Por impugnação, diz que o preço de € 100.000,00 da compra do imóvel à 1ª ré foi pago em numerário, por exigência da insolvente, sendo completamente fantasioso o valor de € 500.000,00 indicado pela autora como correspondente ao valor de mercado do imóvel, sendo que de acordo com a avaliação realizada pela Autoridade Tributária, à fracção em causa foi atribuído o valor patrimonial de € 98.501,94€, pelo que o preço pelo qual foi realizado o negócio de compra e venda da referida fracção não foi prejudicial para a 2ª Ré.

Foi proferido despacho saneador e organizada a matéria de facto assente e a base instrutória, sem reclamação.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, tendo sido proferida sentença a julgar a acção procedente e, em consequência, condenou os réus no pedido.

Inconformada, apelou a ré, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: (…) A autora contra-alegou, batendo-se pela confirmação do julgado.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - ÂMBITO DO RECURSO Como emerge do conteúdo das conclusões da alegação da recorrente que, como se sabe, delimitam o objecto do recurso, as questões cuja resolução vêm propostas consistem em saber: - se deve ser alterada a matéria de facto nos concretos pontos indicados pela recorrente; - se assiste à autora o direito de resolver o contrato de compra e venda celebrado entre a 1ª e a 2ª ré a favor da massa insolvente desta última; - se caducou o direito de proceder à resolução do negócio.

III – FUNDAMENTAÇÃO A) OS FACTOS Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos[1]: 1) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Mogadouro sob o n.º 1142/199661220 o prédio urbano, sito em Prado, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3316, constituído em propriedade horizontal, composto pelas fracções A e B [al. A].

2) A sociedade “E…, Lda.” foi declarada insolvente por sentença de 2 de Abril de 2009, proferida no âmbito dos Autos Principais, tendo sido nomeada como Administradora de Insolvência (AI) a Sra. Dra. P…, com escritório na Rua Padre Américo, Edifício Marialva, 1.º J, em Anadia [al. B)].

3) Por escritura de compra e venda outorgada em 14.08.2008 no Cartório Notarial do Ex.mo Sr. Dr. António Gonçalves de Sousa, sito na Rua Gomes de Amorim, 36, 1º, cidade da Póvoa de Varzim, a 2.ª R. vendeu à 1.ª R., C…, Llc, com sede em Suite 808, 1220 N. Market Street, Wilmington, New Castle, Delaware 19801, Estados Unidos da América, o seguinte bem imóvel: fracção autónoma designada pela letra “B”, localizada no rés-do-chão esquerdo destinado a comércio do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito no lugar do Prado, freguesia e concelho de Mogadouro, descrito na CRPredial de Mogadouro sob o n.º 1142, inscrito na matriz sob o artigo 3316 da citada freguesia de Mogadouro e com Alvará de Licença de Utilização atribuído pela Câmara Municipal de Mogadouro em 04.12.2006 [al. C)].

4) No acto notarial em causa a 2.ª R./proprietária e vendedora foi representada pelo 3º R., seu sócio-gerente, Sr. S…, residente na Avenida Calouste Gulbenkian, 5200, em Mogadouro, e a 1.ª R./alegada compradora foi representada pelo Exm.º Sr. Dr. J…, com domicílio na Rua Gomes de Amorim, 36, 3º, 4490-641 Póvoa de Varzim [al. D)].

5) No ano de 2012, o valor patrimonial do prédio identificado em C) dos factos assentes era de € 98.501,94 e no ano de 2006 era de € 91.510,00 [al. E)].

6) Por contrato de promessa de compra e venda datado de 06.06.2006 secundado por Acordo Parassocial outorgado em 20.03.2007, S… e C… criaram a propriedade horizontal do imóvel, sede da empresa, dividindo-o em duas parcelas autónomas que partilharam entre si [art. 1º].

7) Permanecendo a sociedade insolvente e igualmente 2.ª R. com a fracção “B” entretanto constituída [art. 2º].

8) O preço declarado pago pela 1.ª R. à 2.ª R. e que o 3.º R. admitiu ter recebido, ou seja, € 100.000,00 (cem mil euros) não foi pago pela 1.ª Ré à 2.ª R. [art. 3º].

9)...

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