Acórdão nº 2380/08.0TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução30 de Janeiro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães * 1.Relatório. L.., por si e em representação da sua filha menor, D.., intentaram acção declarativa de condenação, na forma ordinária, contra .., Companhia de Seguros, S.A, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia total de € 340.000,00, acrescida de juros legais de mora, que se vencerem sobre aquele capital, desde a citação até efectivo pagamento, sendo : a) 10.000,00€, devida a titulo de indemnização pelo sofrimento que o finado D.. suportou durante o período que antecedeu a sua morte ; b) 40.000,00€, devida a titulo de indemnização da viúva pelo direito à vida do marido ; c) 40.000,00€, devida a titulo de indemnização da filha D.. pelo direito à vida do pai; d) 30.000,00€ devida a titulo de Ind. Pelos danos morais próprios do viúva; e) 30.000,00€, a titulo de Ind. Pelos danos morais próprios da filha D.. ; f) 150.000,00€, a titulo de danos patrimoniais correspondentes à quebra salarial ou lucros cessantes.

Para tanto , alegaram os AA, em síntese, que : - No dia 17 do mês de Julho do ano de 2006, ocorreu um acidente de viação com um veiculo ligeiro conduzido por D.., em consequência do qual veio este último a falecer, sendo que as aqui AA. são , respectivamente, a ex-cônjuge viúva e a filha da vítima falecida; - O acidente referido verificou-se quando o D.. conduzia o veículo referido (..) ao serviço de A.., Ldª, proprietária do mesmo e segurado na Ré ; - Sucede que, o acidente apenas ocorreu por causas relacionadas com a falta de conservação do veículo e o deficiente funcionamento dos seus elementos mecânicos, designadamente os órgãos da suspensão, o que tudo deu origem ao seu despiste , invadindo então a faixa contrária e vindo a embater em veículo que no momento circulava em sentido contrário.

1.1.- Após citação, a Ré Seguradora apresentou contestação, defendendo-se por excepção ( excepcionando a sua ilegitimidade) e impugnação motivada ( aduzindo que o acidente ficou a dever-se exclusivamente à conduta do falecido, porque conduzia sob a influência do álcool e com velocidade excessiva ) , e deduzindo pedido reconvencional , após o que, seguindo-se a Réplica das AA, neste último articulado responderam ambas às excepções e ao pedido reconvencional , terminando com a formulação do pedido de intervenção provocada de A.., Ldª .

1.2.- Seguindo-se a Tréplica da Ré Seguradora ( articulado em que concluindo como na contestação/reconvenção, impetrando que as excepções invocadas na réplica fossem consideradas/julgadas improcedentes ), foi depois proferido despacho de admissão da intervenção provocada de A.., Ldª , tendo esta última, após citação, apresentando articulado no âmbito do qual, após impugnar a versão do acidente carreada para os autos pelas AA, deduz contra ambas pedido reconvencional, impetrando a respectiva condenação no pagamento à chamada da quantia de € 28.500,00 acrescida dos juros de mora, calculados à taxa legal, que se vencerem desde a data da citação.

1.3.- Após resposta das AA ao articulado da interveniente, seguiu-se finalmente a prolação do competente despacho saneador (com dispensa da realização da audiência preliminar, e no âmbito do qual foi ainda proferida decisão de não admissão da reconvenção deduzida pela ré “Companhia de Seguros” , e , bem assim, que julgou improcedente a excepção dilatória da ilegitimidade arguida pela Ré Seguradora ), tendo-se ainda proferido decisão de admissão do pedido reconvencional deduzido - contra ambas as AA - pela chamada A.., Ldª.

Ainda aquando da prolação ( em 16/11/2009 ) do despacho saneador, proferiu a primeira instância decisão que fixou a matéria de facto assente e organizou a base instrutória da causa, peças estas que foram objecto de reclamação que porém não foi atendida.

1.4.- Finalmente, designado dia para a realização da audiência de julgamento, à mesma se procedeu, vindo a concluir-se a discussão da matéria de facto em Junho de 2012, e , após prolação da decisão a que alude o nº2, do artº 653º, do CPC, que não foi objecto de reclamações, proferiu-se finalmente a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor: “ (…) IV DECISÃO Em face do exposto, o Tribunal: I. Julgando a acção parcialmente provada e procedente, condena a Ré .., Companhia de Seguros, S.A. a pagar: a) à Autora L.., a título de danos não patrimoniais sofridos com a morte do marido, a quantia de € 20.000, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde a presente data até integral e efectivo cumprimento; b) à Autora D.., a título de danos não patrimoniais sofridos com a morte do pai, a quantia de € 25.000, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde a presente data até integral e efectivo cumprimento.

  1. Julga prejudicada a apreciação do incidente de litigância de má fé suscitado pela Ré.

  2. Julgando a reconvenção deduzida pela Interveniente Principal A.., Ldª não provada e improcedente, absolve as Autoras L.. e D.. do pedido formulado.

Custas da acção a cargo das Autoras e da Ré na proporção do decaimento e da reconvenção a cargo da Interveniente Principal.

Registe e notifique.

Fafe, 24 de Setembro de 2012. “ 1.5. - Inconformada com a decisão/sentença indicada em 1.4., da mesma apelou então a Ré Companhia Seguradora, apresentando a recorrente na respectiva peça recursória as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida foi proferida ao arrepio de toda a prova produzida em audiência de julgamento.

  1. Foi desprezada por completo a experiência acumulada ao longo de mais de 32 anos pelas testemunhas Dr. M.., coordenador do Gabinete Médico-Legal, e Dr. M.., preferindo conferir credibilidade à versão apresentada pela testemunha Dr. F.., especialista em psiquiatria, cujas credenciais a própria sentença reconhece não ter conseguido apurar.

  2. A prova produzida, nomeadamente os depoimentos dos peritos médico-legais Dr. M.. (coordenador do Gabinete Médico-Legal), e Dr. M.. (que, enquanto perito do Gabinete Médico Legal, realizou a autópsia), leva a que os artigos 13º, 14º e 15º da base instrutória tivessem de ser dados, na íntegra, como provados, não comportando as respostas restritivas que foram dadas aos artigos 13º e 14º nem a resposta negativa dada ao artigo 15º.

  3. Por isso, deverá a decisão sobre a matéria de facto ser revogada e dados como provados, integralmente, aqueles artigos 13º, 14º e 15º da base instrutória.

  4. A culpa da ocorrência do acidente ficou a dever-se, exclusivamente, ao facto de o malogrado D.. conduzir o veículo UU com uma taxa de álcool no sangue de 2,41 g/l.

  5. Refere o artigo 483º do Código Civil que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.

  6. No caso dos autos, foi o falecido D.. quem violou, de forma grosseira, o disposto no artigo 81º do Código da Estrada, que proíbe a condução sob o efeito do álcool, de taxa igual ou superior a 0,5 g/l.

  7. Com a sua conduta, cometeu o crime previsto e punível pelo artigo 292º do Código Penal, que considera como tal a condução de veículos com taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20 g/l.

  8. Ambas as citadas disposições existem para proteger interesses alheios, nomeadamente, a integridade física dos restantes utentes das vias, enquadrando-se no conceito definido pelo citado artigo 483º do Código Civil.

  9. Por conseguinte, os danos morais arbitrados às autoras teriam de ser ressarcidos por quem violou aqueles interesses e único culpado na ocorrência do acidente, in casu, o malogrado D.., marido e pai delas.

  10. O contrato de seguro dos autos foi celebrado entre a recorrente e a entidade patronal do causador do acidente, não com este, pelo que a indemnização arbitrada não se enquadra nas respectivas condições.

  11. Foram violados os artigos 483º do Código Civil, 81º do Código da Estrada e 292º do Código Penal.

Termos em que deverá a douta decisão recorrida ser revogada, com o que se fará inteira JUSTIÇA.

1.6.- Contra-alegando, vieram as AA, sinteticamente, aduzir que a primeira instância julgou com inteiro acerto e perfeita observância das disposições legais aplicáveis aos factos apurados, não podendo a douta sentença deixar de ser integralmente confirmada.

* Thema decidendum Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões ( daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória , delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem) das alegações do recorrente (cfr. artºs. 684º nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do Código de Processo Civil - com as alterações introduzidas pelo DL nº 303/07, de 24 de Agosto - revogado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho - cfr. artº 7º, nº1, deste último diploma legal ), as questões a apreciar e a decidir são as seguintes : I - Da pertinência da impetrada alteração da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto ; II - Apurar se as AA, na qualidade de viúva e filha de vitima mortal de acidente de viação, têm direito à reparação dos danos não patrimoniais próprios sofridos e decorrentes da referida morte, ou ,ao invés, porque o acidente ficou a dever-se a “culpa” exclusiva do próprio, estão as referidas AA excluídas da “cobertura” emergente do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.

*** 2.Motivação de Facto.

Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade : 2.1.- Encontra-se junto aos autos escritura pública, data de 12 de Outubro de 2006,denominada de “Habilitação”, nos termos da qual, resulta que “L..”, disse “ que é a cabeça de casal da herança deixada pelo seu marido D.. e nessa qualidade declara que: no dia dezassete de Julho de 2006, na freguesia de Quinchães, concelho de Fafe, faleceu D.., natural de Riom, departamento de Puy-de-Dôme, França, no estado de casado, sob o...

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