Acórdão nº 6056/12.6TDLSB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA LU
Data da Resolução17 de Março de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes na secção criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO Nos autos de instrução n.º6056/12.6TDLSB do 1ºJuízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, por despacho proferido em 30/9/2013, foi decidido não pronunciar os arguidos Bruno F... e Joaquim F... pela prática do crime de difamação p. e p. pelos arts.180.º, 183.º n.º1 e 2, ambos do C.Penal e arts.30.º e 31.º da Lei de Imprensa (Lei n.º 2/99, de 13/1) que lhes foi imputado na acusação particular.

Inconformado com a decisão, o assistente António M... interpôs recurso, extraindo da motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: 1ª Vem o presente recurso interposto da decisão instrutória proferida nos autos em epígrafe, que não pronunciou os arguidos os arguidos BRUNO F... e JOAQUIM F..., pela prática do crime de difamação, p. e p. pelos artigos 180º, 183º n.º 1 e 2 do C.P.e pelos artigos 30º e 31º da Lei de Imprensa.

  1. Entendeu o Mmo. Juiz a quo que tal factualidade não se encontrava no entanto suficientemente alicerçada pela prova produzida em inquérito e em sede de instrução, alegando, em síntese, que “da análise que fazemos da prova entendemos resultar suficientemente indiciado que a noticia se referia ao crime de falsificação” (…) cremos que pelo facto da notícia não adulterar de forma ilícita a decisão do Supremo Tribunal de Justiça nos motiva e convence no sentido dos factos dados como indiciariamente não provados.

  2. Por ter entendido que o artigo jornalístico com a terminologia “apropriação indevida” não retrata de forma distorcida a decisão do Supremo Tribunal de Justiça porquanto «da interpretação que o Tribunal faz de tal acórdão, enquanto acto jurídico que o é, decorre, eu para os destinatários do mesmo emerge que na realidade o aqui assistente, através da referida “S...”, recebeu indevidamente do V... uma quantia que se destinava ao Fisco em virtude do aludido crime de falsificação pelo qual foi condenado».

  3. Indícios suficientes são elementos de facto trazidos pelos meios probatórios no processo que, livremente analisados e apreciados, criam a convicção de que a manterem-se em julgamento, terão sérias probabilidades de conduzir a uma condenação do arguido pelo crime que lhe é imputado, ou quando esta seja mais provável que a absolvição.

  4. Para o Assistente deduzir despacho de acusação, não se exige a certeza da prática dos factos mas apenas que haja indícios suficientes de que os haja praticado.

  5. Por outro lado, as provas recolhidas nas fases preliminares do processo, constituindo pressuposto não da decisão de mérito mas da mera decisão processual da prossecução do processo até julgamento, não têm de sofrer uma apreciação tão exigente como a que é pressuposta para a condenação dos arguidos.

  6. Em síntese, analisada a prova carreada para inquérito, conclui-se que a mesma é mais que suficiente e adequada a indiciar os factos vertidos para a acusação particular, sendo que tal prova foi aliás reforçada em sede de instrução pelos depoimentos das testemunhas Marlene A... e José C....

  7. Atentando no teor do Douto Acórdão proferido pelo STJ publicado in www.dgsi.pt, verifica-se que o mesmo, nos seus pontos 4.1 a 4.3, evidencia aquilo que já resultava do Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, a absolvição do aqui assistente da prática de todos os crimes de peculato (negrito e sublinhado nosso) que lhe vinham imputados.

  8. Aliás e no que à questão da verba objecto da notícia nos presentes autos, o Douto Acórdão consigna que a quantia recebida pelo assistente (90 mil contos titulados pelos 10 cheques) ficou aquém do valor dispendido pelo arguido com o custo e encargos da aquisição dos passes dos jogadores.

  9. Ou seja, de forma simples e clara, ficou provado que o aqui assistente recebeu menos do que lhe era devido, concluindo-se por isso nesta parte «Não tendo o Arguido recebido mais do que lhe era devido, o pedido, nesta parte, terá naturalmente de ser julgado improcedente».

  10. O Acórdão do STJ, condenou o assistente numa obrigação de indemnização ao V... por um dano que foi entendido como causalmente resultante do crime de falsificação e não qualquer “recebimento ilegítimo” (como se diz na decisão recorrida) ou “apropriação indevida.” (como escrevem os arguidos).

  11. A expressão «apropriar-se» no dicionário de português significa «tornar seu uma coisa alheia.» 12ª A testemunha José C..., inquirida em sede de instrução afirmou entender e ser entendida pela generalidade das pessoas, que apropriar-se seria correspondente a «roubar» ou «pôr ao bolso», entendimento que resulta igualmente da prova testemunhal produzida em sede de inquérito.

  12. Como foi considerado indiciariamente provado na decisão recorrida, os leitores da notícia objecto dos presentes autos «retiveram que de acordo com o jornal, o ora assistente se havia apropriado indevidamente de verbas do clube e que o Tribunal o tinha condenado a ressarcir o clube do valor da apropriação.» 14ª Acresce ainda, a decisão recorrida enferma de um duplo erro quando afirma que da notícia junta aos autos a fls.8 resulta, por nela constar a informação da absolvição do aqui assistente pelos crimes de peculato que a notícia objecto dos presentes autos tem por referência o crime de falsificação.

  13. Em primeiro lugar, porque se afigura que uma verdade anterior não impossibilita a falta de verdade posterior.

  14. Em segundo lugar porque é demonstrativa do conhecimento que os arguidos tinham dos factos, e que aliás não negaram e foi dado como indiciariamente provado pela decisão recorrida.

  15. Ora, conforme se exarou no Ac. da R.C. de 18/2/2009 proferido no proc. nº 617/06.0TAPBL.C «o direito ao bom nome e reputação consignado no art. 26º da C.R.P., reconhecido a todos os cidadãos, consiste essencialmente no direito a não ser ofendido ou lesado na sua honra e consideração social mediante imputação feita por outrem.

  16. Tal direito, constitui um limite para outros direitos, entre os quais figura o direito de informação.

  17. É a própria C.R.P. que invoca o direito penal para tomar a responsabilidade no frequente conflito entre o direito à honra, de uma parte e o direito à informação, de outra parte[2], estabelecendo no art. 37º nº 1 que “ Todos têm o direito de (…) informar, (…) e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações “e no nº 3 do citado preceito que “As infracções cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal (…)”.

  18. E que, como tal, comete o crime de difamação “Quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração...” – cfr. art. 180º nº 1 do C.P.

  19. Bastando, ao nível do elemento subjectivo o dolo genérico, desde que se integre em qualquer das modalidades definidas no art. 14º do C.P., sendo suficiente para o preenchimento do crime, que o agente, ao realizar voluntariamente a acção, tenha consciência da capacidade ofensiva das palavras utilizadas.

  20. A notícia em questão ultrapassa notoriamente o direito de informar constitucionalmente consagrado. Entra no que é legalmente censurado, ou seja, na afirmação da prática de factos desvalorosos.

  21. O que sucede, em período pré-eleitoral, em momento após ter sido tornado público que o ora queixoso ponderava a hipótese de candidatura nas eleições a realizar em 31.03 para a nova direcção do V....

  22. E após o Assistente ter sido absolvido de crimes de apropriação indevida que durante vários anos foram objecto de julgamento, e de julgamento na praça pública, tendo o assistente o direito de ver assegurado a paz.

  23. A boa-fé, como se afirma no Acórdão publicado in www.dgsi.pt do Tribunal da Relação de Guimarães no processo 152/08.1TABCL.G1 «tem uma vertente subjectiva e objectiva. A justificação da conduta não se basta com a mera convicção subjectiva por parte do jornalista na veracidade dos factos, está sobretudo dependente do respeito das regras de cuidado inerentes à actividade de imprensa e que impõe ao profissional o cuidadoso cumprimento de um dever de informação antes da publicação da notícia e de rigor nas notícias que escreve.» 26ª. Neste sentido aliás, o depoimento da testemunha Marlene A..., jornalista de profissão, e colega de trabalho dos arguidos, cujo depoimento em sede de instrução nada mais acrescentou na medida em que a testemunha afirmou o seu...

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