Acórdão nº 1551/12.0TBBRG-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelESTELITA DE MENDON
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrente: D… A… Recorrida: F…, S.A.

* Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães:*Por apenso ao processo de insolvência dos autos principais os autores D…e A… intentaram acção para verificação ulterior de créditos, pretendendo que seja reconhecido o crédito sobre a devedora F…, SA.

no valor de € 245.273,70 (duzentos e quarenta e cinco mil duzentos e setenta e três e setenta cêntimos).

Foram citados a massa insolvente, o devedor e os credores nos termos do art. 146º nº1 do Cód. da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

A massa insolvente deduziu oposição.

Seguidamente foi proferido despacho saneador-sentença que decidiu julgar a acção improcedente e, em consequência, absolveu a massa insolvente do pedido contra si formulado.

Desta decisão foi interposto recurso pelos AA, que terminaram formulando as seguintes conclusões: 1.

O que está em causa, nos presentes autos, é saber, se o direito dos Autores de intentar a acção para verificação ulterior do seu crédito por apenso ao processo de insolvência padece de caducidade ou, se ao invés, a referida acção poderia ser interposta ao abrigo do artigo 146.º n.º 2 alínea b) do CIRE.

  1. Deveria o tribunal “ a quo” ter concluído pela inconstitucionalidade da primeira parte da norma da alínea b) do nº 2 do art. 146º do CIRE, na medida em que restringe ao prazo de um ano subsequente ao trânsito em julgado da sentença de declaração da insolvência o tempo de que o credor dispõe para reclamar ulteriormente o seu crédito e viola o princípio da certeza e segurança jurídicas.

  2. Salvo melhor opinião, o prazo indicado e previsto no art. 146º n.º 2 al.

    1. do CIRE é inconstitucional, no sentido de não permitir aos recorrentes instaurar a competente acção a partir do momento em que tem conhecimento da insolvência, até à efectiva e integral liquidação do património.

  3. A legislação permite aos credores recorrerem à acção para verificação ulterior de créditos, para que todos sejam tratados com igualdade e não serem excluídos da insolvência por desconhecimento, ou ignorância da mesma, obtendo o reconhecimento dos seus créditos perante o título universal que é a declaração de insolvência.

  4. A acção ulterior de verificação de créditos está sujeita a um prazo de um ano para que os credores possam exercer o seu direito de reclamação de créditos.

  5. A limitação temporal desta faculdade legal concedida aos credores poderá acarretar prejuízos e prejudicar os direitos dos credores que não tiveram conhecimento da declaração de sentença de insolvência e não a exerceram no prazo estabelecido na lei, o que sucede no caso dos recorrentes.

  6. De facto, os aqui recorrentes só tiveram conhecimento do processo de insolvência com o contacto efectuado do administrador de insolvência para a venda do património da insolvente, que correspondeu a um período de tempo posterior ao prazo concedido por lei, que expirou em Dezembro de 2012.

  7. A exclusão dos aqui recorrentes perante o título universal que é a sentença de declaração de insolvência, prejudica-os perante os seus iguais credores perante o mesmo título executivo universal que é a declaração de insolvência.

  8. Além de que, no nosso ordenamento jurídico, são por demais evidentes as situações em que a lei estabelece sempre um limite temporal para os cidadãos exercerem os seus direitos desde uma determinada data ou facto.

  9. A lei permite que os cidadãos possam também exercer os seus direitos a partir do conhecimento da ofensa aos seus direitos, como acontece relativamente aos embargos de terceiro, previstos e estipulados nos arts. 351º e ss. do C.P.C.

  10. No entanto, a lei ao não prever esta situação, a do conhecimento efectivo e concreto da ofensa do direito de garantia patrimonial dos recorrentes, pelo menos até à venda ou liquidação do património, pratica uma grave e injusta ofensa aos seus direitos, uma vez que, o prazo de seis meses para reconhecimento ulterior de créditos pode fazer precludir direitos essenciais dos cidadãos, se estes nunca tiveram conhecimento da sentença de declaração de insolvência dentro desse período de tempo estipulado.

  11. Por outro lado, deveria o tribunal “ a quo” ter observado o que prescreve o artigo 12.º do Código civil, o qual prescreve que” a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”, o que significa que, em regra, a lei nova não valora actos ou factos passados, conferindo-lhes efeitos que eles não tinham no momento em que ocorreram.

  12. Refere ainda o artigo 12.º n.º 2.º do código Civil que “quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa aos factos novos; mas quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam á data da sua entrada em vigor”.

  13. Deste modo, e da análise do artigo supra referido, tem que se distinguir conforme a lei nova tenha em vista o meio de chegar a determinada situação, ou ao contrário, o conteúdo e os efeitos da mesma.

  14. Entendem os Recorrentes - salvo melhor entendimento - que a norma contida no artigo 146.º do CIRE na redacção que lhe foi dada pela Lei 16/12 de 20 de Abril, não é uma lei retroactiva, pois a mesma não se refere expressamente ao conteúdo das relações jurídicas, mas apenas e tão só, a questões de validade formal e substancial de determinados factos. Assim, como se observou “ quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos… entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos”.

  15. Mesmo que se considerasse que a norma contida no artigo 146.º CIRE era uma excepção á regra contida no artigo 12.º do Código Civil, ou seja, que a mesma configura uma excepção ao principio da não retroactividade, presume-se, que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular, tal como impõe o artigo 12.º n.º 1, 2.º parte do código civil. Na verdade, não seria justo, tendo em conta a unidade do ordenamento jurídico, bem como, a segurança do comércio jurídico - os quais seriam necessariamente colocados em causa, tendo em conta a subsistência de um grande número de situações jurídicas duradouras regidas por uma lei já existente e na qual os cidadãos comuns confiaram, face ao reduzido número ou nulo valor da expectativa dos indivíduos que confiaram na continuidade do regime estabelecido pela lei antiga, uma vez que, se tratava de um regime puramente legal e não de um regime posto na dependência dos indivíduos, que se entendesse ser de aplicação imediata a norma...

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