Acórdão nº 3190/11.3TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Fevereiro de 2014
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 27 de Fevereiro de 2014 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I Ma… instaurou, na comarca de Viana do Castelo, processo de divórcio contra M…, no qual deduziu o incidente de atribuição provisória da casa de morada de família, pedindo que esta lhe seja atribuída.O réu opôs-se a essa pretensão alegando, em síntese, que o imóvel é composto por dois andares autónomos, pelo que as partes podem nele viver de forma autónoma, permitindo a separação física do prédio que ali vivam em separado ambos os membros do casal.
Entretanto, na conferência a que se refere o artigo 1420.º do anterior Código de Processo Civil, foi obtido acordo dos cônjuges para que o divórcio sem consentimento fosse convertido em divórcio por mútuo consentimento e fosse, desde logo decretado, tendo ambos acordado em que, não existem menores, prescindem reciprocamente de alimentos e que é bem comum a casa de morada de família, sita em Rua dos Eidos, n.º 8, Areosa – Viana do Castelo. "No mais, por ambas as partes foi dito que não chegam a acordo sobre a atribuição da casa de morada de família." A Meritíssima Juiz homologou o acordo e decretou o divórcio do casal e, face à ausência de acordo em relação à casa de morada de família, proferiu despacho em que decidiu que "quanto à atribuição da casa de morada de família, os autos prosseguem".
Procedeu-se à produção da prova.
Após a Meritíssima Juiz proferiu despacho onde decidiu que: "Em face do exposto, julga-se improcedente o pedido formulado pela Autora de atribuição provisória da casa de morada de família, ficando esta atribuída provisoriamente até à partilha dos bens comuns, a ambos os cônjuges em conformidade com a divisão física já existente, ficando o rés-do-chão atribuído ao Réu e o primeiro andar atribuído à Autora." Inconformado com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: 1. A Recorrente não concorda com a douta sentença que decidiu atribuir a morada de família a ambos os cônjuges, nos termos em que atribuiu a morada de família à A. no primeiro andar e o rés-do-chão ao Réu, apenas por entender que a casa de morada de família estava "fisicamente dividida em duas habitações, cada um delas ocupada por cada um dos cônjuges", não estavam reunidos os pressupostos legais da sua atribuição a apenas um dos cônjuges, não relevando, para este efeito a violência doméstica.
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Na verdade, entende a Recorrente que estão reunidos todos os pressupostos para que a casa de morada de família lhe seja atribuída, nomeadamente o da necessidade e do interesse dos filhos, que não são postos sequer em causa pela douta sentença recorrida.
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Para delimitação das circunstâncias que o Tribunal deve ter em consideração para a atribuição da morada de família a um dos cônjuges, há que ter em consideração o previsto no art.º 1793.º do CC.
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Segundo Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, a circunstância de o citado art.º 1793.º ter especificado as "necessidades dos cônjuges" e o "interesse dos filhos do casal" só se justifica por esses factores serem os mais relevantes, não porque se tenha querido afastar a consideração dos demais factores a que se refere o art.º 84.º, n.º 2, do RAU (hoje 1105.º, n.º 2 do CC), pelo que devem ser também levados em conta nesta situação.
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Destes critérios destacam-se "a situação patrimonial dos cônjuges" e "as circunstâncias de facto relativas à ocupação da casa", não sendo hoje de aplicar o critério da "culpa imputada ao arrendatário na separação ou divórcio" pelo facto de o regime do divórcio introduzido pela Lei 61/08, de 31.10, ter eliminado o conceito de "culpa" no divórcio.
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No entanto, por expressa designação do legislador no n.º 1 do citado art.º 1793.º, os factores primordiais a atender são as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos.
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Nos autos resultou provado que os filhos do extinto casal são maiores, sendo que o mais novo sofre de carcinoma maligno e a mulher e filho menor daquele, regressaram a casa dos pais, em virtude da doença de que padece, passando a residir com a mãe no primeiro andar da casa de morada de família, e resultou ainda provado, entre outros factos, que o casamento entre o casal foi pautado por conflitos frequentes e por situações de violência doméstica, que persistiram após a separação do casal e do divórcio.
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Ainda com relevância, resultou provado que o rendimento do Recorrido é muito superior do da Recorrente, que apenas aufere um salário de € 287,00 mensais e que esta ainda cuida do filho mais novo, que padece de carcinoma maligno.
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E resultou sobretudo provado que o Recorrido nem sequer reside no rés-do-chão da casa de morada de família, mas com a companheira, num outro local, sendo intenção de ambos assim continuar, conforme resulta da douta sentença recorrida.
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Pelo que entende a Recorrente estarem preenchidos os pressupostos para que lhe seja atribuída a morada de família.
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Na verdade, o legislador, ao conferir a protecção especial da casa de morada de família, quis acautelar o interesse do cônjuge menos favorecido, entendendo que a separação dos cônjuges provoca e potencia um mal-estar entre ambos os cônjuges, bem como potencia situações de conflito.
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Foram...
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