Acórdão nº 447/08.4TBAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO A… e mulher R…, instauraram a presente acção declarativa, com processo ordinário[1], contra M… e marido J…, pedindo a condenação dos réus: a) a reconhecerem os autores como donos e legítimos possuidores do prédio urbano sito no lugar de Carreiras, freguesia de Soajo, Arcos de Valdevez, composto por uma casa de rés-do-chão e 1.º andar, para habitação, com a superfície coberta de 95 m2 e com 125 m2 de rossios, a confrontar do norte, nascente e poente com caminho e do sul com J…, inscrito na matriz predial urbana sob o art. 9.º e descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 3197/20080416; b) a fazerem entrega aos autores deste prédio, livre e desocupado; c) a procederem à demolição da parte do seu prédio implantada nos rossios do prédio dos autores, bem como à entrega a estes dessa parte dos rossios livre e desocupada; ou d) caso optem pela manutenção do seu prédio nos rossios do dos autores, devem ser condenados a pagar-lhes o valor actualizado desses rossios, não inferior a € 150,00/m2, acrescido da desvalorização de 40% do valor do prédio dos Réus e de mais 20% do mesmo valor.

Como fundamento, alegaram, por um lado, a aquisição derivada e a aquisição originária do dito prédio, e, por outro lado, a violação do seu direito de propriedade pelos réus, que construíram uma casa de morada com ocupação total dos rossios do prédio dos autores, o que lhe acarreta uma desvalorização não inferior a 40%.

Mais alegaram que a referida construção foi implantada no local da servidão da casa dos autores, pelo que o acesso de e para o rés-do-chão da mesma se passou a fazer através da garagem da casa dos réus, havendo por isso necessidade de proceder à abertura de entradas próprias para esse fim, o que se traduz num aumento de desvalorização do prédio dos autores de, pelo menos, mais 20% do seu valor.

Os réus contestaram, invocando a ilegitimidade do réu marido e negaram que os autores tenham alguma vez sido donos e possuidores do prédio que identificam, por tal prédio jamais ter existido, negando também que alguma vez os autores tenham tido qualquer servidão para acesso ao rés-do-chão da sua casa.

Pedem, por isso, que a acção seja julgada improcedente, com a sua absolvição dos pedidos formulados pelos autores, e estes condenados como litigantes de má fé em multa e indemnização que não deverá ser inferior a € 3.000,00.

Em reconvenção, pedem os réus: a) que se declare que a ré é dona e legítima possuidora, por o ter adquirido por usucapião e por título translativo de propriedade, do prédio urbano sito no lugar de Carreiras, Soajo, Arcos de Valdevez, composto de casa de rés-do-chão e primeiro andar, para habitação, a confrontar do norte e nascente com caminho público e do sul e poente com R…, inscrito na matriz sob o art. 1883.º e descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 2406/19991124; b) que se condene os autores a reconhecer a propriedade desse prédio, constituído por rés-do-chão com duas divisões, sendo uma destinada a garagem, e por 1.º andar com uma casa de banho e mais 6 divisões, com a antiga cozinha incluída.

Dispensada a realização da audiência preliminar foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção da ilegitimidade do réu, tendo-se procedido à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória, sem reclamação.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento e, a final, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julga-se a presente acção improcedente por não provada e, em consequência, absolvem-se os Réus M… e marido J… dos pedidos contra eles formulados pelos Autores A… e mulher R… .

Julga-se a reconvenção procedente por provada e, em consequência: - declara-se que a Ré M… é proprietária, por o ter adquirido por usucapião, do prédio urbano sito no lugar de Carreiras, freguesia de Soajo, Arcos de Valdevez, composto de casa de habitação de rés-do-chão (com duas divisões, sendo uma destinada a garagem) e primeiro andar (nele incluído uma antiga cozinha), inscrito na matriz predial urbana sob o art. 1883.º e descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 2406/19991124; - condenam-se os Autores a reconhecer tal direito de propriedade.

Absolvem-se os Autores do pedido de condenação, em multa e em indemnização a favor da Ré, por litigância de má fé.

» Inconformados com o assim decidido, interpuseram os autores o presente recurso de apelação cuja motivação culminaram com conclusões que, em grande parte, constituem mera remissão para o que escreveram de fls. 7 a 36 do respectivo corpo alegatório, ou seja, 29 páginas (???), que por isso não serão aqui transcritas, e das quais resulta que as questões essenciais colocadas à apreciação deste Tribunal da Relação, são as de saber se deve ser alterada a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo, se é nula a sentença e se a actuação da ré configura abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.

A ré contra-alegou, batendo-se pela confirmação do julgado.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões essenciais decidendas, como se deixou já antever, consubstanciam-se em saber: - se é nula a sentença; - se deve ser alterada a matéria de facto; - se a acutação da ré configura um abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium.

III – FUNDAMENTAÇÃO

  1. OS FACTOS Na sentença foram dados como provados os seguintes factos[2]: 1) Encontra-se inscrito no art. 9.º da matriz predial respectiva o seguinte prédio: prédio urbano sito no lugar de Carreiras, em Soajo, Arcos de Valdevez, composto por uma casa de rés-do-chão e primeiro andar, para habitação, com a superfície coberta de 95 m2 e com 125 m2 de rossios, a confrontar do norte, nascente e poente com caminho e do sul com J… [alínea A) dos factos assentes].

    2) Este prédio está descrito na Conservatória de Registo...

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