Acórdão nº 917/10.4TBGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelMOIS
Data da Resolução25 de Setembro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO Apelante: M… (executado/opoente).

Apelado: Banco…, SA (exequente).

Tribunal Judicial de Guimarães – Juízos de Execução 1. Em 13 de janeiro de 2014 foi proferido despacho que julgou improcedente a oposição à execução intentada pelo aqui apelante.

  1. Inconformado, veio o executado/opoente interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem: 1.ª - O recorrido deu à execução uma letra de câmbio prescrita, alegando que a mesma constitui documento de reconhecimento de dívida.

    1. - Em sede de oposição à execução, o ora recorrente alegou que, contra si, inexiste título executivo.

    2. - O recorrente alegou ainda que o regime previsto nos art.ºs 46.º n.º 1 al. c) do C. P. C. e 458.º n.º 1 do C. Civil só é válido no âmbito das relações estabelecidas entre credor e devedor originários.

    3. - E alegou que o recorrido adquiriu o título por via de endosso da credora originária “C…, Ld.ª”, pelo que se encontra fora da relação original.

    4. - Na sua contestação, o ora recorrido pugnou pela existência de título executivo, enquanto documento particular.

    5. - Alegou ainda que a prescrição foi interrompida por reconhecimento do direito por parte do recorrente, uma vez que ambos (recorrente e recorrido) outorgaram um acordo de pagamento de dívida em prestações nos termos do então art.º 882.º do C. P. C.

    6. - Mediante estas duas posições, o tribunal recorrido entendeu pôr termo ao processo em saneador/sentença.

    7. - Fundamentou a decisão de improcedência da posição à execução por entender que, havendo a celebração de acordo de pagamento de dívida em prestações, a apresentação de oposição à execução constitui abuso de direito por parte do recorrente, na modalidade venire contra factum proprium.

    8. - Existe abuso de direito quando um direito legítimo é exercido de modo a constituir clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante.

    9. - A modalidade de abuso de direito em causa tem que se traduzir num comportamento relevante, inequívoco, gerador de confiança no outro, de molde a que este acredite que não terá um comportamento contrário.

    10. - Entendeu, pois, o tribunal, que o simples facto de ter sido subscrito um acordo de dívida em prestações e por ter sido cumprida uma parte do mesmo, que esse facto é gerador na contraparte da confiança que tal acordo nunca seria posto em causa.

    11. - A sentença refere que o acordo subscrito foi um acordo extrajudicial, quando não foi. A simples leitura do mesmo faz-nos perceber que se trata dum acordo judicial, exarado nos termos do art.º 882.º do C. P. Civil.

    12. - A douta sentença refere que houve cumprimento de parte do acordo.

    13. - Ora, na douta contestação, o recorrido não alegou em parte alguma que tivesse sido cumprido parte do acordo. Apenas alegou ter sido subscrito o acordo.

    14. – O tribunal não pode proferir uma decisão baseada em factos que não foram alegados ou carreados aos autos pelas partes.

    15. – Em face do título apresentado e do seu valor, não houve lugar a citação prévia nos presentes autos.

    16. - O requerimento executivo foi distribuído em março de 2010 e em dezembro do mesmo ano o processo foi suspenso em face do já referido acordo de pagamento.

    17. - Não tendo havido cumprimento do acordo, o exequente requereu o prosseguimento dos autos, em novembro de 2011, o que veio a suceder.

    18. - Apenas em fevereiro de 2013, o recorrente foi citado, obtendo a informação de que se podia opor à execução.

    19. - No requerimento de novembro de 2011, o exequente informou que o recorrido pagou apenas € 201, ou seja, uma das 31 prestações acordadas.

    20. - O abuso do direito ocorre quando um determinado direito – em si mesmo válido – é exercido de modo que ofenda o sentimento de justiça dominante na comunidade social.

    21. - O doloso provoca, na outra parte, a impressão de que o negócio é eficaz e assume, assim, a confiança desta: deve responder, pois, pela situação de confiança obtida.

    22. - O quantum relevante de credibilidade para integrar uma previsão de confiança, por parte do factum proprium, é, assim, função do necessário para convencer uma pessoa normal, colocada na posição do confiante e razoável, tendo em conta o esforço realizado pelo mesmo confiante na obtenção do fator que se entrega.

    23. - Requer-se, porém ainda um elemento subjetivo: o de que o confiante adira realmente ao facto gerador de confiança.

    24. - O exequente não é uma entidade impreparada e sem experiência e, sobretudo, sem conhecimento do funcionamento do processo executivo, intentado, como é público e notório, milhares de execuções por ano e celebrando outros tantos acordos.

    25. - Por outro lado, o executado é uma pessoa singular e que no momento de celebração do acordo estava desacompanhado de advogado.

    26. - O executado, durante anos, não cumpriu o acordo, pelo que o seu comportamento é insuscetível de convencer o exequente de que nunca contestaria a dívida.

    27. – Pelo que a simples celebração dum acordo de pagamento em prestações, que nunca foi cumprido durante anos, no âmbito dum processo executivo, no qual o executado ainda nem sequer foi citado, desconhecendo assim a possibilidade, o prazo e o modo de se opor à execução, não configura nenhuma violação do princípio da boa fé, pois é insuscetível de convencer o bonus paterfamilias, o homem médio, de que nunca iria opor-se à execução por se conformar com a dívida.

    28. - Face ao facto da contraparte ser um Banco, com vasta experiência de execuções, que sabe melhor do que ninguém o elevado número de acordos incumpridos, nunca se poderia concluir que tivesse investido na confiança de que nunca iria ser discutida a dívida, ainda por cima sabendo-se que a letra estava...

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