Acórdão nº 169/09.9TBVRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelCARVALHO GUERRA
Data da Resolução29 de Novembro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Apelação – N.º R 64/12 Processo n.º 169/09.9TBVRM.G1 – 1ª Secção.

Recorrentes: Creminda e marido Joaquim.

Recorridos: Cely e marido Hildebrando.

* Acordam na 1ª secção civil do Tribunal da Relação de Guimarães: * Cely e marido Hildebrando intentaram a presente acção com processo comum e forma ordinária contra Creminda e marido Joaquim, pedindo se declare a nulidade ou ineficácia da escritura de justificação lavrada de 20 de Outubro de 1987, bem como a doação constante da mesma escritura a favor dos Réus, pois que eles não são donos nem possuidores legítimos dos prédios identificados na petição inicial, inscritos na matriz sob os artigos …, descritos na Conservatória do Registo Predial com os n.ºs 3…, que pertencem à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Amadeu e mulher Maria, pais da Autora; mais pedem o cancelamento das inscrições feitas na conservatória do Registo Predial de Vieira do Minho G1-Ap. 03/11042000, respeitante ao prédio descrito com o n.º …; G1-Ap. 08/18.02.87, respeitante ao prédio descrito com o n.º …180287; G1- Ap.02/080188, respeitante ao prédio descrito com o n.º …/080188; G1- Ap.03/11042000, respeitante ao prédio descrito com o n.º …/11042000, feitas com base na referida escritura de justificação e doação e na escritura de habilitação de herdeiros e de Imposto Sucessório referidos no registo constante de folhas 22 do documento n.º 1 junto com a petição inicial.

Regularmente citados, os Réus contestaram, impugnando a factualidade alegada pelos Autores e deduzindo reconvenção, onde pedem seja declarado serem eles os proprietários dos prédios por os haverem adquirido por doação e testamento e também por usucapião, pois que estão na sua posse há mais de 20 anos.

Replicaram os Autores, pedindo seja julgada improcedente a reconvenção, no mais concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e regularidade da instância, organizando-se de seguida despacho sobre a base instrutória, que não mereceu das partes qualquer reclamação.

Procedeu-se a julgamento com observância de todo o formalismo legal, tendo a matéria controvertida sido respondida por despacho que não mereceu censura.

A final, foi proferida sentença, que julgou a acção totalmente procedente e, consequentemente, declarou: a) a ineficácia da escritura de justificação lavrada em 20 de Outubro de 1987, no Cartório Notarial de Vieira do Minho, bem como a doação constante da mesma escritura a favor dos Réus; b) que os Réus não são donos nem possuidores legítimos dos prédios: Prédio urbano, conhecido por Casa da Cerdeira ou Casa do Rego, composta de 1º e 2º andar, com área de 60 m2 de superfície coberta e 136 m2 de logradouro, Prédio rústico denominado Sorte do Ribeiro do Poço, Prédio rústico, denominado Campo do Soutinho, inscritos na matriz sob os artigos …, descritos na Conservatória do Registo Predial com os n.ºs …; c) tais prédios pertencem à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Amadeu e mulher Maria, pais da Autora; d) e ordenou o cancelamento das inscrições feitas na conservatória do Registo Predial de Vieira do Minho G1-Ap. 03/11042000, respeitante ao prédio descrito com o n.º …; G1-Ap. 08/18.02.87, respeitante ao prédio descrito com o n.º …/180287; G1- Ap.02/080188, respeitante ao prédio descrito com o n.º …/080188; G1- Ap.03/11042000, respeitante ao prédio descrito com o n.º …/11042000, feitas com base na referida escritura de justificação e doação, e na escritura de habilitação de herdeiros e de Imposto Sucessório referidos no registo constante de fls. 22 do doc. 1 junto com a petição inicial.

E julgou a reconvenção improcendente.

Desta senteça apelaram os Réus, que concluem a sua alegação da seguinte forma: - existe uma contradição insanável entre os factos descritos nos nºs 1, 3 e 8 do nº 9 da alínea A) da fundamentação da douta sentença impugnada e nos nºs 7, 8, 10, alíneas a) e b) 11 (terceiro parágrafo) e 23 da mesma alínea A); - tal contradição consiste em se afirmar (facto 9) que os prédios referidos naqueles nºs 1, 3 e 8 faziam parte (também) da herança da avó da Autora, Ludovina de Sousa e, ao mesmo tempo, se afirmar que esses prédios pertenciam à herança do pré-defunto marido desta, Adelino José da Silva, em cuja partilha foram adjudicados aos filhos varões do casal e não à viúva Ludovina.

- deve, por isso e ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 712º do Código de Processo Civil alterar-se, revogando-a, a decisão da matéria de facto na parte em que, no dito facto 9, se menciona o nome da referida Ludovina de Sousa; - como deve, por outro lado e ao abrigo da mesma disposição legal, alterar-se a matéria de facto descrita no n.º 23 da fundamentação, considerando-se não provada; - desde logo porque deu-se aí como assente a partilha de bens pertencentes a pessoas (José e Manuel) sobre cuja morte não foi feita a mínima prova; - prova que, por força do disposto, entre outros, na alínea o) do artigo 1º e no artigo 211º do Código de Registo Civil, só pode fazer-se por documento autêntico; - inexistindo tal documento, ao considerar provada a morte dessas duas pessoas, a douta sentença entrou em rota de colisão com o disposto no artigo 364º, n.º 1 do Código Civil, decidindo contra lei expressa; - acresce que não foi feita qualquer prova sobre a data da morte dos referidos cidadãos (se, porventura, morreram, o que não se concede nem, à míngua de documento autêntico, se pode conceder); - essa data é crucial para efeitos da presente ação e do objeto da suposta partilha amigável reportada no quesito 1º da base instrutória (ver o facto 23) porquanto, para salvar a coerência lógica do facto ali descrito, teria de ser anterior a 1957 (data da suposta partilha amigável) e, sobretudo, anterior a 04.03.1947 (data da morte da Ludovina – facto 7) o que, de todo, se desconhece e nem sequer foi alegado; - acontece mesmo que a testemunha Alzira de Jesus Vieira, única que aflorou este tema e cujo depoimento se transcreveu acima, na parte interessante, deixa em aberto as mais sérias dúvidas sobre se, pelo menos um dos filhos (não se sabe qual) não sobreviveu à mãe Ludovina; - acresce que a fundamentação da sentença, quanto a este ponto da matéria de facto, incorre em flagrante contradição; - por um lado argumenta, com base no depoimento da testemunha Alice … que, na suposta partilha amigável de 1957, os prédios dos autos foram adjudicados a Amadeu; - os prédios, anote-se, na respetiva totalidade, incluindo, portanto, a parte alíquota que neles detinham os irmãos José e Manuel; - por outro lado, no entanto, a mesma sentença reconhece como dignos de credibilidade todos os depoimentos das testemunhas que afirmaram que os mesmos prédios “pertencem aos brasileiros” e que “o povo dizia que aquilo era dos brasileiros” (entendendo-se por tal, os três irmãos varões, emigrantes no Brasil); - existe uma óbvia contradição entre as duas proposições: ou houve partilha amigável da herança da Ludovina e os prédios não podiam ser “dos brasileiros”; ou os prédios eram “dos brasileiros” e, por isso, não podia ter havido qualquer partilha amigável; - deve, portanto, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 712º do Código de Processo Civil e por força do disposto também na o) do artigo 1º, no artigo 211º do Código de Registo Civil e ainda no artigo 364º, n.º 1 do Código Civil, revogar-se a decisão proferida quanto ao facto 23 da fundamentação, considerando-o não provado; - decidiu mal, por outro lado, a douta sentença impugnada ao considerar não provado o facto descrito no quesito 21 da base instrutória (relativo ao animus possidendi dos Réus) contra elementos probatórios que impunham e impõem, sem alternativa, decisão contrária; - com efeito, os factos descritos sob os n.ºs 1, 5, 18, 19, 20, 21, 22 e 36 a 41 da fundamentação consubstanciam, sem possibilidade de qualquer outra interpretação ou alternativa, uma declaração formal de propriedade, o anúncio por parte dos Réus e dos seus antepossuidores de que se consideram e proclamam donos dos prédios e de que, nessa qualidade e com essa unívoca intenção, exerceram os atos materiais de posse aí descritos; - igual conclusão se tem de extrair da circunstância – referenciada na fundamentação da matéria de facto – de o antepossuidor dos Réus, António, ter prometido vender ao Réu marido “a água da nascente da Sorte do Ribeiro do Poço” – hoje designada por “Sorte de Mato do Poço de Cabanas, do Tremedário e do Alto Penedo Corvo”; - tanto mais quanto é certo que tal promessa de compra e venda (que está junta aos autos e foi formalizada por escrito, com reconhecimento notarial das assinaturas) foi outorgada no ano de 1973, mais de 15 anos antes da doação dos prédios aos Réus; - ou seja, mais de quinze anos antes de doar os prédios aos Réus e de outorgar a escritura de justificação referenciada nos autos, o depois, doador António Costa já praticava sobre os prédios actos de inequívoca e solene afirmação de proprietário; - como, de resto, resulta do depoimento incontroverso de várias testemunhas, entre as quais António e Maria Adelaide, cujo depoimento gravado ficou transcrito acima, na parte que interessa; - deve, portanto, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 712º do Código de Processo Civil, alterar-se também nessa parte a decisão da matéria de facto, considerando-se provado o facto descrito no quesito nº 21 da base instrutória; - deve por último e ao abrigo da mesma disposição legal, alterar-se, revogando-a, a decisão proferida sobre os factos descritos nos nºs 30 a 33 da fundamentação, que mais não fosse, porque estão em insuprível contradição com o facto enunciado no nº 1 da mesma peça; - a merecerem acolhimento os reparos que ficaram anotados contra a decisão da matéria de facto, dúvidas não podem subsistir, atento o disposto nos arts 1287º, 1294º ou, no limite, 1296º do Código Civil, que os Réus adquiriram por usucapião os prédios sub judice e são, por isso, proprietários dos imóveis, como deve ser...

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