Acórdão nº 472/11.8TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução11 de Outubro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Apelantes e apelados: Luís … (autor) e Caixa Geral de Aposentações (ré).

  1. Juízo do T.J. de Fafe – acção ordinária.

    ***** Na presente acção ordinária, o autor demandou a ré, pedindo que se declare que o A. é titular das prestações por morte de Deolinda …, com quem viveu maritalmente, desde 1976 até à data do seu óbito (14.04.2009) e que se condene a Ré a pagar ao Autor tais prestações devidas desde a referida data do óbito e sem limite de tempo.

    Para tanto, alega que durante esse período (de 1976 a 2009) viveu com a dita Deolinda como se marido e mulher fossem, em comunhão de mesa, cama e habitação, tendo aquela falecida em 14.04.2009 e sendo então beneficiária da Caixa Geral de Aposentações; o autor não tem outros rendimentos para além da sua reforma de valor inferior a 200€/mês; suporta despesas mensais de cerca de 100€ com água, luz, gás e medicamentos; não tem filhos, nem pais e os seus três irmãos não estão em condições de o ajudar, por serem reformados e os rendimentos percebidos por estes são insuficientes para prover ao seu sustento.

    Contestou a Ré, impugnando a verificação dos requisitos legais para a procedência da acção e defendendo, subsidiariamente, que a serem pagas as prestações peticionadas, apenas são devidas desde o mês seguinte à data do óbito.

    Realizada a audiência de julgamento e fixada a matéria de facto, foi proferida sentença que condenou a Ré Caixa Geral de Aposentações a reconhecer que o autor Luís … é titular das prestações por morte de Deolinda …, com quem viveu em união de facto durante mais de vinte anos e a pagar-lhas desde a entrada em vigor da Lei do Orçamento de Estado de 2011.

    Inconformados, o autor e a ré interpuseram o competente recurso, em cujas alegações apresentam, em súmula, as seguintes conclusões: A – Apelação da Ré: 1.ª A acção que deu origem à presente execução é uma acção de simples apreciação que tem por finalidade reconhecer aos seus autores a qualidade de herdeiro hábil para efeitos de eventual atribuição das prestações por morte das pessoas com as quais viveram em situação de união de facto e não o reconhecimento concreto do direito a essas mesmas prestações (cuja atribuição depende de outros requisitos previstos na lei administrativa).

    1. Sobre esta matéria existe diversa jurisprudência produzida, toda ela afirmando que as decisões judiciais proferidas em acções relativas a alimentos têm por fim obter unicamente a declaração da existência ou inexistência de um direito, não constituindo título executivo.

    2. Uma coisa é saber se a recorrente reunia as condições legais para que lhes seja atribuída a qualidade de companheiro, a fim de, uma vez empossada dessa qualidade, poder apresentar à Instituição de segurança social um pedido de prestações por morte do de cujus, e outra, muito diferente, é a de saber se terá direito a elas, desde quando e com que valor, matéria que competirá à recorrida posteriormente analisar no âmbito do competente processo administrativo.

    3. Consequentemente, deve a sentença recorrida ser revogada por ter incorrido na nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alínea e), do CPC, e na violação do disposto no artigo 2.º, alínea e) da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, das alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 12.º do Regulamento das Custas Processuais.

    B – Apelação do Autor: 1º- Ao contrário do decidido, o apelante logrou demonstrar todos os requisitos da atribuição das prestações sociais por morte de Deolinda ,,,, uma vez que não lhe era exigível que provasse que não podia obter alimentos do ex-cônjuge, dado que, tendo vivido em união de facto com a referida Deolinda durante mais de vinte anos, a respectiva obrigação de alimentos do ex-cônjuge já havia cessado.

  2. - De facto, “o fundamento da cessação reside na perspectiva de que, tendo o credor de alimentos iniciado uma comunhão de vida análoga à comunhão conjugal, perde sentido o apelo à anterior comunhão conjugal para justificar um dever de apoio do ex-cônjuge. Existindo uma nova situação de comunhão de vida, mesmo sem deveres institucionalizados, num juízo ético-jurídico, numa sociedade monogâmica, deixa de ser possível apelar à memória da anterior relação para fazer funcionar um dever de solidariedade. A relevância desse passado, face ao nascimento de uma nova relação de comunhão, desaparece”. Cfr. Cfr. Ac. Rel. Coimbra, de 25/10/2011, publicado em www.dgsi.pt.

  3. - “Daí que, tendo-se iniciado uma relação com um conteúdo material análogo ao da relação conjugal, as razões que levaram o legislador a determinar a cessação dos alimentos a prestar pelo ex-cônjuge quando o credor de alimentos contraia novo matrimónio com terceiro, também impõem que quando inicia uma relação de união de facto esse dever também cesse”.

  4. - “Por este motivo é possível incluir, por integração analógica, a união de facto do alimentado nas causas legais de cessação da obrigação alimentar do ex-cônjuge, pelo que a remissão do art.º 2020º para as pessoas referidas na alínea a) do artigo 2009º, ambos do C. Civil, não inclui o ex-cônjuge, uma vez que invocando o pretendente às prestações sociais por morte precisamente a existência duma relação de união de facto com o beneficiário falecido, nunca poderia obter alimentos do ex-cônjuge”. Cfr. Ac. Rel. Coimbra, de 25/10/2011, publicado em www.dgsi.pt.

  5. - Por isso deve o apelante ser considerado herdeiro hábil, para efeitos de atribuição das prestações da pensão de sobrevivência anteriores a 1 de Janeiro de 2011, conforme peticionado.

  6. - Decidindo de modo diferente, a douta sentença proferida fez errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 2019º e 2020º do Código Civil, violando-os.

    Foram apresentadas contra-alegações pelo apelado/autor.

    II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar; O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 685º-B, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC).

    As questões suscitadas são as seguintes: A – Apelação da Ré: - Nulidade da sentença, porque a presente acção é de simples apreciação e não de condenação no reconhecimento concreto do direito a determinadas prestações por morte? B – Apelação do Autor: - O autor tem direito às prestações por morte (pensão de sobrevivência) anteriores a 01 de Janeiro de 1911, por cessação da obrigação alimentar do seu ex-cônjuge por ter iniciado a união de facto em causa? Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    III – Fundamentos; 1. De facto; A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte: 1. O Autor é filho de João … e de Aurora ,,, (doc. de fls. 54 e 55).

    1. O Autor casou em 25 de Julho de 1972 com Conceição … (doc. de fls. 54 e 55).

    2. O casamento referido em 2) foi dissolvido por sentença de divórcio transitada em julgado em 22 de Julho de 1982 (doc. de fls. 54 e 55).

    3. João … faleceu a 8 de Julho de 1992 e de (doc. de fls. 17 e 18).

    4. Aurora … faleceu a 1 de Fevereiro de 1993...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT