Acórdão nº 1159/08.4TBVCT.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Apelante: “Honda …, SA” (Ré); Apelado: Fernando … (A.); O A. Fernando … demandou “TM …, Lda.” e “Honda ,,,, SA”, pedindo que se declare a anulação da compra e venda do veículo de matrícula ...-BV-... celebrada entre o A. e a Ré “TM …, Lda” e que tais RR. sejam condenadas a restituírem ao A. a quantia de 21.000,00 € que este pagou pelo preço do referido veículo, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até efectivo pagamento, ou, em alternativa, que as RR. sejam condenadas a substituir o veículo por um novo, do mesmo modelo.
Alegou, em síntese, que, em 5 de Julho de 2007 o A. comprou à Ré “TM – …, Lda” o veículo automóvel de marca Honda, mod. Civic, com a matrícula ...-BV-..., no estado de novo, e pelo preço de 21.000,00€ e logo após a aquisição o veículo começou a apresentar deficiências de funcionamento, tais como um consumo excessivo de óleo do motor, deficiências ao nível da direcção, que se desvia para a direita e vibra, problema para o qual não foi obtida qualquer solução pelos técnicos da Honda, apesar da reclamação do autor; tal situação causa-lhe prejuízos vários que enumera.
Contestou a co-ré “Honda …, SA”, invocando a sua ilegitimidade e contrapondo que o consumo de óleo é normal e que a anomalia atinente ao desvio da direcção só lhe foi comunicado quando o veículo tinha 30.000 Kms percorridos e trata-se de queixas que são compatíveis com as que podem suceder quando o veículo passa por buracos de maiores dimensões ou se subir ou descer algum passeio; que já procedeu à reparação de tal deficiência; na hipótese de procedência de algum dos pedidos do A., sempre terá que se ter em conta o valor correspondente à desvalorização do veículo resultante do uso e utilização dado pelo A. que, a 19 de Novembro de 2007, tinha já 35.950 Km, Respondeu o A. pugnando pela legitimidade da Ré contestante.
Realizada a audiência de julgamento e fixada a matéria de facto, foi, então, proferida sentença, na qual se decidiu:
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Julgar improcedente o pedido de anulação do contrato de compra e venda do veículo de matrícula ...-BV-... celebrada entre o A. e a Ré “TM …, Lda”, bem como o pedido de restituição ao A. da quantia de 21.000,00 € que este pagou pelo preço do referido, veículo, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até efectivo pagamento, absolvendo-se, em conformidade, a Ré “TM – …, Lda.” deste pedido.
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Julgar procedente, por provado, o pedido de substituição do veículo, condenando-se, solidariamente, as RR. a substituir o veículo vendido ao A., entregando-lhe um novo, do mesmo modelo.
Inconformada com tal decisão, dela interpôs o presente recurso de apelação a Ré “ Honda … SA“, em cuja alegação formula, em súmula, as seguintes conclusões: 1. Nos termos da garantia prestada, a Ré Honda assume a obrigação de reparar ou substituir gratuitamente, qualquer elemento defeituoso do veículo, encontrando-se a sua responsabilidade limitada ao âmbito da garantia prestada.
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A queixa do A. não se reportava a uma anomalia ou deficiência já existente à data da aquisição do veículo.
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O desvio que um qualquer veículo apresente pode ter origem em situações diversas e distintas, não consubstanciando essas situações um defeito em si mesmo, antes resultando das regras da experiência comum que a utilização normal de um veículo pode, por si só, provocar o desalinhamento de um veículo.
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Os mais de 200.000 quilómetros percorridos com o veículo não são compatíveis com a existência de um “defeito” de fabrico no veículo, sendo que não é igualmente compatível com a sua existência desde o momento de entrada em circulação do produto o facto de apenas aos 23.547 ter sido reportada essa situação.
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A inexistência de um defeito de fabrico foi comprovada por relatório pericial junto aos autos.
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Os desvios que o veículo do apelado foi apresentando consubstanciam situações decorrentes da utilização do veículo e não um defeito, sendo que esse desvio pode ser eliminado.
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Ainda que se presumisse a contemporaneidade do defeito com o momento de colocação do produto em circulação, certo é que essa presunção foi ilidida pelos mais de 200.000 quilómetros percorridos pelo veículo, pelo facto de só a partir dos 23.547 se verificar tal queixa e ainda das conclusões do relatório pericial.
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O recorrido pode exercer os seus direitos contra a recorrente Honda ..., não só pela qualidade de importadora e representante do fabricante em Portugal, como pela garantia de bom funcionamento que presta aos veículos da marca Honda.
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A garantia voluntária de bom funcionamento limita-se à substituição de qualquer elemento defeituoso do veículo, não podendo, por esta via, ser a recorrente condenada para além dos limites da garantia por si prestada.
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Sobeja a sua responsabilidade enquanto representante do produtor, nos termos da qual, é permitido ao consumidor que tenha adquirido coisa defeituosa, optar por exigir do produtor a sua reparação ou substituição, salvo se tal se manifestar impossível e desproporcionado tendo em conta o valor que o bem teria se não existisse a falta de conformidade, a importância desta e a possibilidade de a solução alternativa ser concretizada sem grave inconveniente para o consumidor.
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A noção de defeito no âmbito da compra e venda civil é substancialmente diferente da noção de defeito constante do Decreto-Lei 383/89, sendo que tal distinção é fundamental já que a ora recorrente apenas pode ser responsabilizada em sede de responsabilidade do produtor.
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Enquanto que no Código Civil, o legislador acentuou o carácter funcional do vício privilegiando a aptidão do bem para a função a que se destina, em sede de responsabilidade do produtor a noção de defeito afere-se pela segurança do produto no momento em que o mesmo é colocado em circulação.
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A queixa do apelado não se reportava a uma anomalia ou deficiência existente à data de entrada em circulação do veículo e não oferece qualquer insegurança.
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Inexiste defeito nos termos e para os efeitos de aplicabilidade do regime jurídico de responsabilidade objectiva do produtor.
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Ao condenar-se as RR. na substituição do veículo do A. por um veículo novo está a consagrar-se uma situação de verdadeiro abuso de direito, sendo que o exercício de qualquer dos direitos conferidos ao consumidor tem de ser limitado pelo instituto do abuso de direito.
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O veículo igual ao do recorrido já não se fabrica.
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Em Janeiro de 2012 o veículo do apelado tinha já percorrido 213.876 quilómetros, sendo que essa quilometragem é por si só incompatível com a existência de qualquer defeito essencial no veículo.
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Não está o apelado em posição de restituir o que recebeu o que, nos termos do artigo 432º do Código Civil, aplicável por analogia, inviabiliza as suas pretensões de substituição do veículo.
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O recorrido sabia, e não podia ignorar que, a substituição da viatura que veio pedir a juízo implicava necessariamente a destruição dos seus efeitos retroactivamente, ficando assim sem causa a utilização da viatura que empreendera e que, depois disso, viesse a empreender.
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