Acórdão nº 1521/10.2TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Dezembro de 2012
Magistrado Responsável | FILIPE CARO |
Data da Resolução | 04 de Dezembro de 2012 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.
M.., casada, residente na Rua da.., Viana do Castelo, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra: COMPANHIA DE SEGUROS.., S.A., com sede .., Lisboa; A.. e mulher, M.., residentes, no lugar de.., Viana do Castelo, alegando essencialmente que, no dia 10 de Julho de 2005, ocorreu uma colisão entre o veículo ligeiro conduzido pela 2ª R., propriedade dela e do marido, e seguro na 1ª R., e o velocípede sem motor conduzido pelo filho menor da A., E.., de onde resultou a sua morte, sem que deixasse descendentes, e sendo os seus pais os seus herdeiros universais.
O acidente foi causado com culpa exclusiva da condutora.
A A. reclama, pela perda da vida do E.. a quantia de € 300.000,00, pelo sofrimento da vítima nos momentos que que antecederam a morte a quantia de € 200.000,00, pelas danos patrimoniais da demandante, por direito próprio, a quantia de € 150.000,00 e ainda, pela perda do rendimento com que o falecido contribuía para a A. e família a quantia de € 33.000,00.
Pediu a intervenção principal provocada do pai da vítima, por haver litisconsórcio necessário ativo.
Terminou assim o articulado: “Nestes termos e nos demais, que V.ª Ex.ª doutamente suprirá, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e em consequência:
a) Ser admitida a intervenção de E.., como associado da A., nos termos do disposto nos art.ºs 26º, 28º, 325º a 327º do CPC; b) Serem os R.R. condenados a pagar à A. a quantia de 683.500,00€, acrescida de juros desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.” Citados, os R.R. M.. e marido, A.., deduziram contestação pela qual invocaram: - A prescrição do direito da A. à indemnização; - A ilegitimidade passiva dos R.R. contestantes, por a ação dever ser intentada apenas contra a seguradora; - A ilegitimidade da A. M.., por estar desacompanhada do marido, pai da vítima; - O abuso de direito, pelo desmesurado exagero dos pedidos; - A litigância de má-fé da A., por alterar conscientemente a verdade dos factos.
Por via de impugnação, os 2ºs R.R. não aceitam grande parte dos factos alegados na petição inicial, dando uma outra versão do acidente, no sentido de que a colisão dos veículos se ficou a dever a culpa exclusiva da vítima.
Terminam assim o seu articulado: “Termos em que deve:
a) Ser julgada provada e procedente a excepção dilatória de Ilegitimidade Passiva dos Réus, com a sua consequente absolvição da instância; b) Ser julgada provada e procedente a excepção dilatória de Ilegitimidade Activa da Autora, com a consequente absolvição da instância dos Réus; c) Ser julgada provada e procedente a excepção peremptória do abuso do direito, com as legais consequências; d) Ser julgada provada e procedente a Excepção Peremptória de Prescrição, com a consequente absolvição dos Réus do Pedido contra eles formulado; e) A presente acção ser julgada totalmente não provada e improcedente, com a consequente absolvição dos Réus do pedido contra eles formulado; f) A Autora ser condenada em multa, por litigância de má-fé, e, ainda, em justa indemnização, a reverter a favor dos Réus – que expressamente se requer – e a qual não deve ser fixada em menos de 5.000,00 €, para cada um dos Réus; g) Ser revogado o benefício do apoio judiciário concedido à Autora.” Citada, também a R. seguradora contestou a ação, invocando: - A ilegitimidade passiva dos 2ºs R.R.; - A prescrição do direito da A.
A R. ainda impugnou grande parte dos factos da petição inicial, apresentando uma versão diferente do acidente e concluindo do seguinte modo: “Termos em que:
a) Na procedência da excepção de ilegitimidade passiva dos co-réus M.. e A.., devem os mesmos ser absolvidos da instância; b) Na procedência da excepção de prescrição, deve a ré seguradora ser absolvida do pedido, com todas as consequências legais; caso assim se não entenda, c) Deve a acção ser julgada improcedente, por não provada, e ser a ré seguradora absolvida do pedido, com todas as consequências legais.” Replicando, a A. opôs-se à procedência das exceções e do pedido de condenação como litigante de má-fé.
Admitido a intervir na ação como associado da A., o pai do falecido, E.., foi citado nos termos do art.º 327º do Código de Processo Civil e declarou que faz seus os articulados apresentados pela A.
Os 2ºs R.R. contestaram, reiterando todo o factualismo alegado no seu primeiro articulado de contestação.
Também a 1ª R. contestou a petição inicial do interveniente, remetendo, no essencial, para a sua contestação primitiva.
Foi então proferido despacho saneador, onde: - Se julgou improcedente a exceção da ilegitimidade passiva dos 2ºs R.R.; - Se remeteu para final conhecimento da exceção da prescrição do direito à indemnização.
Foram fixados factos assentes e base instrutória de que reclamou a 1ª R., com deferimento.
Instruída a causa, teve lugar a audiência de discussão e julgamento que culminou com respostas fundamentadas à matéria da base instrutória, de que nenhuma das partes reclamou.
Foi depois proferida sentença, cuja decisão foi posteriormente retificada com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido: Julgar totalmente improcedente, por não provada, a presente acção nº 1521/10.2 TBVCT e o pedido formulado pela autora M.. e pelo interveniente E.. contra os réus “Companhia de Seguros.., S.A.”, A.. e M.. e, consequentemente, absolvo estes réus daquele pedido.
- Custas em dívida na acção a suportar pela autora e interveniente, sem prejuízo do apoio judiciário que tenha sido concedido. art. 446.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C.
A decisão ora proferida é complemento e fica a fazer parte integrante da sentença reformada”.
* Inconformada, recorreu a A. de apelação, recurso que foi admitido e ao qual apenas os 2ºs R.R. responderam, em contra-alegações.
Na apelação, a A. formulou as seguintes CONCLUSÕES: «1º - O presente recurso vem interposto da matéria e facto e de direito.
(..) Pretende, assim, a revogação da sentença, a substituir por outra que condene os R.R. a ressarcir os A.A. ou, caso se considere que ambos os intervenientes no acidente de viação violaram os deveres estradais, se pondere “a gravidade dos deveres violados e a suas consequências, atendendo sempre ao facto de que num acidente de circulação rodoviária em que tenha intervenção um veículo a motor e peões, ciclistas e outros utilizadores não rodoviários das estradas, estes constituem a parte mais vulnerável num acidente com intervenção de um veículo motorizado”.
Apelou também o interveniente principal E.., com as seguintes CONCLUSÕES: (..) Pede a revogação da sentença, a substituir por outra que condene os R.R. a ressarcir os A.A. ou, “caso se considere que ambos os intervenientes no acidente de viação violaram os deveres estradais, ponderar a gravidade dos deveres violados e a suas consequências, atendendo sempre ao facto de que num acidente de circulação rodoviária em que tenha intervenção um veículo a motor e peões, ciclistas e outros utilizadores não rodoviários das estradas, estes constituem a parte mais vulnerável num acidente com intervenção de um veículo motorizado”.
Nas contra-alegações que apresentaram, os 2ºs R.R., formularam as seguintes CONCLUSÕES: (..) Termos em que entendem que deve negar-se provimento aos dois recursos.
* Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
* II.
As questões a decidir --- exceção feita para o que é do conhecimento oficioso --- estão delimitadas pelas conclusões das apelações da A. e do Interveniente Principal [1] (cf. art.ºs 660º, nº 2, 684º e 685º-A, do Código de Processo Civil, na redação que foi introduzida pelo Decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto).
Assim, são-nos trazidas para apreciação e decisão as seguintes questões: 1- Erro de julgamento em matéria de facto; e 2- Se, mesmo sem modificação da matéria de facto, há fundamento legal para indemnizar a A. e o IP.
* III.
Os factos dados como provados na 1ª instância - Constantes da matéria de facto dada como assente:
-
E.., nascido a 28/9/87, era filho da autora e do chamado E.., e faleceu no dia 10/7/2005.
-
Os RR. M.. e A.. eram proprietários do veículo de matrícula ..-EQ no momento em que ocorreu o acidente abaixo descrito.
-
A responsabilidade civil pelos danos causados com o veículo matrícula ..- EQ estava transferida para a ré seguradora através de contrato de seguro, titulado pela apólice nº .., até ao montante de € 600.000,00.
- Constantes das respostas à matéria da base instrutória: 1) E.. faleceu sem ter deixado descendentes. -Quesito 1º 2) No dia 10 de Julho de 2005, pelas 13:15 horas, o menor E.., circulava num velocípede pela Rua da Videira, freguesia de Santa Marta de Portuzelo, desta cidade, no sentido de marcha Rua da Videira/Souto da Silva. -Quesito 2º 3) Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo ligeiro marca Ford, modelo Fiesta, matrícula ..-EQ, era conduzido pela R. M... -Quesito 3º 4) o referido veículo circulava na mesma Rua da Videira, mas em sentido oposto, em direcção à Rua de Santiago, -Quesito 4º 5) A Rua da Videira é uma rua única, com 3,30 metros de largura, que permite trânsito em ambos os sentidos. -Quesito 5º 6) Esta via, atento o sentido de marcha do EQ, apresenta-se num segmento de recta, que vai terminar numa bifurcação. Continua com traçado em curva para o lado direito, onde começa a apresentar alguma inclinação, embora ligeira, na sua fase inicial, seguida de pequeno segmento de recta e contra-curva para a esquerda. -Quesito 6º 7) Precisamente sobre esse traçado curvo entronca, do lado esquerdo atento o sentido do veículo EQ), a Rua de Santiago, para onde se dirigia o referido veículo. -Quesito 7º 8) No ponto onde se deu o sinistro o piso é plano, pavimentado em calçada à portuguesa. -Quesito 8º 9) Deu-se uma colisão entre o velocípede e o veículo EQ, e o ponto deste veículo que colidiu fica situado sobre a frente do lado esquerdo. -Quesito 11º 10) Em consequência dessa colisão, o condutor do velocípede foi projectado sobre o capôt, e de encontro ao...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO