Acórdão nº 4114/15.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução10 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

*I – RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. Caixa (…) C.R.L.

(aqui recorrida), com sede na Praça (…), em Viana do Castelo, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra João …, residente no lugar de …, freguesia de …, em Monção, contra Maria …, residente no …, em …, Viana do Castelo, e contra Maria …, residente na Rua …, em Monção (aqui recorrentes), pedindo que · (a título principal) se declarasse nulo, por simulação, um negócio de doação (que melhor identificou), e se determinasse o cancelamento do registo de aquisição realizado com base nele a favor da 3ª Ré (Maria …); · (a título principal e cumulativo) se declarasse nulo, por simulação, um negócio de partilha (que melhor identificou), e se determinasse o cancelamento do registo de aquisição realizado com base nele a favor da 3ª Ré (Maria …); · (a título subsidiário) se declarasse procedente a impugnação pauliana desse mesmo negócio de partilha, reconhecendo-se o seu direito à restituição dos prédios dele objecto, na medida do seu interesse, podendo executá-los no património da 3ª Ré (Maria …), sua adquirente; · (a título principal e cumulativo) se declarasse nulo, por simulação, um negócio de permuta (que melhor identificou), e se determinasse o cancelamento do registo de aquisição realizado com base nele, a favor da 3ª Ré (Maria …).

Alegou para o efeito, em síntese, que sendo detentora de um crédito global de € 1.112.412,50 sobre os 1º e 2ª Réus (João … e Maria …), o exigiu judicialmente, em quatro acções executivas movidas em 2014 contra os mesmos (respectivamente, para cobrança de € 426.839,00, de € 468.540,54, de € 57.962,53 e de € 159.060,49).

Mais alegou que, exclusivamente por forma a frustrar a garantia patrimonial dos créditos que fossem detidos sobre eles, os 1º e 2ª Réus (João … e Maria…) - inicialmente casados entre si, e desde 19 de … de … divorciados por mútuo consentimento - realizaram com a 3ª Ré (Maria …), sua sobrinha, sucessivos negócios de transferência de bens e direitos próprios, declarando em qualquer deles uma vontade que não possuíam, e sabendo que desse modo a prejudicavam.

Com efeito: em 17 de Março de 2005, os 1º e 2ª Réus (João … e Maria …) declararam doar à 3ª Ré (Maria …), que declarou aceitar, uma terça parte indivisa de seis prédios rústicos, e o quinhão hereditário que pertencia à 2ª Ré, na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de seu pai (José …; em 15 de … de 2015, os Réus (João …, Maria … e Maria …) declararam partilhar as heranças dos pais da 2ª Ré (José … e Rosa…), adjudicando à 3ª Ré (Maria …) a maior parte, e mais valiosa, desse património, e sem que a mesma procedesse ao efectivo pagamento das tornas declaradas como devidas; e também em 15 de … de 2015, as Rés (Maria … e Maria …) declararam permutar entre si a terça parte indivisa de seis prédios rústicos, pertença da 2ª Ré (Maria …), pelo direito ao uso vitalício de um prédio urbano, pertença da 3ª Ré (Maria …), e sem que esta tenha pago àquela a diferença patrimonial declarada como existente entre um património e outro.

Por fim, a Autora (Caixa … C.R.L.) alegou que, mercê de qualquer dos negócios simulados (e, por isso, nulos) em causa, viu frustrada a possibilidade de cobrança dos seus créditos, sendo que relativamente à escritura de partilha se verificaram os requisitos da respectiva impugnação pauliana.

1.1.2.

Regularmente citados, os Réus (João …, Maria …e Maria …) contestaram conjuntamente, pedindo que a acção fosse julgada totalmente improcedente.

Alegaram para o efeito, em síntese, encontrar-se o pagamento dos créditos da Autora (Caixa … C.R.L.) garantido pelo património quer da Sociedade devedora principal, quer dos demais e respectivos avalistas, já penhorado nas execuções que aquela moveu a todos.

Mais alegaram que, tendo a doação impugnada sido celebrada em …, e o primeiro crédito da Autora (Caixa … C.R.L.) sido constituído em 2007, não só esta seria parte ilegítima para impugnar aquele acto, como a petição inicia seria inepta, por falta de idónea causa de pedir.

Por fim, os Réus impugnaram todos os factos relativos à verificação dos requisitos pertinentes à alegada simulação que afectaria todos os negócios por eles celebrados (doação, partilha e permuta), reafirmando terem as suas vontades declaradas correspondido às suas vontades reais, e bem assim ter inexistido qualquer intuído de enganar quem quer que fosse, nomeadamente a Autora (Caixa … C.R.L.); e impugnaram ainda a verificação dos requisitos pertinentes à alegada impugnação pauliana relativa ao negócio de partilha, reafirmando nomeadamente que a Autora manteria depois dele a mesma possibilidade de se fazer pagar pelos seus créditos que já antes possuía.

1.1.3.

Em sede de audiência prévia foi proferido despacho: fixando o valor da acção em € 217.549,98; saneador (certificando a validade e a regularidade da instância, julgando nomeadamente improcedentes quer a excepção de ineptidão da petição inicial, quer de ilegitimidade da Autora); identificando o objecto do litígio e a enunciando os temas da prova; e apreciando os requerimentos probatórios das partes (nomeadamente, deferindo a realização de uma perícia de avaliação aos imóveis objecto dos negócios impugnados nos autos, e bem assim aos bens e direitos já penhorados pela Autora para pagamento dos seus créditos).

1.1.4.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção totalmente procedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) III- Decisão: 1. Pelo exposto, o Tribunal decide julgar procedente a presente acção e, em consequência, decide declarar a nulidade, por simulação: a) do negócio de DOAÇÃO descrito em 1.30. dos factos provados, e, consequentemente, determina-se o cancelamento do seguinte registo de aquisição, a favor da ré Maria …, feito com base nessa escritura: - apresentação n.º ... de …, referente às seguintes descrições, freguesia de …, Viana do Castelo: n.º …, n.º …, n.º … n.º …, n.º … e n.º ….

  1. do negócio de PARTILHA descrito em 1.45. dos factos provados e, consequentemente, determina-se o cancelamento do seguinte registo de aquisição, a favor da ré Maria …, feito com base nessa escritura: - apresentação n.º … de …, referente às seguintes descrições, freguesia de …, Viana do Castelo: n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º … e n.º ….

  2. o negócio de PERMUTA descrito em 1.62. dos factos provados e, consequentemente, determina-se o cancelamento do seguinte registo de aquisição, a favor da ré Maria …, feito com base nessa escritura: - apresentação n.º … de …, referente às seguintes descrições, freguesia de …, Viana do Castelo: n.º …, n.º …, n.º …, n.º …, n.º … e n.º ….

  1. Custas a cargo dos Réus.

  2. Registe e notifique.

(…)»*1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformados com esta decisão, os Réus (João …, Maria … e Maria …) interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo que fosse revogada a sentença recorrida.

Concluíram as suas alegações da seguinte forma (reproduzindo-se ipsis verbis as respectivas conclusões): 1ª - No que concerne à matéria de facto, foram incorrectamente julgados os factos sob os nºs 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 49, 50, 55, 57, 58, 59, 60, 61, 66, 67, 68, 69, 71, 74 e 75, dos factos dados como provados, e 2.4, 2.5, 2.6, 2.7, 2.8, 2.9, 2.10 e 2.13, dos considerados pela decisão recorrida, como não provados, pelo que se deixam expressamente impugnados; 2ª - Relativamente aos factos dados como provados sob os nºs 31 e 32, os autos nada contêm que permita sustentar tal, nem documentalmente nem nos depoimentos gravados, pelo que têm dados como não provados; 3ª - Pelo contrário, em sentido absolutamente oposto é o depoimento de Maria … - 00:00:00 a 01:13:14, em … (14h25m43s a 15h38m57) que referiu não terem, ela e o marido, João …, quaisquer problemas com credores na altura da celebração da doação, em 2005, e com a recorrida os problemas que há é por causa da …; 4ª - E, ainda que o recorrente, João …, possuísse um estabelecimento comercial na vila de …, mesmo quanto a esse, nada existe nos autos sobre negócios ou assunção de riscos por parte dos recorrentes, João … e M. M. …, ou qualquer expansão desse ou qualquer outro negócio.

  1. - Do mesmo modo, nada existe nos autos que permita dar-se como provado o facto sob o nº 33 - riscos de perder o património por causa dos negócios, acrescendo que nada se extrai nesse sentido do depoimento da recorrente, Maria … - 00:00:01 a 00:30:12, em … (14h28m55s a 14h59m06s); 6ª - A qual, de forma categórica, a instância do mandatário da recorrida (00:08:30) referiu que à data da doação de …, os doadores e aqui recorrentes, Maria … e João …, não tinham negócios, dívidas ou credores; 7ª - De igual modo, têm que dar-se como não provados os factos dados como provados de 34 a 36, como resulta do depoimento de Maria … - 00:00:00 a 01:13:14, em … (14h25m43s a 15h38m57), referindo que era casada em comunhão geral de bens com João … , que não tinham herdeiros directos e que a recorrente, Maria … era a sobrinha do coração do casal (00:05:00 a 00:08:0); 8ª - Articulando estes depoimentos com os factos dados como provados de 81 a 84. que não houve filhos do casamento da M. M. … e João …, que nenhum destes tem filhos, que mantêm uma relação muito próxima e familiar com a recorrente, Maria …, que são padrinhos da filha desta, Ana …, e que a recorrente, M. M. não possui quaisquer descendentes ou ascendentes e que à data da doação possuía apenas a sua mãe viva, mas já de avançada idade - octogenária; 9ª - É de mediana clareza que tal doação não foi fictícia, não havia ou se divisavam negócios que pudessem correr mal, nem existiam quaisquer credores que pudessem ser prejudicados; 10ª - Sendo pacífico, por outro lado, que o que constitui a causa de pedir dos presentes autos é o crédito da recorrida, apenas constituído em 2007; 11ª - Relativamente ao...

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