Acórdão nº 30/14.5TBPVL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO J.. e mulher M.. deduziram ação declarativa contra “.. – Companhia de Seguros, SA” pedindo que seja considerada como não escrita a cláusula constante do artigo 3.º, n.º 3 das Condições Gerais e a cláusula do artigo 2.º, n.º 2 da cobertura complementar de Invalidez Total e definitiva, nos termos da alínea a) do artigo 8.º da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais e que a ré seja condenada no pagamento aos autores da quantia liquidada pelos mesmos a título de prestação bancária – capital, juros e prémio de seguro vida – no período compreendido entre 11/02/2011 e 04/09/2012, acrescido de juros legais a contar da interpelação da demandada para pagamento e dos juros vencidos a contar da citação, bem como condenada no pagamento aos autores ou à beneficiária do seguro – C.., CRL -, da quantia de € 83.323,27, acrescida dos juros legais a contar da interpelação da ré para pagamento e dos juros vincendos a contar da citação e, ainda, condenada ao que se vier a apurar em execução de sentença, em conformidade com o alegado nos artigos 65.º a 70.º da petição inicial e até ao limite do capital seguro.
Contestou a ré, por impugnação afirmando ter informado os autores de todas as cláusulas contratuais, designadamente da que impunha uma percentagem mínima de invalidez de 75% para que o seguro fosse acionado.
Teve lugar a audiência prévia com fixação dos temas da prova, seguida de prova pericial.
Após a audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a ré dos pedidos formulados pelos autores.
Discordando da sentença, dela interpuseram recurso os autores, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes Conclusões: 1. Foi dado como assente que como condição necessária à aprovação de mútuo contraído junto de instituição bancária (C..), o demandante e a mulher subscreveram na demandada seguradora (.. – Companhia de Seguros, S.A) um seguro de vida (Ramo – Vida Grupo), com capital seguro no valor de 100,000,00, de modo a garantir, em caso de morte ou invalidez total e definitiva dos mutuários, a liquidação do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos, de acordo com as condições gerais e especiais da apólice, ficando cobertos os seguintes riscos: falecimento da pessoa segura e a invalidez total e definitiva da pessoa segura.
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Nos termos da cláusula 3ª das condições particulares da apólice desse seguro, “a pessoa segura é considerada em estado de invalidez total e definitiva quando se verifiquem em simultâneo as seguintes condições; a. Situação irreversível de invalidez provocado por doença ou acidente; b. Impossibilidade de desenvolver a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos, capacidades ou aptidões; c. Um grau de invalidez de pelo menos 75% determinado com base na Tabela Nacional de Incapacidades e confirmado pelo médico nomeado pelo C...» 3. Nesse contrato de seguro de protecção do crédito à habitação, o banco C.. é a tomadora do seguro e beneficiária do mesmo.
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Ficou igualmente provado que a formalização do contrato foi concretizada, na agência bancária de Ponte, da C.. (tomadora do seguro) onde um funcionário se limitou a obter as assinaturas dos demandantes na Declaração Individual de Adesão do Seguro de Protecção do Crédito Habitação, nos minutos imediatamente anteriores à celebração da escritura, sem que tenha explicado o seu sentido e alcance aos demandantes, nomeadamente, o âmbito da cobertura da cláusula Invalidez Total e Definitiva.
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Ficou provado que a demandada .. – Companhia de Seguros, S.A., limitou-se a remeter aos demandantes o Certificado Individual de Adesão constante de fls. 60, cujo conteúdo se considera aqui por reproduzido e de onde consta, além do mais, como «Coberturas: Morte ou Invalidez total e definitiva» e «Beneficiários: CCAM Guimarães, pelo montante em dívida na data de ocorrência do risco coberto pela apólice, tendo como limite o capital contratado e restantes beneficiários designados para o capital remanescente».
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Ficou provado que no dia 17-02-2011 o Demandante marido (J..) sofreu um acidente que lhe originou várias lesões, tendo ficado com sequelas que o tornam incapaz para o exercício da sua profissão habitual de agricultor e criador de gado.
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Submetido a junta médica de avaliação de incapacidade, na Administração Regional de Saúdo do Norte/Braga, foi-lhe atribuído, em consequência das lesões referidas em 4., uma incapacidade permanente global de 60%, com carácter definitivo.
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No âmbito do processo de acidente de trabalho, com o nº 98/11.1TTBRG-A, do 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Braga, o Autor foi submetido a perícia por junta médica para fixação da incapacidade para o trabalho, em consequência das lesões referidas em 4, tendo-lhe sido atribuída a IPP (incapacidade Permanente Parcial) de 39,61%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH).
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Nos presentes autos foi fixada ao demandante uma incapacidade parcial permanente, pela TNI, de 34 pontos, mas com impossibilidade de exercer a sua profissão.
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Nessa esteira, a Demandada foi interpelada para efectuar o pagamento do capital em dívida e recusou-se a fazê-lo, referindo que não se encontrava verificada a situação de invalidez necessária para ter que pagar o capital seguro.
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O contrato de seguro celebrado entre demandantes e demandada é um contrato de seguro de grupo, contributivo, em que as pessoas seguras que venham a aderir ao seguro serão, como os demandantes, os contraentes de crédito à habitação junto do tomador do seguro, cujo regime jurídico é disciplinado pelos artigos 425° e seguintes do Código Comercial e pelo Decreto-Lei n º 176/95, de 28 de Julho.
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O seguro de grupo é um seguro de adesão, sendo as suas cláusulas, apresentadas por um dos contraentes, insusceptíveis de modificação por parte dos aderentes (segurados), cuja liberdade contratual se limita a aderir ou não aderir (sendo que, na circunstância, a imperiosa necessidade do seguro como condição da obtenção do empréstimo, impeliu/ia os segurados à adesão, donde até essa parcela de liberdade negocial ficou reduzida, senão mesmo suprimida.
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O seguro de grupo é um contrato complexo, em que inicialmente constituído por um plano de seguro, no ramo vida ou outro, contratado entre o tomador de seguro e a seguradora depois converte-se em tantos contratos de seguro quantas forem as adesões, promovidas pelo tomador. Com as adesões, no seguro de grupo estabelece-se uma relação jurídica triangular, em que seguradora, tomador de seguro e aderente tem direitos e obrigações recíprocas.
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É nosso entendimento que se trata também de um contrato de seguro a favor de terceiro, tal como é delineado nos artigos 443º a 451º do Código Civil. Efectivamente, contrato a favor de terceiro é o contrato em que um dos contraentes (promitente) assume perante outro (promissário) a obrigação de efectuar uma prestação a favor de terceiro (beneficiário) estranho à relação contratual.
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No presente caso concreto, temos como promissários, os Demandantes, como promitente a demandada seguradora e como beneficiário o Banco mutuante, independentemente de os promissários virem a ser indirectamente beneficiários do seguro, na medida em que, com a entrega do dinheiro pela seguradora se vêm livres da obrigação de pagamento da dívida ao Banco.
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Como consta do Preâmbulo do DL 72/2008, de 16 de Junho, que estabelece a nova regulamentação do contrato de seguro “nos contratos de seguro de grupo em que os segurados contribuem para o pagamento, total ou parcial, do prémio, a posição do segurado é substancialmente assimilável à de um tomador do seguro individual. Como tal, importa realçar que da nova regulamentação deste tipo de seguro resulta que o facto de o contrato de seguro ser celebrado na modalidade de seguro de grupo não constitui um elemento que determine um diferente nível de protecção dos interesses do segurado e que prejudique a transparência do contrato”.
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Inquestionável é que o contrato de seguro de grupo subscrito pelos Demandantes, ao ter um clausulado elaborado apenas pela Demandada Seguradora, aceite pelo Banco tomador e que o apresenta para a aceitação pelos aderentes ao Seguro de Grupo (Demandantes), e em que os aderentes nada possam opor e/ou modificar nesse clausulado, terá que qualificar-se como um contrato de adesão.
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Revestem, assim, as cláusulas gerais e especiais do contrato celebrado a natureza de cláusulas contratuais gerais, caracterizadas pela pré-formulação, generalidade e imodificabilidade, estando a conferência da sua eficácia e validade sujeita ao regime previsto nas normas do DL 446/85, de 25 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo DL 220/95, de 31 de Agosto, e pelo DL 249/99, de 7 de Julho, aqui aplicável, por ser o que estava em vigor à data da sua contratação.
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Trata-se de cláusulas elaboradas de antemão, que destinatários indeterminados (como sejam os clientes do banco, como os recorrentes que junto daquele contraíram um empréstimo para aquisição de habitação) se limitam a aceitar, sem possibilidade de as modificar (artigo 1º do DL 446/85), para as adaptar às suas conveniências.
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De modo que para vincular o aceitante/aderente das cláusulas gerais, necessário é que este as conheça (antes de se vincular contratualmente, por isso, na fase das negociações), o que implica que lhe sejam comunicadas/entregues e sejam esclarecidas ou explicadas, no que, para compreensão integral do seu conteúdo, exigir esclarecimento.
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Esse dever de comunicação destina-se a possibilitar ao aderente o conhecimento antecipado da existência das cláusulas contratuais gerais que irão integrar o contrato e conhecer o seu conteúdo, antes de se decidir pela Adesão.
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É certo que , o art. 4º do Dec. Lei 176/95 de 26/07 faz impender sobre o Banco, enquanto tomador do seguro, a obrigação geral de comunicação e explicação das cláusulas do contrato, contudo, perfila-se o entendimento que essa...
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