Acórdão nº 1720/13.5TBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO “..– Companhia de Seguros, SA” deduziu ação declarativa contra B.. pedindo que o réu seja condenado a pagar à autora a quantia de € 10.810,07, acrescida dos juros de mora à taxa ou taxas legais supletivas e aplicáveis aos créditos de natureza comercial, sobre a quantia de € 9637,00, até efetivo e integral pagamento, sustentando-se no seu direito de regresso por haver pago indemnização a terceiro em virtude de acidente de viação provocado pelo seu segurado/réu que conduzia com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente permitida.

Contestou o réu, por impugnação, imputando a culpa do acidente à condutora do veículo terceiro.

Após julgamento foi proferida sentença que julgou a ação procedente, condenando o réu no pagamento à autora da quantia de € 9637,00, sobre a qual incidem juros moratórios desde 08.11.2011 até integral pagamento, à taxa legal dos juros civis de 4%, sem prejuízo de posterior alteração legislativa.

Discordando da sentença, dela interpôs recurso o réu, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: 1ª O Tribunal não deveria ter dado como provado os factos constantes das alíneas d., f. e o. da sentença por ausência de prova.

  1. Não deveria ter sido dado como provado que a viatura conduzida pela E.. circulava a velocidade não superior a 40 km/hora.

  2. Não se fez prova de que o Recorrente circulava a velocidade entre 50 km/hora a 60 km/hora e quanto a este facto o depoimento da testemunha E.. é contraditório.

  3. O Tribunal não valorizou o depoimento de Recorrente.

  4. Não deveria ter sido dado como provado que a “taxa de alcoolemia existente no corpo do Réu foi a causa do seu comportamento na condução, que determinou o embate, nomeadamente, a taxa de alcoolemia, acima referida” – de 0,54g/l – “fez com o réu não lograsse manter o veículo por si conduzido dentro da metade da faixa de rodagem destinada à sua circulação, passando assim a invadir a hemifaixa de rodagem contrária.”.

  5. A sentença recorrida desvaloriza o mau estado do piso, quando, quer o Réu, quer as testemunhas ouvidas falam do mau estado em que se encontrava o piso.

  6. A testemunha J.., militar da GNR, referiu no seu depoimento que a causa do acidente poderia ter sido o estado do piso, ao ter feito com que a carrinha conduzida pelo Recorrente lhe fugisse na curva.

  7. Nenhum facto permite afirmar, em concreto, a interferência da alcoolemia no processo causal do sinistro.

  8. Nenhumas das testemunhas ouvidas disseram ao Tribunal que o Réu aparentava estar alcoolizado ou que qualquer comportamento seu estivesse fora dos parâmetros normais.

  9. A TAS do Recorrente era de 0,54g/l, tão próxima do mínimo legal, que é praticamente impossível que tenha tido influência na produção do acidente.

  10. A testemunha J.. (militar da GNR) admite que o acidente se tenha ficado a dever às ”pedrinhas” existentes nas bermas da estrada, ou até a qualquer outra causa. Desvalorizando até o grau de alcoolemia do Recorrente.

  11. Perante a factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, não resulta preenchida a exigência legal da relação de causalidade adequada entre a ingestão de álcool e a produção do acidente.

  12. Resultando das regras da experiência científica e comum que a condução sob uma TAS de 0,54 g/l, o facto de a carrinha ter fugido numa curva, o facto de o piso estar em mau estado, com buracos e pedras nas bermas e não havendo qualquer outro facto relevante, não preenche o conceito de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, não só em concreto, como também em abstracto.

  13. No que se refere ao direito de regresso da seguradora contra o condutor, estabelecia o art.º 19º, al. c) do D.L. n.º 522/85, de 31/12, que “satisfeita a indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso contra o condutor, se … tiver agido sob a influência do álcool …”.

  14. O art.º 27º, n.º1, al. c), do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21/8, que veio revogar aquele D.L., veio dispor que a seguradora tem direito de regresso contra o condutor “quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida”.

  15. Por sua vez, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 81º do Código da Estrada, por referência à proibição do n.º 1 do mesmo normativo, e relativa à condução sob a influência do álcool, “considera-se sob a influência de álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após o exame realizado nos termos previstos no presente código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico”.

  16. Para a efectivação do seu direito de regresso tem de resultar, no entanto, face ao que ora dispõe a al. c) do n.º1 do art.º 27º do D.L. n.º 291/2007, que o acidente em causa tenha ocorrido por responsabilidade do segurado e, no caso, em consequência de o mesmo se encontrar sob o efeito do álcool.

  17. Esta mudança legislativa alterou, em nosso entender – agravando-a -, de forma substancial, o funcionamento do direito de regresso da seguradora.

  18. Anteriormente exigia-se apenas que a alcoolemia fosse causal do acidente; agora, a exigência legal é maior: exige-se a culpa do condutor na ocorrência do acidente, por qualquer violação das regras estradais e, cumulativamente, que conduza com taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida - TAS superior a 0,5g/l.

  19. Sem a exigência do nexo de causalidade entre a taxa de alcoolemia e o acidente, pode cair-se no extremo de um sinistro em que interveio um condutor alcoolizado, mas cujo estado não foi a causa do acidente, que ocorreu meramente por violação de uma qualquer norma estradal, implicar sempre o direito de regresso, com a desvalorização inerente do contrato de seguro.

  20. Por isso consideramos exigível a alegação e prova pela seguradora que exerce o direito de regresso, do nexo de causalidade entre o estado de etilização e o acidente - a que o condutor demandado deu causa, por violação de qualquer regra estradal -, de que resultaram os danos de terceiro indemnizados por ela, isto é, que o álcool foi causa real, efectiva e adequada ao desencadear do acidente.

  21. No fundo, a redacção da al. c) do n.º 1 do art.º 27º do D.L. n.º 291/2007, de 21/08, veio alterar, na tese que defendemos, de modo significativo, a redacção do art.º 19º, al. c) do D.L. n.º 522/85, de 31 de Dezembro, no sentido de exigir à seguradora não só a prova da responsabilização do condutor pelo acidente como ainda do nexo de causalidade entre o acidente e o estado etilizado do mesmo.

  22. Face à interpretação da al. c), do n.º1 do art.º 27º do citado D.L. n.º 291/2007, de 21/08, (à semelhança da interpretação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 6/2002, de 28/05/02) cabe à seguradora demonstrar aquela relação causal; que o acidente foi causado pelo facto de o condutor se encontrar sob o efeito do álcool.

  23. A conduta contravencional do condutor deve ser determinante, em termos de causa adequada, do evento (causa concretamente apurada, não baseada em qualquer presunção) para que se deva considerar estabelecido e provado o nexo causal entre a condução sob a influência do álcool e o acidente de que advieram os danos.

  24. No caso em apreço, o nexo causal exigível na disposição legal citada, entre a condução do Réu sob o...

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