Acórdão nº 622/14.2TBGMR-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CUNHA XAVIER
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO 1. J.. e A.. vieram apresentar-se à insolvência, requerendo, simultaneamente, a exoneração do passivo restante.

Decretadas as respectivas insolvências, por sentença datada de 05.03.2014 (cf. fls. 36 e segs. dos autos principais), já transitada em julgado, elaborado o relatório a que alude o artigo 155º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas e realizada a competente assembleia de credores, pelo Exmo. Sr. Administrador da Insolvência foi manifestada a sua não oposição à requerida exoneração do passivo restante, enquanto que os credores B.. e B.. declararam expressamente opor-se a tal pretensão.

  1. Por despacho de 19/02/2015, certificado nos autos a fls. 22-30, foi decidido indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante apresentado pelos insolventes, ao abrigo do disposto nos artigo 238º, n.º 1, alíneas b), d) e e) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

  2. Inconformado com esta decisão recorreram os insolventes, pedindo a sua revogação e substituição por outra que defira liminarmente o pedido formulado.

    Para tanto, invocam o seguinte [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª O despacho recorrido não se pode manter, pois ao contrário do que resulta de tal despacho, os Recorrentes não eram titulares de empresa na data em que ocorreu a sua situação de insolvência, já que apenas eram sócios de uma sociedade.

    1. Tal facto não pode ser interpretado no sentido de que seriam os Recorrentes titulares de empresa, já que o facto de os Recorrentes serem sócios de uma sociedade comercial, não implica, com todo o respeito que nos mereça opinião diversa da nossa, que os Recorrentes fossem titulares de empresa, na acepção prevista no artigo 18.°, do CIRE.

    2. O sobredito artigo impõe sobre as pessoas singulares titulares de empresa, ou seja, os comerciantes e os empresários em nome individual, a obrigatoriedade de se apresentarem à insolvência, à semelhança do que sucede com uma empresa.

    3. Esclarece o artigo 5.°, do CIRE o que entende por empresa, sendo esta caracterizada por ser uma organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer actividade económica, não abrangendo, obviamente, esta noção os sócios da sociedade.

    4. Neste sentido atente-se a anotação 6., ao artigo 18.°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado, de Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Volume I, página 123, que refere “À vista da formulação final do art. 18.°, ficou excluído o carácter universal do dever de apresentação, o que se projecta em dois planos distintos. Por um lado, como se diz expressamente no n.º 2, ele não é extensivo às pessoas singulares que não sejam titulares de uma empresa - na acepção do art. 5 - na data em que incorram em situação de insolvência.”.

    5. É entendimento dos Recorrentes que na data em que incorreu a sua situação de insolvência não eram titulares de empresa na acepção do disposto no artigo 5.°, do CIRE, uma vez que apenas eram sócios de uma sociedade comercial, pelo que sobre si não impendia obrigação de se apresentarem à insolvência dentro dos 30 dias seguintes à data do conhecimento da situação de insolvência.

    6. Neste mesmo sentido já se pronunciou o Tribunal da Relação do Porto, por Acórdão proferido em 6 de Outubro de 2009, processo n.º 286/09.5TBPRD-C.P1, in www.dgsi.pt, onde determinou que “I - A qualidade de sócio de uma sociedade declarada insolvente não configura a titularidade de empresa a que aludem os n.º 2, e 3, do art.º 18º, do CIRE, para que a pessoa singular tenha o dever de se apresentar à insolvência. II - A não observância do prazo de seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência por pessoa singular não titular de empresa comercial, para fundamentar o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante, tem que resultar clara dos autos e ser cumulativa com a evidência de que o atraso na apresentação prejudicou os interesses dos credores, sabendo o insolvente ou não podendo ignorar, sem culpa grave, que inexistia qualquer perspectiva de melhoria da sua situação económica, e tendo-se apresentado à insolvência enquanto pessoas singulares, não impendendo sobre eles o dever de se apresentarem à insolvência, deve ser deferido o pedido de exoneração do passivo restante.”.

    7. Tendo em conta que não impendia sobre os Recorrentes a obrigatoriedade de apresentação à insolvência, ao contrário do que decorre do despacho de que se recorre, a verdade é que os Recorrentes não se abstiveram de o fazer nos seis meses seguintes à verificação da situação da insolvência, cumprindo, assim, o disposto no artigo 238.°, n.º 1, alínea d), do CIRE.

    8. Os Recorrentes apresentaram-se à insolvência assim que se consciencializaram da sua incapacidade para liquidar a totalidade das obrigações por si assumidas, enquanto avalistas, cumprindo desta forma o prazo legalmente estabelecido.

    9. Com efeito, e decorrendo as dívidas dos Recorrentes de avales por si prestados à sociedade da qual eram sócios, tais compromissos poderiam ser acautelados, em primeira mão, pela sociedade em causa, mediante a liquidação do seu activo em sede de processo de insolvência.

    10. É inequívoco que apenas perante a incapacidade da sociedade comercial em liquidar as suas obrigações é que os Recorrentes se apercebem da sua própria incapacidade de liquidar as obrigações assumidas decorrentes da actividade da sociedade comercial, e não antes.

    11. Posto isto, e mesmo que assim não se entenda ou seja, que os Recorrentes não se apresentaram à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência - o que apenas se concede por mera questão de raciocínio - não constitui motivo justificativo que esse facto, necessariamente, conduza ao indeferimento da concessão da exoneração do passivo restante, nos termos do disposto no artigo 238.°, n.º 1, d).

    12. Atento o preceito fundamentador do indeferimento da exoneração do passivo restante, verifica-se que não basta que o devedor, não estando obrigado a se apresentar à insolvência (como é o caso que se verifica nos presentes autos), não o tenha feito nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, exigindo o artigo, por um lado, que exista prejuízo para os credores; exigindo, ainda por outro lado, que o devedor soubesse, ou não pudesse ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

    13. Nada disto resulta dos autos, nem pode resultar! 15.ª Não resulta nos autos, que os credores tenham sofrido qualquer prejuízo pela não apresentação à insolvência, por parte dos Recorrentes, nos seis meses posteriores à verificação da situação de insolvência.

    14. Não foram trazidos para o processo factos e elementos que levassem o Meritíssimo Juiz “a quo” a concluir de forma inequívoca que se deve aplicar, ao caso em apreço, o disposto no artigo 238.°, n.º 1, d), do CIRE, nem tão-pouco esses elementos constam dos autos.

    15. E nem se diga, como resulta do despacho recorrido, que o pretenso atraso na apresentação à insolvência causou prejuízo aos credores dos Recorrentes, designadamente por se continuarem a vencer dívidas de IVA e IRS.

    16. Por tais dívidas, em primeiro lugar, responde a sociedade comercial e não os recorrentes, pois estes apenas configuram ser responsáveis subsidiários de tais dívidas que podiam ter sido pagas pela sociedade, a devedora originária.

    17. Portanto, e em conclusão, a continuação da existência de dívidas ao Estado não pode ser visto como um prejuízo para os credores dos Recorrentes, uma vez que a responsável primeira por tais dívidas é a sociedade M.., Lda.

    18. Este é o único prejuízo que o Tribunal “a quo” elenca como tendo existido, sendo certo que não nos parece que o mesmo, pelas razões já supra expostas, se enquadre no prejuízo a que alude o artigo 238.°, n.º 1, d) do CIRE.

    19. O que leva a que exista prejuízo para os credores é o agravamento da situação económica da Recorrente, no lapso de tempo decorrido desde a verificação da situação de insolvência até ao momento em que os Recorrentes se apresentam à insolvência, tendo necessariamente de existir um agravamento da situação financeira, o que não se verifica no caso em apreço.

    20. A lei não se basta com o agravar da dívida; a lei exige efectivamente um prejuízo para os credores decorrente do agravamento da sua situação financeira, que no caso sub judice, não se verifica.

    21. Adicionalmente temos que...

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