Acórdão nº 683/10.3GBVLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL CERQUEIRA
Data da Resolução05 de Outubro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Criminal deste Tribunal: Relatório Nos autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que correram termos pela Instância Local de Valença – Secção de Competência Genérica (Unidade 2) da Comarca de Viana do Castelo, foi a arguida Maria J., por decisão de 6/11/2014 (fls. 463 a 473), condenada pela prática, de um crime de furto qualificado p. e p. pelos art.ºs 203º n.º 1 e 204º n.º 1 alínea a), do Código Penal (a partir de agora, apenas designado por CP), na pena de 400 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros, e ainda a pagar à demandante civil Eva M., a quantia que se vier a apurar em execução de sentença, com o limite de 8.325,00 euros, a título de danos patrimoniais, quantia acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação para contestar o pedido civil e até integral pagamento, e ainda a de 500,00, a título de danos não patrimoniais.

Desta decisão interpôs a arguida o presente recurso (fls. 485 a 511), no qual, e nas suas conclusões (pelas quais se afere o âmbito do recurso), alega: Ter sido feita uma errada apreciação da prova, designadamente quanto aos factos 2, 3 e 5 a 7, que deveriam ter sido dados como não provados, perante o depoimento da testemunha Maura P. e a documentos juntos aos autos; ser a decisão recorrida nula por falta de fundamentação (designadamente quanto à pena aplicada) e de exame crítico da prova e estar ferida de todos os vícios previstos no n.º 2 do Art.º 410º do Código de Processo Penal (a partir de agora apenas designado por CPP), nomeadamente quanto ao montante de indemnização civil, face ao depoimento da assistente; violação dos princípios da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo; inconstitucionalidade por força do art.º 32º da CRP, do artigo 358º do diploma legal supra citado. Como questão prévia do seu recurso, alega as nulidades decorrentes de, na data do julgamento, a arguida ainda estar em prazo para declarar se autorizava a realização da audiência na sua ausência, indeferimento de todas as diligências de prova por si requeridas, em audiência, e de a sentença não ter sido lida publicamente, ao arrepio do disposto no n.º 3 do art.º 372º do CPP.

A Magistrada do M.P. junto do tribunal recorrido respondeu ao recurso interposto, a fls. 527 a 539, pugnando pela sua total improcedência.

A Ex.mª Senhora Procuradora-Geral Adjunta junto deste tribunal não emitiu parecer, por ter sido requerida a audiência.

Foram colhidos os vistos legais, e procedeu-se à audiência, que decorreu pela forma constante da acta, cumprindo decidir.

*****Na decisão recorrida, foram as seguintes a fundamentação de facto e a motivação desta (que se transcrevem integralmente): II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

  1. Factos provados.

  1. A arguida Maria J. e a ofendida Eva M. eram amigas e tinham os filhos a estudar no mesmo colégio em Espanha, sendo que, nessa qualidade, a primeira frequentava com frequência a casa do noivo da segunda, sita em …, …, Valença.

  2. Em momentos que não foi possível precisar, mas até ao dia 27 de Outubro de 2010 e nas duas semanas que o antecederam, a arguida apoderou-se de diversas peças em ouro de Eva M., que se encontravam acondicionadas em dois joalheiros num quarto sito no piso superior da residência acima mencionada, concretamente: - uma medalha com Santa, - uma medalha com pedra, - uma medalha com anjo, - um berloque mina, - um berloque ½ lua, - um berloque estrela, - um berloque coração maciço, - um berloque pássaro com coração, - um berloque flor, - um berloque pedra lilás, - um berloque ferradura, - um berloque trevo, - um berloque golfinho, - um fio de corda, - uma pulseira três tiras três argolas, - uma pulseira de argolas com seis berloques, - uma pulseira de rolo quatro argolas duplas, - uma pulseira ouro amarelo/ouro branco com nó duplo, - uma pulseira bolas minhotas, - uma pulseira friso, - uma pulseira espinha com seis argolas ovais, - uma pulseira ouro branco e amarelo, - uma pulseira ouro amarelo de anilhas, - uma medalha de ouro amarelo, - um pingente de ouro amarelo, - uma pulseira ouro amarelo malha branco, - um pingente dedal em ouro, - um pingente sino em ouro, - dois brincos de ouro, tudo em valor que não foi possível concretizar mas superior a 50 (cinquenta) unidades de conta.

  3. A arguida, ao apoderar-se de tais objectos em ouro e fazendo-os coisa sua, actuou livre, consciente e deliberadamente, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que agia contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.

  4. A arguida sabia igualmente que tal conduta não lhe era permitida por lei.

  5. Na posse de tais objectos em ouro, a arguida Maria J., no dia 22 de Outubro de 2010, vendeu os seguintes: - uma pulseira ouro branco e amarelo, - uma pulseira ouro amarelo de anilhas, - uma medalha de ouro amarelo, - um pingente de ouro amarelo, - uma pulseira ouro amarelo malha branco, - um pingente dedal em ouro, - um pingente sino em ouro, numa ourivesaria em Espanha, denominada …, SL, sita na Rua C…, n.º 13, Galerias …, …, Espanha, pelo valor de € 300,00 (trezentos euros).

  6. De forma a reaver tais objectos, que identificou como sendo seus, a ofendida Eva M., no dia 15 de Novembro de 2011, em hora que não foi possível apurar, descolou-se à referida ourivesaria em …, Espanha e pagou pelas ditas peças em ouro € 150,00, ficando a firma … com o prejuízo do restante valor das peças.

  7. As peças de ouro subtraídas tinham um valor sentimental inestimável para a ofendida porquanto tinham sido oferecidas por familiares seus, pelo que o seu desaparecimento causou-lhe desgosto e angústia, o que sucedeu também pelo facto se ter sentido traído, uma vez que acolheu em sua casa a arguida e nela depositou toda a sua confiança.

  8. A arguida é primária.

  9. Não trabalha.

*b) Factos não provados.

Com relevância para a boa decisão da causa não se provou que: - os objectos referidos no ponto 3 dos factos provados tinham o valor global de € 8.668,70 (oito mil seiscentos e sessenta e oito euros e setenta cêntimos); - a ofendida não se sentiu bem a andar na rua, nomeadamente quando se deslocava a …, onde diariamente levava o seu filho menor ao colégio frequentado pela filha da arguida.

*c) Motivação.

Na formação da sua convicção o Tribunal teve em conta o teor do depoimento da testemunha Eva M., ofendida, que explicou que, à data dos factos, mantinha uma relação de confiança com a arguida, já que esta frequentava a sua casa (e do seu namorado, em …, … com alguma assiduidade. Esclareceu que esse relacionamento nasceu do facto de os filhos de ambas frequentarem o mesmo colégio.

Quanto aos factos, referiu que no dia 27 de Outubro de 2010 a arguida se encontrava em sua casa e que, a dado momento, insistiu com a ofendida para ir à casa de banho do andar de cima da habitação com o pretexto de pretender lavar as suas "partes íntimas", ao que aquela acedeu apesar de ter estranhado tal atitude uma vez que existia uma casa de banho no piso térreo da casa. Referiu que a arguida, logo que desceu do primeiro piso, quis de imediato ir-se embora. A ofendida referiu ainda que a arguida já conhecia o local onde aquela tinha guardadas (em dois joalheiros) as suas jóias em ouro, uma vez que já lhas tinha exibido noutra ocasião pois a arguida, a pretexto de pretender observar as diferenças entre o ouro espanhol e o ouro português (é sabido que o ouro português tem um grau de pureza superior ao do ouro espanhol), insistiu várias vezes com a ofendida para que lhe exibisse as suas peças, o que aquela, como vimos, acabou por fazer.

A ofendida referiu ainda que, logo que a arguida manifestou vontade imediata de ir embora de casa daquela, subiu ao primeiro piso e constatou a falta de variadíssimas peças em ouro que tinha acomodadas nos referidos joalheiros. Explicou que na altura não teve o impulso de confrontar de imediato a arguida com o sucedido porque, perante as evidências, não raciocinou de forma escorreita. Parece-nos que tal justificação, podendo afigurar-se numa primeira análise algo estranha, não põe de modo algum em causa a credibilidade do depoimento da ofendida Eva M., pois parece-nos razoável que esta, perante uma tal quebra de confiança, ao que se soma o facto de não ter presenciado directamente a subtracção de que foi alvo, não tenha de imediato confrontado a arguida com o desaparecimento das jóias. Aliás, a conduta prudente da ofendida é coonestada pelas diligências que depois encetou, como explicou, no sentido de averiguar se a arguida havia alienado as peças em ouro em alguma ourivesaria (o que explica também que apenas também tenha apresentado a queixa-crime apenas no dia 17 de Novembro de 2010, o que aliás fez, note-se, apenas dois dias depois de ter confirmado que a arguida, como veremos, vendeu algumas das peças subtraídas num estabelecimento comercial em …. Com efeito, José M., dono de uma joalharia, confirmou no seu depoimento que a ofendida é sua cliente e que há cerca de 3 anos atrás, em Outubro ou Novembro, se recorda que aquela se deslocou ao seu estabelecimento comercial procurando saber se a arguida ali tinha ido para vender peças em ouro. O depoente confirmou que, efectivamente, a arguida ali tinha estado na semana anterior para que o mesmo lhe avaliasse umas peças em ouro que trazia consigo, o que nem chegou a fazer porque o que a arguida pretendia na realidade era vendê-las e a testemunha, segundo afirmou, não compra ouro, tendo-lhe sugerido para o efeito um estabelecimento comercial existente nas Galerias …, em ….

O depoente confirmou ter transmitido tais informações à ofendida quando esta o interpelou nos termos aludidos, pelo que aquela se deslocou às ditas Galerias …, onde veio a recuperar alguns dos objectos subtraídos.

Sobre tal matéria foi fundamental o depoimento da testemunha L. funcionária no dito estabelecimento comercial (que se dedica, segundo informou, à compra e venda de ouro, detida pela firma …, que de forma que se nos afigurou desinteressada e credível referiu que conhece a arguida e que esta é...

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