Acórdão nº 3854/09.1TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelANA CRISTINA DUARTE
Data da Resolução05 de Março de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO P.. deduziu ação declarativa contra J.., A.. e A.. pedindo que se declare nulo o substabelecimento efetuado pelo primeiro réu ao segundo réu, em 27/10/2009, utilizado na escritura de trespasse celebrada na mesma data, declarando-se nulo o identificado contrato de trespasse do estabelecimento comercial de farmácia referido no artigo 1.º da petição, declarando-se que a autora é dona e legítima possuidora do referido estabelecimento comercial de farmácia e condenando-se os réus a reconhecerem esse direito de propriedade, bem como, condenando-se a terceira ré a restituir de imediato o estabelecimento comercial de farmácia à autora, sua legítima proprietária. Pede, ainda, que os réus sejam condenados a pagar à autora uma indemnização no montante de € 40.000,00, pelos danos morais que lhe causaram, bem como, a pagarem à autora, solidariamente, indemnização pelos danos patrimoniais causados, como consequência direta e necessária da atuação supra descrita, a quantificar em execução de sentença, por só cessarem quando cessar a ocupação abusiva do identificado estabelecimento comercial de farmácia.

Contestaram os réus J.. e A.. impugnando os factos alegados e defendendo que, de qualquer forma, a sua pretensão sempre constituiria um abuso de direito. Deduziram reconvenção, pedindo a declaração de que o réu J.. adquiriu a propriedade da farmácia por usucapião e a transmitiu por contrato de trespasse a favor da ré A... Subsidiariamente, pedem a declaração de nulidade por simulação relativa do trespasse pelo qual a autora adquiriu a mesma farmácia e a validade do trespasse a favor da ré A.. Ainda subsidiariamente, pedem a declaração de que são possuidores da farmácia e a condenação da autora a não perturbar essa posse. Em qualquer caso, pedem a condenação da autora no pagamento da quantia de € 40.000,00 a título de danos não patrimoniais. Por fim, pedem a condenação da autora como litigante de má fé. Requereram a intervenção principal de M.., que foi admitida sem qualquer intervenção deste.

A autora replicou, pugnando pela improcedência da reconvenção e mantendo a versão adiantada na petição inicial.

Os réus treplicaram.

A reconvenção foi admitida, foi proferido despacho saneador e definidas a matéria de facto assente e a base instrutória, com reclamação da autora, parcialmente atendida.

Foi ordenada a apensação de ação intentada por A.. contra P.. e A.., em que aquele pede a anulação do contrato de trespasse de um estabelecimento de farmácia, celebrado entre a 1.ª ré e a 2.ª ré, uma vez que, ao contrário do que consta no mesmo, a 1.ª ré não é divorciada mas sim casada consigo, autor, no regime de comunhão de adquiridos.

Contestou a ré A.., impugnando os factos alegados e defendendo que, de qualquer forma, a sua pretensão sempre constituiria um abuso de direito. Deduziu reconvenção, pedindo a declaração de validade do contrato de trespasse da farmácia a seu favor. Subsidiariamente, pede a declaração de que J.. adquiriu a propriedade da farmácia por usucapião e a transmitiu por contrato de trespasse a seu favor. Ainda subsidiariamente, pede a declaração de nulidade por simulação relativa do trespasse pelo qual a ré P.. adquiriu a mesma farmácia e a validade do trespasse a seu favor.

Houve réplica e tréplica.

Foi requerida, e admitida, a intervenção principal de J.. e mulher M...

Foi proferido despacho saneador e definidas a matéria de facto assente e a base instrutória.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, cujo teor decisório é o seguinte: «Pelo exposto, julgo: I. Proc.3854/09.1: 1. a acção parcialmente procedente e, em consequência, declaro que são nulos o substabelecimento indicado no ponto 5 dos Factos e a escritura pública de trespasse indicada no ponto 6 dos Factos.

No mais, julgo a acção improcedente, absolvendo os RR. do restante pedido.

2. a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, declaro que: a) o R. J.. é proprietário, por o ter adquirido por usucapião, do estabelecimento comercial de farmácia denominado “Farmácia ..” identificado no ponto 8 dos Factos; b) é nulo, por simulação relativa, o trespasse pelo qual a A. adquiriu o direito de propriedade desse estabelecimento comercial.

No mais, julgo a reconvenção improcedente, absolvendo a A. do restante pedido.

  1. Proc.3854/09.1-A: 1. a acção procedente e, em consequência, declaro que é nula a escritura pública de trespasse indicada no ponto 1 dos Factos.

    2. a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, declaro que: a) o interveniente J.. é proprietário, por o ter adquirido por usucapião, do estabelecimento comercial de farmácia denominado “Farmácia..” identificado no ponto 1 dos Factos; b) é nulo, por simulação relativa, o trespasse pelo qual a R. P.. adquiriu o direito de propriedade desse estabelecimento comercial.

    No mais, julgo a reconvenção improcedente, absolvendo o A. do restante pedido».

    Discordando da sentença dela interpôs recurso a autora, tendo finalizado a sua alegação com as seguintes Conclusões: 1. Na douta Sentença ora impugnada, o M.mo Juiz do Tribunal “a quo” procedeu, e é com o maior respeito que o afirmamos, a um incorrecto julgamento da matéria de facto dada como provada, 2. pois, e salvo o devido respeito, que é muito, não somente não retirou dos elementos documentais as necessárias ilações, como não validou de forma adequada as declarações prestadas em sede de audiência de julgamento quer pelas testemunhas apresentadas pela Autora, ora Apelante, quer pelas testemunhas indicadas pelos RR., aqui Apelados, 3. sendo que, em função da prova realizada e de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, se impõe a exclusão do elenco dos factos dados como provados da matéria constante dos pontos 11., 19., 20., 21. (segunda parte), 22. e 24. da “Fundamentação de Facto”, 4. devendo, em função da resposta positiva que deveria ser dada aos quesitos 1., 3., 4., 5., 6., 13., 14. e 17. da base instrutória, proceder-se à substituição da actual redacção do ponto 20. desse elenco pela que ora se propõe: “ Entre 20/12/1991 e 28/10/2009, foi a A. P.. quem exerceu a gestão e administração efectivas do estabelecimento, decidindo tudo quanto dizia respeito à respectiva actividade, com ânimo de proprietária e com conhecimento da generalidade das pessoas, dos trabalhadores e dos fornecedores da empresa, decidindo a contratação dos seus trabalhadores, que exerciam funções, todos eles, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, decidindo e pagando as obras de remodelação da farmácia, e decidindo o que comprar e a quem comprar e quando eram efectuados os pagamentos aos fornecedores, finanças, segurança social, etc.”.

    5. Quanto aos pontos a excluir da fundamentação de facto, impõe-se salientar, desde logo, a matéria constante do ponto n.º 11 da “Fundamentação de Facto”, na medida em que o M.mo Juíz do “Tribunal a quo” considerou estar demonstrado que a sociedade “L..,Lda” era «…”controlada” pelo R. J..…», 6. sendo que a expressão utilizada, não constituindo mais que uma mera consideração ou juízo valorativo – o que, nos termos do Código de Processo Civil aplicável à data da instauração da acção, obrigaria a considerar essa resposta como não escrita, 7. não merece acolhimento em qualquer dos depoimentos prestados, nem sequer nos depoimentos de parte que constam do processo e relativamente aos quais o M.mo Juiz da causa considerou inexistirem quaisquer efeitos confessórios.

    8. Ao desconsiderar o depoimento das testemunhas M.. e M.. - na gravação do dia 29 de Abril de 2013, no sistema H@bilus Media Studio, respectivamente, entre as 00:00:01 e as 01:16:02 e as 00:00::01 e as 01:10:50, o que se aplaude dadas as suas evidentes contradições, o que igualmente sucedeu quanto ao artigo 19. do mesmo elenco, quando se declara como provado que quem adquiriu a farmácia a M.. foi o aqui R. J.., “…pessoa que efectivamente pagou o respectivo preço…”, é notório que fica o julgador sem qualquer sustentáculo probatório para dar esses factos como provados.

    9. Deste propositado afastamento, pelo M.mo Juíz da causa, do teor das declarações dos alegados “sócios” do R. J.. quanto à aquisição da farmácia, em 1985, importa tirar outras ilações: se o seu depoimento nada vale, quanto às motivações que terão estado por detrás do negócio de trespasse a M.. e à forma como este se terá concretizado, de forma alguma poderá aproveitar-se para fazer prova de outras circunstâncias, nomeadamente quanto à alegada gestão do estabelecimento, a partir dessa data.

    10. Quanto à matéria plasmada nos pontos 19. e na segunda parte do 21. (a partir de “….razão pela qual…”) da fundamentação de facto, afastado o depoimento dessas testemunhas nada temos nos autos que nos permita a contraprova necessária para afastar o que ressalta de um documento autêntico – veja-se o documento de fls. 109 e ss. dos autos.

    11. Mais importa considerar que, estando em causa, como viria a ser decidido a final, uma simulação relativa subjectiva, ainda que se admitisse que do depoimento de parte poderia resultar alguma prova dos factos contidos nos citados pontos 19. e 21. da fundamentação de facto, o que não se concebe nem concede, certo é que a mesma teria que ser afastada, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 394.º do Código Civil.

    12. Termos em que a única matéria que podemos admitir como por provada, é que, como resulta do ponto 8. dos factos provados, por escritura pública de trespasse, celebrada em 22/10/1985, M.. trespassou a M.. o estabelecimento de farmácia denominado “Farmácia..”, que, em contrapartida, pagou o preço de quatro milhões, setecentos e cinquenta mil escudos.

    13. A douta sentença ora recorrida incorre em claro erro de julgamento ao consagrar, no ponto 20. da fundamentação de facto, que “…a partir do dia 22/10/1985 foi o R. J.. quem exerceu a gestão e administração efectivas do estabelecimento….”.

    14. Essa factualidade colide com a vasta prova documental produzida e com o...

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