Acórdão nº 13036/11.2TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AA….

Recorridos: BB….

Tribunal Judicial de Viana do Castelo – Instância Central – Secção Cível.

AA…, residente na Estrada Nacional n.º …, 1823, Lanheses, Viana do Castelo, veio propor contra BB…, residentes no lugar de …, fracção B, rés-do-chão direito, Arcozelo, Ponte de Lima, a presente acção ordinária n.º 3036/11.2TBVCT, pedindo que: a) se declare que a Autora é dona e legítima proprietária dos prédios rústicos leira de cultivo sita no Lugar de Campelo, freguesia de Lanheses, concelho de Viana do Castelo, com área de 443,00 m2, a confrontar do norte com a linha do Vale do Lima, do sul com Estrada Nacional, do nascente com Manuel Mendes e outros e do poente com José Silva Castro, inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 1192.º e omisso na Conservatória do Registo Predial, e da leira de cultivo, sita no Lugar de Campelo, freguesia de Lanheses, com área de 113,00m2, a confrontar do norte com a linha do Vale do Lima, do sul com Estrada Nacional, do nascente com Manuel Mendes e do poente com José Silva Castro, inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 1195.º e omisso na Conservatória do Registo Predial; b) se condene o Réu a reconhecer o direito de propriedade da Autora sobre os mesmos prédios; c) se declare que Autora e Réu incorporaram nesses prédios obras e edificações, dando origem ao prédio urbano situado em Campelo, com a área coberta de 139,70 m2 e descoberta de 416,30 m2, composto por rés-do-chão, anexo e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo, freguesia de Lanheses, sob o n.º 1422/19980727; d) se condene o Réu a reconhecer que tais obras e edificações foram feitas e pagas pelos Autora e Réu em valor não superior a € 30.000,00, e que tal valor é inferior ao que os referidos prédios rústicos tinham antes dessa incorporação; e) se adjudique à Autora ou se declare que a Autora adquiriu, por acessão e livre de quaisquer ónus ou encargos, o direito de propriedade sobre o prédio identificado em c) e benfeitorias em consequência daquela incorporação.

Para a hipótese dos pedidos formulados em c) a e) improcederem, pede a Autora: g) a condenação do Réu a pagar à Autora o preço correspondente ao valor, que vier a ser apurado, das parcelas de terreno descritas em a) dos pedidos.

Citado que foi de forma válida e regular, o Réu contestou em tempo, defendendo-se por via de excepção, invocou a ineptidão da petição, após o que impugnou os factos alegados pela Autora, tendo ainda deduzido reconvenção, em que peticiona que, em caso de procedência da acção, a Autora seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 85.237,38.

A Autora ofereceu réplica concluindo pela improcedência do pedido reconvencional e pela procedência da acção.

O Ré apresentou tréplica na qual concluiu como na contestação, pedindo a procedência da reconvenção.

Em sede de saneamento dos autos, a instância foi considerada válida e regular, tendo-se procedido à elaboração da Matéria de Facto Assente e da Base Instrutória.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do pertinente formalismo legal.

Realizado o julgamento, foi proferido despacho que respondeu à matéria de facto controvertida, sendo proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção e a reconvenção.

Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a Autora, das quais extraiu as seguintes conclusões: 1. - O tribunal “a quo” deu como provado que “além dos montantes auferidos por Autora e Réu e usados na construção da casa, o Réu aplicou nos acabamentos dessa casa € 10.474,76 que recebeu de tornas da herança da sua mãe”.

  1. O próprio Réu alegou que foi adquirida uma caldeira (art. 57º), um bar (art. 59º), um fogão de sala (art. 60º), nove ventiladores (art. 61º).

  2. Tais bens são bens móveis que podem ser partilhados no inventário para partilha de bens do casal ou levantados pelo Réu e não constitui a realização de quaisquer benfeitorias.

  3. Não foi junto qualquer documento que justifique qualquer aquisição de materiais.

  4. A referida quantia foi depositada numa conta titulada pelo Réu: fls. 83 e 85 mas não foi junto qualquer extracto de conta donde se pudesse aferir a movimentação dessa quantia em proveito do casal, seja na aquisição de bens ou serviços para a realização de benfeitorias seja na aquisição de bens móveis.

  5. Foi ouvida como testemunha Albino, cujo depoimento se encontra gravado no sistema Habilus, das 14h.57.26 às 15h.08.50, apenas sabe que nos finais de 1999 após o falecimento da mãe do Réu adquiriram a caldeira a gasóleo, radiadores, recuperador, e arranjou a casa em baixo.

  6. Diz não saber quanto dinheiro recebeu e mais à frente refere que a A. e o Réu pediram um empréstimo de 2.500 contos para acabar a construção, que era o que lhes fazia falta… 8. Deste depoimento não se pode retirar que toda a quantia de € 10.474,76 que recebeu de tornas da herança da sua mãe” tenha sido despendido em benfeitorias na casa.

  7. Foi ouvida como testemunha Maria, cujo depoimento se encontra gravado no sistema Habilus, das 15h.09.52 às 15h.18.23 e também desse depoimento não se pode retirar que a totalidade da quantia de € 10.474,76 que recebeu de tornas da herança da sua mãe” tenha sido despendido em beifeitorias na casa.

  8. Admite-se que o tribunal “a quo”, face a todos os depoimentos prestados em audiência, desse como provado que foi despendido em obras dinheiro que o Réu recebeu da herança da mãe a título de tornas.

  9. Mas não que tenha sido exactamente a quantia de € 10.474,76.

  10. Entendeu o tribunal a quo afastar a aplicação do instituto da acessão industrial imobiliária, “porque as obras não foram implantadas em terreno alheio”.

  11. Mas tais obras foram implantadas em prédio da Autora pelo património do casal: o património do casal e os bens próprios da Autora são realidades jurídicas distintas.

  12. Como tal, o prédio onde foram implantadas as obras – propriedade da A.- é prédio alheio por referência ao património comum do casal.

  13. Desta forma, andou mal o tribunal “a quo” ao afastar a aplicação do instituto da acessão industrial imobiliária.

  14. A não ser assim, o tribunal “a quo” deveria lançar mão no disposto no art. 1726º do C.C., determinando o prédio urbano descrito na al. F) dos factos assentes pertence ao património do casal – por revestir a natureza da mais valiosa das prestações – sem prejuízo da compensação devida à A. pelo bem próprio nele incorporado.

  15. Com efeito, os prédios descritos nas al. A) e B) deram origem ao referido prédio descritor na Al. F).

  16. Mas, se assim não for entendido, também andou mal o tribunal “a quo” ao decidir o valor relativo a benfeitorias nos termos em que o fez.

  17. Como é sabido, o art. 216º, nº 1 define benfeitorias como sendo todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa e os nºs 2 e 3 do mesmo normativo classificam as benfeitorias como: - necessárias (as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa); - úteis (as que, não sendo indispensáveis para a conservação da coisa, lhe aumentam, todavia, o valor) e - voluptuárias ( as que, não sendo indispensáveis para a conservação da coisa, nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante ).

  18. O art. 1273º, determina que o possuidor de boa ou de má fé tem direito a ser indemnizado das benfeitorias necessárias que haja feito «e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa», desde que o possa fazer sem detrimento dela (nº 1) e o nº 2 do mesmo normativo preceitua que «quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa».

  19. Deste modo, ao pedir indemnização por benfeitorias, o réu tem de alegar factos que possibilitem qualificá-las como necessárias ou úteis e, relativamente às primeiras, é necessário alegar que foram efectuadas com a finalidade de evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa (art. 216º, nº 3) e, quanto às úteis, exige-se que ele concretize o aumento do valor da coisa e alegue se podem ou não ser levantadas sem o detrimento dela e, a dar-se este último caso, qual o seu custo e valor actual.

  20. O que concerne às benfeitorias úteis, portanto, dois caminhos se abrem: se tem a possibilidade de as levantar, desde que tal circunstância não prejudique a coisa, não há lugar a qualquer indemnização por parte do proprietário.

  21. Se houver impossibilidade de levantamento das benfeitorias úteis ou se houver prejuízo para a coisa resultante do levantamento, o proprietário deve entregar o valor delas, aplicando-se, aqui, então, as regras do enriquecimento sem causa.

  22. Na verdade, nas benfeitorias úteis que não possam ser levantadas sem detrimento da coisa, o valor a receber por quem realizou as benfeitorias não coincide com o montante da despesa por ele feita, pois o objecto desta obrigação é medido pelo efectivo locupletamento do titular do direito, enriquecido.

  23. Essa indemnização há-de corresponder ao valor daquilo que o titular tiver obtido à custa do empobrecido mas a medida da restituição continua, pois, a estar sujeita àqueles dois limites: o do custo, que, neste caso, consistirá, em regra, no empobrecimento do possuidor, e o do enriquecimento do titular do direito (valor actual).

  24. Tal valor não está determinado nos autos mas apenas e tão só o dinheiro despendido no ano de 1997 e a matéria de facto é insuficiente para tal.

  25. Entendeu ainda o tribunal “a quo” condenar a Autora, ora Recorrente, a pagar ao Reu a quantia de € 43.237,62, a título de benfeitorias realizadas por este ultimo no prédio urbano em questão. Quantia essa que o tribunal “a quo” actualizou por referência à data da decisão proferida, recorrendo para isso aos índices de preços no consumidor anualmente fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística, obtendo assim o valor de € 62.564,86.

  26. Tal actualização não deveria ter...

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