Acórdão nº 1797/12.0TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL ROCHA
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes que constituem a 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO AA, Unipessoal, Lda, sociedade comercial por quotas com sede na Rua …, Braga, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra Seguros BB, S.A., com sede na Rua …, Porto, pedindo a condenação desta no pagamento à demandante da quantia de € 13 842,75, a que acrescem juros de mora, desde a citação e até efectivo pagamento, bem assim como de uma indemnização pela privação e paralisação do veículo, desde a data do acidente até à data do pagamento à autora do valor do mesmo, no montante diário de € 30,00 ou outro valor reputado mais adequado a liquidar em momento ulterior.

Alega, para o efeito, que o veículo de matrícula …BC… de que é proprietária, embateu no veículo de matrícula …JL… (segurado pela ré), o qual cortou a linha de progressão do veículo da autora ao não respeitar o sinal “STOP” e conceder prioridade à passagem deste veículo. Em resultado do sucedido, o veículo da autora sofreu estragos, cujo preço da reparação era superior ao preço da viatura da demandante, pelo que resultou o prejuízo de € 12,500,00, a que acresce o valor dos materiais então transportados e que foram danificados em resultado do acidente e ainda o valor do prejuízo decorrente da privação do uso.

Contestou a ré, impugnando a forma como a autora diz ter ocorrido o acidente, designadamente sustentando que o acidente ora em apreço não existiu. Impugnou, ainda, os valores dos danos sofridos pelo BC, bem assim como das mercadorias por este transportadas.

Respondeu a autora, sustentando a ocorrência do acidente e concluindo como na petição inicial.

Foi saneado o processo, tendo sido dispensada a selecção da matéria assente e da base instrutória.

Após audiência de julgamento, foi proferida sentença, decidindo-se a final, julgar a acção parcialmente procedente e, consequentemente, condenou-se a Ré a pagar à autora o montante de € 13.750,00, a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos (correspondendo € 8.750,00 aos danos patrimoniais propriamente ditos) e € 5.000,00 aos danos pela privação do uso), em consequência do acidente que se discute nos autos.

Até ao pagamento do valor de € 8.750,00, condena-se a Ré a indemnizar a autora no pagamento da quantia de € 12,00 diários para ressarcimento dos danos advenientes da privação do uso que resultaram do dito não pagamento.

Inconformada, a Ré interpôs recurso de apelação da sentença, apresentando alegações de onde se extraem as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença dos autos em referência e é o mesmo apresentado na firme convicção de que a matéria de facto e de direito sujeita à apreciação do Douto Tribunal impunha decisão diversa.

  1. De acordo com o depoimento das testemunhas Paulo … e José …, em consequência de um acidente ocorrido em 07.03.2011, em que ambos teriam sido intervenientes, o BC teria ficado com danos na frente lateral direita e o JL da porta do condutor para a frente, incluindo a zona da roda.

  2. As fotografias juntas aos autos com a Contestação (fls. 21 v.º), corroboradas pelo depoimento da testemunha Marco …, demonstram que o JL tem danos em toda a largura da sua parte frontal, em todos os componentes da frente, estando a roda esquerda intacta.

  3. A testemunha Marco … esclareceu que o BC ficou com a frente desfeita, com danos consentâneos com um embate frontal.

  4. A dinâmica do acidente apresentada pelas testemunhas Paulo … e José … – um embate do BC no JL que se apresenta à sua direita num entroncamento – impunha a produção de danos na lateral direita (parte da frente) e na frente lateral direita do BC e na frente lateral esquerda do JL, como notou a testemunha Marco …, circunstância que não se verificou.

  5. Conforme alegado (e não impugnado) pela Recorrente, o BC interveio num acidente em 26.01.2010, em resultado do qual ficou numa situação de perda total, tendo sido peritado e reparado na oficina …, Lda.

  6. A testemunha Marco … esclareceu que o JL interveio, também, num acidente ocorrido em 13.10.2010, tendo sido peritado na oficina ….

  7. A testemunha José … afirmou que o JL, em consequência de um sinistro ocorrido em data muito anterior a 07.03.2011, esteve a ser peritado na oficina …, que não foi reparado e que acabou por ser vendido como salvado, já que ficara numa situação de perda total.

  8. Conforme assinalou a testemunha Marco … e resulta do confronto entre as fotografias 5 e 8 (tiradas quando do acidente de 13.10.2010) e 6 e 7 (tiradas após 07.03.2011), juntas a fls. 21 v.º, o JL apresenta, em ambos os casos, os mesmos danos: a frente do veículo, a toda a largura, e em todos os seus componentes, totalmente danificada, incluindo os guarda-lamas direito e esquerdo; o para brisas junto ao lugar do pendura estilhaçado; o reservatório da água danificado e exactamente na mesma posição.

  9. Das conclusões referidas acima resulta que: a dinâmica do sinistro provado pelo Tribunal a quo e apresentada pelas testemunhas José … e Paulo … é incompatível com os danos apresentados pelo BC e pelo JL; os danos existentes no JL após a data de 07.03.2011 são os mesmos que se detectaram à data da peritagem relativa ao sinistro de 13.10.2010, sendo certo que, na sequência deste, o veículo esteve na oficina … mas não foi reparado, tendo sido vendido como salvado.

  10. Combinados os dois pressupostos referidos acima, não resta alternativa que não dar por não provada a ocorrência de um sinistro em 07.03.2011, envolvendo o BC e o JL.

  11. Da certidão do histórico do registo de propriedade do BC (cfr. Requerimento da Recorrida de 14.01.2014) resulta que o veículo apenas pertenceu à Recorrida entre 23.11.2010 e, o mais tardar, 27.07.2011, porquanto, a propriedade do mesmo foi registada favor do Banco …, S.A. a partir de 28.07.2011.

  12. O período durante o qual a Recorrida foi proprietária do BC é relevante para a decisão da causa, designadamente para decidir o pedido de indemnização pela privação do uso.

  13. A douta sentença em crise deve ser reformada, dando-se por não provados os factos constantes dos pontos 1, 5, 6 (o primeiro e o segundo), 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16 e 20 da Alínea A) da Decisão da Matéria de Facto e por provados os seguintes: a) O BC sofreu um acidente de viação em 26.01.2010; b) Em virtude desse sinistro, o veículo foi peritado e reparado na oficina …, Lda.

    c) O JL interveio num acidente de viação em 13.10.2010; d) Na sequência do acidente de viação de 13.10.2010, o JL foi peritado na oficina …Lda. mas não chegou a ser reparado, tendo sido vendido como salvado; e) Por ocasião do acidente ocorrido em 13.10.2010 e após a data de 07.03.2011, o JL apresentava os mesmos danos, designadamente: todos os componentes da frente danificados em toda a largura; os guarda-lamas direito e esquerdo danificados; o pára-brisas estilhaçado junto ao lugar do pendura.

    f) A Recorrida foi proprietária do BC entre o dia 23.11.2010 e, o mais tardar, o dia 27.07.2011; g) Pelo menos desde o dia 28.07.2011 o proprietário do BC é o Banco …, S.A.

    SEM PRESCINDIR, XV. A privação do uso, como tem decidido larga jurisprudência, não constitui um dano indemnizável de per se, só podendo dar lugar ao arbitramento de uma indemnização caso se prove a ocorrência de prejuízos efectivos, tais como danos emergentes causados pelo recurso a meios de transporte alternativos ou lucros cessantes decorrentes da não utilização do veículo imobilizado.

  14. A Recorrida é uma sociedade comercial, pelo que a utilização que faz de uma determinada viatura encontra-se, necessariamente, subordinada à prossecução da actividade comercial a que se dedica.

  15. Não tendo a Recorrida alegado o recurso a quaisquer transportes alternativos e não tendo conseguido fazer prova de que de que a impossibilidade de utilização do BC tenha provocado quaisquer prejuízos (a angariação de menos clientes, a perda de oportunidades de negócio ou o atraso no fornecimento de alguma mercadoria) deverá concluir-se pela efectiva inexistência de qualquer dano em consequência da impossibilidade de gozo do BC.

  16. A douta sentença, ora recorrida, violou o disposto nos artigos 483.º e 562.º a 566.º do Código Civil, devendo ser revogada, na parte em que condena a Recorrente no pagamento de €5.000,00 acrescidos da quantia de €12,00 diários até pagamento de €8.750,00, e substituída por outra que absolva a Recorrente do pedido de indemnização pela privação do uso.

    Sem prescindir, XIX. A existência e ressarcibilidade do dano da...

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