Acórdão nº 3284/12.8TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução21 de Maio de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.

T.., LDA., sociedade comercial por quotas, com sede em .., Arruda dos Vinhos, instaurou acção declarativa de condenação para efectivação da responsabilidade civil emergente de acidente de viação, com processo comum, na forma ordinária, contra I.., S.A., atualmente .. – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.[1], com sede .. Lisboa, alegando que é proprietária do semi-reboque utilizado no veículo trator de mercadorias que contratara à F.., Lda., conduzido por conta e no interesse desta no transporte de mercadoria, nas circunstâncias em que, num entroncamento, o respetivo condutor teve que fazer uma travagem brusca para evitar uma colisão com um veículo automóvel que ocupava a via destinada ao sentido de marcha do trator e se colocou em fuga, sendo, por isso, desconhecido.

Na sequência daquela travagem, o atrelado sofreu vários danos materiais resultantes da deslocação da carga, cujo custo de reparação é da responsabilidade da R. por força do contrato de seguro então em vigor, assim como o prejuízo emergente da paralisação do veículo que utilizava diariamente na prossecução da sua atividade.

Terminou com o seguinte pedido: «Nestes termos e nos mais de direito supridos por V.Ex.a, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, ser a R. condenada no pagamento à A. da indemnização a título de danos patrimoniais no montante de €.:38.248,32, acrescida dos respectivos juros legais, desde a citação até integral pagamento.» (sic) Citada, a R. contestou a ação.

Aceitou a vigência do contrato de seguro relativamente ao semi-reboque, bem como a cobertura dos danos sofridos por tal veículo e resultantes, além do mais, de choque, colisão e capotamento. Invocou os limites da cobertura, designadamente a franquia estabelecida, a exclusão da responsabilidade por mau acondicionamento da carga, a exclusão do dever de reparar os danos em virtude de ter havido perda total do veículo e do dever de indemnizar por privação do uso do veículo.

Impugnou ainda, parcialmente, os factos alegados na petição inicial e concluiu pela sua absolvição do pedido.

A A. replicou quanto às referidas matérias de exceção, terminando pela reafirmação do pedido de condenação da R. nos termos da petição inicial.

Teve lugar a audiência preliminar, onde foi proferido despacho saneador tabelar seguido de factos assentes e de base instrutória, de que não houve reclamações.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença fundamentada em matéria de facto e de Direito, cujo dispositivo tem o seguinte teor, ipsis verbis: «Com fundamento no atrás exposto: a) condeno a ré .. - Companhia de Seguros, S.A. a pagar à autora T.., lda a quantia de € 21.500,00 (já deduzida da franquia de € 500,00), acrescida de juros vencidos e vincendos desde a data da citação até integral e efetivo pagamento.

  1. condeno a ré .. - Companhia de Seguros, S.A. a pagar à autora T.., lda a quantia que se vier a liquidar em posterior incidente de liquidação, referente ao prejuízo resultante para a autora, da privação do uso do veículo acidentado.

    Custas por autor e ré, na proporção de 1/10 e 9/10, respetivamente.» É desta decisão que apela a R., formulando as seguintes CONCLUSÕES: «1. O acionamento do presente contrato funda-se (exclusivamente) na cobertura facultativa de danos no veículo – choque, colisão e capotamento (pág. 14 das cláusulas contratuias juntas aos autos em 23.02.2014).

    1. Da factualidade provada resulta que o acidente dos autos consistiu numa travagem brusca, provocada pelo atravessamento de um veículo, sem que tenha havido qualquer choque ou colisão do veículo seguro contra qualquer outro veículo ou objeto ou corpo fixo ou em movimento, ou capotamento.

    2. Assim, e não sendo o acidente dos autos subsumível ao enquadramento contratual exigível á responsabilização da Ré, impor-se-á a absolvição desta do pedido, sem mais.

    3. Ainda que assim se não entendesse, sempre se dirá, cautelarmente que o valor da condenação referente aos danos sofridos pelo veículo seguro não corresponde ao contratualmente acordado.

    4. Com efeito, e resultando da factualidade provada (resposta ao quesito 15) que o veículo seguro foi considerado uma perda total, o valor a indemnizar corresponde ao valor preceituado na cláusula 14ª – B – 2.2.2 (pág. 6 das cláusulas juntas aos autos), ou seja, previstos na Tabelas anexas de desvalorização – ou seja, € 8.500,00, atendendo a que os salvados ficaram em poder da A.

    5. Será este, assim o valor a considerar para indemnização da perda total, e não o valor de € 22.000,00, correspondente ao custo orçamentado para a reparação, conforme resulta da sentença ora em recurso.

    6. A tal valor haverá ainda que deduzir, nos termos contratualmente acordados, a franquia contratual de 2% sobre tal valor - € 170,00 – pelo que, o valor total a indemnizar a este título corresponderia a € 8.330,00.

    7. Por último, e sempre sem conceder, discorda ainda a Recorrente da interpretação que a Meritíssima Juíz a quo fez da cláusula de exclusão atinente aos danos de privação de uso do veículo.

    8. Com efeito, e desde logo, somos de opinião que, perante a factualidade, a este propósito, dada como provada – e que se restringe à estrita menção da privação do uso do veículo e respetivo período – não poderia, tão-pouco o Tribunal a quo te assumido que daí advieram despesas e, acrescidamente, ter condenado a Ré ao pagamento de tais despesas cuja determinação relegou para ulterior incidente de liquidação.

    9. Na verdade, de tal factualidade não resulta, tão-pouco que dessa privação tenham advindo danos e, muito menos, que esses danos se traduzam em despesas (mormente de índole patrimonial).

    10. E, nessa conformidade, não nos podemos conformar, desde logo, com a condenação no pagamento destas despesas (ainda que a sua determinação tenha sido relegada para momento ulterior) porquanto entendemos que inexiste, no caso, a prova de tais despesas, sendo certo que o incidente de liquidação pressuporia que estivesse já previamente assente a sua existência, restando apenas a definição do seu quantum, ou seja, a sua determinação.

    11. Logo, e sem prejuízo do primeiro argumento acima exposto, sempre se imporia a absolvição da R. deste pedido.

    12. De todo o modo, e ainda que assim se não entendesse, sempre se nos afigura que tais despesas consubstanciariam cumulativamente lucros cessantes, perda de benefícios e resultados que a Autora deixou de auferir por força da dita imobilização.

    13. E, nessa medida, sempre estariam tais danos excluídos contratualmente, face ao teor da cláusula invocada na douta sentença.

    14. Assim, nunca poderia com qualquer dos fundamentos, ser a Ré condenada no pagamento dos danos emergentes da privação do uso do veículo.

    15. Decidindo-se em contrário violou-se, além do mais, o disposto nos arts. 406º do Cód. Civil e 615º nº 1 c) do Código de Processo Civil.» (sic) Termos em que o R. recorrente defendeu a revogação da sentença.

    A A. ofereceu contra-alegações, onde defendeu improcedência da apelação, com as seguintes conclusões: «I – A decisão aqui em discussão é exemplar, quer no que concerne à matéria de facto, quer no que concerne à aplicação do direito; razões pelas quais deverá ser mantida nos seus precisos termos.

    II – A Recorrente propugna a revogação da sentença, com base em três ordens de razões: - Por um lado, refere que o acidente dos autos não é subsumível ao enquadramento contratual exigível para que a Ré seja responsabilizada, impondo-se por essa razão sem mais a absolvição desta do pedido.

    - Por outro lado, defende que o valor da condenação referente aos danos sofridos pelo veículo seguro não corresponde ao contratualmente acordado.

    - Por último, discorda da interpretação que a Meritíssima Juíz a quo fez da cláusula de exclusão atinente aos danos de privação de uso do veículo.

    III- Porém, não lhe acede razão em qualquer uma delas, vejamos: Contrariamente ao alegado, a questão agora levantada pela Recorrente não se enquadra no âmbito de aplicação do artigo 611.º do CPC, isto é, não se trata de factos jurídicos supervenientes.

    IV- Ainda que assim não fosse, o acidente dos autos, sem sombra de dúvida, enquadra-se no contrato de seguro celebrado entre as partes, e os danos que dele advieram, devem ser ressarcidos pela Recorrente; aliás, da própria redacção das cláusulas contratuais é-se obrigado a concluir como concluiu a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo - O que a seguradora garante – “A indemnização dos danos sofridos pelo veículo seguro em consequência de acidente devido a causa súbita, fortuita e violenta, alheia à vontade do Tomador, Segurado ou Condutor, quer o veículo se encontre em circulação, quer imobilizado, quer em curso de transporte.” V- Obviamente, não poderá colher a interpretação, aliás uma novidade das alegações, de que o acidente dos autos não consubstanciou qualquer choque, colisão ou capotamento.

    VI – Por outro lado, e contrariamente ao pretendido pela Recorrente, não merece qualquer reparo a condenação desta no pagamento da quantia de €22.000,00, correspondente ao valor da reparação do veículo; em primeiro lugar, não estamos já em fase de resolução amigável da questão; em segundo lugar, a Recorrente não comunicou à Recorrida que considerava o veículo seguro uma perda total, nem o que quer que fosse relacionado com esta questão; por último, não alegou ou provou o que quer que fosse no que concerne à perda total, nem sequer havia ainda adiantado o valor do veículo, o que apenas veio a fazer agora nas alegações.

    VII – Ora, assim sendo, obviamente andou bem o Tribunal ao decidir como decidiu, isto é, aplicando o regime geral.

    VIII – Por último, também não acede razão à Recorrente no que concerne ao dano pela privação do uso do veículo; tal conclusão impõe-se da simples leitura do ponto 3.3 al i) das condições especiais da apólice – vide pág. 15, a cláusula em questão refere-se unicamente a “lucros cessantes, perda de benefícios ou de resultados.” IX – Por outro lado, a matéria de facto provada no que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT