Acórdão nº 3458/11.9TBBCL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução24 de Setembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AAA.

Recorridos: BBB e CCC.

Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, Instância Central – 2ª Secção de Execução.

BBB e CCC, Executados nos autos apensos, deduziram a presente oposição à execução que corre termos sob o n.º 3458/11.9TBBCL, contra o Exequente AAA, alegando, em síntese, que – e que restringe à parte da execução para pagamento de quantia certa (rendas), considerando que relativamente à entrega do imóvel já foram os executados absolvidos da instância (cfr. fls. 38 dos autos principais) – o valor das rendas acordado não é o indicado pelo exequente, mas apenas € 199,52, sendo ainda que o executado BBB apenas deixou de proceder ao referido pagamento das rendas relativas ao mês de Abril de 2009 e subsequentes.

Refere, finalmente, que o não pagamento das rendas se ficou a dever à circunstância de, desde Agosto de 2008, o locado haver sofrido sucessivas infiltrações de água, as quais provocaram por sua vez inundações que deixaram o locado não utilizável, com a queda de parte do tecto de pladur e risco de provocar curto-circuito.

De tal facto deram conta ao Exequente, que não deu qualquer resposta nem diligenciou pela reparação do espaço, certo sendo que antes o Oponido/Exequente havia acordado verbalmente com o executado BBB que até à situação ficar resolvida não haveria o mesmo de proceder ao pagamento das referidas rendas.

Contestou o Exequente, impugnando a factualidade alegada pelo Opoente e concluindo como no requerimento executivo.

Proferido despacho saneador, foi dispensada a selecção da matéria de facto assente e controvertida, passando-se após à organização da prova.

Realizado o julgamento, foi proferido decisão que julgou totalmente procedente presente oposição à execução, e, em consequência, determinou o arquivamento da execução apensa.

Inconformado com tal decisão, apela o Exequente, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões: “I A douta sentença recorrida padece de erro de julgamento por errada aplicação da lei, ferindo, nomeadamente, o disposto nos artigos, 1074, 1111, alínea b) do 1032, 1421, 1424, 798, 804 nº 1 do artigo 805, e por inidoneidade dos fundamentos que levaram a considerar legítima a actuação do arrendatário/executado em deixar de proceder ao pagamento das rendas, por ter considerado que houve incumprimento do contrato de arrendamento por parte do exequente, assim, julgando totalmente procedente a oposição deste à execução e determinando o arquivamento da execução apensa.

II Concluiu-se nesta sentença "que as obras de reparação da estrutura da cobertura do imóvel constitui obrigação do senhorio/exequente porque integra o cumprimento da obrigação principal, qual seja, a de assegurar o gozo do locado ao locatário. Não tendo efectuado tais obras, apesar de lhe terem sido solicitadas pelo executado BBB tem indiscutível fundamento legal a invocada excepção de não cumprimento, ou seja, o executado não está obrigado a pagar as rendas referentes ao locado enquanto o exequente não fizer as obras capazes de garantir o gozo do imóvel por parte do executado. O incumprimento do locador ora exequente, determina o impedimento total do gozo do imóvel por parte do executado arrendatário, já que a ruína do tecto e o risco do curto-circuito impediu a sua utilização total, demonstrando-se legítima a decisão deste de suspender o pagamento das rendas, com fundamento na excepção de não cumprimento do contrato, atento o disposto nos artigos 428, 762, 1031 aI. a) e b) e 1038 al. a), o que aliás expressamente invocou perante o exequente como fundamento do seu não pagamento. Acresce que, mostrando-se incumprida a obrigação do senhorio de assegurar o gozo do locado para o fim contratualmente previsto, devendo efectuar ou diligenciar pelas reparações ou outras despesas essenciais ou indispensáveis, se o não fizer após aviso do locatário, falta culposa mente ao cumprimento de tal obrigação, sendo responsável pelos prejuízos que causa ao credor, conforme resulta do preceituado nos artigos 562 e seguintes." III Mas, estas conclusões não resultam dos factos dados como provados nos autos e não são conformes à lei.

IV Com efeito, o locado destinava-se ao exercício da actividade comercial.

V E, quanto a obras no arrendado destinado ao comércio o artigo 1111º do Código Civil (Subsecção VIII - Disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais) estatui:" As regras relativas à responsabilidade pela realização das obras de conservação ordinária ou extraordinária, requeridas por lei ou pelo fim do contrato, são livremente estabelecidas pelas partes. Se as partes nada convencionarem, cabe ao senhorio executar as obras de conservação, considerando-se o arrendatário autorizado a realizar as obras exigidas por lei ou requeridas pelo fim do contrato".

VI No contrato de arrendamento dos autos foi estabelecido, entre exequente e executados, que o inquilino estava autorizado a proceder às obras interiores e exteriores que entender convenientes à comodidade, eficiência e funcionamento dos serviços ou actividades desenvolvidas no local arrendado, inclusive o arranjo da fachada do prédio, salvaguardando a linha arquitectónica e segurança das estruturas existentes (Cláusula 4ª do Contrato dada como provada nos autos) e que ficam a cargo do inquilino todas as despesas de conservação, limpeza e reparações interiores do local arrendado (Cláusula 6 do Contrato).

VII As obras de que o locado necessitaria eram obras de conservação, pelo que, em face do contrato de arrendamento, competia ao executado realizá-las e suportar todas as despesas inerentes às mesmas, sem direito a delas vir a ser reembolsado pelo exequente (Cláusula 7º do Contrato).

VIII Assim, tendo a douta sentença recorrida concluído que era ao exequente que competia realizar as obras no arrendado, incorre em erro de julgamento por violação do disposto no contrato de arrendamento, substituindo-se indevidamente à declaração negocial das partes constante do contrato, ferindo o disposto nos artigos 405, nº 1 e 1111, nº 1, Ambos do Código Civil.

IX Mesmo que, apesar daquelas cláusulas contratuais, eventualmente, se entendesse que era ao exequente que competia proceder ou mandar proceder a tais obras, a verdade é que o executado não fixou qualquer prazo ao exequente para a realização das obras nem, tão pouco, as descriminou, nem nos factos dados como provados nem na douta sentença recorrida se faz qualquer referência a qualquer prazo dado pelo executado ao exequente para a realização das obras, nem as mesmas se encontram descriminadas em qualquer lado.

X O dever de indemnizar supõe, a mora do devedor (senhorio), sejam ou não urgentes as reparações a efectuar; e a mora, por seu turno, pressupõe a interpelação (nº 1 do artigo 805 do Código Civil) que, seja judicial ou extrajudicial, terá que ser acompanhada do estabelecimento de um prazo, dada a natureza específica da prestação do senhorio; caso contrário, nunca a omissão que lhe é imputada poderá considerar-se ilícita nem culposa, o que exclui a sua responsabilidade" (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 10/01/2006 no processo 05A3241, acessível em www.dgsi.pt).

XI Embora a sentença recorrida não se refira expressamente que o incumprimento do contrato se deu a mora do exequente, tal conclusão é inevitável, pois não há incumprimento sem mora do devedor, pelo que tendo a douta sentença concluído pelo incumprimento do contrato por mora do exequente, padece de erro de julgamento por violação do disposto nos artigos 798º, 804, nº 2 e 805º nº 1 do Código Civil.

XII Por sua vez, o artigo 1032º do Código Civil determina que só se considera o contrato de arrendamento como não cumprido no caso do defeito da coisa locada surgir posteriormente à entrega do arrendado, se o defeito surgir por culpa do locador. O defeito do arrendado como resulta dos autos surgiu depois da sua entrega ao executado e não se deve a culpa do exequente, por esse defeito ser de uma parte comum (terraço de cobertura) do prédio constituído em propriedade horizontal de que faz parte a fracção arrendada o executado, não podendo, como tal, neste caso, presumir-se a culpa do senhorio/exequente, por não estar obrigado a fazer obras fora da fracção arrendada, e por, legalmente, as não poder fazer - artigo 1424º do Código Civil.

XIII Com efeito, foi alegado pelos executados na sua oposição à execução e dado como provado (9., 12., 13., 14. e 16. da Decisão da Matéria de Facto), que no arrendado, ocorreram precipitações de água da chuva em virtude de má vedação do terraço de cobertura da fracção arrendada.

XIV Os terraços, nos prédios constituídos em propriedade horizontal, são partes comuns do prédio (alínea b) do n2 1 do artigo 14212 do Código Civil) não pertencendo a nenhum dos condóminos.

XV Não pode, também, assim, o exequente/senhorio ser obrigado a fazer obras de conservação em partes comuns do prédio por isso conflituar o que estabelece o artigo 1424º do Código Civil para a propriedade horizontal. Sendo o arrendado fracção autónoma de um prédio em propriedade horizontal o dever do senhorio de fazer obras de conservação apenas lhe cabe se a sua necessidade se situa na própria fracção, porque, se localiza em parte comum, o senhorio não pode ser obrigado a fazer aí as obras, nem as pode fazer (Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 13/01/2004 no processo 03A3958, acessível em www.dgsi.pt e acórdão já citado no n~ 17º deste Recurso).

XVI Sofre a douta sentença de erro de julgamento, por não ter levado em consideração o facto do defeito no arrendado ter surgido após a sua entrega ao executado, por não ter e, também, por não ter considerado que a fracção arrendada fazia parte de um prédio constituído em propriedade horizontal e que o defeito do arrendado se situava numa parte comum do prédio (terraço de cobertura), violando, desse modo o disposto nos artigos 1030º, 1421º...

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