Acórdão nº 17/16.3T8EPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução20 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Comarca de Braga - Instância Local de Esposende - Secção de Competência Genérica (J1) * Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1ª Adjunta - Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente; 2º Adjunto - Heitor Pereira Carvalho Gonçalves.

I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. AA e mulher, BB, residentes em Esposende, (aqui Recorrentes), propuseram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Companhia de Seguros, S.A.

, com sede em Lisboa, (aqui Recorrida), pedindo que a Ré fosse condenada · a pagar a quantia de € 33.977,32 (sendo € 30.993,49 à DD, S.A. - para liquidação de um mútuo contraído por CC, sua filha, entretanto falecida -, € 2.974,80 a eles próprios - para reembolso de prestações do dito mútuo, já pagas por eles -, quantia aquela acrescida ainda das prestações vincendas que venham a suportar, e € 9,03 a título de juros de mora - gerados pelo pagamento das prestações pagas -, quantia aquela também acrescida dos juros vincendos por prestações a pagar), a título de cumprimento de um contrato de seguro do ramo vida, celebrado entre a Ré e CC.

Alegaram para o efeito, em síntese, que tendo esta última adquirido, em 24 de Novembro de 1998, um apartamento, por meio de um financiamento de Esc. 13.000.000$00, contraído junto da DD, S.A., sendo eles próprios respectivos fiadores, viria a celebrar em 08 de Novembro de 2012, com a Ré, um seguro de vida grupo - crédito à habitação, por adesão.

Mais alegaram que, sendo o capital seguro de € 37.834,92, beneficiária do mesmo a DD, S.A., e prevenido o risco de morte de CC, veio a mesma a falecer em 11 de Março de 2015, sendo eles próprios os seus únicos herdeiros legais.

Alegaram ainda os Autores recusar-se agora a Ré a cobrir o risco seguro, alegando injustificadamente omissões ou inexactidões dolosas na declaração inicial prestada sobre a condição de saúde de CC, quando a mesma se limitou a preencher com verdade tudo o que lhe foi apresentado, desconhecendo à data que padecesse de qualquer doença que pudesse influenciar a apreciação do risco feita pela Ré.

Por fim, alegaram que, face à recusa da Ré em pagar o capital seguro, têm sido eles próprios a suportar as prestações mensais do empréstimo contraído pela Filha, no valor de € 297,40, ascendendo o montante já desembolsado (a título de capital) a € 2.974,80.

1.1.2.

Regularmente citada, a Ré (Companhia de Seguros, S.A.) contestou, pedindo que a acção fosse julgada totalmente improcedente, sendo ela própria absolvida do pedido.

Alegou para o efeito, em síntese, que, tendo CC sido submetida, em Agosto de 2012, a uma ecografia mamária, com nódulo suspeito, e tendo em Outubro de 2012, após realização de biópsia, sido-lhe diagnosticada uma neoplasia da mama esquerda, quando - em 8 de Novembro de 2012 - celebrou consigo um seguro do ramo vida não o declarou.

Mais alegou que ela própria não teria celebrado o seguro titulado pela apólice em causa se tivesse conhecido a real situação de saúde de CC, o que esta não ignorava, omitindo conscientemente a referida informação, sabendo que só dessa forma poderia vir a beneficiar do seguro.

Defendeu, assim, a Ré assistir-lhe o direito de anular o contrato de seguro em causa, o que fez e comunicou aos Autores por carta registada com aviso de recepção, de 09 de Julho de 2015.

1.1.3.

Os Autores responderam à excepção deduzida, pedindo que a mesma fosse julgada improcedente; e reiteraram o bem fundado do seu pedido inicial.

Alegaram para o efeito, em síntese, ter CC preenchido com verdade as declarações de saúde solicitadas pela Ré, desconhecendo à data que padecesse de qualquer doença oncológica, o que apenas soube no dia 9 de Novembro de 2012, ao final da tarde.

Mais alegaram que os tratamentos a que CC viria a ser submetida debelaram a neoplasia da mama, não tendo esta qualquer relação com a outra neoplasia que a veio a vitimar.

1.1.4.

Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho: saneador (reconhecendo a validade e a regularidade da instância); fixando o valor da acção em € 33.977,32; definindo o objecto do litígio, e enunciando os temas da prova; apreciando os requerimentos probatórios das partes e designando dia para a realização da audiência de julgamento.

1.1.5.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, na qual se julgou a acção totalmente improcedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) Nestes termos e pelos fundamentos expostos, julgando pela total improcedência da demanda, decido absolver do pedido a ré Companhia de Seguros, S.A. e condenar os autores AA e BB no pagamento das custas do processo.

(…)»*1.2. Recurso (fundamentos) Inconformados com esta decisão, os Autores (AA e mulher, BB) interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo que fosse julgado procedente, e revogada a sentença recorrida, sendo a acção julgada totalmente procedente.

Concluíram as suas alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições do processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais):1ª - Ter o Tribunal a quo feito uma errada interpretação e valoração da prova produzida, já que a mesma não permitia dar como provados os factos enunciados na sentença recorrida sob o número 24 («A Ré não teria aceitado celebrar o contrato de seguro dos autos se tivesse conhecimento que a segurada CC havia sido submetida a uma ecografia mamária, com nódulo suspeito»), sob o número 25 («A Ré nunca celebraria o contrato de seguro titulado pela apólice supra referida se tivesse conhecimento que a Segurada padecia de doenças oncológicas como as referidas em 22 e 23»), sob o número 26 («A segurada CC sabia que a Ré jamais celebraria o contrato de seguro dos autos se tivesse conhecimento da doença de que aquela padecia»), e sob o número 27 («Ao subscrever o boletim de adesão, a segurada CC tinha conhecimento que lhe havia sido detectado um nódulo suspeito na mama, o que omitiu conscientemente porque sabia que só dessa forma poderia beneficiar do seguro referido nos autos»).

2 - O tribunal a quo julgou incorrectamente a matéria de facto ao dar como provado que:

  1. A Ré não teria aceitado celebrar o contrato de seguro dos autos se tivesse conhecimento que a segurada, CC havia sido submetida a uma ecografia mamária, com nódulo suspeito.

  2. A Ré nunca celebraria o contrato de seguro titulado pela apólice supra referida se tivesse conhecimento que a segurada padecia de doenças oncológicas como as referidas nos pontos 22. e 23.

  3. No segmento do ponto 27. da matéria provada: “O que omitiu conscientemente porque sabia que só dessa forma poderia beneficiar do seguro referido nos autos”.

    3 - E, considera-se assim, porque havia nos autos prova bastante quer testemunhal quer documental que sustentava conclusões diversas, como atrás se referiu e descreveu, sendo que, para além disso, o ónus da prova do dolo incumbia à Ré.

    1. - Ter o Tribunal a quo feito uma errada interpretação e aplicação das normas legais consideradas (nomeadamente, por ser aplicável ao contrato em causa o actual regime do contrato de seguro, e não o anterior, sendo por isso irrelevante ao fim de dois anos a inicial omissão meramente negligente de informações de saúde), devendo assim ser alterada a decisão de mérito proferida, julgando-se procedente a acção.

    4 - Para além disso, o tribunal a quo, depois de fixados os factos provados e não provados e exarada a correspondente fundamentação, fez errada aplicação da lei, apreciando e aplicando ao caso sub judice, as disposições legais revogadas em vez da lei vigente à data da celebração do contrato de seguro.

    *1.3. Contra-alegações A Ré (Companhia de Seguros, S.A.) contra-alegou, pedindo que fosse negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

    Alegou para o efeito, em síntese: 1 - Ter a prova produzida sido correctamente avaliada, nomeadamente por a Segurada, à data da contratação do seguro, já ter realizado uma ecografia mamária a nódulo suspeito e, na sequência do seu resultado, uma biópsia, actos médicos exigentes e que causam alarme social, idóneos a influenciarem a apreciação do risco, e cuja declaração foi por ela omitida.

    2 - Dever ser aplicado ao contrato de seguro em causa nos autos o regime legal que se encontrava em vigor à data da sua celebração, ou seja, o Dec-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril, o que o Tribunal a quo fez (pese embora, por lapso, haja referido como aplicável o regime legal anterior, pro aquele outro revogado).

    3 - À face do mesmo regime legal aplicável, mostra-se a sentença correctamente proferida, sendo irrelevante para a improcedência da acção que a omissão das relevantes declarações sobre o estado de saúde da Segurada tivesse sido feita a título doloso, ou a título negligente.

    *II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do C.P.C.).

    *2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, 02 questões foram submetidas à apreciação deste Tribunal: 1ª - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e valoração da prova produzida, já que a mesma . não permitia dar como provados os factos enunciados na sentença recorrida sob o número 24 («A Ré não teria aceitado celebrar o contrato de seguro dos autos se tivesse conhecimento que a segurada CC havia sido submetida a uma ecografia mamária, com nódulo suspeito»), sob o número 25 («A Ré nunca celebraria o contrato de seguro titulado pela apólice supra referida se tivesse conhecimento que a Segurada padecia de doenças oncológicas como as referidas em 22 e 23»), sob o número 26 («A segurada CC sabia que a Ré jamais celebraria o contrato de seguro dos autos se tivesse conhecimento da doença de que aquela padecia»), e sob o número 27 («Ao...

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