Acórdão nº 1292/15.6T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Abril de 2017
Magistrado Responsável | MARIA PURIFICA |
Data da Resolução | 27 de Abril de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães – I.
RELATÓRIO A presente acção declarativa com processo comum, ordinário foi intentada pela C, com sede na Praça Dr. António Feio Ribeiro da Silva, da cidade de Viana do Castelo, contra A e mulher M, residentes no Lugar de Moldes, freguesia de Castelo do Neiva, concelho de Viana do Castelo, e D, residente na Avenida Eng.º Losa Faria, …, 2º esquerdo nascente, freguesia e concelho de Esposende na qual pede que se declare nula e de nenhum efeito a confissão de dívida e hipoteca e, em consequência, se ordene o cancelamento do registo da hipoteca a favor do réu D e, caso assim não se entenda, que se reconheça o direito da autora executar o prédio objecto da hipoteca com precedência sobre o crédito do réu D.
Alegou a autora que a confissão de dívida e a constituição da hipoteca celebrados entre os réus se tratam de negócios simulados, ou caso assim não se entenda, foram celebrados com vontade e consciência de prejudicar a autora, credora dos 1ºs réus.
Citados, os réus impugnaram a factualidade alegada pela autora, pedindo a improcedência da presente acção, com todas as consequências legais, devendo os réus ser absolvidos do pedido formulado pela autora.
Findos os articulados, foi realizada a audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador e ainda fixado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova, ao abrigo do disposto no art.º 596º, do NCPC.
Apreciados os requerimentos probatórios e produzida a prova pericial, designou-se dia para a audiência de discussão e julgamento, a qual se veio a proceder com inteira observância das formalidades legais, como consta da respectiva acta.
No final foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente e, em consequência, decide-se: A) julgar improcedente o pedido principal formulado pela autora, não considerando nulo, por simulação, o contrato de confissão de dívida e hipoteca celebrado entre os réus e titulado pela escritura celebrada em 22.12.2011, absolvendo os réus de tal pedido; B) julgar parcialmente procedente o pedido subsidiário formulado pela autora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Noroeste, CRL, assim julgando procedente a arguida impugnação pauliana e, em consequência, declara-se ineficaz quanto à autora a constituição daquela hipoteca, titulada pela escritura celebrada em 22.12.2011, podendo assim a autora executar o seu crédito, correspondente aos créditos exequendos reclamados nos processos executivos nºs 647/14.8TBVCT e 650/14.8TBVCT, sobre o prédio urbano identificado nos autos.
Custas a cargo da autora e dos réus, na proporção de 2/5 e 3/5, respectivamente – cf. art.º 527º, nºs 1 e 2, do NCPC.
Inconformado com esta decisão recorreu o réu Delfim Duarte Fernandes rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1º. O Tribunal a quo decidiu mal, havendo erro manifesto na aplicação do Direito.
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O recorrente reclamou o crédito que possui sobre os réus A e mulher, no processo executivo que correu termos no Pº 152/13.0TBVCTA, da Instância Central Cível J1, do Tribunal da Comarca de Viana do Castelo, como se constata de fls.203 e ss. e 215 e ss. dos autos.
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A aqui autora C, era credora no referido processo, foi notificada da reclamação feita pelo aqui recorrente, não impugnou o crédito do credor D, foi proferida Douta Decisão que reconheceu o crédito do referido D, Douta Decisão que foi colocada em crise pela aqui autora, tendo sido objecto de recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, que confirmou a Decisão de primeira instância, 4º. A Decisão supra referida transitou em julgado muito antes da Sentença recorrida, conforme certidão de fls. 214 dos autos, que se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
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A referida decisão constitui caso julgado.
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Na verdade, quer as partes, quer o efeito jurídico, quer a causa de pedir são idênticos no identificado Pº 152/13.0TBVCT-A, da Instância Central Cível J1, do Tribunal da Comarca de Viana do Castelo, e nos presentes autos.
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Assim, s.m.o., existindo uma decisão transitada em julgado, confirmada pela Relação (Pº152/13.0TBVCT-C. G1, 2ªSecção Cível) que reconheceu o crédito do aqui recorrente, e a sua graduação, num processo em que a recorrida C era parte, a Sentença proferida nos presentes autos viola o disposto nos artigos 580º, nº 1 (parte final), 581º e 625º do C.P.C.
Sem prescindir, 8º.Tendo o Tribunal a quo julgado, e bem, não haver simulação no contrato de confissão de dívida e hipoteca celebrado entre os réus, titulado pela escritura celebrada em 22/12/2011, e em face dos factos julgados provados, e os factos julgados não provados, não podia ter decidido por julgar parcialmente procedente o pedido formulado pela autora, pelas razões que a seguir se referem.
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Para uma impugnação pauliana proceder, num ato oneroso, como é o caso sub judice, é necessário que o devedor e o terceiro tivessem agido de má-fé (artº 612º, nº 1 do C. Civil).
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Perante a factualidade provada, e não provada, dúvidas não há, que nem devedores, e muito menos o terceiro, agiram de má-fé.
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Dos factos julgados não provados, com interesse para o supra exposto passa-se a citar: - “O negócio de confissão de dívida e hipoteca foi combinado entre os réus com intuito de enganar a autora”; - “Os 1ºs réus nunca quiseram dar de hipoteca ao 2º réu o prédio supra identificado em 4. Dos factos provados”; - “Em 22.12.2011 ou em qualquer outra data, os 1ºs réus não deviam ao 2º réu a quantia de €150.000, nem qualquer outro valor”; - “O 2º réu tinha conhecimento das dívidas bancárias assumidas pelos 1ºs réus”.
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Ao dar como não provados os factos constantes do artigo anterior falece qualquer possibilidade de verificação do requisito imposto pelo artº 612º, nº 1 (primeira parte) e nº 2 do C. Civil, como condição necessária e imprescindível para a impugnação pauliana.
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A objetiva não verificação da má-fé, leva, sem mais, à improcedência do pedido subsidiário formulado pela autora, e à ilegalidade cometida pelo Tribunal a quo ao julga-lo parcialmente procedente.
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Acresce que, os réus A e mulher, à data que contraíram os empréstimos junto da autora tinham vários bens imóveis livres de quaisquer ónus ou encargos, entre eles o prédio que mais tarde foi hipotecado ao réu Delfim Fernandes.
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Já após a hipoteca registada sobre o prédio em causa, a autora concedeu novos empréstimos aos réus A e mulher.
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Ao contrário do recorrente, a autora é uma instituição de crédito, habituada a efectuar profissionalmente contratos de mútuo aos seus clientes, o que faz parte do respectivo objecto de negócio.
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Se a autora não fez depender a concessão de crédito, ou empréstimos, aos réus Abel e mulher, da constituição de hipotecas, ou outros ónus, a incidir sobre os vários prédios livres que os réus, A e mulher, possuíam, foi porque não quis.
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A Douta Sentença recorrida, na prática atinge o credor que foi previdente e agiu de boa fé –o recorrente-, em benefício do credor profissional, que foi relapso e imprudente, e que não fez prova dos factos necessários, e indispensáveis para a procedência da impugnação paulina.
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A Douta Sentença recorrida percorre um caminho denso e sinuoso, para conseguir chegar ao destino errado a que chegou.
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No entanto, como todas as soluções rebuscadas, afasta-se do espírito e da letra da Lei, que secundariza a verdade material, e que conduz à injustiça, porquanto não há justiça sem verdade.
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Desse modo, o Tribunal a quo não falhou na apreciação da matéria de facto, falhou sim na aplicação da Lei, tendo assente a decisão a que chegou numa interpretação cirúrgica e rebuscada de doutrina, que sendo Douta, não substitui os factos, nem o espírito e a letra da Lei.
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A Sentença recorrida viola o disposto nos artigos 580º, nº 1 (parte final), 581º e 625º do C.P.C., e, artigos 610º, 612º, 686º, 939º, do C. Civil Desse modo, dando provimento ao recurso, revogando a Douta Sentença recorrida, substituindo-a por Acórdão que em conformidade com o concluído, Vossas Excelências farão, como sempre, JUSTIÇA.
Contra-alegou a requerida defendendo com os argumentos que constam de fls. 256 a 262 que deve ser negado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, fazendo-se assim JUSTIÇA! O recurso foi recebido como de apelação com efeito meramente devolutivo, a subir imediatamente e nos próprios autos.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
As questões a resolver, partindo das conclusões formuladas pelo apelante, como impõem os artºs. 635º, nº 4, e 639º, nºs 1 e 2, do C.P.Civ, serão as seguintes: I.Se se verifica a excepção de caso julgado II. se o acto impugnado: hipoteca, deve ser considerado acto oneroso ou acto gratuito.
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Decisão da causa perante a resposta dada à questão anterior e os factos provados.
* II.FUNDAMENTAÇÃO OS Factos: Foram dados como provados os seguintes factos: 1.
A autora intentou, em 4.03.2014, contra, entre outros os 1ºs réus uma execução comum, com o valor de € 88.680,62, que corre termos sob o nº 647/14.8TBVCT, com base numa livrança, no valor de € 74.819,68, com data de emissão em 3.03.2003 e data de vencimento em 19.07.2012, conforme documentos de fls. 10 a 17 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
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A autora intentou, em 5.03.2014, contra, entre outros, os 1ºs réus uma execução comum, com o valor de € 18.871,09, que corre termos sob o nº 649/14.4TBVCT, com base numa livrança, no valor de € 18.464,92, com data de emissão em 30.04.2012 e data de vencimento em 27.01.2014, conforme documentos de fls. 17v a 23v e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
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A autora intentou, em 5.03.2014, contra os 1ºs réus uma execução comum, com o...
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