Acórdão nº 137/14.9TBCBT.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | JO |
Data da Resolução | 23 de Novembro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I- Relatório 1- J. J.
e M. R.
, casados entre si, residentes (quando em Portugal) na localidade de …, freguesia de …, concelho de Celorico de Basto, instauraram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Maria, residente na mesma localidade, e ainda contra a Junta de Freguesia X, com sede na …, alegando, em breve resumo, que, são donos do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo …º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...º, o qual confronta a nascente com dois prédios da 1ª Ré.
Do lado nascente do seu prédio existe uma parcela de terreno com 3 metros de largura e 15 metros de comprimento, que dele faz parte integrante.
Sucede que a 1ª Ré pretende passar com carros de bois, tratores e veículos automóveis através dessa parcela, alegando, juntamente com a 2ª Ré, que tal parcela de terreno é pública. E, assim, para por ela passar, a 1ª Ré construiu uma abertura/entrada com a largura de mais de 3 metros no lado norte-poente dos seus prédios, onde pretende colocar uma cancela, o que não pode ser por não lhes assistir esse direito.
Daí que pretendam nestes autos ver reconhecido o seu pleno direito de propriedade e ressarcidos pelos danos que a conduta das Rés lhes causou e continua a causar.
Concretamente, pedem que se declare que o seu prédio já referido, lhes pertence em exclusivo, tal como a parcela de terreno referenciada, e que se condene a 1ª Ré a tapar a abertura/portão nela aposta, abstendo-se de por aí passar com carros de bois, tratores e veículos automóveis para a parte traseira dos seus prédios.
Pedem também que se condenem ambas as Rés a reconhecer os pedidos anteriores e a absterem -se da prática de quaisquer atos que atentem contra o seu direito de propriedade.
Pedem ainda que se condenem as Rés, solidariamente, a indemniza-los pelos prejuízos sofridos, em montante a apurar em liquidação de sentença, bem como na quantia de 2.500,00€, a título de danos não patrimoniais, acrescida dos respetivos juros legais até efetivo e integral pagamento.
E, por fim, pedem que se condenem as Rés a pagar-lhes, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de 50,00€ por cada dia, no caso de persistirem no uso e ocupação do dito prédio, após o trânsito em julgado da sentença e até cessarem efetivamente a dita violação.
2- Contestaram as Rés, impugnando a versão dos AA. e alegando, ao invés, que a parcela de terreno indicada por estes últimos é pública, por integrar o “caminho de P.”.
A 1ª Ré deduziu ainda pedido reconvencional, no sentido de, caso se reconheça a propriedade daquela parcela de terreno aos AA., lhes ser facultado o direito de nela passarem com veículos automóveis, tratores e toda a maquinaria necessária à atividade agrícola que desenvolvem, uma vez que o seu prédio rústico não tem outro acesso para a via pública. Ademais, há mais de 40 anos que utiliza, bem como os seus antecessores, a dita parcela de terreno para ter acesso à sua propriedade, afirmando ter servidão de passagem por usucapião sobre a mencionada parcela e para acesso aos prédios de que é proprietária.
Em consequência, formula o seguinte pedido: ser reconhecida à Ré, por usucapião, a servidão predial de passagem sobre a parcela de terreno em causa e a favor dos prédios de que é proprietária.
3- Replicaram os AA., mas a sua resposta apenas foi admitida quanto à matéria da reconvenção, impugnando-a, alegando ainda que a 1ª Ré já não passa pela referida parcela desde, pelo menos, janeiro de 1990, pelo que, a existir a servidão, deve ser declarada extinta pelo não uso. Ademais, o prédio urbano daquela Ré tem acesso direto à via pública, motivo pelo qual, a existir a servidão, deve a mesma ser declarada extinta por desnecessidade.
4- Terminada a fase dos articulados, foi proferido despacho no qual, além do mais, se dispensou a audiência prévia, se identificou o objeto do litígio e se enunciaram os temas de prova.
5- Em seguida, realizou-se a audiência final, com inspecção judicial ao local, após o que foi proferida sentença que julgou a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e, consequentemente, absolveu as Rés dos pedidos.
6- Os AA. interpuseram recurso desta sentença, mas esta, em sede de recurso, veio a ser anulada por esta instância.
7- Em nova sentença, a presente ação foi, uma vez mais, julgada improcedente e os RR. absolvidos do pedido.
8- Inconformados, reagem os AA., interpondo recurso que rematam com o seguinte quadro conclusivo: “1- Da audição depoimentos das testemunhas arroladas pelos RR. é lícito concluir que foram erradamente apreciados e valorados, pelo que ocorre notório erro de julgamento: 2- Com efeito, tais depoimentos, se devidamente analisados, autorizam resposta de provado à matéria constante das alíneas b-), c-), d-) e e) dos factos não provados, acima descritos como pontos I. a VII.; 3- E como não provada a matéria descrita na parte final do ponto 17 dos factos provados, - permite o cruzamento e estacionamento de veículos de quem quer que lá passe - ficando a constar apenas que “A parcela de terreno referida em 9.1 além de permitir o acesso aos prédios referidos em 1. a 3. e de um terceiro” 4- Da prova testemunhal e documental (fotografias) resulta provado que: a- os autores, há mais de 15 e 20 anos, por si e antecessores, vêm praticando os atos descritos em 12 e 13 dos factos provados, na firme convicção, eles próprios, bem como toda a gente, de que são donos e lhes pertence a parcela de terreno referida em 9; b- Na parcela de terreno plantaram uma carvalha donde durante mais de vinte anos cortaram lenha e ramos, e que, há cerca de 2 anos, a cortaram por completo e recolheram os seus ramos e tronco: c- Parte do tronco da carvalha ainda está implantado e é visível no interior da aludida parcela de terreno.
d- Na dita parcela os AA. tratavam e cuidavam da carvalha lá implantada, que a cortaram, ainda sendo visível o pé; lá depositaram durante muitos anos restos de telha, como se verifica das fotografias juntas aos autos, e- O que fizeram à vista e com o conhecimento de todos, inclusive das Rés, aliás, que nunca praticaram qualquer ato de posse ou fruição na aludida parcela, apesar de terem alegado tal matéria nas contestações tal matéria; 5- As Rés não provaram um único ato de posse ou fruição sobre a aludida parcela, 6- Se a parcela fosse pública, é evidente que as Rés e a população em geral, logo teria reagido contra a conduta dos AA.; 7- Actos de posse que os AA. exercem há mais de 30 anos, de maneira alguma, passariam despercebidos aos mais distraídos, tanto mais que tal parcela confina com o caminho público denominado de pereira; 8- Também resultou provado que o poste de eletricidade foi mudado para o interior dos limites da parcela já no decurso do processo, pois estava na berma do caminho público de pereira, como é visível na sequência das fotografias juntas, 9- Ficou provado (ponto 14 do factos provados) - a referida parcela de terreno só dá acesso aos prédios referidos em 2. e 3. e a um prédio de terceiro, não dando acesso a qualquer caminho público ou terreno de natureza pública; 10- Ficou provado que a parcela de terreno não permite o estacionamento, nem o cruzamento de veículos de quem quer que seja; 11- E a douta sentença, nem nenhuma das testemunhas, consegue explicar para quê, e com que desiderato, a faixa de terreno em discussão nos autos parcela de terreno permite o estacionamento, nem o cruzamento de veículo.
12- E nem podia, ficou provado que: (12) A referida parcela de terreno tem sido utilizada, desde a partilha referida em 1., pelos autores e seus antecessores para entrarem para a casa referida em 1., e para dela saírem a pé, trator, veículos automóveis de qualquer natureza, a qualquer hora do dia e durante todo o ano, à vista e com o conhecimento de todos, sem interrupção nem oposição de ninguém; (13.) Os autores servem-se da referida parcela de terreno para depositarem lenhas, mato, palhas, canhotos e outras coisas, à vista e com o conhecimento de todos, sem interrupção nem oposição de ninguém; 13- A prova testemunhal produzida pelos AA. é de molde a autorizar a alteração da matéria constante das alíneas b-), c-), d-) e e) dos factos não provados, para provada e não prova a parte final do ponto 17 dos factos dados como provados; 14- Na verdade, sobre tal matéria, pronunciaram-se as testemunhas: - R. M., em declarações prestadas na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 24/02/2015 das 12:11:08 às 13:00:15, gravadas no sistema de gravação digital integrado na aplicação informática (…).
16- J. C.- em declarações prestadas na sessão de audiência de julgamento realizada no dia 04/03/2015 das 15:57:47 às 17:08:22 gravadas no sistema de gravação digital integrado na aplicação informática (…).
17- Por tudo isto, facilmente se vê que os autos indicam a existência de notório erro de julgamento, pois o Tribunal não valorou devidamente a prova testemunhal produzida; 18- Quanto ao facto 17, a Mmª Juiz a quo alicerça a sua convicção nos depoimentos das testemunhas J. C. e J. L., retirando, do contexto, afirmações vagas e sem sentido que não se coadunam com o restante depoimento, como se pode verificar do depoimento transcrito do J. C..
19- A J. L. não deve merecer credibilidade, pessoas de muita idade, nem sequer sabia quantos anos tinha, de relações cortadas com os AA., sendo que demonstrativo que toda a família (duas suas filhas E. R., C. R.) foram arroladas pela Ré Maria.
20- A J. L., que nem sequer sabia a sua idade, não deve merecer credibilidade face ao sobredito.
21- A prova em questão, foi assim erradamente apreciada e valorada, pelo que se afigura aos apelantes que ela se revela suficiente e bastante para sustentar a pretendida alteração da matéria de facto, no sentido de se dar como provados a matéria dos pontos I. a VII. e não provada a parte final do ponto VIII; 22- E, consequentemente, a ação deve ser julgada procedente por provada.
...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO