Acórdão nº 2044/16.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução30 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrente: Empresa A – Comércio e Aluguer de Automóveis, Lda.

Recorridos: Empresa X, Lda.

AF Empresa T – Imobiliária, S.A.

*Comarca de Braga – Juízo Central Cível de Braga – Juiz 5*Relator: António José Saúde Barroca Penha.

  1. Adjunto: Desembargadora Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha.

  2. Adjunto: Desembargador José Manuel Alves Flores.

*Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO EMPRESA A – Comércio e Aluguer de Automóveis, Lda.

intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra Empresa X, Lda.

; AF; e Empresa T – Imobiliária, S.A.

pedindo: a) que sejam declaradas nulas e de nenhum efeito as compras e vendas do veículo NN, datadas de 30 de Maio de 2012; b) a condenação da 3ª. Ré a restituir-lhe esse veículo em bom estado de conservação e funcionamento; c) que se determine o cancelamento dos registos de propriedade correspondentes às aps. 063.., 063.. e 0631..; d) a condenação da 3ª. Ré a pagar-lhe a quantia de € 20 000,00, a título de depreciação do veículo; e subsidiariamente, caso assim não se entenda: e) a condenação dos réus a pagar-lhe o valor de € 50 000,00, a título de preço de veículo, acrescido de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, desde 30 de Maio de 2012.

Alegou para o efeito, em suma, que as vendas do referido veículo efetuadas em 30 de Maio de 2012 de si para a 1ª. ré, desta para o 2º réu e deste para a 3ª. ré são fictícias, pois nenhum dos supostos vendedores quis efetivamente vender esse veículos, nem nenhum dos indicados compradores o quis realmente comprar, não tendo sido pago ou recebido qualquer valor respeitante a essas declarações de vontade.

Acrescentou que as partes apenas efetuaram tais declarações com vista a evitar que o veículo viesse a ser penhorado e executado por dívidas da autora e que a 3ª ré tem vindo a usufruir do mesmo desde aquela data, o que lhe causou uma depreciação de € 20.000,00, sendo certo que tinha à data um valor comercial de € 50.000,00.

Os 2º e 3º réus contestaram, invocando, em primeiro lugar, a irregularidade de representação da autora e impugnando os factos alegados pela A. na petição inicial, defendendo que não existiu qualquer negócio simulado, mas antes uma transmissão válida do direito de propriedade do veículo para a 3ª ré, cujo representante legal (o aqui 2º réu) era detentor de um crédito sobre a 1ª ré de € 50.000,00 e que assim ficou liquidado.

Invocaram, ainda, o abuso de direito, pedindo a condenação da autora no pagamento de uma indemnização de € 10.000,00 como litigante de má fé.

Concluíram, pedindo a absolvição da instância de todos os réus e, subsidiariamente, a sua absolvição do pedido.

A autora respondeu, pugnando pela inexistência de irregularidade de representação e pelo indeferimento das restantes questões suscitadas pelos réus na sua contestação, concluindo como na petição inicial.

Realizou-se uma audiência prévia, no decurso da qual foi proferido despacho saneador, negando-se provimento à exceção dilatória de irregularidade de representação.

De seguida foi fixado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova.

Após produção de prova pericial, procedeu-se a realização da audiência de julgamento.

Na sequência, por sentença de 12.07.2017, veio a julgar-se parcialmente procedente a ação e, em consequência, foi a 1ª ré “Empresa X, Lda.

” condenada a pagar à autora a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros contados desde a citação, às taxas legais em cada momento em vigor para as operações comerciais, até integral e efetivo pagamento.

Mais se decidiu em absolver a 1ª ré do restante pedido; assim como se absolveu os 2º e 3º réus de todo o pedido.

Inconformada com o assim decidido, veio a autora EMPRESA A – Comércio e Aluguer de Automóveis, Lda.

interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES 1ª Sendo a obrigação de pagar o preço um dos efeitos essenciais do contrato de compra e venda, competia aos réus o respetivo ónus da prova, não tendo estes logrado provar o pagamento do preço do veículo NN - cfr. al. c) do art.º 879.° e n.º 2 do art.º 342.°, ambos do C. Civil; 2ª Da prova pericial realizada à escrituração da ré "Empresa X, Lda." e dos depoimentos das testemunhas Manuel e Joaquim resulta, inequivocamente, que o preço de aquisição do veículo não foi pago pelos réus, pelo que deve considerar-se como provado que "nenhum dos réus pagou, nem a autora ou os réus receberam qualquer valor pela compra e venda do veículo NN" - cfr. relatório pericial de fls. e depoimento gravado da testemunha Manuel, com início às 10h:29m:03s e termo às 10h:40m:44s (vd. passagens aos 02m:45, 03m:36, 05m:21, 05m:30 e 06m:45) e depoimento gravado da testemunha Joaquim, com início às 10h:41m:26s e termo às 11h:12m:39s (vd. passagens aos 03m:29 a 4m:20, 04m:30, 05mA8, 09m:33, 10m:26) - vd. n.º 1 art..º 662.° e art.º 640.° C. P. Civil; 3ª A autora alegou e provou não apenas o seu crédito sobre a 1ª ré, mas também o crédito desta perante o 2º réu e deste perante a 3ª ré, emergente do não pagamento do preço da compra e venda do veículo NN celebrada entre ambos - vd. al. c) do art.º 879.° e art.º 342.° C. Civil; 4ª Ficou também demonstrado que os réus adquirentes/transmitentes não exigiram, nem exigem esse valor à ré "Empresa T", havendo por isso uma inatividade consciente por parte dos mesmos que leva, naturalmente, ao agravamento da já difícil situação económica da 1ª ré; 5ª Resulta da certidão comercial desta ré, junta à petição inicial como doc. n.º 2, que a mesma foi objeto de um processo especial de revitalização no final do ano de 2012 e que, desde aí, não apresenta contas, corroborando a testemunha Manuel, contabilista da ré, que esta já desde esse ano se encontra com graves dificuldades económicas, estando mesmo inativa desde então; 6ª A sub-rogação da autora é, pois, essencial à satisfação ou garantia do seu direito de crédito - vd. n.º 2 do art.º 606.° CC; 7ª Encontram-se verificados os 3 requisitos da sub-rogação, tendo por isso a autora direito a receber também dos réus o valor do preço de € 50 000,00, acrescido de juros contados desde a citação, às taxas legais, até efetivo e integral pagamento - vd. n.º 1 art.º 606.° C. Civil.

Finaliza, pugnando pelo provimento do recurso de apelação e, em consequência, deve revogar-se a sentença proferida, condenando-se todos os réus a pagar à autora a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros contados desde a citação, às taxas legais, até efetivo e integral pagamento.

*Os réus contestantes apresentaram contra-alegações nas quais formularam as seguintes CONCLUSÕES 1) A sentença proferida nos presentes autos em primeira instancia mostra-se ajustada, de facto e de direito, à questão posta a Tribunal; 2) A recorrente limitou o seu recurso ao pedido subsidiário que peticionou e não impugnou a matéria de facto que se tem de ter por assente, definitivamente, nestes autos; 3) A ora recorrente não alegou quaisquer factos no sentido de se verificar uma inação da ré PS e AF perante os seus credores; 4) Em especial em relação à ré “Empresa T”; 5) Não tendo sido sequer alegado que esta “Empresa T” tivesse qualquer dívida para com aquela PS e AF; 6) Ou, ainda, que a sua conduta tivesse resultado a perda de património e que a situação da PS e AF seja de insolvência; 7) Desta forma, não estão verificados os elementos necessários que justifiquem a aplicação do disposto no artigo 606º do Código Civil.

8) Devendo, assim, improceder o presente recurso.

*Após os vistos legais, cumpre decidir.

* II. DO OBJETO DO RECURSO: O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, n.º 4, 637º, n.º 2 e 639º, nºs 1 e 2, do C. P. Civil), não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, n.º 2, in fine, ambos do C. P. Civil).

No seguimento desta orientação, cumpre fixar o objeto do presente recurso.

Neste âmbito, as questões decidendas traduzem-se nas seguintes: Ø Saber se cumpre proceder à alteração da factualidade dada como provada e não provada pelo tribunal a quo nos moldes preconizados pela recorrente.

Ø Saber se assiste direito à autora recorrente em ver os demais réus condenados no pagamento do respetivo valor do veículo por via de sub-rogação da autora nos direitos de crédito da 1ª ré sobre aqueles réus.

* *III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

  1. Factos Provados O tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos: 1. No dia 30 de Maio de 2012, a autora declarou vender à ré “Empresa X, Lda.” o veículo de matrícula NN, marca Audi, modelo Q7; 2. Nesse mesmo dia, a ré “Empresa X, Lda.”, declarou vender esse veículo ao réu AF e este último, por sua vez, declarou vendê-lo à ré “Empresa T – Imobiliária, S.A.”; 3. A ré “Empresa T – Imobiliária, S.A.” passou a usufruir do veículo desde essa data, circulando e beneficiando do mesmo, que passou a ser conduzido pelo seu representante legal, o réu AF; 4. Nessa data, o veículo encontrava-se em perfeito estado de conservação, interior e exterior, de chaparia, pintura e mecânica; 5. É do ano de 2012, a diesel, com 2.967 cm3 de cilindrada e tinha cerca de 100.000 kms rodados; 6. Nessa altura, o valor comercial do NN era de € 50.000,00; 7. A autora é detentora de vários veículos automóveis.

    *B) Factos não provados Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a discussão da causa, nomeadamente os seguintes:

    1. Nenhum dos referidos “vendedores” quis vender esse veículo, nem, correspondentemente, nenhum dos réus o quis comprar; b) Nenhum dos réus pagou, nem a autora ou os réus receberam qualquer valor pela “compra e venda” declarada desse veículo; c) As declarações manifestadas tiveram por fim, apenas, fazer constar esse veículo em nome da ré “Empresa T – Imobiliária, S.A.

    ”, evitando que o mesmo viesse a ser executado por quaisquer dívidas da autora; d) Até hoje a ré percorreu com esse veículo cerca de 80.000 kms; e) Por efeito...

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