Acórdão nº 1694/16.0T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução02 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores L. C.

e mulher M. P.

, instauraram, em 10-05-2016, no Tribunal de Viana do Castelo, acção declarativa, com processo comum, contra os réus J. L.

e mulher M. V.

, e J. P.

e mulher M. S.

.

Formulam os seguintes pedidos: A - Declarar-se que os autores são donos e legítimos possuidores da água, da nascente de água, poço, sifão, condutas, presas e caixas de visita, descritas nos artigos 15.º a 32.º da petição.

B - Condenar-se os réus a reconhecerem o alegado direito de propriedade dos autores sobre a água descrita na alínea A) supra.

Ou, subsidiariamente: C – Declarar-se que os autores são titulares do direito de servidão constituído por usucapião da água, da nascente da água, poço, sifão e condutas e caixa de visita, descritos nos artigos 15.º a 32.º da petição.

D – Condenar-se os réus a reconhecerem esse direito de utilizar a água a título de direito de servidão, descrito na alínea C) supra.

Alegaram, como fundamentos, sintetizando [1], que, são donos de um imóvel resultante da edificação por eles da casa que habitam num rústico adquirido em 03-08-1995; e, os demandados, na proporção, respectivamente, de 2/5 e 3/5, de um prédio rústico na mesma localidade. O seu prédio (urbano) “é abastecido de água para consumo doméstico e rega proveniente de um poço/sifão (nascente de água)” situado neste, que “foi construído e edificado” por eles e pelos 1ºs réus, “a suas expensas”, em 1996. A água nasce no prédio dos réus e aí foi, nesse ano, explorada e captada. Em 1995, autores, réus e pais destes “negociaram e chegaram a acordo, no sentido de os autores e os 1ºs réus construírem e efectuarem obras de captação, exploração e aproveitamento de água”, nascente em tal prédio, “ficando os primeiros réus como comproprietários com o direito de utilizar essa água também para consumo do seu prédio urbano (casa de habitação)”. Ao abrigo de tal acordo, os autores e os 1ºs réus, “exclusivamente”, além da obra de “captação e exploração”, fizeram “todas as obras de canalização, encanamento e tubagem” desde o poço (em anilhas de betão e com cerca de 30 metros de profundidade) até ao prédio dos primeiros, num percurso de 1,5 km, para aproveitamento “da água e todo o circuito”. A água é assim conduzida “por um canal subterrâneo constituído por um tubo de plástico negro” e cai num depósito sito na extrema entre logradouros dos prédios urbanos de autores e 1ºs réus, sendo neste repartida igualmente para ambas as casas através de tubo individual respectivo, assim chegando à dos autores onde é aproveitada continuamente “para consumo doméstico e rega do prédio urbano” [2]. Em 2006, os autores regularizaram, junto da respectiva entidade administrativa, a captação e exploração da água. Os autores e os 1ºs réus têm “preservado e mantido” a infra-estrutura descrita. A água tem sido aproveitada pelos autores “desde 1995” [3] – logo, há mais de 20 anos, período em que “estão na posse da nascente e poço e das condutas” e tem sido “exercida à vista de toda a gente, de modo exclusivo, de forma ininterrupta, de boa fé, de forma pacífica e pública, todos respeitando essa posse”. Sempre eles “limparam e conservaram” o poço e condutas até sua casa. Todos reconhecem os autores como “donos da água que nasce no poço, depósitos, caixas de visita e conduta de todo o circuito”. Exploram a água e condutas e utilizando-as “com o animus de que são donos e legítimos possuidores de coisa própria”. Assim, os autores, “pelo facto de terem construído e feito as obras […], são titulares do direito de propriedade sobre a água […] e do poço, sifão e respectivas condutas” – direito adquirido por usucapião.

[4] “Sempre actuaram na exploração da água como se sua fosse.” Caso se entenda que não têm o direito de propriedade, deve ser-lhes reconhecido o “direito de aproveitar, usar e servir-se da água nas condições supra descritas a título de servidão, constituída por usucapião, nos termos do artº 1390º, do CC” [5] [6] Contestando em conjunto, os réus aceitaram parte da factualidade alegada, impugnaram outra (por desconhecimento e falsidade) e acrescentaram que, sendo verdade que, mas nunca antes de 1997, o autor e o réu J. L. abriram um poço, no entanto, desde aí e até pelo menos ao ano de 2002, a água captada foi exclusivamente encaminhada para o prédio dos 1ºs réus, nunca tendo sido utilizada pelos autores, tanto que, tendo estes apenas concluído a construção da sua casa em 1999, nela utilizaram água mas apenas de outra proveniência. Só anos depois disso é que o autor e o 1º réu ligaram e conduziram a água para o prédio dos autores, só a partir de então tendo começado a recolher a água e a dar-lhe uso do poço – nunca, portanto, há 15 anos. Argumentaram, ainda, que, na petição, os autores nada alegaram quanto ao animus da posse da água. Aliás, a utilização referida constitui mera detenção, sempre sabendo os autores que tal acontecia por mera tolerância do 1º réu e que a água era alheia. Por isso é que, em 2004 e 2005, o autor tentou e insistiu junto do 1º réu para que lhe fosse outorgada escritura pública de venda do direito de propriedade a metade da água, o que este não podia cumprir por o então comproprietário do prédio (pai daquele) onde se integra o poço não concordar e sempre se ter oposto a que os autores utilizassem a água dele. Eventual posse sempre, por isso, seria de má-fé.

Juntou documentos e, entre eles, um acordo, datado de 13-05-2004, subscrito por autor e 1º réu, em que, no âmbito de outras questões, este se obrigou a fazer àquele a escritura de venda de metade da água do poço, e uma carta subscrita pela Advogada dos autores e dirigida ao 1º réu, na qual invoca esse contrato que considera promessa de compra e venda de metade da dita água e solicita indicação de data disponível daquele para realização da escritura.

Na audiência prévia, fixou-se o valor da causa, proferiu-se saneador tabelar, dispensou-se a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas de prova, apreciaram-se os requerimentos de prova, ordenaram-se diligências e agendou-se a audiência.

Realizado a discussão e julgamento, nos termos e com as formalidades descritas nas respectivas actas, no decurso do qual foram inquiridas testemunhas e ouvidas as partes, com data de 03-03-2017, foi proferida a sentença (fls. 117 a 124), que culminou na seguinte decisão: “Em face de todo o exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvo os réus J. L. e mulher M. V. e J. P. e mulher M. S. dos pedidos.”.

Os autores não se conformaram e apelaram, apresentando-nos, para fundamentar o pedido de revogação da sentença, argumentos que explanaram em texto que é praticamente cópia do das alegações mas por eles apelidado de conclusões: “- EM CONCLUSÃO – 1.

Salvo o devido respeito e melhor opinião, a Meritíssima Juiz a quo não apreciou de forma correcta a prova produzida em audiência de julgamento. Com efeito, 2.

entendemos, salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, que os seguintes factos deveriam ter sido dados como provados: 3.

- O prédio urbano descrito no artigo 1.º da petição inicial, propriedade dos Autores, é abastecido de água para consumo doméstico e rega proveniente de um poço/sifão (nascente de água), situado no prédio rústico dos Réus (artigo 15.º da petição inicial).

  1. - No ano de 1995 os Autores e os Réus e os pais destes, A. L. e Maria, já falecida, negociaram e chegaram a acordo, no sentido de os Autores e os Primeiros Réus construírem e efectuarem obras de captação, exploração e aproveitamento de água que nascia no prédio dos Réus, ficando os primeiros Réus como comproprietários com o direito de utilizar essa água também para consumo do seu prédio urbano (casa de habitação) – (artigo 19.º da petição inicial).

  2. - Essa água é aproveitada pelos Autores para consumo doméstico e rega do prédio urbano dos Autores (artigos 28.º e 29.º da petição inicial).

  3. - Todas as obras descritas e sucessivas manutenções, desde onde a água é captada, respectivamente no poço e nascente localizada no prédio rústico dos Réus e condutas até ao prédio urbano dos Autores, destinado á exploração, captação, represa, condução e descarga foram efectuadas pelos Autores juntamente com os Primeiros Réus (artigo 34.º da petição inicial).

  4. - Têm sido preservadas e mantidas em conjunto, pelos Autores e Primeiros Réus enquanto donos dos prédios que delas beneficiam (artigo 35.º da petição inicial).

  5. - A água vem sendo aproveitada pelos Autores no seu prédio urbano, nas condições supra descritas, desde 1995, ou seja, há mais de 1, 5, 10, 15 e 20 anos (artigo 36.º da petição inicial).

  6. - Os Autores estão na posse da nascente e poço e das condutas de água existentes desde onde é captada no prédio dos Réus até ao prédio urbano deles há mais de 1, 5, 10, 15 e 20 anos (artigo 37.º da petição inicial).

  7. - Posse essa exercida à vista de toda a gente, de modo exclusivo, de forma ininterrupta, de boa-fé, de forma pacífica e pública, todos respeitando essa posse (artigo 38.º da petição inicial).

  8. - Os Autores sempre utilizaram a água que nasce no poço por eles construído, bem como as respectivas condutas, para consumo e rega do seu prédio urbano (artigo 39.º da petição inicial).

  9. - Os Autores limparam e conservaram o referido poço e as condutas de água até ao seu imóvel (artigo 40.º da petição inicial).

  10. - Isto sem oposição de ninguém, todos reconhecendo os Autores como donos da água que nasce no poço, depósitos, caixas de visita e conduta de todo o circuito, como seus verdadeiros donos, todos respeitando como tal (artigo 41.º da petição inicial).

  11. - Explorando tal água e condutas e utilizando-as com o animus de que são donos e legítimos possuidores de coisa própria (artigo 42.º da petição inicial).

  12. - Assim, os Autores enquanto donos do prédio urbano descrito no artigo 1.º da petição inicial e pelo facto de terem construído e feito as obras de construção do poço, caixas de visita e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT