Acórdão nº 68450/16.1YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução16 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.

*I – RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. X - Companhia de Seguros, S.A.

(aqui Recorrente), com sede na Rua …, no Porto, apresentou um requerimento de injunção, contra Empresa A - Transportes Nacionais e Internacionais, S.A.

(aqui Recorrida), com sede na Rua do …, em Braga, e Outras (11), pedindo que · lhe fosse paga a quantia de € 26.833,20 (sendo € 20.186,67 a título de capital, e € 6.340,63 a título de juros de mora vencidos, calculados à taxa supletiva aplicável aos créditos de que sejam titulares empesas comerciais, contados desde 19 de Abril de 2012 até 24 de Junho de 2016), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à mesma taxa supletiva aplicável aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, contados sobre a quantia reclamada a título de capital, desde 25 de Junho de 2016 até integral pagamento.

· Alegou para o efeito, em síntese, que, dedicando-se à actividade seguradora, celebrou com o Grupo Empresa A (composto pelas aqui doze Sociedades requeridas) um contrato, por meio do qual se obrigou a criar uma conta-corrente comum ao conjunto das Requeridas, onde seriam debitados todos os prémios de seguro vencidos e os fluxos financeiros de todas as Apólices a que dissessem respeito, de que aquelas eram tomadoras, e onde ela própria garantia os riscos respectivos; e as Requeridas se obrigaram a pagar o saldo devedor da dita conta-corrente.

Mais alegou que, tendo garantido a responsabilidade sinistral das diversas Apólices em causa, as Requeridas não lhe pagaram as respectivas contrapartidas.

1.1.2.

Regularmente notificadas todas as Requeridas, vieram deduzir oposições: conjunta, Empresa A - Transportes Nacionais e Internacionais, S.A.

(1ª Requerida), Empresa A Transitários, Limitada (2ª Requerida), FB & Companhia, Limitada (3ª Requerida), Empresa T - Aluguer de Automóveis, S.A.

(4ª Requerida), Empresa Y & Companhia, Limitada (5ª Requerida), Empresa S - Trânsitos e Transportes Internacionais, Limitada (6ª Requerida), Auto, S.A.

(8ª Requerida), EMPRESA L - Transportes Courier Internacional, S.A.

(9ª Requerida), e TT, Limitada (10ª Requerida); e individuais, Empresa P - Serviços de Aluguer, S.A.

(7ª Requerida) e EMPRESA M - Transportes Especiais, S.A.

(12ª Requerida).

Em qualquer das oposições, foi pedido que se julgasse a injunção improcedente (impugnando-se os factos aduzidos em contrário pela Requerente); foram ainda deduzidas as excepções de ineptidão do requerimento de injunção (oposição conjunta) e de prescrição do crédito reclamado (oposição conjunta e oposição individual da 11ª Requerida); e foi requerida a intervenção acessória de RR - Mediação de Seguros, S.A. (oposição conjunta).

1.1.3.

Distribuídos os autos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, foi proferido despacho, convidando as partes a pronunciarem-se, «querendo e em 10 dias, sobre a existência de um uso indevido do procedimento de injunção, configurado como uma excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância» (conforme fls. 153).

1.1.4.

Apenas a Requerente/Autora (X - Companhia de Seguros, S.A.) se pronunciou, defendendo inexistir a dita excepção, nomeadamente por a complexidade da causa não se encontrar prevista na lei como fundamento da sua exclusão do âmbito do Dec-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro.

1.1.5.

Foi proferida decisão, considerando verificada nos autos uma excepção dilatória inominada, por uso indevido do processo de injunção, absolvendo-se as Requeridas/Rés da instância, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Há que verificar se o crédito invocado pelo requerente é um crédito que a lei reconhece como susceptível de obter injunção de pagamento da quantia pedida, constituindo título executivo, após a aposição da fórmula executória.

No caso dos autos, em face do que acima se descreveu relativamente ao respectivo objecto, não estamos perante um mero e simples cumprimento de uma obrigação pecuniária emergente de contrato nem do simples incumprimento de obrigações emergentes de transacções comerciais, isto é, pagamentos efectuados como remuneração de transacções comerciais.

O litígio, tal como a requerente o configura, compreende a discussão de um contrato com múltiplas partes, agregando, por sua vez, no seu seio, uma grande multiplicidade de obrigações e contra obrigações inerentes aos vários contratos de seguro que lhe subjazem sobre o cumprimento, ou não, dos quais as partes estão em desacordo.

O processo simplificado que o legislador teve em vista com a criação do regime especial da injunção, com vista a facultar ao credor de forma célere a obtenção de um título executivo, em acções que normalmente se revestem de grande simplicidade, não é adequado a decidir litígios decorrentes de contratos que revestem alguma complexidade.

Conforme se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28/10/2015 (processo 126391/14.1YIPRT.P1), o processo de injunção não é adequado a «situações de contornos complexos referentes a responsabilidade civil obrigacional, cujos pressupostos não são de fácil e liminar verificação, antes exigindo, as mais das vezes, aturada discussão e trabalhosa decisão, mormente quando os próprios contratos em discussão são de natureza complexa pelos feixes de direitos e deveres recíprocos que movimentam» (itálico e sublinhado ora acrescentados). No mesmo sentido se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 27/11/2014 (processo 1946/13.3TJLSB.L1-8).

Assim sendo, não sendo o procedimento adoptado pela parte o meio adequado, existe um obstáculo processual impeditivo do conhecimento de mérito, ocasionando excepção dilatória inominada, que determina a absolvição da instância (art.º 576.º, n.ºs 1 e 2; 577.º e 578.º, todos do C.P.C.) Pelo exposto, absolve-se a requerida da instância.

Custas, na sua totalidade, pela requerente – artºs 527.º, nºs 1 e 2; 152.º, nº 2; e 607.º, nº 6, todos do C.P.C. – fixando-se o valor da causa em € 26.680,30 – artºs 296.º; 297.º, nºs 1 e 2; e 306.º, todos do C.P.C.

Registe e notifique.

(…)»*1.2. Recurso (fundamentos) Inconformada com esta decisão, a Requerente/Autora (X - Companhia de Seguros, S.A.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse revogada a decisão recorrida, considerando-se o procedimento de injunção adequado à relação contratual comercial invocada, e ordenando-se o prosseguimento dos autos.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições do processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais): 1ª - Mostrarem-se cumpridos nos presentes autos todos os pressupostos previstos na lei para que a Requerente lançasse mão do procedimento de injunção - neles não se incluindo a não complexidade da relação comercial invocada - , conforme o próprio Tribunal a quo teria reconhecido em momento anterior.

1 - A douta sentença recorrida merece natural respeito. Contudo, no nosso entender, constitui uma violação das normas constantes no artigo 7º do Anexo ao D.L. 268/98, de 1 de Setembro e nos artigos 1.º, 2.º, n.º 1, 3.º e 7.º do D.L. 32/2003, de 17 de Fevereiro.

2 - O facto de uma acção poder revestir-se de alguma complexidade, não se encontra previsto na lei como fundamento de exclusão da mesma do âmbito dos referidos Decretos-Lei n.ºs 269/98, de 1 de Setembro e 32/2003, de 17 de Fevereiro, pelo que não há uso indevido do procedimento de injunção no caso em apreço.

3 - Aliás, esse foi inclusivamente o entendimento do Tribunal “a quo” no despacho proferido nos presentes autos em 07-11-2016, a fls…, no qual se considera que, no caso em apreço, a Recorrente poderia e deveria intentar uma injunção – que foi o que efectivamente fez.

4 - E, bem assim, no despacho de 07-02-2017, a fls…, no qual o Tribunal “a quo” vem dar razão à aqui Recorrente ali dizendo expressamente que “inexiste” nos presentes autos “qualquer erro na forma do processo”, ordenando o prosseguimento dos mesmos.

5 - Para depois, por despacho de 21-03-2017, de fls…, vir dizer contraditoriamente que, “o processo de injunção… não é adequado a decidir litígios decorrentes de contratos que revestem alguma complexidade…” 6 - Ou seja, em momentos diferentes do processo, o Tribunal revela entendimentos diferentes (e contraditórios) sobre a mesma questão, isto é, sobre a adequação ou não adequação do procedimento de injunção para a Requerente reclamar o crédito invocado nos presentes autos! 7 - Com o devido respeito, não podemos concordar com os fundamentos que determinaram a absolvição da instância da Ré pelo Tribunal recorrido, porquanto o artigo 7º do Decreto-lei 269/98, de 1 de Setembro preceitua que “considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro." 8 - Por sua vez, dispõe o artigo 3º, al. a), do Decreto-lei nº 32/2003, de 17 de Fevereiro: "Para efeitos do presente diploma, entende-se por “Transação comercial” qualquer transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respetiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração e por “Empresa” qualquer organização que desenvolva uma atividade económica ou profissional autónoma, mesmo que exercida por pessoa singular.” 9 - Ou seja, no caso dos presentes autos, ambas as partes são pessoas colectivas, sociedades comerciais – portanto, empresas – estando em litígio a questão do não pagamento das obrigações assumidas pelas Requeridas nos...

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