Acórdão nº 1762/16.9T8VNF-I.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução29 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: “Calçado, Lda”.

Recorrido: Mónica.

Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão, J2.

Mónica veio requerer a declaração de insolvência de “Calçado, Lda”, alegando, em síntese, que se encontra impossibilitada de satisfazer pontualmente as suas obrigações assumidas e vencidas, sendo que, o montante das dívidas, o seu significado no conjunto do passivo e as circunstâncias que ladeiam o incumprimento, revelam que tal impossibilidade de satisfação das obrigações vencidas, abrange a generalidade das suas responsabilidades.

Não tendo sido deduzida oposição, foram considerados confessados os factos alegados na petição inicial, proferida sentença que declarou a Requerida em estado de insolvência.

Inconformado com tal decisão, apela o insolvente, pugnando pela revogação da decisão, tendo ainda arguido como questão prévia, a nulidade da citação que lhe foi dirigida, sobre a qual incidiu despacho que a jugou improcedente, tendo igualmente o insolvente apelado desse mesmo despacho.

A- No recurso da sentença que o declarou insolvente formulou nas suas alegações as seguintes conclusões: 1) Os aqui Recorrentes não se conformam com a sentença proferida nos Autos; 2) Salvo do devido respeito a sentença é nula, por violação flagrante de preceitos legais, falta de fundamentação e omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artigo 615.º n.º 1 do CPC; 3) O presente Recurso baseia-se em quatro pilares essenciais, a saber: I) Falta de citação da Requerida, II) falta de preenchimento dos requisitos para declaração de situação de Insolvência, por não verificação do efeito cominatório previsto no artigo 30.º n.º 5 do CIRE, III) decurso de Plano Especial de Recuperação e IV) Inexistência do crédito aludido na petição inicial; Quanto ao primeiro ponto, vejamos: 4) Foi instaurada a presente instância em 11.03.2016, tendo a Requerente MÓNICA, pedido o decretamento da Insolvência da aqui Recorrente Empresa.

5) Foi, por despacho ordenada a citação da Devedora, tendo sido enviada carta registada com aviso de recepção, que seguiu sob o registo número RE048412252PT.

6) A carta que se acaba de referir foi devolvida aos Autos com a indicação de “não atendeu” e “não reclamado”.

7) Foi repetida a citação, que seguiu com o número de registo RE048665000PT.

8) Tendo sido a mesma depositada no respectivo receptáculo postal; 9) Mas que veio a ser igualmente devolvida aos Autos, a pedido, com a indicação inscrita manualmente de que “há mais de dois anos que esta morada não pertence a esta pessoa”.

10) Ademais, para corroborar a informação antecedente indiciada com a devolução das cartas, remetida que foi a notificação da sentença proferida à aqui 1.ª Recorrente, através de carta registada sob o n.º RE059458935PT, foi a mesma igualmente devolvida com a indicação de “MUDOU-SE”.

11) Assim, ambas as citações, a 1.ª e a 2.ª tentativas foram devolvidas aos Autos, bem como a notificação da sentença proferida.

12) Sendo claro e notório que a aqui 1.ª Requerente jamais recepcionou qualquer das missivas que lhe foram dirigidas; 13) Tendo os Recorrentes apenas tomado conhecimento da declaração de Insolvência através de anuncio contante em processo executivo, no qual a Recorrente era Executada; 14) Prescreve o artigo 29.º do CIRE, que a citação a efectuar é pessoal, e nada mais dizendo remetendo-nos pelo seu artigo 17.º para o disposto no Código de Processo Civil (CPC).

15) Dispondo o artigo 225.º do CPC, que a citação é pessoal ou edital e que a primeira se pode efectuar por transmissão electrónica de dados, entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção, seu depósito, ou certificação da recusa de recebimento, ou por contacto pessoal do agente de execução ou do funcionário judicial com o citando; sendo ainda admitida a citação por mandatário judicial, nos termos dos artigos 237.º e 238.º.

16) Acrescentando, a respeito da citação das pessoas colectivas, o artigo 246.º CPC, a aplicação das regras consagradas para a citação das pessoas singulares, em tudo o que o artigo não ressalve expressamente; 17) Ora, nos termos do seu n.º 4 havendo “devolução do expediente, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção à citanda e advertindo-a da cominação constante do n.º 2 do artigo 230.º, observando-se o disposto no n.º 5 do artigo 229.º.” 18) Ora, no caso dos Autos, a citação foi enviada e devolvida, com a indicação de “não atendeu” e “não reclamado”; 19) Pelo que ordenada, nos termos do n.º 4 do artigo 246.º do CPC, a repetição da citação, a mesma foi efectuada com prova de depósito, mas ainda assim, foi igualmente devolvida aos Autos, com a indicação manuscrita que a empresa já ali não exercia qualquer actividade “há mais de dois anos”.

20) Ora, com a devolução de ambas as cartas, confirmou-se a não citação da visada e o não conhecimento do teor daquilo que lhe era dirigido; 21) Aliás as cartas remetidas à aqui Recorrente empresa foram remetidas para a seguinte morada: CALÇADO LDA, Avenida C., Esposende.

22) Ora, a sede da Requerente é Avenida C., Apúlia, bastando para o efeito consultar a certidão permanente; 23) Ou seja, foram as cartas remetidas sem indicação do respectivo bloco/fracção.

24) Pelo que, é até natural que as cartas tenham sido devolvidas aos Autos, não tendo chegado ao seu destinatário.

25) E se tal não fosse suficiente para provar a não recepção, pelo menos dúvidas suscitaria, o que deveria ter determinado que o Tribunal tomasse outro tipo de providências para assegurar a citação da aqui Requerente.

26) Ora a citação padece assim de um vício, o que impede o exercício do direito de defesa e do contraditório, na sua plenitude, não tendo tido oportunidade de se pronunciar quanto aos factos e quanto ao teor dos documentos juntos.

27) Pelo que não tendo sido respeitadas as formalidades prescritas na lei, a citação é nula, nos termos do disposto no artigo 191.º do C.P.C., com as consequências legais daí decorrentes, devendo ser anulados todos os actos posteriormente praticados, ordenando-se a repetição da citação à Devedora, para, querendo, apresentar oposição, sob cominação legal.

28) Como já se disse, apenas na data de 25/05/2016, os Recorrentes tomaram conhecimento da declaração de insolvência, mediante consulta de um processo de Execução que contra si pendia, tendo de imediato junto procuração aos Autos, para integração da situação; 29) Ora, atenta a devolução de ambas as citações, frustrada a citação pessoal por via postal, deveria ter sido ordenada a citação da empresa na pessoa do seu gerente, ou, frustrando-se aquela, por contacto pessoal ou, gorando-se esta, por via edital.

30) O que não ocorreu, tendo-se limitado este Insigne Tribunal a proferir sentença de declaração de insolvência da Requerente empresa.

31) Vindo a Devedora posteriormente a tomar conhecimento dessa situação.

32) E havendo a mesma sido impedida de apresentar oposição ao pedido de insolvência.

33) Tendo-lhe sido vedados os princípios do contraditório e da defesa e do acesso à Justiça.

34) Termos em que, dúvidas inexistem quanto à necessidade de revogação da sentença proferida.

Acrescendo ainda que, e ainda que a citação tivesse sido efectuada, Passando assim ao segundo ponto: 35) A sentença declaratória de insolvência foi decretada, tendo sido confessados os factos em face da não oposição ao pedido insolvência, nos termos do artigo 30.º do CIRE; 36) Enunciando na parte referente ao “Direito e subsunção jurídica”, o seguinte: “A única questão que importa decidir é a de saber se a presente acção de declaração de insolvência deve ou não prosseguir, questão que passa pela determinação da situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas da Requerida e/ou da existência de um passivo manifestamente superior ao activo.

Prescreve o artigo 3.º, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas aprovado pelo Decreto – Lei n.º 53/2004, de 18 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto – Lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto, pelo Decreto – Lei 76-A/2006, de 29 de Março, pelo Decreto - Lei n.º 282/2007, de 7 de Agosto, pelo Decreto – Lei n.º 136 de 116/2008, de 4 de Julho, pelo Decreto – Lei n.º 185/2009, de 12 de Agosto e pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril (código a que pertencem todas as disposições infra citadas e que doravante será denominado de C.I.R.E.), que “É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas”.

Dos factos julgados como provados resulta evidente que a mesma se encontra impossibilitada de cumprir as suas obrigações vencidas atento o montante em dívida e o desconhecimento de activo suficiente para o seu cumprimento.

Daqui se conclui que a situação económica da Requerida se encontra debilitada – diríamos mesmo em colapso -, não só dados os montantes em dívida como o desconhecimento de activo.

Assim, resulta claro o estado de precariedade da situação económico-financeira da Requerente, estado esse que demonstra estar a mesma impossibilitada de cumprir pontualmente as suas obrigações vencidas e não ter activo disponível que lhe permita liquidar o seu passivo.

Atentos os factos julgados como provados, tendo em consideração os elementos juntos aos autos não se verifica, pelo menos para já, a dedução de pedido infundado, nos termos do artigo 22.º do C.I.R.E. “A dedução de pedido infundado de declaração de insolvência, ou a indevida apresentação por parte do devedor, gera responsabilidade civil pelos prejuízos causados ao devedor ou aos credores, mas apenas em caso de dolo”.

Fica, pois, demonstrada a situação de insolvência da Requerida pelo que, nos termos dos artigos 3.º, n.º 1 e n.º 2, cabe declarar de imediato.” (sublinhado nosso).

37) Ora, atentemos ao disposto no artigo 30.º n.º 5 do CIRE: “Se a audiência do devedor não tiver sido dispensada nos termos do artigo 12.º e o devedor não...

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