Acórdão nº 2416/15.9T8BCL-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | RAQUEL TAVARES |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório J. C.
intentou o presente Incidente de Incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais contra S. L.
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Para tanto e em síntese, alega que nos autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais foi homologado acordo nos termos do qual as responsabilidades parentais passaram a ser exercidas por ambos os progenitores, sendo o menor entregue à guarda e cuidados da mãe, ficando ainda estipulado no mesmo acordo quanto ao regime de visitas que o progenitor poderia visitar e conviver com o menor sempre que o desejasse, mediante aviso prévio à mãe, com a antecedência de 24 horas e sempre sem prejuízo dos períodos de descanso e de estudo do menor, tendo ainda ficado estipulado um regime quanto às festividades, férias e fins-de-semana, podendo o menor pernoitar com o pai das 21 horas de sexta-feira às 21 horas de domingo.
Mais alega que tentou por diversas vezes estabelecer contacto com o filho sendo-lhe tal contacto vedado pela Requerida, nomeadamente nos dias 7, 13, 20, 27 de Fevereiro de 2016, 5 e 12 de Março de 2016, bem como a 12 de Abril de 2016 e que a Requerida, apesar de previamente avisada, impediu o Requerente de estar com o menor na segunda semana de Páscoa.
Conclui pedindo que sejam ordenadas as diligências necessárias com vista ao cumprimento coercivo por parte da Requerida e a condenação em multa bem como em indemnização a favor do menor no montante de €2.500,00 e do progenitor no valor de €2.000,00.
Foi agendada conferência de pais nos termos previstos no art. 41º, nº 3 do RGPTC, tendo-se frustrado a possibilidade de acordo no seu âmbito, bem como, em momento ulterior, a resolução do litígio através da mediação e/ou audição técnica especializada.
Face à impossibilidade de obtenção de acordo foi determinada a notificação das partes para querendo alegarem e apresentarem prova.
Foi realizada a inquirição das testemunhas arroladas e foi proferida decisão nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Por tudo o exposto, decido julgar procedente o incidente de incumprimento suscitado pelo requerente, J. C., quanto ao regime de regulação das responsabilidades parentais no que toca ao regime de visitas, condenando a requerida, S. L., na multa de € 300,00 (trezentos euros).
Custas pela progenitora.
Registe e notifique”.
Inconformada, apelou a Requerida concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES 1. O presente recurso é da sentença que condenou a requerida pelo incumprimento das responsabilidades parentais.
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O Douto Tribunal “A Quo” decidiu-se pela condenação da requerida com base, unicamente, na convicção da Meritíssima Juíza.
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O Douto Tribunal “A Quo” valorou de forma diferente o depoimento das testemunhas, optando por valorar uns em detrimento de outros, quando o valorado não tem qualquer conhecimento directo das questões, nomeadamente, se o requerente avisou efectivamente a requerida de que pretendia visitar o menor, desvalorizando documentos de autoridades policiais que atestam que nos dias referidos pelo requerente nenhuma reclamação ou telefonema receberam a dar conta de um suposto incumprimento das responsabilidades parentais por parte da requerida.
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O Douto Tribunal a Quo aceita como suficiente, dois autos de ocorrência relativos a dias que não constam do requerimento inicial, nem das alegações do requerente e sobre os quais a requerida não teve como se defender.
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A testemunha do requerente E. C. que teve um depoimento sobrevalorizado refere “acabei de dizer não..ele disse-me que avisou” 6. Salvo o devido respeito, por opinião contrária e na nossa modesta opinião da análise do depoimento supra transcrito temos que a decisão do Douto Tribunal “A Quo” deve levar à absolvição da requerida, por não se terem provados os factos alegados no requerimento inicial de incumprimento e posteriormente confirmados nas alegações do requerente.
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O Douto Tribunal “A Quo” devia ter absolvido a requerida, por não se trem provados os factos constantes do requerimento inicial de incumprimento, nomeadamente o facto de o requerente ter avisado a requerida.
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O Tribunal “A Quo” não fez aplicação prática dos Princípios “In Dubio Pro Reo”.
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Não tendo o Douto tribunal logrado obter a certeza dos factos, tendo permanecido na dúvida, como acontece nos autos, na nossa modesta opinião, deveria ter decidido em desfavor do requerente, a quem competia provar os factos alegados, absolvendo a requerida.
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Já que perante a prova produzida em audiência de discussão e de julgamento, deve a aqui recorrente ser considerado absolvido por se ter violado o princípio in dubio pro reo, constitucionalmente fundado no princípio da presunção da inocência ate ao trânsito em julgado da sentença de condenação, previsto no art. 32º n. 2 da C.R.P.
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Existe, assim, fundamento para recurso, nos termos do art. 629º, Código Processo Civil.
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Houve contradição insanável da fundamentação, uma vez que perante quatro depoimentos, valoram-se dois depoimentos de testemunhas que apenas sabem porque o requerente lhe disse e não se dá credibilidade aos documentos juntos pela autoridade que contradizem o alegado pelo requerente.
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Foi valorizado pela Meritíssima Juíza “A Quo” dois autos de ocorrência de datas que não foram sequer suscitadas pelo requerente e cujo teor a requerida não se pode pronunciar para se defender.
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A decisão do Douto Tribunal “A Quo” deveria ter sido a da improcedência do pedido do requerente e absolvição do requerida do peticionado 15. Foram violadas as normas do artigo 32º da C.R.P. artigo 607º, 609º ambos do C.P.C.”.
O Requerente contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso interposto pela Requerida e apelou também da decisão proferida na parte que julga improcedente a parte do pedido no que respeita à indemnização a favor do menor na quantia de €2.500,00 e na parte que respeita à indemnização a favor do progenitor no valor de €2.000,00, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES:
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Toda a criança ou jovem tem o direito de estabelecer, reatar ou manter uma relação directa e continua com o progenitor a quem não foi confiada a sua guarda, devendo este direito ser exercido no interesse da criança ou do jovem b) A criança ou jovem é o verdadeiro beneficiário do Direito de Visita.
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Incumbe ao progenitor a quem foi confiada a guarda da criança as obrigações de não interferir nas relações da criança com o progenitor não guardião e de facilitar o direito de contacto e de relacionamento prolongado.
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A questão que se coloca é a de saber se, em abstracto, a condenação em indemnização a favor do menor e a favor do progenitor deverá ou não abarcar o Direito de Visita por parte do progenitor não guardião.
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O incumprimento do exercício das responsabilidades parentais tem uma sanção específica estatuída na Lei, nomeadamente no Artigo 41°, n.? 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC).
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Resulta deste preceito legal que o progenitor remisso, que não cumpra o acordado ou decidido pelo Tribunal, pode ser condenado em multa e em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos.
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Este entendimento que tem vindo a ser reforçado ao nível europeu, quer pela Doutrina, quer pela Jurisprudência, como forma de manter e preservar os laços afectivos entre os filhos e o progenitor a quem não foi atribuída a guarda desses filhos.
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A ratio deste entendimento tem como fundamento a natureza jurídica do Direito de Visita que se assume como um direito-dever e não como um direito subjectivo propriamente dito, como forma de o progenitor não guardião colaborar também no exercício das responsabilidades parentais.
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O Direito de Visita funciona como uma forma de o progenitor não guardião manifestar a sua afectividade para com o filho, estreitando os laços familiares, partilhando emoções e ideias e transmitindo-lhe determinados valores e sentimentos indispensáveis ao real crescimento do seu filho e ao seu desenvolvimento harmonioso do ponto de vista psicológico.
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Deste modo, o afastamento de um dos progenitores da vida do menor é uma situação que se configura em si mesma como contrária aos interesses da própria criança e, por consequência, é necessário salvaguardar tais situações.
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O exercício deste Direito de Visita não pode ser assim restringido ou suprimido, a não ser que circunstâncias extremamente graves o justifiquem.
1) Neste contexto, é totalmente reprovável a conduta da Recorrida em querer impedir e restringir o Direito de Visita que assiste ao Requerente para com o seu filho menor, m) Sendo que é manifesto que a Recorrida, nas circunstâncias e condições em que agiu, actuou ilicitamente ao não permitir o cumprimento do regime fixado judicialmente, n) Pelo que foi, e a nosso ver correctamente, o pedido de reconhecimento do incumprimento julgado e decidido procedente.
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Contudo, concretamente, o Tribunal a quo decidiu julgar improcedente o pedido na parte que diz respeito à indemnização a favor do menor na quantia de 2.500 euros e na parte que respeita à indemnização a favor do progenitor no valor de 2.000 euros.
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In casu, verificou-se por parte da Recorrida um incumprimento culposo, reiterado e grave, sem qualquer motivo aparente e não desculpável, e não apenas uma mera situação ocasional ou pontual, ocasionada por motivos ponderosos alheios à sua vontade.
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A Recorrida ao impedir as visitas do Recorrente ao seu filho menor agiu de forma intencional, tendo a consciência que estaria a incumprir o acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais relativo ao menor.
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A Recorrida tem conhecimento, assim como ficou provado pelo Tribunal a quo no ponto 4 dos factos dados como provados, que “O menor R. C. nutre por ambos os progenitores muito carinho e manifesta vontade de estar com ambos, referindo de forma clara e inequívoca que gosta muito do pai, de estar na sua companhia, bem como da actual mulher deste.” s) A Recorrida sabia que ao actuar daquela forma, estaria a impedir o menor...
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