Acórdão nº 772/15.8T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | ANABELA TENREIRO |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- RELATÓRIO C. S.
, solteira, residente na Rua …, Fafe, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra “Seguros A, S.A.”, com sede no largo …, Ponta Delgada, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 14.122,21, relativa ao valor necessário para a reparação dos danos causados na sua viatura; no pagamento da quantia de € 30,00 (quantia necessária para alugar viatura equivalente), contados desde a data do sinistro, até efectivo e integral ressarcimento dos danos sofridos como consequência dos danos causados pela imobilização e privação do uso do veículo; no pagamento da quantia de € 1.412,22, como consequência da desvalorização de que ficou a padecer a sua viatura; no pagamento da quantia diária de 15,00€ devida pelo parqueamento junto da oficina onde se encontra depositado o veículo desde a data do sinistro, cujo valor se reclama até efectiva e integral reparação ou pagamento da indemnização; no pagamento da de € 280,00, para ressarcimento dos danos alegados em 50 e 51 da petição e, por último no pagamento da quantia de € 2.000,00 para ressarcimento do dano moral sofrido pela A. em virtude do sinistro. Pede ainda que todas as quantias sejam acrescidas de juros desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que no dia 25 de Abril de 2015 foi interveniente num acidente de viação, na Rua …, Fafe, tendo o segurado da Ré sido exclusivamente culpado na sua produção; de tal acidente resultaram danos na sua viatura tendo, além do mais, resultado inutilizadas as peças de roupa que envergava no dia do acidente; em virtude da actuação da Ré, ao recusar o pagamento da indemnização devida para a reparação, o seu veículo está parado desde a data do acidente o que lhe acarreta também prejuízos, sendo que o seu veículo ficará desvalorizado em consequência do acidente e que sofreu danos morais.
A Ré contestou aceitando a responsabilidade pelo acidente impugnando, no entanto, os valores peticionados pela Autora, que considera exagerados.
*Proferiu-se sentença que decidiu julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu condenar a Ré a pagar à Autora: A. a quantia de € 14.122,21, a título de indemnização para reparação do veículo GB, quantia essa acrescida de juros à taxa legal supletiva desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento; B. a quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros) a título de reparação dos danos materiais decorrentes da inutilização do vestuário da Autora, a que acrescem juros desde a presente data da sentença até efectivo e integral pagamento; C. a quantia de € 10,00 (dez euros) por dia, desde a data do acidente e até pagamento da quantia supra arbitrada a título de reparação do dano de privação do uso, a que acrescem juros desde a presente data da sentença até efectivo e integral pagamento; D. a quantia de € 400 (quatrocentos euros) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autora, quantia essa a que acrescem juros desde a data da presente sentença até efectivo e integral pagamento; No mais que foi pedido, a Ré foi absolvida.
*Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso, terminando com as seguintes Conclusões a)Os presentes autos fundam-se na responsabilidade civil extracontratual emergente de acidente de viação.
b)Com tal fundamento, veio a Apelada peticionar a condenação da Seguradora ora Apelante no pagamento da quantia de referente à reparação do veículo e bem assim de uma indemnização pela privação do uso.
c)Contestou a Seguradora Ré afirmando que o veículo, por força da extensão dos danos e valor estimado para a reparação, e bem atento o seu valor comercial, constituiria perda total, e com as inerentes consequências em sede de cômputo do período de privação do uso.
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Em face da matéria de facto considerada provada, considerou o douto Tribunal a quo que impendia sobre a Ré Seguradora a obrigação de proceder ao pagamento do valor da reparação, inviabilizando a configuração da situação em causa como perda total.
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E, nessa medida, proferiu a douta decisão ora posta em crise.
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Ora, salvo o devido respeito por diversa opinião, não pode a Seguradora ora Apelante concordar com os fundamentos que suportam a douta decisão proferida, não se conformando com a decisão recorrida na parte em que a condenou a proceder ao pagamento do valor referente à reparação do veículo automóvel, bem como, na parte atinente à fixação do período ressarcível para efeitos de privação de uso.
DO DIREITO g) Ante a factualidade dada como provada impõe-se a consideração da situação em apreço como um caso de perda total, por força da excessiva onerosidade da reparação, quanto cotejada com o valor comercial/venal do veículo, e por virtude da aplicação do disposto no art.s 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007.
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São três as razões da discórdia que nos afastam da solução vertida na sentença aqui posta em crise: a. obrigatoriedade da aplicação do regime vertido no art.s 42..º do Decreto-Lei n.º 291/2007 (em sede extrajudicial e judicial) e respectivas repercussões em sede de fixação de indemnização pela privação do uso; b. concretização do conceito de excessiva onerosidade da reparação; c. do ónus da prova dos factos atinentes à excessiva onerosidade da reparação/ valor de substituição do veículo, e suas repercussões na contabilização do período atinente ao dano da privação do uso do veículo.
Isto posto, i) Compulsados os presentes autos, constata-se que a apelada tinha na sua posse, um veiculo cujo valor comercial, na data do sinistro dos autos, ascendia a €6.950,00 (cfr. alínea 1.27 dos factos dados como provados na sentença), e cuja reparação, após o acidente ascende a, nunca menos de €14.122/21 (Cfr. alínea 1.12 dos factos dados como provados na sentença).
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Foi atribuído ao salvado o valor de €2.120,00 (Cfr. alínea 1.28 dos factos dados como provados na sentença).
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É o próprio legislador que reconhece a devida justiça á indemnização em dinheiro em detrimento da reconstituição in natura quando o valor da reparação é manifestamente superior ao valor venal do veículo.
I) "Dando concretização ao princípio geral estabelecido no art. 566.º n.º 1 do CCivil, veio o legislador, através do n.º 1 do art. 41.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, estabelecer as situações em que um veículo interveniente num acidente se considera em situação de perda total, sendo a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo. De entre as hipóteses aí consideradas, importa aqui reter a da alínea c): quando se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado o valor do salvado, ultrapassa 100% ou 120% do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. N (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 26/10/2010/ disponível on fine in www.dgsi.pt).
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Salvo o devido respeito por diverso entendimento, não subsistem quaisquer ponderosos motivos para o afastamento do regime legal imposto pelo art.s 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007/ tendo andado mal a decisão recorrida ao negar a aplicação deste diploma ao caso dos autos, por considerar que o mesmo apenas se aplica em contexto extrajudicial.
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Ora, se através do art.s 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007/ o legislador pretendeu clarificar e concretizar o princípio geral contido no art.º 566.º do Código Civil, o mesmo deverá ser efectivamente aplicado, sob pena da desvirtuação da vontade concretamente manifestada pelo legislador e da transformação do aludido preceito, numa norma absolutamente inócua.
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O entendimento de que o art.s 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007 estabelece um critério mínimo, vinculativo para a seguradora mas não vinculativo para o lesado, e não vinculativo em sede judicial, mais não é do que um verdeiro convite ao recurso aos meios judiciais.
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Circunstância essa que, de acordo com a sentença proferida, foi precisamente o que o legislador pretendeu evitar.
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Sempre com o merecido respeito, urge aplicar ao caso dos autos o regime estabelecido no art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, na medida em que se trata de norma que veio dar concretização, no caso dos acidentes rodoviários, ao conceito indemnizatório geral do artigo 566.º do Código Civil.
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Na senda do supra expendido a propósito do enquadramento jurídico da questão relativa à reconstituição in natura, reiteramos que, in casu, estamos perante de uma situação de perda total do veículo, nos termos e para os efeitos do disposto no art.s 41.º, n.º 1/ alínea c) do Decreto-Lei n.º 291/2007.
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O que, naturalmente, terá repercussões ao nível do cômputo do período de privação do uso efectivamente ressarcível.
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Assim, nos termos e para os efeitos do disposto no art.s 42.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 291/2007/ verificando-se a imobilização do veículo sinistrado, o lesado tem direito a um veículo de substituição de características semelhantes a partir da data em que a empresa de seguros assuma a responsabilidade exclusiva pelo ressarcimento dos danos resultantes do acidente nos termos previstos nos artigos anteriores.
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Por sua vez, o n.º 2 do referido preceito legal, estabelece que no caso de perda total do veículo imobilizado, nos termos e condições do artigo anterior cessa no momento em que a empresa de seguros coloque á disposição do lesado o pagamento da indemnização.
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Posto isto, e recordando a factualidade que resultou provada, temos que: - o acidente dos autos ocorreu em 25.04.2015; - a Seguradora ora Apelante assumiu a responsabilidade exclusiva pelo ressarcimento dos danos resultantes do acidente; - a Seguradora ora Apelante informou a ora Apelada de que a sua viatura foi considerada perda total e apresentou-lhe uma proposta de indemnização em 20.05.2015 colocando, nessa data, à disposição desta o valor da indemnização; - o veículo encontra-se imobilizado desde a data do sinistro.
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Atendendo aos critérios legais...
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