Acórdão nº 2556/06.5TJLSB-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução12 de Outubro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório 1.1.

Nos autos de execução comum instaurados por Banco A, SA contra P. C. e Outros, a exequente deu à execução, como título executivo, o despacho judicial que conferiu força executiva à petição inicial apresentada no processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000 no âmbito do Dec. Lei n.º 269/98, de 1/09.

Na petição inicial apresentada nessa ação especial o requerente Banco A, SA pediu a condenação solidária dos RR. no pagamento da quantia de € 6.892,80, acrescida de € 582,61 a título de juros vencidos, e de € 23,31, a título de imposto de selo sobre esses juros, acrescida ainda dos juros vincendos desde 13/07/2006, à taxa anual de 29,74%, até integral pagamento, bem como imposto de selo que, à taxa de 4%, recair sobre estes juros.

Aferida a regularidade da citação pessoal dos RR. e não tendo sido apresentado contestação, nos termos do disposto no art. 2º do Anexo ao Dec. Lei nº 269/98, de 1/09, por não ocorrerem, de forma evidente, excepções dilatórias e o pedido não ser manifestamente improcedente, o Mmº juiz conferiu força executiva à petição inicial.

Na acção executiva de que este recurso provém a exequente apresentou reclamação à nota discriminativa apresentada pelo solicitador de execução, pugnando que este deverá calcular os juros à taxa de 32,24% - taxa contratual acrescida de 5% e excluindo os 2,5% destinados aos cofres do Estado -, e não à taxa de 4%.

*1.2.

Por despacho datado de 26/05/2017, a Mm.ª juíza a quo decidiu que: «Uma vez que a nota discriminativa de 05/10/2015 foi reformulada pelo Sr. Agente de Execução e, em consequência, substituída pela nota discriminativa de 17/11/2016, tendo o exequente reclamado desta por requerimento apresentado nos autos em 28/11/2016, impõe-se considerar que a reclamação é tempestiva e cumpre os trâmites legais.

Por conseguinte, passamos a apreciar a reclamação apresentada, conhecendo da única questão essencial em causa: qual a taxa de juro aplicável para efeitos de cálculo dos juros de mora: 4% ou 32,24%.

A ação executiva visa a implementação das providências adequadas à efetiva reparação do direito violado e tem por base um título pelo qual se determinam o seu fim e limites (artigos 10º, n.ºs 4 e 5, e 703º, do C.P.C.).

O título executivo é o documento do qual resulta a exequibilidade de uma pretensão e, portanto, a possibilidade da realização coativa da correspondente prestação através de uma ação executiva; esse título incorpora o direito de execução, ou seja, o direito do credor a executar o património do devedor ou de um terceiro para obter a satisfação efetiva do seu direito à prestação (cfr. artigos 817º e 818º, do C.C.). É o título executivo, portanto, que delimita o objeto da execução. Nos termos do artigo 703º, nº 2, do C.P.C., consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante.

O título executivo apresentado nos presentes autos é a sentença proferida nos autos principais, a fls. 105, a qual, nos termos do artigo 2º do D.L. nº 269/98, de 01/09, conferiu força executiva à petição inicial.

Nessa petição inicial, é o seguinte o pedido formulado: condenação dos réus a pagarem a quantia de € 6.892,80, acrescida de € 582,61 a título de juros vencidos, e de € 23,31, a título de imposto de selo sobre esses juros, acrescida ainda dos juros vincendos desde 13/07/2006, à taxa de 29,74%, até integral pagamento, bem como imposto de selo que, à taxa de 4%, recair sobre estes juros.

Sucede que o pagamento dos juros contratualmente fixados pela parte não pode ser exigido na pendência da ação executiva, em face do disposto no artigo 703º, nº 2, do C.P.C..

Com efeito, não pode o autor/exequente obter a sentença de condenação no pagamento de determinada quantia com base em incumprimento do contrato - isto é, obter o título executivo -, e, ao mesmo tempo, prevalecer-se, findo tal contrato por incumprimento que veio a ser judicialmente reconhecido, de uma das suas cláusulas que determinou a taxa de juro devida. Ou seja, não pode executar-se uma sentença condenatória que é produzida por via do reconhecimento do incumprimento de um contrato e, na respetiva execução, fazer-se valer a taxa de juro determinada por tal contrato (que finda por incumprimento).

Na verdade, numa ação em que se pretende a condenação no pagamento de uma quantia em dinheiro, só faz sentido formular-se um pedido de juros quando se pretende exigi-los a partir de um momento anterior à sentença (data em que contratualmente a obrigação devia ser cumprida, data da interpelação extrajudicial, data da citação para a ação), pois que, se o credor só pretender exigir juros que se vençam a partir da sentença, não tem obviamente que os pedir na ação, porquanto os mesmos resultam diretamente da lei.

É que, a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória que impôs o pagamento de uma quantia em dinheiro, o devedor fica em situação de mora se não pagar. E as consequências dessa mora, no plano da indemnização, resultam diretamente de preceitos legais, tais como o artigo 829º-A, nº 4, do Código Civil.

Do exposto se conclui que a taxa de juro contratada só vale para a contagem dos juros de mora vencidos até à data do trânsito em julgado da sentença. A partir de então, de acordo com o disposto no artigo 829º-A, nº 4, do Código Civil, e no artigo 703º, nº 2, do C.P.C., os juros de mora são contados à taxa legal.

Conclui-se, portanto, que não assiste razão ao exequente na reclamação da nota discriminativa apresentada pelo Sr. Agente de Execução, motivo pelo qual se julga a mesma improcedente.

Notifique».

*1.3.

A exequente, Banco A, SA, inconformada, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, a seguinte e única conclusão: O «presente recurso deve ser julgado procedente, pois o despacho recorrido violou, frontal e flagrantemente, o disposto no artigo 829°-A, do Código Civil e o disposto no artigo 703º, n.º 1, alínea a) e 703º, n.º 2 do Código de Processo Civil, pelo que o dito despacho deve ser substituído por Acórdão que, revogando o mesmo, defira o que nos autos o exequente, ora recorrente, oportunamente requereu a fls. , aos 30 de Janeiro de 2017 e que reiterou a fls. , aos 23 de Março de 2017, desta forma se cumprindo o determinado na sentença dada à execução, se cumprindo e respeitando a lei, assim se fazendo JUSTIÇA».

*1.4.

O recorrido A. C. apresentou contra-alegações, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção do despacho recorrido.

*1.5.

O recurso foi admitido por despacho de 14 de setembro de 2017 como de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (cfr. fls. 36).

*1.6. Foram colhidos os vistos legais.

*II. Objecto do recurso Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do CPC –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a única questão que se coloca à apreciação deste tribunal consiste em saber se os juros deverão ser calculados à taxa de 32,24% - taxa contratual (29,74%), acrescida de 5% e excluindo os 2,5% destinados aos cofres do Estado.

*III. Fundamentação de facto Os factos materiais relevantes para a decisão da causa são os que decorrem do relatório supra.

*IV. Fundamentação de direito 1.1.

Nos termos do n.º 1 do art. 45º do Código de Processo Civil (CPC) - [anterior ao aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, aplicável no caso em razão do art. 6º, n.º 3, do referido diploma legal] -, “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.

Define-se título executivo como “(...) o instrumento que é considerado condição necessária e suficiente da acção executiva”(1). «Títulos executivos «são documentos de actos constitutivos ou certificativos de...

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