Acórdão nº 2025/16.5T8CHV-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório 1.1.
V. S. requereu a abertura do processo especial de revitalização, o que foi deferido, tendo sido nomeada administradora judicial provisória.
Foram encetadas as negociações e apresentado um plano de recuperação.
Foi concluído o processo negocial, sem a aprovação do plano de recuperação.
Ouvidos os credores e a devedora, a administradora judicial provisória emitiu parecer no sentido de que a devedora se encontra em situação de insolvência e requereu a insolvência da mesma.
Por sentença datada de 15 de novembro de 2016, a Mmª juíza a quo declarou a insolvência de V. S. e, entre o mais, designou o dia 9 de janeiro de 2017, pelas 10.00h, para realização da assembleia de credores para apreciação do relatório a que alude o art. 156º do CIRE.
A insolvente foi notificada dessa sentença a 17 de novembro de 2016.
A insolvente requereu que se declare a nulidade da citação da sentença de insolvência efectuada à devedora, com as todas as consequências legais, bem como a revogação do despacho com a referência 30764682 e, em consequência, seja reconhecido o pedido de exoneração do passivo restante, com todas as consequências legais.
Para tanto, alegou, em síntese, que aquando da citação à insolvente da sentença proferida nos autos, nada se fez constar quanto à possibilidade de solicitação da exoneração do passivo restante, em conformidade com o disposto no artigo 236.°, n.º 2, do CIRE, mais alegando que, embora nada conste na respectiva acta, requereu a exoneração do passivo restante na assembleia de apreciação do relatório.
Por despacho datado de 31 de maio de 2017, a Mmª Juiz a quo proferiu o seguinte despacho: «Requerimento referência citius 1272951: Veio a insolvente requerer se declare a nulidade da citação da sentença de insolvência efectuada à devedora, com as todas as consequências legais, bem como a revogação do despacho com a referência 30764682 e, em consequência, seja reconhecido o pedido de exoneração do passivo restante, com todas as consequências legais, para tanto alegando, em síntese, que aquando da citação à insolvente da sentença proferida nos autos, nada se fez constar quanto à possibilidade de solicitação da exoneração do passivo restante, em conformidade com o disposto no artigo 236.°, n.? 2, do CIRE, mais alegando, por outro lado, que embora nada conste na respectiva acta, requereu a exoneração do passivo restante na assembleia de apreciação do relatório.
Cumpre decidir.
No que se refere à suscitada nulidade da "citação" à insolvente da sentença proferida nestes autos, cumpre referir, desde logo, que a sentença proferida nestes autos não foi citada à insolvente, mas notificada à mesma, como, aliás, legalmente se impõe, na medida em que não se destinou o acto a chamar a insolvente à acção para se defender, mas tão-só para lhe dar conhecimento da sentença proferida (cfr. artigo 219.° do Código de Processo Civil).
Por outro lado, a previsão do artigo 236.°, n.º 2, do CIRE destina-se aos casos em que a insolvência é requerida por terceiro, hipótese em que é o devedor/requerido citado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 29.° e 30.° do CIRE.
Ora, não foi este o caso dos autos.
ln casu, a insolvência da devedora, ora requerente, foi declarada em conformidade com o estipulado no artigo 17.
0-G, n.os 1, 3 e 4, do CIRE, normativo este que remete para o disposto no artigo 28.° do mesmo Código, assim equiparando a vertente situação à da apresentação à insolvência.
Nesta conformidade, não foi, nem carecia ter sido, dado cumprimento ao estipulado no citado artigo 236.°, n.º 2, do CIRE, não estando previsto tal acto na normal tramitação destes autos, pelo que não se verifica a nulidade arguida.
Sem prejuízo do exposto, sempre assistiria à insolvente a possibilidade de requerer a exoneração do passivo restante até ao final da assembleia de apreciação do relatório, nos termos do disposto o artigo 236.°, n.º 1, do CIRE.
Não resultando dos autos que o tenha feito, não se verificando qualquer lapso na elaboração acta da assembleia de credores, conforme se extrai da informação dada nos autos pela Sra. Oficial de Justiça que elaborou a predita acta (cfr. referência citius 31039743), sendo certo que não suscitou a insolvente qualquer incidente de falsidade da mesma, necessariamente se conclui que precludiu a possibilidade de a insolvente requerer a exoneração do passivo restante, nada mais nos competindo determinar quanto a esta matéria.
Em face do exposto, decide-se julgar não verificada a nulidade arguida pela insolvente, mantendo-se, integralmente, o despacho com a referência citius 30764682.
Notifique.
(…)».
*1.3. Inconformada com esta decisão dela recorre a requerente V. S. (cfr. fls. 25 a 30), pedindo o provimento integral do presente recurso, a modificação da decisão sobre a matéria de direito da primeira instância e, em consequência, a revogação do despacho recorrido e a declaração de nulidade insanável da citação da sentença à recorrente, com a consequente anulação de todo o processado subsequente ao pedido de insolvência efectuado pelo administrador judicial provisório, devendo ser determinado que a devedora, ora apelante, seja citada para, em 10 dias, querendo, apresentar plano de pagamentos ou requerer a exoneração do passivo.
A terminar as respectivas alegações formulou as seguintes conclusões: 1.° - Mal andou o Tribunal “a quo" ao " ... julgar não verificada a nulidade arguida pela insolvente".
2.° - Com efeito, na citação da sentença de declaração de insolvência à requerente, datada do dia 16-11-2016, deveria constar a indicação da possibilidade de solicitar a exoneração do passivo restante.
3.° - O disposto no n.º 2 do art. 236.° do CIRE, quanto ao pedido de exoneração do passivo restante, é aplicável à questão sub judice.
4.° - Sucede que, da citação à insolvente nada se fez constar quanto à solicitação da exoneração do passivo restante.
5.° - Na verdade, ao contrário do que entende o Tribunal a quo, não poderão aqui deixar de ser observados os formalismos inerentes ao pedido de insolvência feito por terceiros - pois o administrador judicial provisório é, manifestamente, um "terceiro" relativamente à devedora, ora requerente - designadamente, concedendo-se ao devedor a possibilidade de o mesmo se poder vir a pronunciar sobre tal pedido de insolvência ou solicitar a exoneração do passivo restante (vide ainda este respeito douto Acórdão da Relação de Évora de 15-07-2015, Processo n," 529/14.3T85TB- E.E1).
6.° - Com a não aprovação do plano de recuperação em sede de processo especial de revitalização, o requerimento do administrador judicial provisório é equiparado à apresentação à insolvência pelo próprio devedor e a aplicação do disposto no artigo 28° do CIRE é efetuada, conforme decorre expressamente do n° 4 do citado artigo 1r-G, "com as necessárias adaptacões".
7.° - As "necessárias adaptações" impõem a possibilidade de o devedor que não concorde com a declaração de insolvência deduzir oposição à mesma e/ou apresentar recurso.
8.° - Ou seja, apesar de ser equiparado a uma apresentação, certo é que não podem deixar de ser observados os formalismos legais inerentes ao pedido de insolvência por terceiros, designadamente os plasmados nos artigos 236.° e 253° do CIRE, concedendo ao devedor a possibilidade de se pronunciar sobre tal pedido de insolvência ou solicitar a exoneração do passivo restante.
9.° - Salvo o devido e maior respeito, entende a aqui recorrente que não só deveria ter sido citada para apresentar oposição, como, inclusivamente, para, querendo apresentar plano de pagamentos e ainda requerer a exoneração do passivo, o que, no caso em apreço, lhe foi manifestamente negado.
10.° - O que, salvo o reiterado respeito, configura uma nulidade insanável e uma preterição crassa do princípio do contraditório, constitucionalmente consagrado.
11.° - De facto, a aqui recorrente, arguiu a nulidade da citação, porque a mesma não continha, a indicação da possibilidade de apresentar plano de pagamentos e ainda requerer a exoneração do passivo, tal como preceituado nos artigos 236.° e 253° do CIRE.
12.° - Nulidade que viria a não ser reconhecida pelo Exma. Sra. Juiz a quo, conforme despacho proferido a 31 de maio de 2017.
13.° - Pugna-se pela nulidade da citação da sentença à aqui recorrente, na medida em que, da mesma, não constava a possibilidade de apresentação de uma proposta de plano de pagamentos ou sequer de requerer a exoneração do passivo restante.
14.° - Neste sentido, entende a ora recorrente que a omissão constante da citação da sentença à devedora da possibilidade de apresentar plano de pagamentos e requerer exoneração do passivo restante configura uma nulidade.
15.° - Deve ser reconhecida a possibilidade da devedora apresentar plano de pagamentos e/ou exoneração do passivo restante.
16.° - Daí que, também pelas razões supra referidas. a citação da sentença não se poderá manter, por ocorrer nulidade insanável, devendo ser revogada a mesma em conformidade, anulando-se também todo o processado subsequente ao pedido de insolvência efectuado pelo administrador judicial provisório e determinando-se que o devedor, ora apelante, seja ouvido para, em 10 dias, querendo, apresentar plano de pagamentos ou requerer a exoneração do passivo cfr.arts.17°-G, n° 4, 28°,29°,30°,236° e 253°, todos do CIRE (sublinhado nosso).
17.° Nestes termos, deveria o Tribunal lia quo" ter declarado esta nulidade insanável.
18.° Não o fazendo resulta claro que o Tribunal recorrido violou os artigos 17°-G, n° 4,28°,29°,30°, 236° e 253°, todos do CIRE.
19.° Com efeito, estas normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas pelo Tribunal recorrido: - No sentido de ter declarado a nulidade insanável da citação da sentença à recorrente, e, em consequência, anular também todo o processado subsequente ao pedido de insolvência efetuado pelo administrador judicial provisório e determinar...
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