Acórdão nº 391/16.1T8GMR-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO ALEXANDRE DAMI
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

APELAÇÃO Nº 391/16.1T8GMR-C.G1* Comarca de Braga – Guimarães -Instância Local- 1ª Secção de comércio– J2 * Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

    Recorrente(s):- AA; * No presente incidente de qualificação da insolvência de “BB, que corre os seus termos sob o nº 391/16.1 T8GMR, o Sr. Administrador de Insolvência elaborou parecer nos termos do art. 188º, nº3 do CIRE, concluindo que a mesma devia ser considerada culposa na pessoa da respectiva gerente AA.

    Foi aberta vista ao Ministério Público, o qual igualmente concluiu que a presente insolvência deveria ser qualificada como culposa.

    Foi deduzida oposição como decorre de fls. 22 e ss.

    Por fim, realizou-se a audiência de julgamento, com observância de todo o legal formalismo como da respectiva acta se infere.

    * Na sequência foi proferida a seguinte decisão: “Decisão.

    Pelo exposto, nos termos do disposto nos arts. 189º nºs 1 e 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o tribunal qualifica como culposa a insolvência da sociedade ““BB.” em consequência:

    1. Declara afectado pela qualificação a gerente AA; b) Declara-a inibida, pelo período de três anos para o exercício do comércio, e para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa; c) Determina a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pela referida AA.

    2. Condena-se a afectada AA a indemnizar os credores do devedor declarado insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças dos respectivos patrimónios.

    Custas do incidente pelos afectados pela qualificação – art. 303º do CIRE.

    Valor tributário: € 30.000,01.

    Registe e Notifique.

    * Remeta certidão à Conservatória do Registo Civil competente, nos termos e para os efeitos previstos no art. 189º nº3 do CIRE e art. 1º, nº1 al. m) do Código de Registo Civil.

    ” * É justamente desta decisão que a Recorrente AA veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “I. Foi dado como provado o seguinte quesito: “ O signatário remeteu oportunamente uma carta registada à gerente da insolvente a solicitar informação do paradeiro do dito saldo de caixa, mas até ao momento o mesmo não lhe foi apresentado “, no entanto, face a toda a prova produzida na audiência de discussão e julgamento e aos elementos constantes do processo, nomeadamente o depoimento do senhor administrador e da recorrente, e o registo da carta junto aos autos, deveria ter sido dado como provado, apenas, “ O signatário remeteu oportunamente uma carta registada à gerente da insolvente a solicitar informação do paradeiro do dito saldo de caixa, que esta não recebeu, uma vez que a morada constante da mesma estava errada “.

  2. Deve-se dar como provado o quesito: “ Que a gerente da Insolvente AA tenha utilizado o referido saldo de caixa para pagamento de horas extraordinárias a funcionários “, face a toda a prova produzida na audiência de discussão e julgamento e aos elementos constantes do processo, nomeadamente ao depoimento das testemunhas CC e da gerente/recorrente, que depuseram de forma coerente, conjugados com as regras da experiência comum.

  3. Devem-se aditar os seguintes factos: “ A insolvente apresentou um PER, antes de ser declarada insolvente “, o que resulta dos autos e do depoimento da testemunha CC; “ A insolvente envidou Mostrava-se alegado “endividou” que significa “ fazer contrair dívidas; contrair dívidas” segundo o Dicionário Francisco Torrinha, pág. 461; no entanto, do contexto da alegação da Recorrente resulta que o que o Exmo. Mandatário da Recorrente pretendia alegar era antes “envidou” que significa “empregar ou pôr em prática (esforços)” –v Dicionário citado, pág. 477; todos os esforços para reverter a situação “, o que resulta dos depoimentos da testemunha CC e da gerente/recorrente; “ A insolvente deixou dezenas de máquinas e carrinhas “, conforme se verifica dos autos de liquidação e do depoimento do Sr. administrador.

    Com toda a matéria de facto, devidamente apurada, no sentido aqui defendido, deverá a sentença ser revogada e substituída por outra que declare a mesma fortuita.

    IV) No caso de não se entender assim, o que não se concede, sempre se dirá, que, mesmo assim, falta um dos requisitos, para que se declare a insolvência como culposa, uma vez que a empresa foi constituída em 11.01.2012, tendo o processo tido início, em 19/01/2016, não se sabendo se o saldo de caixa foi constituído nos três anos anteriores ao início do processo, ou, no quarto ano anterior.

    V) É jurisprudência unanime que a verificação da existência de culpa grave do devedor, não tem como consequência directa e necessária a qualificação da insolvência como culposa, tendo ainda de ser demonstrada a existência de nexo de causalidade entre tal conduta e a criação ou agravamento da situação de insolvência. Ora, perante a escassa matéria de facto apurada, não se vê a prova e existência de tal nexo. Por isso, deverá a sentença ser substituída por outra que declare a insolvência fortuita.

    VI) No caso de não se entender assim, então, o montante da indemnização deverá ser calculado, em função do grau de ilicitude e culpa manifestado nos factos determinantes dessa qualificação.

    VII) A douta decisão recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 186º e 189º do CIRE.

    Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência ser revogada a douta sentença e substituída por outra que qualifique a insolvência da empresa “ BB.” como fortuita, com as legais consequências...”.

    * Não foram apresentadas contra-alegações.

    * Cumpridos os vistos legais, cumpre decidir.

    * II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

    * No seguimento desta orientação, a Recorrente coloca as seguintes questões que importa apreciar: 1.- Determinar se o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, e, consequentemente, se, reponderado esse julgamento, deve: - a matéria de facto constante da al. e) da decisão sobre a matéria de facto ser alterada para a seguinte redacção: “ O signatário remeteu oportunamente uma carta registada à gerente da insolvente a solicitar informação do paradeiro do dito saldo de caixa, que esta não recebeu, uma vez que a morada constante da mesma estava errada “.

    - deve a matéria de facto contante dos factos não provados ser considerada provada pelo Tribunal, passando a constar destes últimos a seguinte matéria de facto: a) “ Que a gerente da Insolvente AA tenha utilizado o referido saldo de caixa para pagamento de horas extraordinárias a funcionários “, - devem aditar-se os seguintes quesitos correspondentes a matéria de facto que deve ser considerada provada: a)“ A insolvente apresentou um PER, antes de ser declarada insolvente “, b)“ A insolvente envidou todos os esforços para reverter a situação “, c) “ A insolvente deixou dezenas de máquinas e carrinhas “; * II) Saber, se em face da alteração da matéria de facto no sentido defendido pela Recorrente, deverá a sentença ser revogada e substituída por outra que declare a Insolvência como fortuita.

    No caso de não se entender assim, III) saber se falta um dos requisitos, para que se declare a insolvência como culposa, uma vez que a empresa foi constituída em 11.01.2012, tendo o processo tido início, em 19/01/2016, não se sabendo se o saldo de caixa foi constituído nos três anos anteriores ao início do processo, ou, no quarto ano anterior.

    IV) saber se não se mostra demonstrada a existência de nexo de causalidade entre a conduta (da gerente) da Insolvente e a criação ou agravamento da situação de insolvência, com a consequência de, se assim for, a sentença dever ser substituída por outra que declare a insolvência fortuita.

    No caso de não se entender assim, V) saber se o montante da indemnização não deve ser alterado já que deverá ser calculado, em função do grau de ilicitude e culpa manifestado nos factos determinantes dessa qualificação; * A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença proferida em 1ª instância julgou provados os seguintes factos: “Factos Provados.

    1. A devedora foi declarada insolvente por sentença de 22.1.2016, a qual foi publicada no portal citius em 26.1.2016.

    2. Os créditos reclamados nos presentes autos ascendem a €912.612,34.

    3. Dos registos contabilísticos da insolvente consta um saldo de caixa no valor de € 30.948,95.

    4. Instada a insolvente na pessoa do seu Il. Mandatário, para prestar informação relativamente ao paradeiro do supra referido saldo de caixa, não foi possível ao signatário localizar o mesmo.

    5. O signatário remeteu oportunamente uma carta registada à gerente da insolvente a solicitar informação do paradeiro do dito saldo de caixa, mas até ao momento o mesmo não lhe foi apresentado.

    6. Não foi possível apreender para a massa insolvente o referido saldo de caixa.

      * Factos Não Provados.

      - Que a gerente da Insolvente AA tenha utilizado o referido saldo de caixa para pagamento de horas extraordinárias a funcionários.

      * Não se provaram os demais factos alegados pelos intervenientes nem quaisquer outros com interesse para a decisão a proferir neste incidente.

      * B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Já se referiram em cima as questões que importa apreciar e decidir.

      * 1-Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto: Nesta sede, e antes do próprio objecto da impugnação de facto, cumpre tecer algumas considerações prévias, em ordem a evitar quaisquer equívocos quanto à impugnação da decisão de facto em sede de recurso e quanto à actividade jurisdicional que é suposto ser levada a cabo por este tribunal superior.

      Explicitando.

      Nesta matéria, consigna, como é consabido, o art. 640º, n.º 1 do CPC que, «quando seja impugnada a decisão sobre...

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