Acórdão nº 641/09.0TBMNC-A.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelALEXANDRA ROLIM MENDES
Data da Resolução12 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Tribunal da Relação de Guimarães 2ª Secção Cível Processo: 641/09.0TBMNC-A.G2 Comarca de Viana do Castelo – Monção – Inst. Local competência genérica – J1 31 Relatora: Alexandra Rolim Mendes 1º Adjunto: Maria Purificação Carvalho 2º Adjunto: Maria dos Anjos Melo Nogueira Sumário: 1 - Tem natureza administrativa a relação jurídica estabelecida entre os particulares e o IFADAP (agora IFAP) resultante de contratos de ajuda financeira celebrados entre os particulares e aquele Instituto.

2 - Assume também natureza administrativa o ato unilateral de rescisão e determinação de devolução de ajudas concedidas no âmbito dos mencionados contratos por configurar o exercício de um poder sancionatório e autoritário de pagamento de determinada quantia, que tem origem na sua natureza jurídica pública.

3 - Por outro lado, são competentes os Tribunais Tributários para as execuções de dívidas que devam ser pagas por força de ato administrativo (art. 148º, nº 2 – a) do Código de Procedimento e Processo Tributário aplicável por via do art 155º do Código de Procedimento Administrativo vigente à data da interposição da execução e a que atualmente corresponde o art. 179º, nº 2 do novo CPA – DL 4/2015 de 7/1).

4 – Assim, sendo o título executivo uma hipoteca constituída no âmbito de um contrato administrativo de concessão de subsídio pelo IFADAP e a rescisão unilateral desse contrato por alegado incumprimento do mesmo pelo beneficiário desse subsídio e o objeto dos embargos a ilegalidade do mencionado ato, os tribunais comuns são absolutamente incompetentes em razão da matéria para conhecer quer do objeto dos embargos, quer do objeto da execução.

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: J veio deduzir oposição à execução, por apenso à ação executiva que lhe foi movida pelo Instituto de F…, IP, alegando, em síntese que a citação foi feita por solicitador de execução, pelo que existe um erro de classificação, devendo ser mandado anular todo o processado, absolvendo-se o executado da instância; que também deverá ser absolvido por ilegitimidade passiva, uma vez que é casado em regime de comunhão de bens adquiridos e não foi intentada a execução também contra a sua esposa; e que o exequente atua em manifesto abuso de direito e má-fé, porque executa o que sabe não ter direito a receber.

Alega, ainda, que tinha direito ao prémio à primeira instalação, como jovem agricultor, que lhe foi concedido pela exequente, pelo que não se percebe como é que vinte anos decorridos, a exequente vem interpor a presente execução.

Conclui, pedindo que seja anulado todo o processado da instância executiva, por erro na distribuição, que se declare inválido o título executivo e nada ser devido pelo executado, por não ter existido incumprimento contratual, que se declare extinta a hipoteca voluntária constituída a favor do executado, e se condene o exequente por litigância de má-fé, em multa a favor do executado oponente e se julgue extinta a execução.

* O Exequente não contestou, limitando-se a pronunciar-se acerca dos documentos juntos aos autos pelo Embargante.

* O tribunal proferiu a decisão de fls. 59 e ss., julgando extinta a execução por falta de título executivo.

O Exequente recorreu da decisão acima mencionada para o Tribunal da Relação de Guimarães e obteve provimento, tendo a segunda instância revogado a decisão de fls. 59 e seguintes.

* Foi elaborado despacho saneador, no qual se julgou improcedente a exceção de ilegitimidade passiva deduzida, bem como a exceção de nulidade da citação.

* Foi proferida sentença que julgou os embargos nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo a presente oposição à execução procedente, por provada, e declaro extinta a execução.

Determino a extinção da hipoteca voluntária a favor do exequente, sobre o prédio rústico denominado…, sito no Lugar de Regueirinho, Messegães, Monção, inscrito na matriz sob o art…. e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº….

Absolvo o exequente do pedido de condenação em multa por litigância de má-fé.

* Inconformado veio o Embargado recorrer formulando as seguintes Conclusões: 1 - Como se colhe da mesma Sentença recorrida, a Mª Juiz a quo, depois de ter conhecido, apreciado e decidido da exequibilidade do título executivo em que se funda a execução subjacente à Oposição a que respeitam os presentes autos, suscitou a questão de saber se " ... se assiste razão ao exequente em peticionar a quantia exequenda com fundamento na resolução do contrato por justa causa, por incumprimento contratual do executado ou, pelo contrário, se assiste razão ao executado, quando alega não ter existido qualquer incumprimento contratual da sua parte, não existindo, assim, fundamento para a presente execução."; 2 - E, a respeito de tal questão, a Mª Juiz a quo verteu na Sentença recorrida a consideração de que " ... ao contrário do alegado pelo exequente em alegações orais no final da audiência de julgamento, o contrato de atribuição de ajuda pelo IFADAP, ao abrigo do Regulamento (CEE) 797/85 do Conselho e legislação complementar não é um contrato administrativo, mas de Direito Privado. E, nessa medida, ao oponente é permitido deduzir oposição à execução alegando factos que, em processo declarativo, constituiriam matéria de exceção. Assim, não estava obrigado a impugnar administrativamente a decisão de rescisão unilateral do contrato, por parte do IFADAP." com fundamento, exclusivamente, na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) constante do Acórdão de 12-10-2000, in C.J. - S.T.J. VIII- III -74,; 3 - Todavia, decorre da jurisprudência constitucional constante do Acórdão do Tribunal Constitucional (TC) nº 218/2007 que os Contratos de Atribuição de Ajuda celebrados entre ex IFADAP e os respetivos Beneficiários no âmbito da execução dos programas de desenvolvimento do sector primário têm natureza de contratos administrativos, sendo que o ato que determina a rescisão e/ou a modificação unilateral de tais Contratos de Atribuição de Ajuda e a consequente ordem de devolução dos subsídios tidos por indevidamente recebidos pelos respetivos Beneficiários constitui prática de ato administrativo, designadamente na aceção do artº 120º Código do Procedimento Administrativo (CPA/91) ao tempo vigente; 4 - Mas, também, quanto à natureza jurídica do ato de rescisão e/ou modificação unilateral de Contrato de Atribuição de Ajuda celebrados entre o IFADAP e os respetivos Beneficiários, a jurisprudência dos tribunais superiores tem-se revelado uniforme no sentido de o qualificar como ato administrativo 5 - No caso em presença, não parece poder suscitar-se dúvida alguma que, constituindo a decisão constante do ofício do ex IFADAP junto ao Requerimento Executivo sob DOC. 7, através do qual lhe foi comunicado que, por deliberação da Comissão Diretiva do ex IFADAP, tinha sido rescindido unilateralmente o Contrato de Atribuição de Ajuda celebrado com o Recorrido em 08/11/1990 no âmbito do Projeto nº 90.12.6121.4 com a consequente exigibilidade de devolução da quantia de 1.440.015$00, tida por indevidamente recebida a título de Prémio à Primeira Instalação de Jovem Agricultor no âmbito desse Projeto nº 90.12.6121.4, constitui prática de ato administrativo; 6 - Por outro lado, não tendo o Oponente/Recorrido impugnado tal ato administrativo nos termos legalmente prescritos, parece também não se poder suscitar dúvida alguma de que, o mesmo se consolidou na ordem jurídica com força de "caso decidido" ou de "caso resolvido", com a consequente impossibilidade de sindicalização jurisdicional da sua legalidade a partir do termo prescrito para a sua impugnação contenciosa, estando, o Instituto, na prossecução do interesse público, estritamente vinculado à sua execução efetiva; 7 - Por isso, a invocação da natureza administrativa do ato administrativo materialmente exequendo na execução subjacente, apenas teve em vista a salvaguarda, na decisão a ser proferida nos presentes autos, dos efeitos produzidos na esfera jurídica do Instituto por força da consolidação de tal ato administrativo na ordem jurídica - designadamente ter-se constituído na esfera jurídica do Instituto, com carácter definitivo, o direito de crédito exequendo na execução subjacente, nomeadamente por não poder ser jurisdicionalmente sindicada a sua legalidade a partir do termo do prazo prescrito para a sua impugnação contenciosa; 8 - No entanto, afigura que a consideração vertida pela Mª Juiz a quo na Sentença recorrida de que "o contrato de atribuição de ajuda pelo IFADAP, ao abrigo do Regulamento (CEE) 797/85 do Conselho e legislação complementar não é um contrato administrativo, mas de Direito Privado" e que "... nessa medida, ao oponente é permitido deduzir oposição à execução alegando factos que, em processo declarativo, constituiriam matéria de exceção" não estando, assim, "obrigado a impugnar administrativamente a decisão de rescisão unilateral do contrato, por parte do IFADAP." constitui, materialmente, conhecimento e apreciação ex officio da competência do Tribunal a quo em razão da matéria, com decisão contrária à jurisprudência constitucional e administrativa vigente sobre tal questão, e com relevância decisiva na decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis de direito; 9 - Independentemente de o Instituto haver instaurado a...

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