Acórdão nº 2308/11.0TBVCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelALEXANDRA ROLIM MENDES
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Sumário: 1 - O não cumprimento por parte do apelante do disposto nas al. a), b) e c) do nº 1 do art. 640º do C. P. Civil tem como consequência a imediata rejeição na parte em que impugna a decisão da matéria de facto.

2 - Das normas internacionais e nacionais sobre a família e a criança, designadamente Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Convenção sobre os Direitos da Criança, Constituição da República Portuguesa e Código Civil, resulta que se deve dar prevalência à família biológica e apenas quando esta é ausente ou quando apresenta disfuncionalidades que comprometem seriamente os vínculos afetivos próprios da filiação e portanto o estabelecimento de uma relação afetiva gratificante, se devem adotar outras soluções para que o desenvolvimento da criança seja harmonioso; 3 – Assim, a adoção é “o último recurso”, devendo ser aplicada esta medida apenas quando está definitivamente comprometida a possibilidade de o desenvolvimento harmonioso da criança ocorrer no seio da sua família biológica.

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: O Ministério Público (em outubro de 2012) instaurou processo de proteção relativamente ao menor M (nascido a 4-03-2011) filho de ML e de VâV.

Apontou-se então à progenitora V, postura imatura, punitiva, impaciência, rispidez, mendicidade, falta de cuidados com a higiene do menor e a introdução prematura na alimentação deste de alimentos inapropriados.

A 27 de Fevereiro de 2013 foi homologado acordo de proteção, com aplicação da medida de apoio junto da mãe, pelo período de 3 meses (fls. 148).

A 2 de Julho foi determinada a prorrogação da medida por três meses.

A 15 de Novembro foi prorrogada a medida por seis meses.

A 20 de Junho foi prorrogada a medida por três meses.

A 28 de Novembro de 2014, na sequência de feridas auriculares e por ocasião dos exames médicos, o menor foi retirado pela segurança social e colocado no CAT o Berço e de imediato foi a medida substituída pela de acolhimento em instituição (fls. 229).

Em 21 de Maio de 2015 foi homologado acordo pelo qual foi aplicada a medida de acolhimento em instituição, pelo período de seis meses (fls. 401).

A medida veio a ser prorrogada, a 8 de Janeiro, mantendo-se até ao presente (fls. 472).

- A O Ministério Público, em Maio de 2015, instaurou processo de proteção relativamente à menor A (n. 06-05-2014) filha de L e de V.

Em 21 de Maio de 2015 foi homologado acordo pelo qual foi aplicada a medida de apoio junto dos pais, pelo período de seis meses (fls. 33).

Em 7 de Agosto de 2015, a menor foi acolhida no CAT O Berço, vindo a 7 de Agosto a ser confirmada a providência e fixado um mês para a duração do acolhimento (fls. 39, 52).

Em 17 de Setembro foi homologado acordo, aplicando a medida de acolhimento, com duração fixada até 30 de Novembro de 2015 (fls. 96).

O processo passou a tramitar no apenso A, iniciado relativamente a M, por decisão de 8 de Janeiro (fls. 179) e nesse dia foi prorrogada a duração da medida, que persiste até ao presente.

- C O Ministério Público instaurou processo de proteção relativamente à menor C (n.22-08-2016) filha de L e de V, em 28 de Agosto de 2016.

A argumentação: a filha mais velha de V está aos cuidados de tios, devido a negligência parental; M e A foram afastados da mãe, alegadamente por maus tratos físicos por parte do progenitor; a progenitora tem percurso pautado pela instabilidade emocional, relacional e profissional; tem postura imatura e pouco responsável, o relacionamento com o pai da menor é marcado pela instabilidade e pela agressividade deste, sendo provável a ocorrência de situações análogas às já verificadas com os irmãos mais velhos.

Ouvidos os progenitores a 5 de Setembro, foram notificados para alegações. Apresentaram-nas, propondo meios de prova e concluindo pela inexistência de qualquer perigo.

O processo passou a tramitar no apenso A, relativo a M e a A.

As alegações do MP: O MP apresentou alegações, concluindo pela aplicação da medida de confiança a instituição com vista a futura adoção (fls. 596).

A argumentação: M foi afastado dos cuidados da mãe aos três anos devido a maus tratos físicos, é acompanhado desde os seis meses por negligência parental, suspeita de práticas educativas desadequadas e maus tratos infligidos pelo padrasto, L.

A foi afastada dos cuidados da mãe com um ano de idade em consequência de maus tratos infligidos a ambas por L.

Os progenitores apresentam práticas inconstantes e vínculos pouco seguros.

A reintegração na família biológica não é possível e seria atentatória do interesse dos menores, não sendo aquela capaz de garantir, em moldes mínimos, o seu desenvolvimento e educação.

Nas alegações trazidas a respeito de C (ap. E, fls. 64) o MP realça o resultado dos exames de psicologia forense a que foram submetidos V e L, a duração longa do acompanhamento, a ausência de competências e de evolução positiva, a instabilidade do casal, o distanciamento da família alargada.

Conclui igualmente pela necessidade da confiança em vista da adoção e pela separação tão cedo quanto possível para evitar a criação de laços afetivos.

As alegações de V e L: V e L pugnam pela cessação da medida de acolhimento e substituição por medida de apoio junto dos pais (fls. 583).

Em abono da pretensão alegam: A persistência dos contactos com os menores, a vontade destes estarem com os pais, a atual estabilidade do relacionamento de ambos, a ligação de pai-filho entre L e M, as boas condições habitacionais, a ligação de afeto, a estabilidade profissional de Leandro, a ausência das invocadas agressões atribuídas a L e a aptidão para a função parental, a não efetivação do projetado acompanhamento da família.

Reconhecem a existência de clima de conflito com a instituição “O Berço” e informam da existência de vários elementos da família disponíveis para prestarem apoio.

Quanto a C (ap. E, fls. 57) entendem não existir qualquer perigo que a ameace e solicitam o arquivamento do PP ou, no máximo, a aplicação de medida que permita a continuação na família.

Esclarecem que a menor está com os pais desde o nascimento, que recebe os cuidados apropriados e evolui adequadamente e que nada em desabono dos pais pode ser apontado. O vencimento de L é bastante para manter a família e permitir que V se dedique em exclusivo à menor Foi junto relatório da perícia realizada aos progenitores. Os autos contêm ainda bastante documentação, relatórios e informações, declarações e depoimentos, acumulados ao longo dos quatro anos de existência.

Foi realizado o debate. Foi produzida a prova proposta e foram ouvidos os progenitores.

* * Foi proferido acórdão nos seguintes termos: “(…) Fundamentação: Os autos chegam a debate após a evidente perda generalizada de esperança na possibilidade dos progenitores virem a proporcionar aos menores as condições mínimas para o desenvolvimento destes.

Na história de V existe uma primeira filha da qual se desligou, após processo de proteção e confiança ao tio materno. Meses após o nascimento de M iniciou-se o acompanhamento e em Novembro de 2014 veio a ser acolhido, após constatação de que apresentava feridas, algumas das quais atribuídas pelo próprio ao "pai", L. A integrou também instituição na sequência de desentendimento conjugal entre os progenitores, com queixas recíprocas.

C não chegou a ser acolhida. Nascida em Agosto, permanece aos cuidados de Vânia sem que se encontre motivo de preocupação que se possa apontar. Alícia chegou também à instituição em condições irrepreensíveis, sorridente e com postura positiva perante os outros.

Sem necessidade de grande detenção, a proximidade de V indicia um temperamento pouco propício às finalidades da intervenção. O cansaço das Ex.as técnicas foi evidente e as fotos trazidas e as queixas contra a instituição confirmam uma postura beligerante de V A pretérita debilidade económica está, com alguma probabilidade ultrapassada. L mantém vida profissional sacrificada que gera rendimentos bastantes para manter o agregado. O casal tem casa arrendada com boas condições e o relacionamento mostra-se estável, não existindo notícia de desacertos conjugais após Agosto de 2015.

Os cuidados com os menores foram adequados no passado, sendo reconhecida a dedicação de Vânia, na medida das possibilidades de que dispunha. E também o interesse e preocupação de L com os menores.

A ligação com os menores institucionalizados tem sido regular, com razoável frequência, em regra três vezes por semana, e algumas faltas com explicação razoável. O distanciamento entre L e M resulta de imposição externa, tendo todavia aqueles, mantido contacto por via telefónica e a pouca frequência das visitas a A advém de obstáculo intransponível, face à necessidade de sustentar a casa.

A frequência de programa relativo a competências parentais não passou de projeto e poderia ter sido um caminho que, cuidadosamente seguido, permitiria a V deixar de olhar para os outros como inimigos ansiosos por apontar a mínima falta e por lhe levar os filhos.

Os resultados da perícia a que foram sujeitos os progenitores não revelam inaptidão para o exercício das responsabilidades relativamente aos filhos.

A partir de Maio deste ano, reconheceu-se algum desanuviamento na postura de V, aparentando esforço para cumprir as orientações dos técnicos, dando mostras alguma cooperação e um comportamento mais ajustado com os filhos.

Não se aceita que hajam sido comprometidos os vínculos peculiares da filiação nem que os pais hajam colocado os menores em situação de grave perigo (art. 1978º CC) para que possa ser aceite a separação solicitada.

M foi acolhido após deteção, durante a consulta de pediatria de algumas feridas e a atribuição a L da causa de parte delas. Não chegou a ser comprovada a autoria, mas a suspeita teve consequências de monta, potenciadas mais tarde, em Agosto de 2015, pela própria V, que atribuiu a L, comportamento violento para com ela e A. Imputação que não manteve e que também não logrou esclarecimento, descontada a briga conjugal que...

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