Acórdão nº 5601/14.7YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

SUMÁRIO: 1) São pressupostos da exceção de não cumprimento do contrato: a existência de um contrato bilateral, o não cumprimento ou não oferecimento do cumprimento simultâneo da contraprestação; a não contrariedade à boa-fé; 2) E vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o de cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa-fé consagrado nos artigos 227º e 762º nº 2 Código Civil; 3) Existindo um retardamento da obrigação e cessando tal retardamento, à contraparte deixa de ser exigível que continue a recusar o cumprimento da sua obrigação, pois fazendo-o cessa a causa, porventura legítima, até então, para se escusar ao cumprimento das obrigações a que estava obrigada.

***** Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO A) S, veio intentar procedimento de injunção, que veio a prosseguir como ação declarativa, com processo comum, contra I, onde conclui pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €139.394,86, sendo, a título de capital €105.925,00 e €33.166,86, a título de juros moratórios.

A ré, I, apresentou contestação e deduziu pedido reconvencional onde conclui entendendo dever a oposição ser julgada provada e procedente, absolvendo-se a requerida da instância e sempre do pedido de capital e juros e a reconvenção julgada provada e a reconvinda condenada a pagar à reconvinte o montante total de €144.753,24, acrescido do montante a liquidar e de juros nos termos reclamados, valor a compensar com qualquer crédito que eventualmente venha a ser reconhecido à requerente.

A autora S, apresentou réplica onde conclui entendendo dever a ser julgado totalmente improcedente o pedido reconvencional, devendo a ré ser condenada em custas e procuradoria condigna.

* Foi elaborado despacho saneador, onde foi decidido julgar improcedente a exceção de ineptidão da petição inicial, foi identificado o objeto do litígio e os temas de prova.

* Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença que decidiu a) Julgar a ação procedente e, em consequência, condenar a ré I, a pagar à autora a quantia de €95.675,00 (noventa e cinco mil, seiscentos e setenta e cinco euros), acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, calculados desde as datas supra referidas em I.8 f). a I.8 u). e sobre os respetivos montantes e até integral pagamento, às taxas supletivas sucessivamente emergentes do disposto no artº. 102º/§3 do Código Comercial; b) Condenar a ré I, a pagar à autora a quantia de €10.250,00 (dez mil, duzentos e cinquenta euros) quando e se esta lhe entregar o manual de instruções e a sinalética em língua portuguesa; c) Julgar o pedido reconvencional improcedente e, em consequência, dele absolver a autora.

* B) Inconformada com a sentença proferida, veio a ré, I, interpor recurso (fls. 481 vº e seguintes), o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 540).

* Nas alegações de recurso da apelante I, são formuladas as seguintes conclusões: 1. Recorre-se da douta sentença com a referência 141912804, que decidiu: a) Julgar a ação procedente e, em consequência, condenar a recorrente a pagar à recorrida a quantia de €95.675,00 (noventa e cinco mil, seiscentos e setenta e cinco euros), acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, calculados desde as datas supra referidas em I.8 f). a I.8 u). e sobre os respetivos montantes e até integral pagamento, às taxas supletivas sucessivamente emergentes do disposto no artº 102º/§3 do Código Comercial; b) Condenar a recorrente a pagar à recorrida a quantia de €10.250,00 (dez mil, duzentos e cinquenta euros) quando e se esta lhe entregar o manual de instruções e a sinalética em língua portuguesa; c) Julgar o pedido reconvencional improcedente e, em consequência, dele absolver a recorrida.

d) Estipulando que as custas ficam a cargo da recorrida e da recorrente, na proporção dos respetivos decaimentos que fixou, respetivamente em 10% e 90%, suportando a Recorrente, na totalidade, as custas do pedido reconvencional.

  1. Discorda-se do decidido quer na parte de facto, quer na de direito, sendo que aquela que importa a reapreciação da prova gravada, 3. Quanto à decisão de facto é primeira convicção e conclusão da recorrente que, no que concerne ao item 29 do elenco dos factos provados, a decisão de facto deve ser considerada nula, por total ausência de fundamentação.

  2. Posto que ali se considera provado que “em Dezembro de 2009 estava tudo pronto para ser enviado”, sendo que no cotejo da fundamentação da decisão de facto não se vislumbra qualquer alusão a tal factualidade, que não se mostra fundamentada, com violação do disposto no artigo 607º nº 4 do C.P.C., o que importa a nulidade da mesma nesta parte, conforme o disposto no artigo 615º, nº 1. al. b) e 4 do C.P.C.

  3. Impetra-se a revogação da decisão de facto no que tange aos factos subsequentes, indicados por referência ao elenco e numeração dos factos provados e não provados na sentença.

  4. I.11 dos factos provados: “O preço acordado incluía os equipamentos, metade do custo do transporte, a montagem dos equipamentos fornecidos, a colocação em funcionamento e o arranque (start up) dos equipamentos fornecidos.” e I .

  5. Dos factos não provados “A autora não deu qualquer formação técnica aos responsáveis e pessoal da ré.

  6. Nesta parte, para além da factualidade que acima consta como provada em I.11 e se aceita, como resulta da alegação da recorrida e do tema de prova em que tal factualidade se integra (ut. 1 dos temas de prova) resultou ainda provado, a merecer enquadramento neste item e natural aditamento que o preço incluía adequada formação.

  7. Decorre do depoimento do legal representante da recorrente, A, ouvido, em declarações e depoimento de parte, objeto de gravação, na sessão de 16.06.2015 (com início de gravação às 10.09.46 e termo às 11.37.55, e das 12.04.36 às 12.18.34), cujo depoimento o tribunal valorou e jamais considerou afetado na sua credibilidade, que este referiu, clara e inequivocamente, que a formação técnica estava incluída no preço.

  8. Tal decorre da fundamentação da decisão de facto e é absolutamente credível e aceitável, resultando das regras da experiência comum e de critérios de normalidade, que atenta a complexidade da máquina o seu manuseamento importasse formação, sendo que é tão habitual e inerente ao fornecimento de uma máquina deste tipo e complexidade o preço incluir a formação, que sequer se justificaria, por desnecessária, ao contrário do que se evidencia na fundamentação da decisão de facto, qualquer alusão documental a tal facto.

  9. Impondo-se recordar aqui que não foram facultados, como se provou e acolheu na sentença em crise, os manuais em português (ut. 17 dos Factos Provados), que foram considerados e são por lei obrigatórios e que seriam a única forma de remediar a falta de formação a que aludiram o declarante e representante da recorrente acima referido A e as testemunhas R, ouvida na sessão de 9.07.2015 (cujo depoimento se mostra gravado de 10.29.51 a 10.51.08), que referiu que os técnicos da S não deram formação e M, ouvida na mesma sessão (cujo depoimento se mostra gravado com início às 11.14.41 e termo às 12.20.03) que referiu também que não foi dada qualquer formação nem nunca viu os manuais.

  10. Também se conclui nesta parte, que não é por referência ao depoimento da testemunha da autora, e seu procurador, Stefano Zanardi, ouvido na sessão de 16.06.2015, objeto de gravação (com início às 14.17.32 e termo às 16.06.30) e alusão pelo mesmo feita ao facto de não se tratar de um fornecimento em termos de “ chave na mão” que se infirma o que antecede, antes o corroborando, sendo que a confirmação perentória e unânime das testemunhas da recorrente, de que ocorreu formação, infirma a invocada alusão no e credibilidade do depoimento desta testemunha quando refere ocorrer a formação pelo técnico aquando da montagem, que dá as explicações necessárias, que mereceu acolhimento, ao invés bastando atender à fundamentação da decisão de facto na parte a que se refere ao item II.10, também considerado não provado, onde se refere que “…nenhuma das pessoas ouvidas em audiência de julgamento e que trabalham na ré terem referido ter recebido qualquer formação que não as indicações dadas pelo legal representante da ré…” 12. Tal importa igualmente a revogação da decisão de facto no que concerne ao item II.5.dos factos não provados: “A autora não deu qualquer formação técnica aos responsáveis e pessoal da ré”, que deve ter-se como provado.

  11. Como igualmente e ainda que “O preço acordado incluía a adequada formação técnica para operar com os equipamentos e os manuais em língua portuguesa” ao contrário do que consta do item II.1 do elenco dos factos não provados, na consideração do que já anteriormente se alinhou e aqui se dá por integrado e em particular no que concerne aos manuais em português, que decorre da sua obrigatoriedade sufragada na sentença recorrida, na parte da fundamentação de direito, reproduzida no contexto destas alegações.

  12. Posto que se o fornecimento dos manuais é obrigatório por lei, não se vê como os mesmos não tenham que estar incluídos no preço, o que importa a revogação do decidido nesta parte.

  13. Deve dar-se como provado que “A autora não enviou o respetivo programa” considerada não provada em II-7 do elenco dos factos não provados.

  14. Posto que decorre cristalinamente das declarações confessórias do procurador e representante da recorrida Stefano Zanardi, de cujo depoimento acima assinalado consta o seguinte: “A S podia entregar tudo, mas eu fiz uma avaliação da situação e decidi que não tinha que entregar o software. Não estava obrigada e era uma situação de alto risco. O software é para evitar situações de perigo”.

  15. Ainda e na divergência do julgado de facto, relativamente ao ponto II.8 do elenco dos factos não provados, deve considerar-se provado que “A password é essencial ao seu funcionamento e correção de erros e avarias”.

  16. Aqui merece...

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