Acórdão nº 348/14.7TBCMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANABELA TENREIRO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I--Nos depósitos plurais, em regime de solidariedade, qualquer dos titulares da conta bancária pode, por si só, movimentar, total ou parcialmente, a crédito ou a débito, essa conta.

II--É pacífico, na doutrina e na jurisprudência, o entendimento de que a titularidade da conta não se confunde com a propriedade dos valores aí depositados, sendo frequente a abertura de contas bancárias, nesse regime de solidariedade, para facilitar, a quem não é proprietário do dinheiro, a sua movimentação, pelos mais variados motivos.

III--Na relação interna entre os credores solidários (contitulares de contas bancárias) presume-se que comparticipam em partes iguais no crédito, sempre que, da relação jurídica entre eles existente, não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve obter o benefício do crédito—v. art. 516.º do C.Civil.

IV--O ónus da prova consagrado no artigo 342.º do C.Civil estabelece a repartição do encargo demonstrativo que incide sobre a parte que deverá convencer o juiz da realidade dos factos por si alegados. E, por não ser admitido o non liquet, exerce uma função da maior relevância na actividade jurisdicional, ao ditar uma regra de julgamento quando os meios de prova produzidos no processo não foram suficientes para convencer o juiz sobre a realidade dos factos alegados pelos litigantes.

V—O proveito comum é um conceito jurídico, cuja verificação depende da prova de factos demonstrativos no sentido de que o dinheiro levantado só por um dos cônjuges da conta cotitulada pelo casal, em regime de solidariedade, destinou-se a satisfazer os interesses comuns do casal, não bastando a prova de que eram,à data, casados.

VI--Não beneficiando o réu de presunção legal no que respeita ao proveito comum do casal, competia-lhe provar que as movimentações, por si efectuadas, nas contas bancárias, cotituladas por ambos os cônjuges, destinaram-se a satisfazer interesses comuns do casal.

* * Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I—RELATÓRIO M intentou contra J a presente acção declarativa de condenação, peticionando que: -se declare que todas as quantias depositadas e transferidas para as contas bancárias da Caixa Geral de Depósitos, agência de Vila Praia de Âncora, com o nº ... e da União de Bancos Portugueses, agência de Valença do Minho, com o nº ... , bem como os respectivos rendimentos/frutos, pertencem e são propriedade de Autor e Réu na proporção de metade para cada um; -se declare que a Autora tem direito a metade de todas as quantias depositadas e transferidas para as contas bancárias da Caixa Geral de Depósitos, agência de Vila Praia de Âncora, com o nº ... e da União de Bancos Portugueses, agência de Valença do Minho, com o nº ..., bem como dos respectivos rendimentos e frutos; e a condenação do Réu a pagar ou a restituir à Autora a quantia de € 85.507,94 ou outra que vier a ser apurada nestes autos, acrescida dos juros legais de mora contados desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Regularmente citado, contestou o Réu defendendo-se por excepção, invocando a prescrição do direito invocado pela Autora, impugnando os factos alegados por esta e deduzindo reconvenção, através da qual peticiona que se declare que as quantias em causa lhe pertencem.

* Proferiu-se sentença que julgou a presente acção procedente, por provada, e em consequência, condenou o Réu a pagar à Autora a quantia de € 85.507,94, acrescida dos juros legais de mora contados desde a citação até integral e efectivo pagamento.

* Inconformado com a sentença, o Réu interpôs recurso, finalizando com as seguintes Conclusões 1- O recorrente é demandado nos presentes autos, sendo que a acção foi julgada totalmente procedente, e em consequência, ser o Réu obrigado a pagar à A. quantias das quais alegadamente fez suas indevidamente, acrescida de juros legais contados desde a citação até integral pagamento.

2-Peticionou que se declare que todas as quantias depositadas e transferidas para as contas bancárias da Caixa Geral de Depósitos, agência de Vila Praia de  ncora, com o nº ... e União de Bancos Portugueses, agência de Valença, com o nº ..., bem como dos respectivos rendimentos/frutos, pertencem e são propriedade da Autora e do Réu na proporção de metade cada um; se declare que a A. tem direito a metade de todas as quantias depositadas e transferidas para as contas bancárias da Caixa Geral de Depósitos, agência de Vila Praia de âncora, com o nº ... e da União de Bancos Portugueses, agência de Valença do Minho, com o nº ..., bem como aos respectivos rendimentos e frutos; e a condenação do Réu a pagar ou a restituir à autora a quantia de 85.507,94 ou outra que vier a ser apurada nos autos, acrescida de juros legais de mora contados desde a citação até integral pagamento.

2-Regularmente citado o Réu deduziu contestação, defendendo-se por excepção, invocando a prescrição e impugnando os factos alegados pela A.

3-Foi realizada a Audiência de Discussão e Julgamento, tendo o Tribunal a final, julgado a acção totalmente procedente.

4-Com o devido respeito, que é muito, a acção deveria ter sido julgada totalmente improcedente, uma vez que não apresenta condições de procedibilidade necessárias.

5- Salvo o devido respeito por diversa opinião, andou mal o Digníssimo Tribunal a quo ao entender que o Réu terá feito seus os montantes alegadamente levantados pelo Réu, só assim se compreendendo o sentido da decisão, uma vez que nada resulta dos factos provados nesse sentido.

6-A decisão carece assim de factos que sustentem o seu sentido, razão pela qual deverá ser revogada.

7-A A. juntou aos autos cópias de documentos do Réu, cuja proveniência não justificou, não tendo pedido em momento algum qualquer informação bancária sobre o que se encontrava em discussão, sendo que só assim o Tribunal poderia dar como provados os factos que veio efectivamente a dar.

8-A admitir-se a validade da prova dos documentos que se encontram juntos, é de referir que, os alegados movimentos bancários ocorreram nos anos de 1994 e 1995 e A. e R. se divorciaram em Abril de 2012 (alinea b) dos factos provados).

9-Ou seja, desde a data dos citados movimentos bancários A. e R. ainda estiveram casados sensivelmente mais 17 anos.

10-O que é indiscutível é que, tais movimentos bancários, e porque na pendência do matrimónio se devem considerar feitos em proveito comum do casal, como aliás se verificou, e que a A. não logrou infirmar como lhe competia e era exigível para a procedência da acção.

11-Cabia à A. alegar e provar que não existiu proveito comum desses movimentos e que os mesmos teriam resultado em exclusivo benefício do Réu.

12-O que é facto é que não logrou a A. provar tal.

13-Ficou provado, que, e por exemplo (alínea t) que o A adquiriu um apartamento em Vila Praia de Âncora para si e para a A, bem como, deveria ser dado como provado, e constar dos factos provados, que o mesmo foi pago pelo Réu, conforme depoimento da testemunha A.

14-Ou seja, o apartamento foi evidentemente pago, sendo que, e como disse a testemunha Sr. A, procurador de Autora e Réu na escritura pública de transmissão de propriedade “paguei com um cheque do J”.

15-Assim, e salvo o devido respeito por diversa opinião, a alinea t) dos factos provados carece de outra redacção, devendo constar do mesmo, na sequência do depoimento do Sr. A, testemunha arrolada pelo Réu, que foi este quem pagou o dito apartamento.

16-Os movimentos bancários existiram nos anos de 1994/1995, sendo que A. e Réu continuaram casados, e logo a presumir-se a existência de relações jurídicas como cônjuges entre ambos até ao ano de 2012! 17-E o que o Réu defende é que, os movimentos bancários feitos na pendência do matrimónio se presumem no interesse comum do casal, como efectivamente aconteceu, desde logo pela aquisição de diverso...

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