Acórdão nº 1837/11.0TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução25 de Maio de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães * 1 – RELATÓRIO D e marido M, residentes na Rua do Rio Este, n.º … Louro, Vila Nova de Famalicão e L e mulher LA, residentes na Rua do Rio Este, nº … Louro, Vila Nova de Famalicão intentaram a presente acção(1) declarativa, com processo ordinário, contra J e mulher M, residentes na Travessa do Pinheiral, s/n – … Lemenhe, Vila Nova de Famalicão, pedindo que sejam os réus condenados a: a) reconhecer que a primeira e os segundos autores são pela forma referida nos artigos 1º a 8º da p.i., donos e legítimos possuidores dos prédios descritos respectivamente nos artigos 1º e 3º da pi; b) reconhecer que os autores têm o direito de regar os seus prédios com a água proveniente do Ribeiro de Lemenhe, que neste é captada e conduzida para a poça existente no Campo da Levadinha, através da “Levada das Vinhas” e de aí a represar no tempo de rega e de a utilizarem como água de lima, tal como se alegou nos artigos 12º a 15º da p.i.; c) reconhecer o direito dos autores de conduzir essa água através de um rego aberto, em terra e com a largura de cerca de um metro e meio, ao longo de toda a largura do Campo da Levadinha, numa extensão superior a 80 metros, até aos prédios referidos nos artigos 1º e 3º da p.i., como se alegou nos artigos 12º a 15º da p.i.; d) a reporem a levada, a poça e o rego referidos nos artigos 12º a 15º da p.i no estado em que os mesmos se encontravam antes dos actos referidos nos artigos 25º e 26º da p.i., designadamente retirando a canalização e aterro efectuados, deixando a poça e o rego aberto e a respectiva água fluir ao ar livre; e) absterem-se da prática de qualquer acto lesivo dos aludidos direitos de propriedade e posse dos autores.

Os RR. contestaram, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Em sede de excepções alegaram o assentimento dos AA. para a dita colocação pelos RR. dos tubos para condução da água em causa. Referiram ainda que existe uma servidão de presa que se extinguiu pelo não uso.

Alegam ainda que o entubamento da condução de água feita pelos RR. é mais favorável aos AA. Finalmente alegam o abuso de direito.

Replicaram os autores, mantendo no essencial a posição já anteriormente assumida.

Foi proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais.

No final, foi proferida sentença, que julgou a acção procedente, por provada e, em consequência, condenou os RR. a: a) reconhecer que a primeira e os segundos autores são pela forma referida nos pontos 1 a 6 dos factos provados, donos e legítimos possuidores dos prédios descritos respectivamente nos pontos 1 e 3 dos factos provados; b) reconhecer que os autores têm o direito de regar os seus prédios com a água proveniente do Ribeiro de Lemenhe, que neste é captada e conduzida para a poça existente no Campo da Levadinha, através da “Levada das Vinhas” e de aí a represar no tempo de rega e de a utilizarem como água de lima, tal como decorre dos pontos 10 a 12; c) reconhecer o direito dos autores de conduzir essa água através de um rego aberto, em terra e com a largura de cerca de um metro, ao longo de toda a largura do Campo da Levadinha, até aos prédios referidos nos pontos 1 e 3, tal como decorre dos pontos 10 a 12; d) reporem a levada, a poça e o rego referidos nos pontos 10 a 12 no estado em que os mesmo se encontravam antes dos actos referidos nos pontos 23 e 24, designadamente retirando a canalização e aterro efectuados, deixando a poça e o rego aberto e a respectiva água fluir ao ar livre; e) absterem-se da prática de qualquer acto lesivo dos aludidos direitos de propriedade e posse dos autores.

Ficando as custas a cargo dos RR.

* Inconformados com essa sentença, apresentaram os RR.

J e mulher M recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizaram, após convite de síntese, com a apresentação das seguintes conclusões: I –Caracterização dos Direitos dos Autores: a) – Direito às águas preocupadas: "Compropriedade"1À luz do disposto nos art°s. 6° e 8° da L. de Águas, L. 54/2005, de 16 de Nov., e no art°. 1386°, d), do C, Pr. Civil, não se tem dúvida de que aos autores cabe o "direito às referidas águas", "captadas", por uma "comporta", sita no dito ribeiro de Lemenhe.

Mas cujo caudal só pode, como impõe o cit. artº. 1386°, n° 2, ser usado para:

  1. Regar os ditos prédios rústicos Campo da Levadinha (dos Réus) e Campo da Vinha (da primeira autora).

  2. Movimentar o Moinho (prédio dos segundos autores).

    2E, esse direito, dos Autores, e também dos Réus, (quanto a irrigar o seu prédio) "às referidas aguas" "captadas" são direitos de compropriedade, de três consortes - face aos art°s. 1386°, 1, d); 204°, 1°, b); 1398° e 1403° e sgts do C. Civil.

    3E, também, cada um, só tem "direito apenas ao caudal necessário para o fim a que as mesmas se destinam" (cit. artº. 1386°, n° 2).

    Ou seja, a primeira autora para regar o seu Campo da Vinha. E, o segundo autor para movimentar o dito seu Moinho. E os Réus, para regar o seu Campo da Levadinha.

    4Pelo que, "se" o caudal actualmente não é "necessário" (para algum desses fins, então,) - não existe sequer "actualmente" "direito" (a exercer e proteger judicialmente).

    O que ocorre com os segundos Réus - dado estar provado que o Moinho está encerrado há mais de 35 anos.

    4.1E, para o uso de tais direitos de servidão, e conforme provado na sentença - existindo na dita "poça" (sita no Campo da Levadinha, dos Réus), o primeiro "giro", que, divide a água pelos dias e horas que pertence quer aos Réus, quer ao Campo da Vinha (pertencente á primeira Autora) e quer ao Moinho (dos segundos autores).

    4.2Por sua vez, a água que pertence ao Campo da Vinha e ao Moinho, e que pelo dito "giro" no Campo da Levadinha é "encanada", seguia em "rego, a céu aberto", por tal terreno dos Réus, até ao terreno infra, o Campo da Vinha (da primeira Autora).

    E, neste há um segundo registo, que divide a água remanescente, para ser subdividida para lima do Campo da Vinha (1ª Autora) e o Moinho (dos 2°s autores).

    Como tudo consta dos ditos n°s 12 e 13 dos factos provados.

  3. – Direitos quanto à "poça" e ao "rego", a céu aberto: - Servidão5Ora, o dito direito (de propriedade) dos Autores às referidas "águas preocupadas", não se confunde com o direito a "represá-las" (poça) nem com o "direito de condução", das mesmas. Nem com o direito aos objectos físicos da "poça" e "rego a céu aberto", (existentes no Campo da Levadinha, de propriedade dos Réus).

    5.1Sendo assim, e salvo o devido respeito, é errada a assunção pela sentença recorrida de que "do que se trata é de direito de propriedade e não qualquer direito de servidão de presa ou servidão de aqueduto" - como se expressa in fine, da epígrafe "Do direito de propriedade da água do Ribeiro de Lemenhe". (págs. 11 e sgts). Pois, tal direito apenas tem por objecto a água.

    6Pois, o direito de "encanar" as ditas águas por tal prédio alheio, consubstancia, na "unidade do sistema jurídico", um "direito de servidão de águas", na modalidade de "servidão legal de aqueduto" (art°. 1561° do C. C.). E, identicamente, uma "poça, com giros", o que origina é um "direito de presa" (art°. 1559°do C.C.

    ).

    E, assim, a sentença errou na determinação das normas aplicáveis (propriedade - art°. 1386°).

    E, violou os aplicáveis artºs. 1559° e 1561° (direitos de servidão).

    II –Amplitude do direito dos segundos Autores (Moinho)7Como decorre da matéria dada como provada, na sentença, nos pontos 11, 12 e 13 - relativamente aos segundos autores, as referidas águas de que são consortes destinam-se, tão só, "a movimentar o moinho" que lhes pertence. E, tais Autores, só têm direito ao "caudal necessário a tal fim" (cit. art° 1386°, 2).

    8Ora, há que realçar - que tal moinho presentemente e "pelo menos desde há cerca de 30 anos (que) não labora por se encontrar em ruínas (ponto 16 da sentença na matéria de facto).

    8.1Pelo que, desde logo, tais Autores, "actualmente", e "desde há pelo menos 35 anos" - que não "necessitam" de caudal nenhum das ditas águas públicas preocupadas.

    E não têm assim, actualmente, "nenhum direito" a caudal algum (cit. art°. 1386°). E, assim também, actualmente nenhum direito consistente têm a represá-las e conduzi-las pelo prédio dos Réus (limitando os direitos de uso e fruição destes) - dado o carácter (meramente) instrumental dos direitos de servidão (art°. 1543° do C.C.).

    8.2Ou, pelo menos, tal, sempre postulará, quanto ao peticionado(1):III –a) - Abuso de direito, pelos segundos A.A.

  4. - Falta de "interesse processual" c) - "Princípio da proibição de excesso"9Na verdade, "se" tais Autores presentemente e desde há, pelo menos, 35 anos, não fazem uso de tais águas - e o "moinho" não labora por se "encontrar em ruínas", e, assim, também, não têm actualmente direito a caudal algum.

    10Então, por sua vez, a reivindicação por tais autores do exercício meramente "formal" dos referidos direitos de servidão de presa e aqueduto, contra os Réus e direitos esses que nesse exercício comprimem o direito de propriedade dos Réus sobre o seu Campo da Levadinha – sempre chamam à colação a figura do abuso de direito (art°. 334° do CC.).

    10.1Na verdade, no contexto factual referido (n°s 8 e 9), desde logo, o peticionado pelos segundos Autores, nomeadamente nas alin. c) e d), (PI) – excede manifestamente os limites impostos pelo fim económico do seu direito de presa e aqueduto.

    Como, igualmente, o seu fim social, e a boa-fé e os bons costumes.

    11Bem como tal reivindicação actual viola, por sua vez, a norma constitucional do "princípio da proibição do excesso" (art°. 2° da CR).

    12Como também HÁ "FALTA de INTERESSE PROCESSUAL" actual em agir. E sobrecarga inútil dos Tribunais! Porque sem proveito, subjectivo ou social.

    Dado o carácter instrumental das servidões (artºs 1543°, 1559° e 1561° do C.C.).

    13ALIÀS, os Autores, na verdade, até estão hoje melhores do que ANTES! JÁ QUE, os Réus ao "atolarem" a "poça", deixaram...

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