Acórdão nº 70/14.4TBMDB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: - Da extemporaneidade do recurso interposto pelo FGA Veio o FGA reclamar (necessariamente para a conferência) do despacho do Relator que, por extemporaneidade do mesmo, não admitiu o recurso por ele interposto, defendendo a tempestividade do mesmo, bem como verificar-se a nulidade do despacho que julgou a inadmissibilidade do recurso por não se ter pronunciado quanto à nulidade da sentença recorrida arguida no recurso.

O Recorrido pronunciou-se sobre a reclamação apresentada, pugnando pela “manutenção do despacho reclamado”.

Passa, pois, a decidir-se da dita reclamação.

Nas respetivas contra-alegações, o Apelado suscitou a questão da extemporaneidade do objeto do recurso interposto pelo FGA, argumentando, em suma, que, não obstante pedir que se dê como provado o art. 6º da petição inicial e para tal invocar o depoimento de parte do Autor e o depoimento da testemunha J. G., de facto, o referido Recorrente não pretendeu a reapreciação da prova gravada, pelo que o recurso apresentado não pode beneficiar do prazo acrescido de 10 dias previsto no art. 638º, nº 7, do CPC, sendo, por isso, extemporâneo.

Notificado para querendo se pronunciar sobre a matéria (art. 654º, nº2, ex vi art. 655º, nº 2, ambos do Cód. Proc. Civil), o referido Recorrente nada disse.

Cumpre decidir.

É de considerar que: - A elaboração da notificação da sentença a todos os intervenientes foi efetuada no dia 26.09.2016.

- O recurso do FGA foi interposto em 08.11.2016.

- O FGA interpôs recurso da sentença proferida nos autos, alegando que o tribunal a quo entendeu condenar o Recorrente a reembolsar o ISS pelos montantes alegadamente pagos ao Autor a título de subsídio de doença mas não se encontra vertida na matéria de facto essa matéria, pelo que a sentença é nula (art. 615º, nº 1, b), do CPC); assim não se entendendo, deve considerar-se provado tal facto com base na prova produzida, nomeadamente, o depoimento de parte do Autor e o depoimento da testemunha J. G..

- Na sentença objeto de recurso lê-se, nomeadamente, que: No que diz respeito ao pedido de reembolso formulado pelo Instituto da Segurança Social, I.P./Centro Distrital de Segurança Social de VR, diremos o seguinte: O ISS alega que, em consequência do acidente em discussão nos autos, o autor, como beneficiário da Segurança Social, foi vítima de doença, por ter sofrido lesões que lhe determinaram incapacidade para o trabalho.

Por via das lesões sofridas em consequência do acidente, o Centro Distrital de VR do Instituto da Segurança Social, pagou ao autor o montante de € 10.478,60, relativo ao subsídio de doença.

Ao abrigo do disposto no art. 70º da Lei nº 4/2007, de 16-01, vem, assim, pedir o reembolso da quantia paga.

Tendo-se decidido que os demandados respondem pelo risco, na proporção de 50 % dos danos causados, é apenas nessa medida que os réus terão de reembolsar a Segurança Social, ou seja, no montante de € 5.239,30 Sobre o montante a reembolsar à Segurança Social, acrescem juros, tal como pedido, desde a data da notificação do pedido aos réus, por via do disposto nos arts. 804º a 806º do Código Civil.

O direito Nos termos do art. 638º, nº 7, do CPC, se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias.

A justificação desta extensão ou alongamento do prazo consiste na necessidade de o apelante instruir as alegações do recurso com as especificações dos meios de prova constantes da gravação cuja reapreciação, na sua opinião, determinam a modificação da decisão da matéria de facto.

A atribuição de um prazo suplementar está, pois, diretamente relacionada com o cumprimento do especial ónus de alegação, naquela específica circunstância.

Assim sendo, representaria uma fraude à lei e uma violação do princípio da igualdade das partes, que constitui também a concretização de um princípio constitucionalmente consagrado – o princípio da igualdade vertido no artigo 13º da Lei Fundamental (Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, 1996, pág. 39) -, que o recorrente pudesse obter uma ampliação do prazo de recurso, passando a dispor de um prazo superior ao que se encontra geralmente fixado, com base numa mera aparência de pretensão de reapreciação da prova gravada (neste sentido, cfr. Acórdão de 01.03.2007 da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça).

Daí que o prazo acrescido de 10 dias só seja aplicável quando o recorrente o use efetivamente para impugnar a matéria de facto (cfr. entre outros, Ac. da Relação de Évora de 11.05-2017, CJ, tomo V, pág. 242, e Ac. da Relação de Coimbra de 29.11.2007, CJ, tomo V, pág. 63).

Se assim não suceder, o recorrente não pode beneficiar do referido acréscimo de 10 dias e, em consequência, se o recurso for interposto fora do prazo normal de 30 dias, tem o mesmo de ser considerado intempestivo.

Como se pode ler no Acórdão do STJ de 09.02.2017: “A jurisprudência do Tribunal Constitucional entende que o princípio da igualdade reclama uma igualdade proporcional e que exige que se tratem por igual as situações substancialmente iguais e que, a situações substancialmente desiguais, se dê tratamento desigual.

Ora, só se verifica violação do princípio da igualdade, quando exista arbítrio, subjetividade, diferenciações materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou sem uma justificação objetiva e racional.

O que não se verifica no caso concreto.

Aqui existe uma diferenciação objetiva: existência e inexistência da reapreciação da prova gravada.

Do exposto, resulta que tal tratamento diferenciado, quanto ao acréscimo do prazo de 10 dias não viola, antes respeita, o “princípio da igualdade”.

E não o viola porque essa desigualdade é objetiva, não é discriminatória e provém de situações que não são essencialmente iguais mas de factos/realidades diferentes.” No caso, o FGA interpôs recurso da sentença proferida nos autos, alegando que o tribunal a quo entendeu condenar o Recorrente a reembolsar o ISS pelos montantes alegadamente pagos ao Autor a título de subsídio de doença mas não se encontra vertida na matéria de facto essa matéria, pelo que a sentença é nula (art. 615º, nº 1, b), do CPC); assim não se entendendo, deve considerar-se provado tal facto com base na prova produzida, nomeadamente, o depoimento de parte do Autor e o depoimento da testemunha J. G..

Na “reapreciação” desta prova gravada estaria a justificação do acréscimo do prazo.

Sucede, porém, que, como é bom de ver, nenhuma reapreciação da prova gravada está efetivamente em causa: embora, por manifesto lapso, não conste, expressamente, no elenco dos factos provados da sentença recorrida o dito pagamento, resulta à evidência que a mesma considerou tal facto provado para decidir como decidiu, tanto que, com base nele, proferiu condenação a determinar o reembolso, pelo Recorrente, de metade (em função da repartição da responsabilidade ali estabelecida) da referida quantia ao ISS.

Mais importante ainda, o FGA não pretende nenhuma modificação da matéria de facto, mas apenas que passe a constar expressamente, do elenco dos factos provados, um facto que, não obstante a omissão formal a que se alude, manifestamente, foi considerado provado pelo Tribunal recorrido e como tal tratado, pretendendo, pois, quando muito, o Recorrente, não uma alteração da matéria de facto, mas a expressa confirmação de decisão relativa a matéria de facto que, por manifesto lapso, o julgador não fez constar do referido elenco mas que se deduz do teor da própria sentença recorrida, o que não integra a base da previsão do acréscimo do prazo ora em questão.

Ora, assim sendo, a suposta necessidade de reapreciação da prova gravada não é, patentemente, face ao teor das próprias alegações de recurso do FGA, mais do que uma mera aparência, não havendo razão material que justifique o aludido acréscimo de prazo.

E esta impossibilidade de uso do alargamento do prazo em nada se relaciona com o incumprimento total ou defeituoso dos ónus estabelecidos no artigo 640º do CPC.

Isto posto.

Os mandatários são notificados nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º, devendo o sistema informático certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no 3.º dia posterior ao da elaboração ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja - art. 248º do CPC.

Assim sendo, a notificação da sentença aos intervenientes presume-se feita no dia 29.09.2016.

O recurso do FGA foi interposto em 08.11.2016, ou seja, após o termo do prazo de 30 dias que a lei prevê (art. 638º, nº 1, do CPC).

O recurso não deve, pois, ser admitido por se revelar extemporâneo, o que, necessária e manifestamente, implica a insusceptibilidade de apreciação da nulidade da sentença no próprio recurso arguida, não se verificando, pois, por essa razão, qualquer nulidade, decorrente de “omissão de pronúncia”, do despacho reclamado, por força da invocada ausência de decisão quanto à suscitada nulidade da sentença recorrida.

Decisão: Face ao exposto, por extemporaneidade do mesmo, não se admite o recurso interposto pelo FGA.

Custas do referido recurso pelo Recorrente.

*** I. RELATÓRIO: P. G. instaurou a presente ação declarativa de condenação, para efetivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, com processo comum, contra o Fundo de Garantia Automóvel e J. A. peticionando a condenação solidária dos réus a pagar-lhe a quantia de € 146.265,45 a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos e emergentes do acidente de viação em discussão nos autos, quantia acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Como fundamento para esta sua pretensão, alegou, em síntese, que: - no dia, hora e local referidos nos autos, ocorreu um acidente de viação entre o motociclo com a matrícula XX, sua propriedade e por si conduzido, e o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula YY, conduzido pelo seu...

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