Acórdão nº 7261/16.1T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: X CALÇADO; S.A..

Recorrido: Banco Y (Portugal), S.A Tribunal Judicial da comarca de Braga – Juízo de Comércio de Guimarães, J1.

O credor Banco Y (Portugal), S.A, veio deduzir o pedido de recusa de homologação do plano de revitalização da Requerente X CALÇADO; S.A..

Invoca este credor três argumentos como fundamento do pedido de não homologação, a saber: - A devedora não reunia condições para se apresentar a este novo PER; - O novo Plano comporta violação não negligenciável do princípio da igualdade de tratamento dos credores.

- O novo plano comporta violação não negligenciável da norma reguladora do conteúdo do Plano, por dele não constar sequer a comparação do impacto das alterações propostas para os credores com a situação que se verificaria na ausência de plano em violação do estatuído no art. 195º nº 2 al. d) do CIRE.

A devedora e o Sr.(a) Administrador(a) Judicial Provisório(a) pugnam pelo indeferimento da pretensão do Banco Y, pelos fundamentos que deixaram expressos nos autos nos requerimentos que antecedem.

Foi proferida nos autos decisão sobre tal pedido em que se decidiu nos seguintes termos: Pelo exposto, porque violado o princípio da igualdade entre credores e ter-se por verificada uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, considero procedente o pedido de não homologação formulado pelo credor Banco Y, Portugal, S.A., pelo que, nos termos dos arts. 17º-F, nº5; 194º, 195º e 215º, recuso a homologação do plano de recuperação apresentado a fls. 183-196 dos autos.

Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso a Requerente, sendo que, das respectivas alegações desses recursos extraiu, em suma, as seguintes conclusões: 1. In casu, face aos considerandos expostos, veio o Meritíssimo Juiz a considerar que o Plano de Recuperação da Recorrente/Devedora violou regras procedimentais não negligenciáveis, concretamente violando o princípio constante do artigo 194.º, 195.º e 215.º do C.I.R.E.

  1. Fundamentando a sua posição com o argumento de que, ainda que seja admissível um tratamento diversificado a credores, em função da sua categoria, e mesmo, que perante credores inseridos na mesma classe, como é o nosso caso, requer-se, para tanto, que tal diversificação de tratamento não presida a arbitrariedade, antes, se mostre evidenciado estarem elas assentes em circunstâncias objectivas que justifiquem o tratamento diferenciado.

  2. Assim, entendeu o Tribunal a quo que a Recorrente/Devedora no seu plano de recuperação, ainda que se esteja perante credores com origens e regime diferentes, estabeleceu, naquele, uma diferenciação de tratamento abusivo no que respeita o pagamento de juros remuneratórios e prazo de pagamento estipulado para as Instituições Financeiras e para os Outros Credores Comuns, respectivamente de 115 e 144 prestações, entre os quais media uma diferença de 29 prestações, em virtude da Recorrente/Devedora não depender de crédito bancário para a sua reestruturação. Uma vez que entende tais medidas distintas entres esses Credores, inseridos na mesma classe, não está devidamente justificável e se traduz numa enorme desigualdade de tratamento.

  3. Ora, não pode a Recorrente/Devedora estar mais em desacordo com a referida decisão do Tribunal a quo que, desde logo, não atentou à integralidade do Plano e, concomitantemente, a uma leitura correcta do mesmo. O que vem afectar a prossecução da recuperação da Recorrente/Devedora, por essa via, nem privilegiando a recuperação e manutenção da Devedora no giro comercial à satisfação de créditos dos credores.

  4. Dúvidas não há de que decorre do Plano de Recuperação da Devedora as medidas de incidência, nele, estipuladas respeitam os princípios de boa fé, igualdade e proporcionalidade.

  5. Nenhum Credor, senão apenas e só o Banco Y, requereu a não homologação do Plano.

  6. Quer doutrina, quer jurisprudência, trataram logo de consagrar que a análise das circunstâncias de cada empresa, da sua concreta situação financeira, da sua estrutura de credores, poderia e deveria justificar outros alinhamentos de créditos. Em suma razões que permitem destrinçar, dentro da mesma categoria, tratamentos diferenciados.

  7. A revitalização visa, assim, evitar os custos inerentes ao desaparecimento de agentes económicos que se encontram em dificuldades, no pressuposto de que ainda é possível mantê-los em actividade, por terem viabilidade e o esforço da recuperação não ser (pelo menos manifestamente) desfavorável aos credores (por contraposição com a liquidação do património do devedor em processo de insolvência).

  8. A Recorrente/Devedora no Plano de Recuperação, apresentado e aprovado, diferenciou no capítulo dos Créditos Comuns, como lhe cabia fazer, os Créditos das Instituições Financeiras dos Outros Créditos Comuns e, para cada um deles, estipulando medidas de incidência próprias.

  9. Para tanto as premissas do plano foram exaustivamente explicadas e fundamentadas, sem que as mesmas, por uma única vez, fossem, quer em sede de negociação, quer posteriormente, colocadas em causa! 11. Um Plano não é um mero exercício de vontade (pois se o fosse não haveria credor que não propusesse ao seu devedor o pagamento integral e a pronto!) mas sim um exercício de escolhas, proporcionais, equilibradas, que visam colher o máximo de adesão dos credores por elas afectadas, sempre balizadas e limitadas pela realidade económica e financeira da empresa! 12. Ora os credores comuns são um conjunto de credores (todos os outros, subsidiária, reitere-se e sublinhe-se), da mais distinta natureza, sujeitos a regras completamente diferentes, sejam jurídicas sejam contabilísticas.

  10. No caso concreto deparamo-nos, nesta categoria (credores comuns), com um conjunto de credores cujos créditos emergem de instituições financeiras, sujeitas a um enorme conjunto de regras, de índole nacional e comunitária, específicas, que actualmente regem todo o sector em que se inserem e com um outro conjunto de credores que na sua essência são fornecedores de serviços ou bens, essenciais à prossecução do escopo social da sociedade.

    Impunha-se efectuar escolhas e propor soluções que atendesse a todas estas especificidades e resultasse numa proposta final equilibrada e fundamentalmente, do ponto de vista económico e financeiro, exequível, passível de realmente proporcionar a recuperação da sociedade.

  11. Ora estando confrontados com a realidade de não ser possível a todos satisfazer em igual medida, conforme resulta evidente da realidade financeira da sociedade e dos meios libertos pela mesma.

    (realidade essa, reitere-se, nunca questionada, impugnada ou colocada em causa por nenhum credor) impunha-se tratar diferente o que era diferente.

  12. O normativo legal, resultante da directiva denominada Basileia III, bem como todas as recomendações do Banco Portugal, impõe que as instituições financeiras estejam completamente condicionadas, no que concerne à aceitação de reduções dos seus activos (vulgo “hair cuts” aos financiamentos concedidos), bem como as últimas directivas (Directive 2013/36/EU – Capital Requirements Directive e Regulation EU 575/2013 – Capital Requirements Regulation) obrigam a que todos os créditos concedidos, em restruturação ou não, sejam rentáveis. (a vulgarmente denominada proibição dos “non profit loans”).

  13. A reestruturação de um crédito que já tinha sido reestruturado (como é o caso dos autos) implicaria, face às mencionadas regras, que o mesmo fosse considerado um “non profit loans”.

  14. Dentro da categoria dos Créditos Comuns, a Recorrente/Devedora assegurou um tratamento igual, tanto assim, que à excepção dos juros remuneratórios e o prazo de amortização da dívida, todas as demais medidas mantêm-se idênticas.

  15. Esses dois pressupostos de diferenciação de tratamento cumprem com o princípio da proporcionalidade e asseguram a questão da arbitrariedade, pelo que são legítimos e facilmente justificáveis e atentarmos às razões que lhes está subjacente.

  16. Desde logo, deve-se ter em atenção que tipo de “juros” são mencionados no Plano e que a Recorrente/Devedora propôs que fossem acrescidos ao capital consolidado do crédito das Instituições Financeiras para que desta medida se retire a leitura correcta e objectiva. Pois, não confundamos juros moratórios de juros remuneratórios, estes, que são objecto de apreciação e apontados como sendo de exigência abusiva pela Recorrente/Devedora no seu Plano.

  17. Os juros moratórios, esses, foram no Plano da Recorrente/Devedora objecto de perdão, quer para as Instituições Financeiras, quer para os Outros Créditos Comuns e, somente os juros remuneratórios foram considerados e incluídos no pagamento dos créditos das Instituições Financeiras por consistirem em si mesmo num lucro próprio e exigível do exercício destas.

  18. Diferentemente do que sucede no processo de insolvência em que, ao abrigo e para os efeitos do artigo 102.º e segs do C.I.R.E. os “negócios em cursos” suspendem até eventual cessação, esse efeito, no P.E.R. não é exequível tão só porque se prevê a continuidade da empresa e administração mantém-se a cargo da Devedora.

  19. Razão pela qual consta do Plano o pagamento desses juros remuneratórios para as instituições financeiras e não para os demais credores comuns e estando esta, a final, devidamente justificada.

  20. Já no que respeita ao prazo de pagamento, é certo que, existe uma diferença de 29 prestações entre os Créditos das Instituições Financeiras e os Outros Créditos Comuns, contudo, sempre se diga que tal diferenciação na prática não existe.

  21. Pois, pese embora, a Recorrente/Devedora não dependa do apoio da Banca como o Tribunal a quo alegou na sua douta sentença, certo é que, as Instituições Financeiras, no seu conjunto, representam uma percentagem de 69,87% sobre a totalidade do passivo da Devedora, isto é, mais de metade do seu passivo. Enquanto os Fornecedores titulares de outros créditos comuns, representam 30,13% do...

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